A Influencia da emoção em
Julgadores
Os julgadores

Julgam juízes e jurados; julgam os que acusam e os que defendem. Julgam
os que opinam. Entretanto, todos trabalham antes com a realidade dos
relatos do que com os fatos.
Os desafios de julgar

O examinar (do delegado de polícia, do advogado, do promotor, do juiz)
compreende um confronto de linguagens e pensamentos entre o que
pergunta e o responde.

Do primeiro exigem-se conhecimentos mínimos a respeito das técnicas de
entrevistar. Existe um componente metodológico do qual depende a
qualidade dos resultados desse confronto; esse aspecto burocrático e
inevitável possui grande importância, porque dele derivam os conteúdos
que comporão alicerce de qualquer interpretação.

O domínio dessa metodologia requer a compreensão profunda de dois
conjuntos de conhecimentos completares e das técnicas de sua aplicação.

O primeiro deles consiste em dominar os procedimentos de entrevistas
e o segundo, as estratégias para estabelecer sintonia emocional com o
entrevistado. Um não prescinde do outro; sem o domínio dos
procedimentos, prejudica-se a sintonia; se não há sintonia, os
procedimentos não bastam para a obtenção de informações.

A sintonia emocional, que consiste em se atingir uma interação entre
entrevistador e entrevistado por meio da qual o entrevistador consiga
compreender a natureza das principais emoções que dominam o
entrevistado.
ex. compreender quando alguém está disposto a mentir faz parte dessa
sintonia (desconhecer o fato distorceria as interpretações das respostas);

Entender que a emoção domina profundamente uma pessoa possibilita ao
entrevistador identificar limites a estabelecer ou respeitar.

Quando existe sintonia emocional, o entrevistador:
-
Percebe e interpreta sinais do estado de tensão do indivíduo, de emoções
que o dominam e efeitos que possam ocasionar em seu comportamento,
no seu entendimento do quadro que cerca o conflito e na sua capacidade
de elaborar as respostas;
-
Identifica as informações relevantes para entender o percurso histórico dos
acontecimentos, na quantidade e na profundidade necessárias para
interpretar as respostas;
-
Ajusta a linguagem, para torná-la compreensível pelo entrevistado,
evitando a ocorrência de falhas de entendimento comprometedoras da
interpretação;
-
Identifica esquemas de pensamento do entrevistado, ajusta o
questionamento, elimina ambiguidades capazes de interferir nas respostas
e no sentido destas;
-
Compreende a idade de desenvolvimento mental do entrevistado, com o
objetivo de formular as questões de maneira adequada à elaboração
mental do indivíduo.

A sintonia emocional contribui para estabelecer um clima de atenção
concentrada entre julgados e julgadores, caracterizada por extremo foco
no sujeito e nos procedimentos indispensáveis ao bom andamento
dos trabalhos.

O entrevistador deve, por outro lado, estar atento a fatores que contribuem
pra desviar a atenção, tais como:
-
Cansaço físico;
Mecanismos psicológicos de defesa;
Pensamentos automáticos;
Crenças arraigadas;
Esquemas de pensamento.
-

A sintonia emocional representa um esforço concentrado do psiquismo
sobre o evento e contribui para que a atenção permaneça concentrada
sobre ele. A emoção, entretanto, precisa ser devidamente controlada para
não influenciar de maneira inadequada ou indesejada.
Influência da emoção

Reconhecer e controlar as próprias emoções é essencial. Não tem
qualquer fundamento a hipótese de que o bom profissional deva atuar sem
se deixar emocionar. O desafio é emocionar-se sem se contaminar
pelas emoções próprias e dos participantes.

Quando existe raiva dominando os oponentes, o profissional deve aceitar
essa realidade e não se intimidar com seus efeitos sobre sua pessoa; sentir
a presença da raiva é indispensável para compreender o que ela ocasiona
entre os litigiantes e evitar ser contagiado por ela.

O mesmo raciocínio vale com bons sentimentos, como a piedade; se não
identificá-la quando tomado por ela, aquele que julga poderá tornar-se
franco protetor de uma das partes.

Deixar dominar pela emoção significa comprometer percepção, atenção,
pensamento e memória e abrir espaços para enganos de raciocínio (falsas
inferências, conclusões inadequadas), falhas de percepção, lapsos e
outros psíquicos.

As emoções sujeitam o indivíduo a crenças inadequadas, esquemas rígidos
de pensamento, pensamentos automáticos, preconceitos e, fazem aflorar
mecanismos de defesa que comprometem o desempenho no papel.
Efeitos do social

Os valores sociais exercem inegável e poderosa influência sobre as
pessoas, levando-as, muitas vezes, a assumir posturas que condizem com
o melhor para elas mesmas e para a própria sociedade; isso acontece nos
julgamentos e pode, até mesmo, contribuir para penalizar a vítima.
Conteúdos intrapsíquicos

Entre os conteúdos conscientes, destacam-se, pela sua importância
imediata nas avaliações e julgamentos, os objetivos pessoais dos
indivíduos.

O julgador pode perceber a conduta criminosa de três maneiras distintas:
a) anormal, em que o conflito e seu contexto perdem relevância;
b) derivada dos conflitos interpessoais e processos sociais, porém,
responsabilizando cada indivíduo por seus comportamentos;
c) derivada da sociedade, cabendo a esta a assunção da responsabilidade
pela conduta criminosa, incluindo-se aí a identificação de formas de
(re)inserção n sociedade.
O testemunho

A emoção constitui fator-chave nas percepções das testemunhas.

Nos eventos traumático, uma fisiologia da percepção distorce a
ação dos sentidos. O corpo prepara-se para determinadas ações e
concentra as energias em alguns procedimentos; ampliam-se
muitos detalhes e ignoram-se outros; a emoção desencadeia
mecanismos de defesa para preservar o organismo.

Essa situação favorece o surgimento de esquemas de
pensamentos e pensamentos automáticos a respeito dos
acontecimentos, propiciando distorções.

As pessoas “vêem” o que acreditam que devam enxergar. Isso
acentua-se entre fanáticos e preconceituosos.

Testemunhas levam aos tribunais sua bagagem emocional, com a qual
respondem aos interrogatórios. O entrevistador defronta-se com o desafio
de separar os efeitos dos preconceitos, das crenças arraigadas, das visões
distorcidas, do emaranhado das respostas, para deduzir aquilo que seria
“real”.

A influência dos meios de comunicação é notável. Um “delinquente”
transformado em herói terá testemunhas de acusação propensas a
radicalizar suas percepções, possivelmente em dúvida quanto ao que viram
ou escutaram e, contará com a provável simpatia dos ouvintes (inclusive os
jurados).

Esse conjunto de aspectos, permeados pela emoção, faz com que o relato
espontâneo apresente-se irregular, incompleto, com elementos inúteis,
interpolações, idas e vindas; administrá-lo, sem que ele perca a
espontaneidade, requer sólido domínio de técnicas de entrevista.

Por outro lado, assinala Myra e López (2007, p. 178), “o testemunho obtido
por uma interrogação representa o resultado do conflito entre o que o
sujeito sabe, de uma parte, e o que as perguntas que lhe dirigem tendem a
fazer-lhe deles”.

Uma pergunta pode produzir falas associações na memória; dependendo
da formulação, sugere um fato que leva a outro e assim por diante,
afastando-se do real dos acontecimentos ou aproximando-se deles.

A pergunta pode questionar a respeito de fatos esquecidos, lacunas que o
sujeito, inconscientemente procurará preencher, por meio de breves
confabulações, como forma de proteção: o indivíduo não quer dar a
entender que não sabe, com receio de que isso o comprometa ou ao seu
depoimento.

O interrogatório pode, por falha de formulação da pergunta, sugerir
respostas preferenciais; o indivíduo escolhe uma delas por falta de opção
ou por identificá-la como a mais adequada.
Ex.: “e então, o suspeito foi para a esquerda ou para a direita?”

Outro aspecto emocional do interrogatório consiste no desenvolvimento de
sentimentos de inferioridade no interrogado, proveniente do medo de dar
uma resposta que seja considerada tola, maliciosa ou que demonstre suas
deficiências em relação a outros interrogados.

Em relação à inexatidão do depoimento por tendência afetiva, Myra e
López (2007) destacam:
-
A identificação emocional da testemunha com a vítima ou com o réu, que
podem lembrar-lhe sua origem, aspectos da vida passada, dificuldades
enfrentadas etc;
Valores e princípios presentes no julgamento e que se sobrepõem à
questão em si (justiça, verdade, opressão);
Preconceitos originados da condição social, do comportamento, da
aparência de uma ou da outra parte, capazes de provocar distorções no
pensamento (demonstração de riqueza, beleza, cor, sexualidade etc);
Falsas crenças em relação ao que a vítima ou réu praticam (“todo político é
ladrão”, “empregado rouba mesmo”, “quem mora no morro é bandido”).
-
-

A inexatidão de depoimentos também acontece por motivos técnicos.
Deficiência nos sentidos, desconhecimento do assunto podem levar a
inferências e deduções com resultados sem vínculo com a realidade (a
pessoa “pensa que escutou um grito”, por ex.).

Falsa memória:
1ª) Aquisição
2ª) Retenção
3ª) Evocação
ENTREVISTA COGNITIVA

Etapas:
1.
Construção do Rapport;
Recriação do contexto original;
Narrativa livre;
Questionamento;
Fechamento.
2.
3.
4.
5.
ETAPA
OBJETIVOS
I. Construção do Rapport
-Personalizar a entrevista;
-Construir um ambiente acolhedor;
-Discutir assuntos neutros;
-Explicar os objetivos da entrevista;
-Transferir o controle para o entrevistado.
II. Recriação do contexto original
-Restabelecer mentalmente o contexto no qual a
situação ou crime ocorreu;
-Recriar o contexto ambiental, perceptual e afetivo.
III. Narrativa Livre
-Obter relato livre da testemunha, sem interrupções.
IV. Questionamento
-Realizar o questionamento compatível com o nível
de compreensão da testemunha;
-Priorizar o uso de perguntas abertas;
-Obter esclarecimentos e detalhamento do relato;
-Possibilitar múltiplas recuperações.
V. Fechamento
-Realizar o fechamento da entrevista;
-Fornecer o resumo das informações obtidas;
-Discutir tópicos neutros;
-Estender a vida útil da entrevista.
- Exemplo de aplicação da técnica:
... Neste momento eu gostaria de te ajudar a lembrar tudo o que
conseguir sobre (referir o evento em questão). Você pode fechar os
olhos, se preferir. Tente voltar mentalmente ao exato momento em
que aconteceu essa situação (pausa). Você não precisa me dizer
nada ainda, apenas procure observar o local ao seu redor (pausa).
O que você consegue ver? (pausa) Que coisas consegue escutar?
(pausa) Que coisas passam pela sua cabeça? (pausa) Como você
está se sentindo? (pausa) Como está o clima nesse momento?
(pausa) Tem algum cheiro que você consiga sentir? (pausa)
Quando você achar que estiver pronto, pode contar tudo que
conseguir se lembrar sobre o que aconteceu, do jeito que achar
melhor.
- Tipos de perguntas:
Tipo de pergunta:
Definição:
Abertas
Permitem que a pessoa que está
respondendo dê mais informações.
“O que você viu quando entrou na
loja?”
Propiciam que o entrevistado
responda apenas sim/não ou
escolha entre uma alternativa.
“Era manhã, tarde ou noite quando
o crime aconteceu?”
Várias questões colocadas
simultaneamente.
“Você viu o rosto do assaltante? Ele
foi agressivo? O que ele falou?”
Tendenciosas/Sugestivas
Expressam implícita ou
explicitamente, a opinião do
entrevistador, conduzindo a
testemunha a uma determinada
resposta.
“Tendo em vista que o Borracha é
um bandido foragido e no momento
do fato estava nas imediações,
você não acha que ele possuía
algum envolvimento com o crime?”
Confirmatórias/inquisitivas
Procuram confirmar aquilo que foi
dito ou uma hipótese levantada pelo
entrevistador.
“Então você está me dizendo que
viu aquele seu vizinho no local do
crime?” (quando a testemunha falou
que apenas que a pessoa do local
Fechadas
Perguntas múltiplas
Exemplo:
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Julgadores, vítimas e instituições de exclusão