Teresa e os tesouros do mar
por Vanessa Oliveira (texto) e Grão de Pó (ilustrações)
PARTE 1 | Teresa conhece o Patolas
A Teresa e a família, desta vez, foram passear à praia, no Algarve. Ainda se lembrava muito
bem da visita ao Gerês e do amigo picapau Paulo, que a levara a conhecer melhor a floresta.
Será que na praia também teria novos amigos à sua espera?
A Teresa e os primos, que com os tios mais uma vez se juntaram ao grupo, eram muito
curiosos. Não lhes chegava fazer castelos de areia... e tinham de ir explorar as rochinhas!...
Naquelas rochinhas havia muito mais do que as conchas vazias e os bocados de plástico que
viam na areia. Desde algas e limos de várias cores e formas, que obrigavam a ter cuidado ao
pisar para não escorregar, a lapas, com a sua concha em forma de «carapaça» bem colada às
rochas, ou mexilhões que, consoante a luz, pareciam ora pretos ora azul-escuros, agarrados
em grandes multidões às rochas. Nas pocinhas viam-se ouriços, que mais pareciam bolas de
picos, anémonas, que lembravam campainhas de gelatina, mas também pequenos camarões
transparentes, búzios, cracas e tantos outros seres vivos! A Teresa e os primos, cada um de
seu modo, perdeu-se naquele pequeno universo encantado.
E, de pocinha em pocinha, a Teresa foi-se afastando, até chegar a um rochedo mais alto, onde
as pocinhas só se enchiam em dias de grande tempestade. Estava perfeitamente distraída a
observar o sal que brilhava nas covinhas da rocha, quando ouviu uma voz... Não queria
acreditar que lhe estava a acontecer o mesmo pela segunda vez... Teria adormecido de novo?
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Não podia ser, parecia tudo tão real! Abanou a cabeça repetidas vezes, para ter a certeza de
estar bem acordada. E parecia estar... Uma ave branca de cabeça amarelada e patas pretas,
bem maior que uma gaivota, parada à sua frente, parecia querer falar com ela.
- Olá, quem és tu? Eu nunca te vi antes, é normal andares por aqui? - atreveu-se a perguntar.
- Bom dia! Sou o Patolas. De facto, quando estou por aqui só costumo parar no mar, mas vi-te...
e decidi vir a terra... Já deves ter visto parentes meus, pois sobrevoamos o mar perto da
costa, mas se calhar nunca reparaste...
- Pois... - admitiu a Teresa, corando, porque pensava que as aves que voavam sobre costa eram
todas gaivotas. - E como é a vista daí de cima? Deve ser linda! Ah, a propósito, eu sou a
Teresa!
- Sim, é lindo. Nem sempre gosto do que vejo e há alguns perigos mas, porque não vens ver com
os teus próprios olhos? No meu dorso estarás sempre segura.
A Teresa aceitou, agarrou-se bem ao Patolas e lá foram eles - a paisagem era deslumbrante:
via-se a falésia, a praia, o mar, as rochinhas, e as pessoas, pequeninas como formigas... Mais
adiante, já não havia falésia entre a praia e a estrada, e sim dunas - montes de areia como no
deserto, com uns tufos de plantas especiais, algumas raras, como lhe explicou o alcatraz. Nem
sempre havia praia e a costa original nem sempre se reconhecia, tal estava transformada.
Portos de carga e pesca, marinas, grandes pontões e, em alguns locais, casas e mais casas, que
a todo o momento pareciam querer desafiar as ondas do mar de uma qualquer tempestade de
inverno...
O Patolas, de vez em quando, cumprimentava outros amigos: corvos-marinhos, cagarras,
gaivotas e até golfinhos. E, quando viu um barco de pesca lançar a rede, explicou:
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- Teresa, ali deve haver comida de certeza. Mas temos de ter cuidado com as redes, pois já
muitos amigos meus ficaram ali presos e não conseguiram sair... Aliás, é um dos maiores
perigos a que nós, as aves marinhas, temos de estar atentos, mas felizmente já há pescadores
que têm cuidados - por exemplo, usam redes diferentes. Outro perigo, são os derrames de
petróleo - que é muito difícil de sair das nossas penas e polui tudo durante anos... Tantos que
muitas gerações de animais marinhos ficam doentes ou sem casa…
- Estou a ver... - respondeu tristemente a Teresa. - E aquela mancha ali ao fundo, é um
derrame?
- Não. Essa diferença de cor é devido às diferenças das águas que aí se juntam: é estuário,
onde o rio se junta ao mar. Os estuários são muito importantes - sabias que funcionam como
maternidade para muitos peixes? E que são a casa de inverno de muitos milhares de aves? E
fonte de alimento para outras que todos os anos, como eu, viajam muitos quilómetros entre a
sua casa da primavera/verão (no Norte da Europa) e a casa de inverno, mais para Sul?
A Teresa descobriu um mundo novo com o Patolas, mas era hora de voltar à praia e ir ao
banho, com a família. E que outros tesouros o mar esconderia? Na próxima semana, vamos
ficar a saber...
PARTE 2 | Tesouros debaixo do mar...
A Teresa foi ter com os primos, que já estavam na água a chapinhar. Entre mergulhos e
corridas de natação com muita risada pelo meio, não conseguia deixar de se distrair a olhar
para o que a rodeava, pois parecia que o mar falava com ela... Olhou para um lado e depois para
o outro, mas a única coisa que viu foi um saco de plástico a boiar (quem se lembraria de deixar
ali um saco?...). Continuou a brincar com os primos e, quando mergulhou, voltou a ouvir a voz -
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abriu os olhos e um cavalo-marinho piscava-lhe o olho! Estaria a ver bem?... E agora ele dizia
qualquer coisa...
- Olá Teresa, como estás?
- Estou bem, mas... como sabes o meu nome?
- Oh, isto, as notícias nadam depressa!... Digamos que foi uma «avezinha» que me disse que
tinhas ido passear com ele... A propósito, deixa que me apresente: sou o Hipo.
- É verdade, gosto muito de conhecer lugares novos! E tu... também me podes levar a passear?
Hipo, que tinha a cauda enrolada a uma alga, girou de contente! Parecia ter ouvido palavras
mágicas, pois adorava mostrar o seu mundo subaquático, e ainda não tinha tido a sorte de ser
o guia de uma menina como a Teresa. Em geral, eram os cientistas da universidade que vinham
com ele, mas os cavalos-marinhos guia acreditavam que as crianças são ouvintes mais atentos.
Seguiram nadando lado a lado, encontrando peixes e outros seres vivos das mais variadas
formas e cada vez mais coloridos. Nadaram até verem lindos recifes de coral, que pareciam
obras de arte esculpidas em pedra, mas não eram mais do que o esqueleto exterior dos corais,
que por dentro parecem borracha, como as anémonas que viviam nas rochinhas. E com uma
curiosidade quase científica, a Teresa perguntou:
- Oh Hipo, porque é que há corais tão coloridos e outros a ficar brancos?
- Oh, isso é uma história complicada... Em muitos casos, as algas, que vivem com os corais e
lhes dão a cor, vão para outros lados, porque a temperatura da água do mar está a subir com
as alterações climáticas, por exemplo...
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- Pois... estou a ver que o fundo do mar não é todo igual, e que também é frágil, como as
florestas!...
- Sim, há muitas diferenças... Há zonas assim, em que se vê quase tudo, e outras, muito
profundas, sem nenhuma luz, com peixes que até parece terem lanternas incorporadas! Em
cada região do nosso planeta pescam-se peixes diferentes e há datas específicas para se
poder pescar, pois há alturas em que a maioria dos peixes ainda são bebés. E não há só peixes
- há polvos, lulas, caranguejos e lagostas. E baleias - que são mamíferos, como tu!
- Quem diria?... O mar tem mesmo tantos tesouros!
- E ainda só viste uma parte, Teresa. Há muitos seres vivos no mar, que não é só fonte de
comida para os humanos Muitas aves como o Patolas, alimentam-se quase só de peixe e sem ele
não podem viver. Além disso, o mar e os oceanos servem como verdadeiras estradas em que
enormes barcos transportam pessoas e carga e são ainda grande fonte de energia. A energia
vem das ondas, das marés, do vento e do fundo do mar - há grandes plataformas que o furam
para chegar ao petróleo e ao gás natural que estão lá guardados. O petróleo serve depois para
fazer gasolina, plásticos, e muitas outras coisas do vosso dia a dia. E, ainda hoje, há muitas
coisas por descobrir no mar!
- O Patolas também me disse que muitos peixes do mar nascem nos estuários, onde os rios vão
dar ao mar, e também vi que do mar vem o sal que usamos na cozinha. - acrescentou a Teresa.
- É verdade. Mas é também nos estuários onde eu vivo a maior parte do tempo - é mais calmo,
sabes? - respondeu o Hipo. Entretanto, regressados do oceano distante que haviam visitado,
aproximaram-se de uma densa floresta de algas - tinham atravessado toda a praia e acabavam
de entrar na ria. De repente, só se ouviu o Hipo gritar "cuidado, vem aí um barco!".
Felizmente, ambos conseguiram desviar-se a tempo, e o Hipo continuou:
- Sabes, a vida na ria nem sempre é fácil: às vezes, e apesar de ser uma área protegida e aqui
a pesca ser controlada, os barcos partem as algas que nos servem de abrigo. Há também
redes abandonadas e lixo trazido pela maré. - O Hipo fez uma pausa, deixando escapar umas
bolhas de ar pelo seu longo focinho amarelo. - Como vês, está tudo ligado - o rio, o mar, a
praia, as dunas e as falésias e todos os seres vivos, incluindo os humanos... A boa notícia é que
os humanos vão conhecendo cada vez mais todo este ecossistema marinho, e sabendo melhor
como todos podemos viver em equilíbrio...
Nisto, a Teresa ouviu outra voz. Desta vez não era nenhum animal e sim os pais que a
chamavam para sair da água, pois tinham de ir almoçar. Do Hipo não havia rasto e ela já não
sabia se tinha vivido mesmo aquela aventura debaixo de água ou se a tinha sonhado... Mas uma
coisa era certa: queria fazer mais viagens daquelas e a hora de almoço era a altura ideal para
partilhar o que ficou a saber dos tesouros do mar com a família!
FIM
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Conto "Teresa e os tesouros do mar"