Com a “Guerra Fria” em andamento, Churchill se
mostrou muitas vezes mais interessado em questões internacionais do que nos assuntos internos do país. Era essencial fortalecer as relações com os Estados Unidos e evitar
qualquer tendência ao isolacionismo e, neste aspecto,
Churchill achava que podia contribuir de forma especial.
Mas também era essencial que os países livres da Europa
ocidental se consolidassem contra o perigo soviético e
isso seria impossível sem a reconciliação franco-alemã.
Era outro avanço ousado e Churchill viu os meios para
ele no movimento de unidade européia que surgiu no
continente depois da guerra. Em setembro de 1946, na
Universidade de Zurich, Suíça, ele manifestou-se a favor
de uma verdadeira parceria franco-alemã e da criação do
que veio a ser o Conselho da Europa, como passo para
“uma espécie de Estados Unidos da Europa.” Seu prestígio era tal que logo foi visto como figura de destaque
no movimento europeu, o que mais se estabeleceu com
os discursos que proferiu em eventos importantes como
o Congresso da Europa, em Haia, em maio de 1948, e a
primeira sessão do Conselho da Europa em Strasburgo,
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REFREANDO OS ANOS 1945–1965
em 1949. Neste último, foi apresentado como “primeiro
cidadão da Europa,” o que era verdade em relação à sua
fama, mas enganoso como descrição de suas prioridades.
Churchill desejava incentivar a cooperação européia, porém de uma posição afastada, que não diminuísse as relações da Inglaterra com os Estados Unidos nem as ligações
inglesas com o Império e a Commonwealth. Quando
surgiram iniciativas como o Plano Schuman para integração das indústrias européias de carvão e aço, no início
dos anos 50, Churchill não quis erodir a soberania inglesa
e viu com suspeitas a agenda dos federalistas de supranacionalismo e de planejamento econômico estatal.
Antes da guerra, Churchill habitualmente vivera além
de seus meios, mas sua fama de após-guerra enfim trouxe
segurança financeira. Em novembro de 1946, Chartwell
foi comprada dele por 43.800 libras por um grupo de admiradores ricos liderados por Lord Camrose, que, em seguida, doaram a casa ao National Trust com a condição de
que os Churchills lá residissem até o fim de suas vidas. Foi
uma soma substancial, mas de menor importância diante
do que passou a ganhar com o que escrevia. Churchill era
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o único líder de renome do tempo da guerra capaz e desejoso de escrever o seu conto dos acontecimentos, além de
já ser escritor consagrado. A fim de evitar impostos de herança e assegurar os benefícios para a família, criou-se um
fundo que passou a deter os direitos de suas memórias de
guerra, de seus documentos pessoais e da biografia oficial
a ser escrita após sua morte. Em 1947, o grupo do Daily
Telegraph, pertencente a Camrose, pagou a enorme soma
de 550 mil libras pelas memórias de guerra, das quais 175
mil foram diretamente para Churchill e o restante para
o fundo. O mercado americano foi ainda mais lucrativo,
com os direitos do livro rendendo 250 mil dólares e a
revista Life e o New York Times pagando 1.150.000 dólares
pelo direito de publicá-lo em série. Agora Churchill estava
rico e logo depois pôde comprar duas granjas contíguas a
Chartwell. Nestas granjas, ele tipicamente envolveu-se em
atividades rurais, na venda do gado e da produção agrícola,
nova atividade de lazer com a qual se distraiu durante a
década seguinte, até vender as propriedades em 1957.
A obra mais importante destes anos foi o livro com suas
memórias de guerra, que ele começou ao regressar dos
Estados Unidos, na primavera de 1946. Seu método de trabalho continuou o mesmo de antes, dispondo de um grupo
de pesquisadores para reunir material e várias secretárias
para tomar o que ditava. Mas isto em termos gerais, pois
contou com a ajuda do general Ismay, de Lord Cherwell, de
Sir Isaiah Berlin e um elenco de altos comandantes militares do tempo da guerra e personalidades da área científica.
Os seis volumes de A Segunda Guerra Mundial foram publicados entre 1948 e 1954, com os dois primeiros volumes
– Forma-se a Tormenta, sobre os anos até 1940, e Sua Hora
Mais Bela, sobre o período de maior perigo – causando o
maior impacto. A obra foi apresentada na forma de trabalho
histórico, reproduzindo muitos dos memorandos e cartas
de Churchill, mas ficou longe de objetiva. O primeiro
volume, em particular, reforçou a condenação popular
aos “apaziguadores” dos anos 30 e mostrou um Churchill
mais coerente e de visão mais clara do que foi na realidade.
Minúcias e documentação, aliadas à bela linguagem criaram
um relato de autoridade convincente; ele não estava brincando quando disse que a história lhe daria razão “porque
a história escreverei eu.” Teve gigantesca vendagem, com
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uma edição inicial do primeiro volume de 200 mil livros
na Inglaterra e 600 mil nos Estados Unidos. A dimensão
de seu feito foi reconhecida com o Prêmio Nobel de
Literatura em outubro de 1953, não muito antes da publicação do último volume, que cobriu o final da “Grande
Aliança” e prenunciou a “Guerra Fria” seguinte.
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Winston Churchill