O FUNCIONALISMO
EM LINGUÍSTICA
Erotilde Goreti Pezatti
Mestranda: Amanda D’Alarme Gimenez
Disciplina: Teoria da Linguagem
30 de abril de 2009
VISÃO GERAL DO MODELO
O ponto de vista teórico (p. 165-169)

Para DeLancey (2001), o funcionalismo moderno,
de certa forma, é uma retomada de concepções
anteriores a Saussure, que enfoca fenômenos
tanto sincrônicos como diacrônicos e que entende
a estrutura linguística considerando imperativos
psicológicos, cognitivos e funcionais.
Reação à teoria gerativa
Sociolinguística
 Linguística Textual
 Análise do Discurso
 Análise da Conversação
 Funcionalismo

Presença da visão funcionalista









Na Escola Linguística de Praga (Jakobson e as funções da
linguagem);
Na tradição antropológica de Sapir (1921, 1949) e
seguidores;
Na teoria tagmênica de Pike (1967);
No trabalho etnograficamente orientado de Hymes (1972);
Na tradição britânica de Firth (1957) e Halliday (1970, 1973,
1985);
Na tradição filosófica que, a partir de Austin (1962) e por meio
de Searle (1969), conduziu à teoria dos Atos de Fala;
No trabalho de um grupo de pesquisadores que inclui Givón,
Li, Thompson, Chafe, Hopper, DeLancey, Dubois entre
outros;
Na Gramática de Papel e de Referência;
Em Lakoff e Langacker (tendência funcional-cognitiva).
Motivação comum

A explicação linguística deve ser buscada na relação
entre linguagem e uso, ou na linguagem em uso no
contexto social, o que torna obrigatório explicar o
fenômeno linguístico com base nas relações que
contraem falante, ouvinte e a pressuposta informação
pragmática de ambos. Assim, o compromisso do
funcionalismo é descrever a linguagem não como um
fim em si mesma, mas como um requisito pragmático da
interação verbal. O pragmático é, então, o componente
mais abrangente, dentro do qual se estudam a sintaxe e
a semântica.
O conceito de função
(p. 169-171)
Função pode designar as relações:

entre uma forma e outra
(função interna)

entre uma forma e seu significado
(função semântica)

entre o sistema de formas e seu contexto
(função externa)
O funcionalismo e seus princípios de
adequação explanatória (p. 171-174)

Adequação pragmática
Como a GF é uma teoria pragmática da linguagem,
tendo a interação verbal como objeto de análise,
segundo esse princípio, a GF deve revelar as
propriedades das expressões linguísticas em
relação à descrição das regras que regem a
interação verbal.

Adequação psicológica
A GF deve relacionar-se o mais próximo possível
com modelos psicológicos a respeito do
processamento linguístico, ou seja, ao modo como
os falantes constroem e formulam expressões
linguísticas (modelos de produção) e ao modo como
o ouvinte processa e interpreta expressões
linguísticas (modelos de compreensão).

Adequação tipológica
A GF deve ser capaz de fornecer gramáticas a
quaisquer línguas, levando em conta as
similaridades e as diferenças entre os sistemas
linguísticos.
Capacidades humanas

Capacidade linguística: produzir e interpretar corretamente
expressões linguísticas;

Capacidade epistêmica: construir, manter e explorar uma base de
conhecimento organizado;

Capacidade lógica: derivar conhecimentos adicionais por meio de
regras de raciocínio;

Capacidade perceptual: perceber seu ambiente, derivar
conhecimento a partir de percepções e usar esse conhecimento na
produção e na interpretação de expressões linguísticas;

Capacidade social: saber como dizer algo em uma situação
comunicativa particular.
Sistemas de regras envolvidos na
análise linguística

as regras que governam a constituição das
expressões linguísticas (semânticas, sintáticas,
morfológicas e fonológicas);

as regras que governam padrões de interação
verbal em que essas expressões linguísticas são
usadas (pragmáticas).
A polêmica formalismo versus
funcionalismo no Brasil (p. 174-176)

“Em suma, enquanto Votre e Naro (1989) se
posicionam a partir da distinção entre os
enfoques
funcionalista
e
formalista,
considerando-os não apenas diferentes e
excludentes, mas assumindo ainda a primazia
daquele sobre este, Nascimento (1990), por sua
vez, não apenas rejeita a distinção, como
também recusa a necessidade de escolher
entre os dois, baseando-se no fato de que
estudam objetos diferentes.” (p. 175)
A TEORIA FUNCIONALISTA:
TEMAS RELEVANTES
A perspectiva funcional da sentença (p. 177-180)

“Weil distingue entre movimento de idéias expresso pela
ordem de palavras e movimento sintático expresso pela
desinência. A sentença contém o ponto de partida (a
noção inicial) e o objetivo do discurso, sendo o primeiro
ponto de encontro entre falante e ouvinte, e o segundo
informação que deve ser partilhada com o ouvinte: o
movimento da noção inicial em direção ao objetivo do
discurso revela o movimento da mente.” (p. 177)

De acordo com Ilari (2004), a partir dos estudos de
Mathesius, a Escola Linguística de Praga desenvolveu a
chamada Perspectiva Funcional da Sentença. Mathesius
sugere que o dinamismo comunicativo (DC) se distribui
de maneira desigual nos enunciados que efetivamente
são utilizados para fins de comunicação e assim chegou
à idéia de que os enunciados comportam tipicamente
uma parte menos dinâmica – o tema – e uma parte mais
dinâmica – o rema. Essas duas funções são autônomas
em relação ao sujeito e ao predicado. (p. 69-70)
Trabalhos no campo da PFS

Danĕs (1957) e os três níveis de abordagem sintática:
o semântico, o gramatical e o da organização
contextual ou PFS.

Firbas (1974) e a idéia de Dinamismo Comunicativo.

Halliday (1974) e as macro-funções dos componentes
funcionais: ideacional, textual e interpessoal.
O estatuto informacional: noções de
dado e novo (p. 180-183)

Dado ou informação velha:
Conhecimento que o falante assume estar na
consciência do ouvinte no momento da
enunciação.

Novo ou informação nova:
Informação que o falante acredita estar
introduzindo na consciência do ouvinte com o
que diz.
Outros termos

Prince (1981) – a oposição informação dada versus
informação nova explica tanto fenômenos no nível da
sentença como no nível do discurso.

Kuno (1972), Halliday e Hasan (1976) – em termos de
predizibilidade/recuperabilidade, se um elemento é
recuperável pelo contexto, é considerado informação
velha, caso contrário, novo.

Clark e Haviland (1977) – dada é a informação que o
falante acredita que o ouvinte sabe e aceita como
verdade e nova, a informação que o falante acredita que
o ouvinte ainda não conheça.
O conceito de tópico (p. 183-187)
Para Chafe (1976), existem três tipos de tópico:

Tópico do inglês – é um foco de contraste colocado no
início da oração.
Ex.: ... isso mui/muitos no interior fazem assim...
(DID-SP-18: 831)

Tópico do caddo – construções de duplo sujeito.
Ex.: o Nelson ele saiu dos transportes...
(D2-SP-360: 837)

Tópico do chinês – tem como função estabelecer
um esquema espacial, temporal ou individual dentro
do qual a predicação principal se mantém, de modo
a limitar-lhe a aplicabilidade a certo domínio restrito.
Ex.: Filme, eu gosto mais de comédia
(DID-SP-234: 05)
SUJEITO
TÓPICO
nem sempre é definido
sempre é definido
há sempre alguma restrição selecional
não necessita ser argumento de verbo
vinculada ao verbo
é possível predizer que sujeito pode
ocorrer com determinado verbo
não é possível predizer
pode não ter papel semântico (no
português, os sujeitos sempre têm
papel semântico). Ex.: It’s rainning.
tem sempre um papel funcional
concordância com o verbo
rara concordância, já que é
independente em relação ao
predicado
nem sempre se manifesta no início da
sentença (línguas OVS, posição final,
e VSO, posição medial)
manifesta-se no início da sentença
papel proeminente em processos
gramaticais (reflexivização,
passivização)
não desempenha papel proeminente
em processos gramaticais
Tópico
Noção
discursiva
Sujeito
Noção interna à
estrutura da oração
Classificação tipológica das línguas
proposta por Li e Thompson (1976)




Línguas com proeminência de sujeito
(línguas indo-européias)
Línguas com proeminência de tópico
(chinês)
Línguas com proeminência de tópico e de sujeito
(japonês)
Línguas sem proeminência de tópico e de sujeito
(tagalog)
Ponto de vista e fluxo de atenção (p. 187-189)

“Chafe (1976) coloca o conceito de empatia ou
ponto de vista como mais um fenômeno de
empacotamento, uma vez que sua base cognitiva
está ligada ao fato de as pessoas serem capazes
de imaginar-se vendo o mundo por meio dos olhos
dos outros, bem como do seu próprio ponto de
vista.” (p. 187)

“O fluxo de atenção determina a ordenação natural
dos SNs, que são apresentados na sequência
desejada pelo falante para que o ouvinte atente
para eles.” (p. 188)
Transitividade e relevância
discursiva (p. 189-193)

“Hopper e Thompson (1980) consideram que há
uma alta correlação entre relevo discursivo e o grau
de transitividade da sentença, uma vez que o
pensamento e a comunicação humana registram o
universo individual como uma hierarquia de graus
de centralidade/perifericidade a fim de facilitar tanto
a representação interna quanto sua exteriorização
para as pessoas. Os usuários da língua constroem,
assim, as sentenças de acordo com seus objetivos
comunicativos e com sua percepção das
necessidades do ouvinte. Ou seja, em qualquer
situação de fala, algumas partes do que se diz são
mais relevantes que outras, destacam-se de um
fundo que lhes dá sustentação.” (p. 189-190)

Fundo:
Parte do discurso que lhe dá sustentação e
não contribui imediata e crucialmente para os
objetivos do falante, mas apenas sustenta,
amplia ou comenta o aspecto principal.

Figura:
Material que fornece os pontos principais do
discurso.
Estrutura argumental preferida (EAP) e
fluxo de informação (p. 193-196)

“Du Bois (1987) considera que há fatores
pragmáticos que motivam ligações entre
sujeitos de verbos intransitivos (S) e de
verbos transitivos (A) e fatores semânticos
que ligam (S) ao objeto de verbo transitivo
(O), mas as ligações mais poderosas entre
esses últimos se referem ao fluxo de
informação.” (p. 193)
Regras propostas por Du Bois (1987)


(1) Regra de um único argumento novo, que
diz “evite mais de um argumento novo por
oração”.
(2) Regra de A dado, que determina “evite A
novo”.
Desse modo há, no discurso, no máximo
um referente novo por oração nuclear e essa
única menção aparece tipicamente no papel
de S ou de O, mas não no de A, que se
relaciona à continuidade tópica para Givón.
O processo de gramaticalização
(p. 196-197)

“De modo geral, a definição de ‘gramaticalização’
implica a idéia de um processo pelo qual um item lexical,
ou uma estrutura lexical, passa, em certos contextos, a
exercer uma função gramatical ou um item já gramatical
passa a exercer uma função ainda mais gramatical
(Heine el al., 1991).” (p. 196)

Para Traugott e König (1991), “a gramaticalização é um
processo dinâmico, unidirecional e diacrônico mediante
o qual, na evolução temporal, um item lexical adquire
um estatuto gramatical.” (p. 196)
UM MODELO DE ANÁLISE
FUNCIONALISTA
Constituintes extra-oracionais (CEOs) (p. 201-202)
Propriedades:
(1)
(2)
(3)
podem aparecer sozinhos ou são tipicamente
separados da oração por quebra ou pausa no
contorno entonacional;
nunca são essenciais à estrutura interna da oração
com a qual estão associados;
não são sensíveis a regras gramaticais que operam
dentro dos limites da oração.
Doc. vocês acham que o brasileiro se alimenta bem em geral?
[...]
L2
mas eu vejo, aqui, por exemplo, de vez em quando tem
uma verdurinha etecétera e tal, por exemplo
L1
hum, hum
L2
na minha casa, por exemplo, se come verdura, eu
como, minha mulher não come, meus filhos adoram,
principalmente o guri, agora, o brasileiro, em princípio
eu acho que come muito mal, acho que come muito mal,
não é às vezes muitas vezes talvez seja o... aspecto
do... do poder aquisitivo de cada um né, tem pessoas...
Funções pragmáticas (p. 202-213)






A produção das expressões linguísticas depende:
da intenção do falante;
da sua informação pragmática;
da antecipação que ele faz da interpretação do ouvinte.
A interpretação do ouvinte depende, por sua vez:
da própria expressão linguística;
da sua informação pragmática;
da hipótese do ouvinte sobre a intenção comunicativa
do falante.
Tópico (p. 203-204)

Tópico Novo (TN):
Quando o Tópico do discurso é introduzido pela primeira
vez.

Tópico Dado (TD):
Um Tópico, tendo sido introduzido no discurso como TN,
pode ser tratado como TD, subsequentemente, criando-se,
assim, uma cadeia tópica.

Subtópico (ST):
Tópico que pode ser legitimamente inferido de um TD com
base no nosso conhecimento de mundo.
Doc. vocês acham que o brasileiro se alimenta bem em geral?
[...]
L2
mas eu vejo, aqui, por exemplo, de vez em quando tem
uma verdurinha etecétera e tal, por exemplo
L1
hum, hum
L2
na minha casa, por exemplo, se come verdura, eu
como, minha mulher não come, meus filhos adoram,
principalmente o guri, agora, o brasileiro, em princípio
eu acho que come muito mal, acho que come muito mal,
não é às vezes muitas vezes talvez seja o... aspecto
do... do poder aquisitivo de cada um né, tem pessoas...
Foco (p. 204-205)

Constituinte que veicula a informação a ser
ressaltada num dado contexto de interação
verbal.
(...) eu como, minha mulher não come, meus
filhos adoram, principalmente o guri (...)
Definitude (p. 205-206)

“Ao usar um termo definido, F auxilia D a
identificar o referente que supostamente já
esteja, de algum modo, disponível a ele (D),
com base (a) numa informação pragmática de
longo prazo de D; (b) numa informação
pragmática de curto prazo, por ter sido
introduzida no discurso anterior; (c) numa
informação perceptivelmente disponível na
situação; (d) nas inferências deduzidas em
qualquer uma das informações de (a-c).” (p.206)
Estrutura da oração em camadas
(p. 206-209)

“Como uma teoria que se caracteriza pela integração
dos componentes sintático, semântico e pragmático, a
GF apresenta um esquema abstrato de descrição que
busca fazer jus tanto às propriedades formais como às
propriedades semânticas da oração. A oração deve,
então, ser descrita em termos de uma estrutura abstrata
subjacente que é representada na expressão linguística
real por meio de um sistema de regras de expressão,
que determinam a forma, a ordem e o padrão de
entonação dos constituintes presentes na estrutura
subjacente.” (p. 206)
Ordenação dos constituintes
(p. 209-211)

A teoria de ordenação dos constituintes da
GF sustenta que cada língua tem um ou
mais padrões funcionais, conforme o
esquema:
P2, P1 (V) S (V) O (V), P3
(1) DECL [[Pres [Imper [[comer (eu) (verdura)]
(avidamente)] (todos os dias)] (felizmente)]
P2,
P1
σ3
S
V
σ1
O
σ2,
P3
Ø
Ø
felizmente
eu
como
avidamente
verdura
todos os dias
Ø
Tema (p. 211-212)

É um constituinte extra-oracional utilizado como
recurso para especificar a entidade em relação
à qual a oração seguinte apresenta alguma
informação relevante.
eu... quase não vou ao cinema teatro... às vezes
eu vou... mais a teatro do que cinema... filme eu
gosto mais de comédia... não gosto muito de
filme...
P2,
filme,
P1/S
eu
V
gosto mais
O
de comédia
o Nelson ele saiu dos transportes...
P2,
o Nelson,
P1/S
ele
V
saiu
O
dos transportes
Antitema (p. 212-213)

Constituinte que adiciona porções de
informação relevantes para a correta
interpretação da oração, esclarecendo-a
ou modificando-a.
e:: depois volto para casa mas chego já
apronto o outro para ir para a escola... o
menorzinho
(D2-SP-360:158)
P1
S
V
O
Ø
Ø já apronto o outro
σ2,
para ir para a
escola
P3
o menorzinho
CONSIDERAÇÕES FINAIS

“(...) [do exposto] ficam duas idéias muito claras:
a primeira é a de que, embora importante, a
sintaxe não é, para nenhum enfoque funcional,
um componente autônomo que possa conter
todas as explicações possíveis para todas as
formas de organização da linguagem; a
segunda, que não se desvincula da primeira, é a
de que, justamente por não ser autônoma, a
sintaxe depende crucialmente das dimensões
semântica e pragmática da linguagem.” (p. 214)
Referências bibliográficas
PEZATTI, E.G. O funcionalismo em linguística. In:
MUSSALIN, F.; BENTES, A.C. Introdução à linguística:
domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2004. p. 165218.
ILARI, R. O estruturalismo linguístico: alguns caminhos.
In: MUSSALIM, F.; BENTES, A.C. Introdução à
linguística: fundamentos epistemológicos. São Paulo:
Cortez, 2004. p. 53-92.
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