A argumentação jurídica antes das
teorias da argumentação jurídica
A retórica judicial
GIOVANNI DAMELE
A retórica judicial
Argumento psicológico
(ou recurso à vontade do legislador concreto)
A cada enunciado normativo deve ser atribuído o significado
que corresponde à vontade do “emissor” ou autor do
enunciado, a saber, do legislador em concreto, do legislador
histórico.
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Este argumento é condicionado pela adesão à ideologia da
fidelidade do juiz à lei;
Por sua própria natureza, é mais eficaz na altura da emissão da
lei, e não quando há uma grande distância temporal entre a
aplicação do enunciado e a manifestação da mens legis;
Apenas poderá ser utilizado com êxito quando a vontade
normativa do autor do documento efectivamente subsistir;
Privilegiar o argumento psicológico promove a imobilidade da
aplicação normativa.
A retórica judicial
Argumento histórico
(ou presunção de continuidade ou hipótese do
legislador conservador)
É um argumento pelo qual, considerando um enunciado
normativo, à falta de indicação em contrário, deve ser-lhe
atribuído o mesmo significado normativo que
tradicionalmente era atribuído ao enunciado normativo
previamente existente, que disciplinava a mesma matéria na
mesma organização jurídica; ou, em alternativa, deve
estender-se-lhe o significado normativo que esteja contido
num documento arquetípico de outra organização.
A retórica judicial
Argumento a contrario
(ubi lex voluit, dixit; ubi noluit, tacuit)
É um argumento pelo qual, quando há uma norma determinada
que predica uma dada qualificação normativa (por exemplo:
um poder, uma obrigação, um status) de um sujeito ou de
uma classe de sujeitos, à falta de uma norma expressa devese excluir a validade de uma norma diferente que predique a
mesma qualificação normativa para qualquer outro sujeito
ou classe de sujeitos.
A retórica judicial
Argumento literal
(considerações de ordem sintáctica ou gramatical)
Com este argumento atribui-se aos enunciados normativos, ou
às palavras e aos termos neles contidos, o significado que
assumem na conversação ordinária e/ou no linguajar
técnico-jurídico, e na relação sintáctica entre eles. É
sugerido por elementos específicos, estruturais ou
substanciais, do enunciado a interpretar.
A retórica judicial
Argumento a coherentia
(ou da coerência da disciplina jurídica)
É o argumento pelo qual, em presença de duas normas que
respectivamente predicam duas qualificações normativas
incompatíveis entre si, deve-se concluir que, pelo menos
uma das duas normas não valha (não seja válida, não exista)
em geral ou não seja aplicável no caso particular.
 Horizontal – coerência entre leis;
 Vertical – interpretação adequadora à constituição e às
normas supranacionais e internacionais.
A retórica judicial
Argumento a completitudine
(ou da “completude” da disciplina jurídica)
Pode ser definido como o argumento pelo qual, ao não poder
encontrar uma norma que, para um comportamento dado
ou para um sujeito, atribua uma qualificação normativa ao
dito comportamento, deve-se concluir que, contudo, valha
(que seja válida, que exista) uma norma que atribui ao
comportamento não regulado uma qualificação normativa
determinada.
A retórica judicial
Argumento económico
(hipótese do legislador não redundante)
É um argumento pelo qual se exclui a atribuição a um
enunciado normativo de um significado que já está atribuído
a outro enunciado normativo, preexistente ao primeiro ou
hierarquicamente superior ao primeiro ou mais geral do que
o primeiro, e isso porque se a atribuição de significado não
fosse excluída, encontrar-nos-íamos perante um enunciado
normativo supérfluo.
A retórica judicial
Argumento ab absurdo
(ou apagógico)
É o argumento pelo qual se deve excluir a interpretação de um
enunciado normativo que comporte consequências
absurdas. Este argumento deve ser utilizado juntamente
com outros argumentos jurídicos, como o teleológico ou o
equitativo. Sem dúvida, trata-se de um argumento débil e
equívoco, uma vez que a noção de absurdo é relativa,
mutável e, sobretudo, subjectiva.
A retórica judicial
Argumento sistemático
(ou hipótese do direito ordenado)
É o argumento pelo qual a um enunciado normativo ou a um
conjunto de enunciados normativos (entendidos como
relacionados entre si exactamente com a finalidade de
garantir uma interpretação “sistemática”) deve atribuir-se o
significado prescrito, ou não se deve atribuir o significado
proibido pelo “sistema jurídico”.
 Argumento topográfico ou da sedes materiae
 Argumento da constância terminológica
 Argumento conceptualista ou dogmático
A retórica judicial
Argumento naturalista
(ou da natureza das coisas ou hipótese do legislador
impotente, referência ao common sense)
Este argumento não surge como argumento interpretativo, mas
como argumento produtivo. Enquanto tal, fundamenta-se
em concepções do direito segundo as quais as relações
sociais são disciplinadas pela natureza em geral, ou pela
natureza dos homens, ou pela “natureza das coisas”. De
acordo com o argumento naturalista, portanto, o que
determina a inaplicabilidade de uma lei é o facto de esta ser
contrária à própria natureza da coisa.
A retórica judicial
Argumento a simili
(analogia legis)
É o argumento pelo qual, existindo uma norma que predica
uma qualificação normativa determinada (por exemplo, um
poder, uma obrigação, um status) de um sujeito ou de uma
classe de sujeitos, deve-se concluir que valha (que exista,
que seja válida) uma norma diferente que predique a mesma
qualificação normativa face a outro sujeito ou classe de
sujeitos, que tenha com o primeiro sujeito ou com a
primeira classe de sujeitos uma similaridade ou “analogia”
assumida como relevante com respeito à identidade da
disciplina jurídica.
A retórica judicial
Argumento a partir dos princípios gerais
(analogia iuris)
Trata-se de um argumento produtivo, quando utilizado para
preencher lacunas do direito, e de um argumento
interpretativo, quando utilizado para atribuir, ou para
motivar a atribuição, ou para propor a atribuição de
significados a enunciados normativos.
A retórica judicial
Argumento teleológico
(ou hipótese do legislador dotado de finalidades)
É o argumento pelo qual a um enunciado normativo deve
atribuir-se o significado que corresponde ao fim próprio da
lei da qual o enunciado é documento. Concerne ao espírito e
à finalidade da lei.
A retórica judicial
Argumento a fortiori
É um procedimento discursivo pelo qual, dada uma proposição
normativa que afirma uma obrigação ou qualificação
normativa de um sujeito ou de uma classe de sujeitos,
conclui-se que, com maior razão, essa afirmação se aplicaria
a uma prescrição normativa que abrangeria a primeira.
 O argumento a minori ad maius: aplica-se às qualificações
desvantajosas como, por exemplo, as proibições;
 O argumento a maiori ad minus: aplica-se às qualificações
vantajosas como, por exemplo, os direitos.
A retórica judicial
Argumento ab exemplo
A um enunciado normativo atribui-se-lhe o significado que lhe
foi atribuído por alguém, só por este feito.
Permite interpretar a lei segundo os precedentes, conforme
uma decisão geralmente aceite
 Referência à opinio doctorum
 Referencia aos precedentes judiciais
 Referência explícita ao “direito vivente”
 Referencia à aplicação administrativa
 Referencia aos próprios precedentes
 Referência a outros ordenamentos
A retórica judicial
Argumento equitativo
(princípios de justiça utilizados para seleccionar os
significados das disposições)
A equidade serve para determinar, entre diferentes
interpretações possíveis e culturalmente toleráveis, aquela
que está em menor conflito face às ideias, que o juiz
comparte com a sociedade, sobre o “bom” resultado da
aplicação do direito no caso concreto. Neste sentido, o
argumento equitativo serve para evitar interpretações e
aplicações consideradas como “iníquas”.
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INT - Faculdade de Direito da UNL