Centro de Capacitação em Gestalt
Terapia
Curso deEespecialização em Gestalt
Terapia – gt3
Cintia Mara Lavratti
CLÍNICA DA AFLIÇÃO –
“MISERY”
O PROCESSO DE CONTATO
 “Contato
é achar e fazer a solução
vindoura”. (PHG, 1951, p. 48)
 Portanto
o contato é sempre um evento
temporal: intercâmbio entre materiais
intencionalmente “co-dados” (retidos e
doados como orientação) e materiais
“dados” na experiência, tal como os
vividos essenciais da fenomenologia.
O ATUAL E O INATUAL
Os intercâmbios que se dão no campo atrelam
inexoravelmente um dado material e atual,
presente na fronteira de contato, a um codado inatual que é imantado do fundo de
vividos e orienta a ação no horizonte de
possibilidades.É a experiência da unidade
que, em cada contato,
experimentamos relativamente a todas as
outras experiências de contato .
SELF COMO VIVIDO
Sistema de contatos no presente transiente
 Agente de crescimento
 O self é uma sorte de espontaneidade, que somos nós
mesmos, sempre engajados em uma situação – que é
o campo organismo/meio – na qual nos
experimentamos únicos de diversas formas:
- como seres anônimos (nas funções vegetativas, no
sono, na sinestesia, no hábito, nos sonhos, etc);
- como indivíduos (na sensomotricidade, nas formas
de consciência que a habitam, na fala, etc) e
- como “realidades” objetivas (nas identificações
imaginárias, nas formações lingüísticas já
sedimentadas
como
aquisição
cultural,
nas
instituições, nos ideais).

FUNÇÕES DO SELF

FUNÇÃO ID
GENERALIDADE INDETERMINADA
Intencionalidade deliberada no domínio
irreflexivo
Retenção de nossos vividos, construindo um
fundo histórico.
 Responsável por reter e repetir na forma de
hábitos inacessíveis a lente que configura a nossa
história e nos orienta nos deslocamentos que
realizamos no campo.

 Domínio
do excitamento ou das
necessidades.
 Generalidade sensório-motora
(indeterminada) que surge na fronteira
de contato de modo espontâneo.
FUNÇÃO EU
INDIVIDUALIDADE DELIBERADA
Intencionalidade deliberada que pode estar no
domínio irreflexivo ou reflexivo
- Criação
- Destruição
- Deliberação
- Ação: motora
 Ações
motoras e linguageiras (fala falante e
falada)
 “Sistema de identificações e alienações” que
desempenhamos com nossa musculatura a
partir de um fundo histórico (função id) e em
proveito de novas configurações materiais
presumíveis.
 Gera uma individuação, cria um indivíduo,
que é tão somente um certo movimento ou
uma
certa
palavra,
enfim,
um
comportamento
que
introduz
uma
modificação no campo.
FUNÇÃO PERSONALIDADE
GENERALIDADE DETERMINADA
Intencionalidade deliberada no domínio
reflexivo
- Assimilação
- Reconhecimento
Ex.: linguagem, cultura, papéis.
A
função personalidade corresponde a nossa
capacidade para representar nossas próprias
vivências de contato. É a réplica verbal do
self.
 É um fundo de formas ligadas à conteúdos =
pensamentos: falas faladas – tudo aquilo de
que eu possa me lembrar, que eu possa
recordar deliberadamente.
 O self aqui é uma generalidade
linguísticamente determinada com um
conteúdo semântico = biografia.
 Ela
é o sistema de pensamentos, valores e
instituições às quais recorremos no intuito
de lograrmos uma identidade, um “ser
social”. Assim compreendida, a função
personalidade é uma espécie de “ELO QUE
ASSEGURA
O
PERTENCIMENTO
SOCIAL” que experimentamos junto aos
grupos que integramos, aos valores que
assumimos e aos expedientes lingüísticos de
que nos servimos como “réplica verbal” de
nossas vivências de campo (PHG, 1951, p.
188).
COMPROMETIMENTOS DAS FUNÇÕES
DO SISTEMA SELF
 Comprometimento
da função ID
 Opera um tipo específico de ajustamentos
voltado exclusivamente para o fundo de
excitamentos que ou não foi retido ou foi
retido de forma desarticulada, e portanto
não se doa como orientação atual. “Busca”
uma estratégia de atender a demanda feita
no campo relacional não importando o
horizonte de possibilidades apresentado
através do dado material na fronteira de
contato.
 Comprometimento
da função EU
 Inibição
sistemática de um fundo de
excitamentos impedindo uma ação criativa
do self no horizonte de possibilidades
futuras, acarretando a re-petição de uma
forma inatual e anacrônica de interação.
 Evitação dos excitamentos ancorada em um
risco/perigo que não está mais no campo
atual.
COMPROMETIMENTO DA FUNÇÃO
PERSONALIDADE
 Falha
no funcionamento espontâneo do sistema
self, o que significa dizer, uma falha na
experiência de contato, cuja conseqüência é a
não produção de uma função personalidade.
Determina uma vivência aflitiva, representada
por uma impossibilidade real no campo.
 A criação, em situações em que se pode
verificar ajustamentos aflitivos, tem relação
com a solidariedade, com os pedidos genuínos
de inclusão, na forma da qual efetivamente
atribuímos e reconhecemos o poder do
semelhante para nos ajudar.
 Dizendo
de outro modo: apesar de dispormos
de um fundo de excitamentos (função id), a
falta de dados (de uma realidade material e
sociolingüística) impede o sistema self de agir,
de
desempenhar
a
função
de
ego.
Conseqüentemente, o sistema não apenas
deixa de estabelecer o contato entre sua
dimensão passada (excitamentos) e sua
dimensão futura (expectativas, desejos), como
também se vê impedido de assumir um valor
ou identidade objetiva no presente. A função
personalidade, portanto, não se desenvolve e
o processo self sofre em decorrência de não
poder assumir uma identidade objetiva.
 Perls,
Hefferline e Goodman chamam essa
situação de “misery”, “aflição”, conforme a
tradução brasileira) (1951, p. 235) e
“sofrimento
ético-político,
segundo
a
concepção do casal Müller-Granzotto (2007)
 Enquanto
na psicose o self não pode se
conservar de maneira estruturada, no
ajustamento aflitivo o self não pode crescer e
constituir uma identidade objetiva.
 Nos
ajustamentos aflitivos, a função de ego
faz da ausência de dados (da exclusão
social) um “pedido de socorro”.
 Dessa forma, ao mesmo tempo em que
aliena seu poder de deliberação em favor do
meio, dá ao meio o status objetivo de
alteridade. Por outras palavras: o pedido de
socorro faz do meio um “semelhante”.
O
“semelhante”
não
é,
como
nos
ajustamentos neuróticos, a personalidade a
quem manipulamos de sorte a ela se
responsabilizar
por
nossa
ansiedade
(excitamento inibido).
 Ao
contrário, “o semelhante” é a
personalidade em quem reconhecemos uma
genuína capacidade de ajuda solidária, que
favoreça nossa inclusão.
 Neste
sentido
o “semelhante”
atua
funcionando como um ego auxiliar,
oferecendo um meio por intermédio do qual
a inclusão possa acontecer.
 Isso
quer dizer: nos ajustamentos aflitivos, o
semelhante não é responsabilizado por nosso
“sofrimento”. Ele é convocado a nos ajudar,
apoiar... Em vez de manipulação há sim
autorização.
 Supomos que ele (o semelhante) saiba como
nos ajudar a lidar com isso que para nós é
impossível naquele momento: a inclusão em
determinado contexto social, que pode ser
desde o setting terapêutico a uma vaga em
um hospital.
 “O
ajustamento ético-político, portanto, é um
pedido de reconhecimento, mas um pedido
especial, uma vez que ele parte de alguém
que não consegue mais se identificar à
realidade natural e social em que se
encontra.
Não
há
um
pedido
de
reconhecimento específico voltado para esta
ou aquela identidade. O sofredor não sabe
sequer o que lhe falta. Seu pedido é para que
ele possa voltar a pedir. Trata-se de um
ajustamento cuja meta é encontrar “suporte”
para que se possa voltar a criar, para que os
ajustamentos criadores voltem a acontecer...”
DERIVAÇÕES TEÓRICAS
Bader Sawaia (1999) – sofrimento ético político
Impossibilidade do sujeito em encontrar um
“lugar” ético no qual seja possível ser um ser
político, incluído e demendante.
Vygotsky (1986) - compreensão do sujeito como
um “quase social”, pois é somente nas relações
com o outro que se constitui o sujeito.
 MODOS
CLÍNICOS DOS
AJUSTAMENTOS AFLITIVOS.
 Adoecimento somático
 Acidentes e fatalidades
 Crise reativa
 Surto psicótico
 Exclusão social
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