PARECER
O Exmo. Senhor Juiz de Direito da Oitava Vara Cível insiste na questão das
prerrogativas e imunidades diplomáticas, pretendendo que uma informação fornecida
pelo Ministério das Relações Exteriores, contida no Parecer SJ/1.688, de 21 de junho
último, não se justifica, e que “a imunidade diplomática não implica em imunidade do
foro civil”, pois o diplomata “só tem imunidade no foro criminal”.
2. Na verdade, conforme foi declarado no referido parecer, as prerrogativas e
imunidades diplomáticas – que compreendem a imunidade de jurisdição civil e a de
jurisdição criminal – cobrem não somente o chefe da missão diplomática, mas ainda todo
o pessoal oficial desta, - ainda que não exista acordo ou tratado que estabeleça tais
prerrogativas e imunidades.
3. Os princípios estabelecidos a esse respeito são antigos, conforme indiquei no
citado parecer.
4. Mas são aceitas por juristas contemporâneos.
5. Um dos mais eminentes, entre estes, - ou seja Hans Kelsen, - em seu curso,
intitulado Théorie génerale du droit international public, - proferido na Academia da Haia e
constante do Recueil des Cours, 1932 – IV, tomo 42, - observou (p. 218) que a
extraterritoriedade ou inviolabilidade pessoal, de que gozam certos órgãos de Estados
estrangeiros, constitui apenas uma limitação da soberania pessoal do Estado em cujo
território se encontram.
6. O projeto da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas declara,
por exemplo, no artigo 22, que: “ a pessoa de um agente diplomático será inviolável. O
mesmo não será sujeito `a prisão ou detenção, administrativa ou judiciária. O Estado que
o recebe tratá-lo-á com o devido respeito e adotará todas as razoáveis medidas para
evitar qualquer ataque `a sua dignidade”. E acrescenta que, para esse fim, “o termo
agente diplomático incluirá o chefe da missão e os membros do pessoal diplomático da
missão”.
7. Noutro artigo (art. 24), o mesmo projeto declara que “um agente diplomático
gozará de imunidade da jurisdição criminal do Estado que o acolhe”. E, em princípio
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(isto é, salvo algumas exceções), gozará da imunidade de jurisdições civil e
administrativa.
8. Isso não impedirá que o Estado a que pertença o diplomata abra mão das
imunidades deste, em certos casos.
9. A esse respeito, veja-se o documento A/CN.4/L.75, de 16 de maio de 1958, das
Nações Unidas.
10. Convém, aliás, não perder de vista que da Comissão de Direito Internacional
das Nações Unidas fazem parte uns vinte juristas, entre os quais um do Brasil (Gilberto
Amado).
11. Noutro documento (A/CN.4/ L. 78/ Add.2), de 26 de junho de 1958, lê-se, no
artigo 27, de um projeto da referida Comissão, que “ a pessoa de um agente diplomático
será involável. Ele não será sujeito a nenhuma forma de prisão ou detenção. O Estado
que o recebe tratá-lo-á com o devido respeito, e adotará todas as razoáveis medidas para
evitar
qualquer
ataque
`a
sua
liberdade
ou
`a
sua
dignidade”
(doc.
A/CN.4/L.78/Add.2), de 26 de junho de 1956, p. 26.
12. Convém assinalar que as prerrogativas e imunidades diplomáticas se aplicam
não somente no chefe da missão, mas também a todo o pessoal oficial da mesma.
13. Por último, podemos insistir em que, de acordo com a doutrina jurídica e a
prática internacional, os agentes diplomáticos estão isentos da jurisdição civil e criminal
do Estado onde se acham acreditados.
14. Assim, em conclusão, devemos afirmar que as imunidades diplmáticas, ainda
que não figurem em tratados, devem ser respeitadas.
Sub Censura
Rio de Janeiro, 18 de agosto de 1960. – Hildebrando Accioly
Extraído de: MEDEIROS, Antônio Paulo Cachapuz de. Pareceres dos Consultores
Jurídicos do Itamaraty. Vol. V (1952-1960). Brasília: Senado Federal, 2001, pp. 425-427.
Deve-se observar que em 1961 – cerca de um ano após o proferimento deste parecer –
o projeto a que faz alusão Accioly foi transformado em convenção e, até a presente
data, é o principal documento sobre a matéria.
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