Quadro geral dos
vícios das declarações negociais
Quadro geral
1
Vícios no processo de decisão ou de exteriorização da
decisão tendente à produção de efeitos jurídicos
Classificação dos vícios em função dos estádio do
processo em que se manifestem e das circunstâncias
subjacentes:

Vícios na exteriorização da decisão
Vícios na representação dos elementos em que
a decisão de baseia


2
Vícios na decisão propriamente dita
1. Vícios na exteriorização da decisão
Desconformidade entre o conteúdo da declaração
negocial exteriorizada e o conteúdo da decisão
tomada pelo declarante
Simulação
Reserva
mental
Declarações
Erro
3
não sérias
na declaração
2.
Vícios na representação dos elementos em que a
decisão de baseia
Inadequada representação dos elementos em que o
declarante se baseou para formar a sua decisão no
sentido da produção de determinados efeitos jurídicos
4

Erro espontâneo

Erro provocado (dolo ilícito)
3.
Vícios na decisão propriamente dita
Constrangimento da liberdade e esclarecimento da
decisão do declarante
5

Coação moral (distinção em relação à coação
física)

Falta de consciência da declaração

Incapacidade acidental
Exercício
Abel é proprietário de um prédio rústico, contíguo a um prédio
rústico pertença de Belmiro. Abel pretende adquirir este último,
o que Belmiro recusa. Perante isto, Abel adverte-o de que ou
este lhe vende o prédio por um preço de conveniência ou avisará
a repartição de finanças de que Belmiro sonega parte dos seus
rendimentos para efeitos de IRS.
Belmiro acaba por vender, na forma legalmente exigida, o
prédio a Abel em Janeiro de 2001, vindo a regularizar a sua
situação fiscal seis meses mais tarde.
Quid iuris?
6
Coação moral
Vício do negócio = medo
Requisitos:
 Ameaça – medo induzido pela contraparte
ou por terceiro (cfr. 255.º, n.º 2)
 Intenção de coagir – extorquir a declaração
 Ilicitude da ameaça – cfr. 255.º, n.º 3
 Causalidade da ameaça:
ameaça
medo
declaração negocial
(essencialidade – determinação do conteúdo
da declaração)
7
255.º, 256.º
Coação moral e coação física
Coação física (não coação moral por
meios físicos) – privação de liberdade
Consequência:
 Inexistência – simples aparência de
agir negocial (não produz qualquer efeito) –
PPV
 Nulidade
–
inexistência
de
manifestação de vontade, apenas
aparência (mas… tutela da confiança da
contraparte…) – MC
8
246.º
Falta de consciência da declaração
Emissão de uma declaração, com aparência de
declaração negocial mas sem consciência
Consequência:
246.º
 Inexistência – não produz qualquer efeito –
PPV
 Nulidade – inexistência de manifestação de
vontade, apenas aparência (mas tutela da
confiança da contraparte…) – MC
9
Incapacidade acidental
Requisitos:
 Deficiência de discernimento e de liberdade
na decisão negocial
 No momento da prática do acto
(momentâneo)
 Facto notório ou do conhecimento do
declaratário (STJ 15-2-1989 – cognoscível por
um declaratário com normal diligência)
Tipo particular
(incapacidade)
10
de
vício
Consequência: anulabilidade
na
decisão
257.º
Erro
Erro-obstáculo – na exteriorização da decisão
 Erro na declaração – 247.º
 Erro de cálculo ou de escrita – 249.º
 Erro na transmissão da declaração – 250.º
Erro-vício – inadequada representação dos
elementos, falsa percepção da realidade
 Erro sobre a pessoa – 251.º
 Erro sobre o objecto do negócio – 251.º
 Erro sobre os motivos – 252.º, n.º 1
 Erros sobre a base do negócio – 252.º,
n.º 2
11
Exercício
António é comerciante de electrodomésticos na cidade do Porto.
Desde há muito comprava a Bento televisores para revenda ao
público. Os aparelhos pertençam sempre ao tipo B. Numa das suas
últimas encomendas sucedeu-lhe, por lapso e sem se aperceber disso,
pedir aparelhos do tipo V, um modelo de luxo e muito mais caro.
Quando recebe a remessa, descobre imediatamente o equívoco.
a)
b)
12
Poderá António desfazer o negócio?
Suponha agora que António queria efectivamente encomendar
aparelhos do tipo V. Acontece, porém, que depois de os ter
recebido, fica a saber que em tempos de austeridade não haverá
procura para esses televisores de luxo. Poderá António desfazer o
negócio?
Erro na declaração
Divergência não intencional entre a decisão e a
declaração negocial
Requisitos:
 Essencialidade – sobre um elemento do
negócio que seja determinante da celebração
 Cognoscibilidade (com diligência normal)
Consequência:
 anulabilidade
 possibilidade de validação – 248.º
13
247.º
≠ Erro na transmissão (se for com
dolo do núncio – anulável mesmo
que não exista essencialidade e
cognoscibilidade – 250.º, n.º 2)
≠ Erro de cálculo ou de escrita
 Consequência: Rectificação
 Condições: revelado pelo contexto
ou circunstâncias da declaração
14
Exercício
António é comerciante de electrodomésticos na cidade do
Porto. Desde há muito comprava a Bento televisores para
revenda ao público. Os aparelhos pertençam sempre ao tipo B.
Numa das suas últimas encomendas sucedeu-lhe, por lapso e
sem se aperceber disso, pedir aparelhos do tipo V, um modelo
de luxo e muito mais caro. Quando recebe a remessa, descobre
imediatamente o equívoco.
a)
b)
15
Poderá António desfazer o negócio?
Suponha agora que António queria efectivamente
encomendar aparelhos do tipo V. Acontece, porém, que
depois de os ter recebido, fica a saber que em tempos de
austeridade não haverá procura para esses televisores de luxo.
Poderá António desfazer o negócio?
Erro sobre a pessoa ou sobre o objecto
Pessoa do declaratário
Identidade ou qualidades
Objecto
Identidade ou qualidades (também jurídicas) ou valor
Objecto ou conteúdo
Regime (247.º) – Requisitos:
 Essencialidade do elemento
 Cognoscibilidade (conhecimento ou dever de
conhecer)
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Consequência: anulabilidade
251.º
Erro sobre os motivos
252.º/1
Requisitos:
 Essencialidade do elemento
 Acordo (mesmo que tácito – STJ: “recíproco
reconhecimento”; PPV – “base negocial subjectiva”) –
interpretação do NJ
Consequência: anulabilidade
17
Erro sobre a base do negócio
Falsa representação do quadro circunstancial do negócio,
ambiente envolvente
Erro bilateral (CM) ou mesmo unilateral (MC, PPV – “base
negocial objectiva”)
Regime: 447.º
 Alteração anormal em relação às circunstâncias em que as partes
fundaram a decisão de contratar (ao equilíbrio económico do NJ)
 Exigências das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os
princípios da boa fé (perturbação da justiça interna do NJ)
 Não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato
18
252.º/2
Erro sobre a base do negócio
252.º/2
Consequência:
MC – interpretação restritiva da remissão – aplicação do
regime comum do erro – anulabilidade (retroactividade)
OA, PPV – adaptação do regime do 447.º – modificação ou
anulação
19
Erro provocado por dolo
Requisitos:
 erro do declarante
 erro causado ou dissimulado por declaratário ou terceiro
 recurso (declaratário/terceiro) a artifício ou dissimulação
Consequências:
 Anulabilidade
 Responsabilidade civil (v.g. 227.º)
20
253.º
Declaração não séria e Reserva mental
 Declaração cénica, sem intenção negocial
 Expectativa de que seja conhecido
245.º
do
interlocutor (objectivamente cognoscível – tutela
da confiança)
 Consequência:
 Inexistência – PPV
 Nulidade – MC
 Intuito interior de enganar o declaratário +
divergência em relação à declaração
 Consequência: irrelevante
 Se for conhecida do declaratário – 244.º/2
(MC - interpretação restritiva – desde que
declaratário com ela concorde)
21
244.º
Exercício
Abel é proprietário de um prédio rústico X, contíguo a um prédio rústico Y
pertença de Belmiro. Abel pretende adquirir este último, o que Belmiro
recusa. Perante isto, Abel adverte-o de que ou este lhe vende o prédio por um
preço de conveniência ou avisará a repartição de finanças de que Belmiro
sonega parte dos seus rendimentos para efeitos de IRS.
Belmiro acaba por vender, na forma legalmente exigida, o prédio a Abel em
Janeiro de 2001, vindo a regularizar a sua situação fiscal seis meses mais tarde.
Em Outubro do mesmo ano, Abel doa os dois referidos prédios ao seu
sobrinho Carlos, mas na respectiva escritura os contraentes declaram que
efectuam uma venda pela quantia de 800 euros. De seguida, Carlos vende, na
forma prescrita, os prédios a Daniel, entretanto regressado do Brasil onde
estivera emigrado e que era alheio a tudo quanto sucedera. Daniel regista
imediatamente as aquisições.
Em Maio de 2002, Belmiro pretende reaver o prédio Y e Abel pretende ao
mesmo tempo reaver os imóveis de que dispusera.
22
Quid iuris?
Hipótese (teoria geral da batata doce)
23
Antenor é um grande proprietário rural. Bernardo, seu vizinho,
dedica-se à cultura biológica da batata doce e compra a Antenor 300
ha de terreno para juntar à sua exploração de 100 ha e expandir a
cultura do dito tubérculo, ocupando os 400 ha.
Para fugir aos impostos, resolvem declarar na escritura pública, que
optam por outorgar, que entre eles se celebrou um contrato de
arrendamento rural.
César, também vizinho de Antenor, descobre que este vendeu o
terreno a Bernardo porque o ouviu, durante uma soneca debaixo de
um chaparro, confessar toda a história.
César quer exercer o seu direito de preferência, relativamente ao
contrato de compra e venda.
Sabendo que Bernardo entretanto foi informado da existência de
uma lei de 2001 que proíbe plantações de batata doce superiores a
200 ha, explique o que podem fazer os intervenientes para
acautelarem os seus interesses.
Simulação
Elementos:
 Acordo ou pacto simulatório
 Divergência entre a aparência exteriorizada e a realidade negocial
 Intuito de enganar terceiros
240.º
Simulação absoluta ou relativa (241.º/1)
Ex: simulação de preço para reduzir incidência de imposto
Ex: simulação de venda para dissimular doação
24
Simulação inocente ou fraudulenta
(intenção de prejudicar)
Simulação
Forma (241.º, n.º 2):
CM, CF – desde que no documento que consubstancia o simulado constem os
elementos para os quais sejam determinante a exigência de forma legal
MC – necessidade de observar o 238.º
PPV – desde que a forma necessária para o dissimulado tenha sido observada no
negócio aparente (sentença que declare a simulação exprime os elementos
não cobertos por essa forma)
Consequência: Nulidade – regime especial: 242.º e 243.º
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
Arguição por terceiros – 286.º

Arguição por simuladores entre si mas inoponibilidade a terceiros
de boa fé
Exercício
A vende a B um imóvel sito em Lisboa e numa zona histórica mas declaram
na escritura pública um preço inferior ao real para efeitos de pagamento de
menos impostos.
A Direcção Regional de Cultura de Lisboa e Vale do Tejo – IGESPAR,
decide exercer o direito legal de preferência do qual é titular na alienação
do imóvel objecto deste contrato.
O IGESPAR pretende adquirir pelo valor declarado na escritura.
Podem A e B invocar a nulidade do negócio?
26
 Preferência pelo preço declarado
Simulação é um acto ilícito, simuladores não devem ser
protegidos. Titular do direito de preferência deve poder exercêlo.
PPV
 Preferência pelo preço real
Terceiros preferentes não podem invocar a boa fé para optarem
por um preço inferior ao real (seria um enriquecimento
estranho à ratio da lei).
MP – ratio não pode ser facultar o enriquecimento do preferente
MC, CF – abuso de direito
27
Exercício:
Joaquim, beirão, propôs vender a Luís, minhoto, dez pipas de vinho tinto por
2500€. Na Beira Alta uma pipa de vinho corresponde a 500 litros e no Minho a
550 litros.
A proposta chegou ao conhecimento de Luís no dia 9 de Fevereiro de 2007.
Como este não deu qualquer resposta naquela semana, Joaquim encarregou
Manuel – ao qual prometeu pagar 50€ - de ir “convencer” Luís a aceitar a
proposta. No cumprimento do encargo, Manuel espancou violentamente Luís,
após o que este assinou uma carta na qual aceitava a proposta de Joaquim.
A aceitação foi enviada por correio no dia 17 de Fevereiro e chegou ao
conhecimento de Joaquim no dia 19 do mesmo mês.
a)
b)
28
c)
Excluída a intervenção de Manuel, as declarações dariam lugar a um
negócio jurídico?
Sendo válido o negócio, quantos litros de vinho vendeu Joaquim a Luís?
Qual a validade de negócio celebrado entre Joaquim e Manuel e da
aceitação de Luís?
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Erro na declaração - Faculdade de Direito da UNL