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“A PRODUTIVIDADE DA ESCOLA IMPRODUTIVA”: BREVE
REFLEXÃO DAS IDÉIAS DE GAUDÊNCIO FRIGOTTO SOB O
OLHAR DA EDUCAÇÃO.
Kelly Araújo Valença Oliveira / Universidade Tiradentes-SE
[email protected]
Maria Cláudia Meira Santos Barros / UNEB-BA
[email protected]
RESUMO
O presente artigo retrata a obra do autor Gaudêncio Frigotto na perspectiva de contribuir para a
reflexão sobre a escola inserida em uma lógica capitalista e sobre o papel social dessa
instituição. Utilizou-se para isso a pesquisa bibliográfica, a partir dos estudos da disciplina
Tópicos Especiais de Educação III – A teoria do valor em Marx, ministrada pela Prof. Dr.ª Ada
Augusta no PPED/UNIT/SE, tendo como base principal a obra “A Produtividade da Escola
Improdutiva” do referido autor. As reflexões proporcionadas pela criticidade dessa bibliografia
podem ocasionar nos alunos da pós-graduação stricto sensu uma preocupação em aprofundar o
conhecimento em autores Marxistas que analisam a sociedade a partir da ótica dialética. Dessa
forma, a pesquisa teve como objetivo analisar o livro, o qual segundo a interpretação de
Gaudêncio Frigotto levara ao atual patamar da educação em nosso país, onde o caráter
capitalista das escolas assume destaque perante as preocupações com relação ao processo
ensino-aprendizagem ,valorização do professor, aspectos de infra-estrutura. A relevância desse
estudo se dá mediante o contexto em que se percebe um intenso processo de exploração das
relações sociais na sociedade brasileira, caracterizado por exclusão e fracasso escolar.
Palavras-Chave: Escola, Lógica capitalista e Política Pública.
RESUMEN
En este artículo se describe el autor el trabajo de Gaudencio Frigotto a fin de contribuir a la
reflexión sobre la escuela entró en una lógica capitalista y la función social de esta institución.
Se utilizó para esta literatura de investigación, de estudios de la disciplina de Educación
Especial III Temas - La teoría del valor en Marx, impartido por el profesor. Dra. Ada Augusta
en PPED / UNIDAD / SE, con base en el trabajo principal de "La Escuela de la productividad
estéril" de este autor. Reflejos causados por la criticidad de esta literatura puede llevar a los
estudiantes en la preocupación de postgrado estudios profundizar el conocimiento de los autores
marxistas que analizan la sociedad desde la perspectiva de la dialéctica. Así, el estudio tuvo
como objetivo analizar el libro, que según la interpretación de Gaudencio Frigotto llevó al nivel
actual de la educación en nuestro país, donde el carácter capitalista de las escuelas asume
prominencia en la cara de las preocupaciones sobre el proceso de enseñanza-aprendizaje, la
recuperación el maestro, la infraestructura. La relevancia de este estudio viene dada por el
contexto en que se percibe un intenso proceso de exploración de las relaciones sociales en la
sociedad brasileña, que se caracteriza por la exclusión y el fracaso escolar.
Palabras clave: Escuela, la lógica capitalista y la política pública.
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INTRODUÇÃO
[...] para aqueles que buscam a compreensão da realidade numa
perspectiva dialético-histórica, a crise teórica, que é efetiva e
profunda, não é outra coisa senão o reflexo, no plano do
pensamento, da abstração , da crise da sociedade. (FRIGOTTO
e CIAVATTA, 2001)
Gaudêncio Frigotto nasceu em Paim Filho, no interior do Rio Grande do Sul, em
1947. Em 1971, formou-se em Filosofia. Dois anos depois, em Pedagogia, ambos os
cursos pela FIDENE, atual Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio
Grande do Sul (UNIJUI), em Ijuí-RS. Em 1977, já no Rio de Janeiro, onde vive há 34
anos, tornou-se Mestre em Educação pela Fundação Getúlio Vargas. Em 1983, concluiu
o Doutorado em Educação pela PUC de São Paulo. Professor Titular aposentado da
Universidade Federal Fluminense, onde permanece como colaborador, Frigotto hoje é
professor adjunto e ministra a disciplina Economia Política da Educação no curso de
Graduação de Pedagogia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ministra, ainda,
as disciplinas de Epistemologia da Educação e Teoria da Educação no Programa de PósGraduação (mestrado e doutorado) em Políticas Públicas e Formação Humana, também
da UERJ.
Dentre as principais obras do autor destacam-se: A produtividade da escola
improdutiva - Editora Cortez (1984); Educação e crise do capitalismo real - Editora
Cortez (1994); Educação e crise do trabalho: perspectivas de final e século (org) Editora Vozes (1998); Teoria e educação no labirinto do capital (org) - Editora Vozes
(2000).
O artigo abordará o livro “A produtividade da Escola Improdutiva”, o qual
segundo a interpretação de Gaudêncio Frigotto levara ao atual patamar da educação em
nosso país, onde o caráter capitalista das escolas assume destaque perante as
preocupações com relação ao ensino-aprendizagem valorização do professor, aspectos
de infra-estrutura, etc.
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1.1 Teoria do Capital Humano
Segundo Frigotto, para compreender a Teoria do Capital Humano faz-se
necessário não só apreender o seu processo de construção, mas antes, entender como
esta se articula com o desenvolvimento do sistema capitalista. Ou seja, não se pode
compreende- lá se não buscarmos uma articulação entre o que se dá no âmbito da infraestrutura (economia), com o que se dá no campo superestrutural. A teoria como uma
formadora de pensamento, e sendo formulada para justificar as contradições do sistema
capitalista, tem como objetivo a manutenção das relações de força e de desigualdade
existentes. Pois, como já diziam Marx e Engels, idéias dominantes numa determinada
época são aquelas formuladas pelas classes dominantes.
A Teoria do Capital Humano, afirma que uma maior escolarização contribui
diretamente para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos, em função de um
aumento de renda que decorre, diretamente, da sua melhor qualificação para o
desempenho no mercado de trabalho. Em outras palavras, o incremento da
produtividade – decorrente do aumento da capacitação – levaria a que o indivíduo
também se beneficiasse pelo aumento dos seus salários.
De acordo a Frigotto (1993), no entanto, o sistema capitalista busca, cada vez
mais, retirar do trabalhador o controle do seu processo de trabalho. Conseqüentemente,
como haveria por parte do sistema capitalista a busca de uma maior qualificação do
trabalhador se é exatamente o contrário o seu objetivo?
Na obra em análise o autor, defende argumentos que mostram que esta pobreza
existente na sociedade não pode ser meramente atribuída à falta do mérito individual de
cada cidadão, que não lhe permite evoluir no âmbito escolar, ou até mesmo, a ele ter
acesso. Com interessantes reflexões e exemplos, o autor revela que se realmente
houvesse por parte da elite, efetivo interesse em modificar o quadro de exclusão social
vigente, deveria ela pautar seu discurso pela defesa de reformas sociais que
objetivassem garantir aos setores mais pobres da população o acesso aos bens. E não
simplesmente creditar tudo isso a ausência da educação.
Tradicionalmente, em nosso país a escola preocupou-se com o ensino, baseada
numa concepção positivista de ciências, supervalorizando "o como" fazer em detrimento
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do "o que" e "para que" fazer. Essa pedagogia, na qual conhecimentos específicos e
pedagógicos são trabalhados isoladamente, fundamenta-se no rompimento entre
pensamento e ação.
Assim coloca Kuenzer:
[...] A escola por sua vez, constituiu-se historicamente como
uma das formas de materialização desta divisão. Ela é o espaço
por excelência, do saber teórico divorciado da práxis,
representação abstrata feita pelo pensamento humano, e que
corresponde a uma forma peculiar de sistematização, elaborada
a partir da cultura de uma das classes sociais. (...) Assim a
escola, fruto da prática fragmentada, expressa e reproduz esta
fragmentação, através de seus conteúdos, métodos e formas de
organização e gestão (KUENZER, 2002 p. 79-80).
No modelo da escola tradicional privilegia-se a racionalidade formal, baseada
numa prática mecanicista e puramente empírica. Tal método privilegia a seleção e
organização dos conteúdos descontextualizados, desvinculados da prática e dos
problemas sociais. Pretende-se que os conteúdos propostos sejam neutros e imparciais.
Os professores passam a ser os únicos detentores do saber e os alunos são relegados a
uma posição de subordinação. (PIMENTA, 2001)
Assim, a escola é entendida enquanto transmissora de valores. A disciplina e a
manutenção da ordem adquirem papel central no processo ensino-aprendizagem. Sob
essa perspectiva, debater, questionar, refletir, historicizar são ações que ameaçam
estruturas consolidadas em práticas mecânicas e autoritárias.
Na década de 1970, a formação de professores no Brasil
caracterizou-se pela desarticulação das questões enfrentadas no
cotidiano pelos profissionais da educação, com ênfase nas
habilitações e suas especificidades. A concepção que permeia
essa proposta de formação é orientada pela pedagogia tecnicista
e do primado dos estudos psicológicos e pela psicologia
condutivista. Os cursos privilegiam a formação de um técnicoespecialista e de um transmissor de conhecimentos, garantida
pelo livre acesso aos métodos e técnicas de ensino preconizado
na época. Aliada a uma herança positivista, a relação teoria e
prática caracteriza-se por um distanciamento raramente
transposto. A pedagogia tecnicista baseia-se num modelo de
racionalidade técnica que separa teoria e prática, reflexão e
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ação, conteúdo e forma, ensino e pesquisa. Enfim, separa quem
planeja e quem executa. (SACRISTÁN 1996, p. 45).
Nessa perspectiva os professores, são concebidos como meros executores,
cabendo-lhes apenas aplicar corretamente as técnicas para atingir os fins
predeterminados. Objetiva-se o controle cada vez mais burocrático do trabalho do
professor. O ensino é reduzido à formulação de objetivos educacionais e instrucionais,
com predomínio da utilização de técnicas mediante uma prática formal e funcionalista.
Escola, alunos e professores passam a ser medidos em sua eficiência e eficácia. A base
do conhecimento assenta-se na técnica e o processo educativo é um processo de
controle.
Para Frigotto, a visão tecnicista da educação responde exatamente à ótica
economicista do ensino, constituindo-se numa das principais e mais ferozes formas de
desqualificação do processo educativo escolar, que fica evidente quando analisada a
economia global, que exige uma sociedade baseada no mundo das informações,
indicando claramente que o principal recurso de crescimento individual e social é o
domínio de conhecimentos.
O sistema neoliberal, além de se preocupar com a produtividade em grande
escala, atinge o sistema educacional com o discurso da motivação na formação do
trabalho docente – as de perspectiva de motivação – que são postuladas como força
manipuladora para concretizar os anseios governamentais. Assim, a formação docente
tende fortemente a ficar subordinada a um discurso que direciona o trabalho do
professor a ser cooperativo passivo e flexível. Pensando sobre essa questão, Mészáros
(1981) indaga se a escola atende ou não a essas necessidades de produção do capital.
Dessa forma, o discurso da motivação torna-se um instrumento pedagógico
utilizado que instiga a formação docente para que coopere, que se ajude e seja tão
domesticado quanto à necessidade do capital o configure, construindo assim um
trabalhador que possa aderir ao discurso de motivação e aceite que a saída individual é a
única forma de sobreviver num mundo do trabalho em constantes mudanças. Os
docentes passam a vislumbrar na literatura de motivação uma alternativa para diminuir
as suas insatisfações e angústias. Assim, o capital infere nesse discurso como uma
estratégia de controle e de qualificação da força de trabalho.
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Frigotto analisa quais os desafios na formação e profissionalização do educador,
nos dias de hoje, numa perspectiva de construção de relações sociais alternativas democráticas, solidárias ou socialistas - e o papel da educação nesta construção.
Enfatiza que, para responder a esses desafios, a formação e profissionalização do
educador implicará dimensões ético-políticas, teóricas e político-organizativas.
Busca ainda demonstrar em suas reflexões quais seriam as estratégias de
recomposição do capitalismo no contexto da crise do final do século XX, apontando que
esta recomposição implica no plano sócio-econômico, o ajustamento de nossas
sociedades à globalização excludente; no plano cultural, ideológico e ético-político a
naturalização da exclusão ou a exclusão sem culpa e a idéia de que não há alternativa
possível que não seja a refuncionalização do capitalismo; no âmbito teórico, a crise da
razão e emergência do pós-modernismo; e finalmente, no plano pedagógico, a reiteração
do dualismo e fragmentação, uma qualidade para poucos, e a metamorfose do direito à
educação em mercadoria ou serviço que se compra.
O processo educativo, sob essas bases, retira seu caráter histórico e político,
encobrindo e ignorando as contradições que constituem a realidade e a sociedade de
classes, reduzindo os processos de formação e profissionalização do educador
dominantemente a uma perspectiva adaptativa (FRIGOTTO, 1996).
1.2 O Trabalho Pedagógico e a Influência do Pensamento Economicista da
Educação
Saviani (2002) destaca que, a partir da segunda metade do século XX, a
educação é colocada sob a determinação das condições de funcionamento do mercado
capitalista, denominado por ele de “concepção produtivista de educação”, quando “a
educação passou, pois, a ser concebida como dotada de um valor econômico próprio e
considerada um bem de produção (capital) e não apenas de consumo” (SAVIANI, 2002,
p. 22).
Essa visão produtivista, objetivada na “teoria do capital humano”, desencadeou
uma nova função econômica atribuída à escolaridade, na qual “prevalece a busca pela
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produtividade guiada pelo princípio de racionalidade, que se traduz no empenho em se
atingir o máximo de resultados com o mínimo de dispêndio” (Id, Ibid., p. 23).
Essa tendência, apesar de fundada na visão econômica neoclássica, desenvolvese nas últimas quatro décadas, de acordo com Frigotto (1993) “no âmbito propriamente
educacional e pedagógico, na qual a teoria do capital humano vai ligar-se a toda a
perspectiva tecnicista que se encontra em pleno desenvolvimento na década de 50”
(p.121).
Assim coloca Frigotto:
O conceito de capital humano – ou, mais extensivamente, de
recursos humanos, busca traduzir o montante de investimento
que uma nação faz ou os indivíduos fazem, na expectativa de
retornos adicionais futuros. Do ponto de vista macroeconômico,
o investimento no “fator humano” passa a significar um dos
determinantes básicos para aumento da produtividade e
elemento de superação do atraso econômico. Do ponto de vista
microeconômico, constitui-se no fator explicativo das
diferenças individuais de produtividade e de renda e,
conseqüentemente, de mobilidade social (FRIGOTTO 1993, p.
41).
Esse conceito coloca a educação como instrumento de desenvolvimento
econômico, distribuição de renda e equalização social. Considera Frigotto que:
A idéia-chave é de que a um acréscimo marginal de instrução,
treinamento e educação correspondem um acréscimo marginal
de capacidade de produção. Ou seja, a idéia de capital humano é
uma “quantidade” ou um grau de educação e de qualificação,
tomado como indicativo de um determinado volume de
conhecimentos, habilidades a atitudes adquiridas, que
funcionam como potencializadoras da capacidade de trabalho e
de produção. (FRIGOTTO, 1993, p. 41)
Desta suposição deriva-se que o investimento em capital humano é um dos mais
rentáveis, tanto no plano geral do desenvolvimento das nações, quanto do plano da
mobilidade individual (Id. Ibid.).
O autor denuncia que a teoria do capital humana expressa à forma falsa e inversa
de a burguesia conceber as relações homem, trabalho e educação no interior do processo
produtivo, acenando para o fato de que, (...) a análise econômica da educação, veiculada
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pela teoria do capital humano, funda-se no método e pressupostos de interpretação da
realidade da economia clássica. Este modo de interpretação da realidade é um produto
histórico determinado que nasça com a sociedade de classes e se desenvolve dentro e na
defesa dos interesses do capital (FRIGOTTO, 1993, p. 54).
Saindo do próprio aparelho estatal, essa teoria assume um caráter ideológico, na
medida em que mascara os processos de acumulação, concentração e centralização do
capital como uma mediação necessária para a manutenção das relações capitalistas de
produção.
Explicita Frigotto:
Essa teoria, então, que se propõe como concreta, mas que é
pseudoconcreta, não resulta de uma abstração ou de um
processo conspiratório, mas decorre rigorosamente de uma
necessidade histórica circunstanciada. Ela se estrutura, em sua
formalidade, com um referencial neoclássico que se afasta cada
vez mais das formas concretas que assumem as relações de
produção no capitalismo monopolista. Deste afastamento
resulta a sua força de ilusão e, ao mesmo tempo, da legitimação
das novas formas que assumem as relações capitalistas de
produção. E é sobre esta ilusão produtiva que se estruturou a
política educacional brasileira nas últimas décadas.
(FRIGOTTO 1993, p. 135).
Frigotto argumenta que as análises descritas acima são „enviezadas‟ pelo fato de
estabelecerem uma ligação mecânica entre estrutura e superestrutura e, ainda, uma
separação estanque entre trabalho produtivo e improdutivo. Este autor procura mostrar
as diferentes mediações que a prática educativa escolar estabelece com o modo
capitalista de produção. Segundo ele, os vínculos entre educação, desenvolvimento e
mercado não são diretos pela própria natureza e especificidade da prática educativa.
Portanto, ao situar o trabalho, nas suas diversas formas, como categoria central
na compreensão das relações sociais e, dentre estas, os processos e as relações
educativas, Frigotto (1993) não aceita as teses que definem a escola apenas como um
aparato ideológico, reprodutor das relações sociais de produção capitalista. Ao
contrário, por mediações de natureza diversa, a escola insere-se no movimento geral do
capitalismo e, nesse sentido, articula-se com os interesses do capital, sendo ou podendo
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ser um instrumento de mediação na superação e negação das relações sociais de
produção que determinam a separação entre capital e trabalho, trabalho manual e
intelectual, mundo da escola e mundo do trabalho.
No entanto, observamos que a organização do trabalho pedagógico acontece em
meio a uma organização social historicamente determinada e que a educação como
mediadora dos interesses dominantes assume - no atual estágio de desenvolvimento papel fundamental para potencializar o crescimento econômico e garantir o bom
desempenho do mercado. Tais constatações nos colocam uma nova questão: há de fato
uma relação linear entre formação humana e mercado? Como se coloca essa relação nas
políticas governamentais? Partimos, portanto, do entendimento do trabalho diante da
lógica da mercadoria na atual fase de acumulação flexível e entendemos que o trabalho
pedagógico sofre as determinações dessa concepção.
A conformação/formação desse trabalhador de "novo tipo" vem sendo proposta
desde o final da década de 1980, por organismos de classe dos empresários nacionais
articulados a organismos internacionais18. Assim denominados por Frigotto (1993,
1995), “os homens de negócio” retomam a tese do capital humano, não mudando a
natureza de suas demandas no campo educativo, mas o conteúdo da mesma, apontando
para a necessidade de um trabalhador com capacidade de elevada abstração, flexível e
participativo.
O Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre
Educação para o Século XXI: Na indústria especialmente para
os operadores e os técnicos, o domínio do cognitivo e do
informativo nos sistemas de produção, torna um pouco obsoleta
a noção de qualificação profissional e leva a que se dê muita
importância à competência pessoal. O progresso técnico
modifica, inevitavelmente, as qualificações exigidas pelos
novos processos de produção. As tarefas puramente físicas são
substituídas por tarefas de produção mais intelectuais, mais
mentais, como o comando de máquinas, a sua manutenção e
vigilância, ou por tarefas de concepção, de estudo, de
organização à medida que as máquinas se tornam, também,
mais „inteligentes‟ e que o trabalho se „desmaterializa‟.
(FRIGOTTO 1993, 1995, 1996 p. 93-94)
Frigotto explicita, na citação abaixo, como o ajuste neoliberal se manifesta no
campo educativo por um revisitar e “rejuvenescer” a Teoria do Capital Humano:
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Os grandes mentores desta veiculação rejuvenescida são o
Banco Mundial. BID, UNESCO, OIT e os organismos regionais
e nacionais a eles vinculados. Por esta trilha podemos perceber
que tanto a integração econômica quanto a valorização da
educação básica geral para formar trabalhadores com
capacidade de abstração, polivalentes, flexíveis e criativos
ficam subordinados à lógica do mercado, do capital e, portanto
da diferenciação, segmentação e exclusão. Neste sentido os
dilemas da burguesia em face da educação e qualificação
permanecem, mesmo que efetivamente mude o seu conteúdo
histórico e que as contradições assumam formas mais cruciais
(FRIGOTTO, 1995, p. 145).
Assim, como nos coloca Frigotto, observamos que novos conceitos são
introduzidos como imposição das novas formas de sociabilidade capitalista, “tanto para
estabelecer um novo padrão de acumulação, quanto para definir as formas concretas de
integração dentro da nova reorganização mundial” (1995, p. 144).
As atuais reformas educacionais emergem no bojo das transformações
produtivas que atingem o mundo do trabalho e as relações sociais e produtivas, com
repercussões para os processos de formação humana evidenciadas, especialmente, no
momento em que “as propostas educativas substituem o conceito de formação humana
básica pela noção de competências individuais para o mercado” (FRIGOTTO e
CIAVATTA, 2001), cujo maior objetivo é adequar os sistemas de ensino às regras das
políticas de ajuste econômico à nova ordem mundial, dentro de um quadro de
redefinição do cenário econômico internacional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na análise empreendida neste estudo, nos foi possível evidenciar que a base
epistemológica que sustenta as políticas de formação de professores e pedagogos nasce
no contexto do pensamento neoliberal, assentado numa concepção pragmatista e
tecnicista de educador pela ênfase que coloca na dimensão instrumentalizadora do
conhecimento. As atuais propostas de formação de professores e pedagogos estão
fundadas numa visão fragmentária e utilitarista do conhecimento, a qual pode ser
identificada, nas concepções que fundamentam a formação do professor como práticoreflexivo com determinadas competências profissionais, expressas na “nova
epistemologia da prática”; nas formas de organização institucional que propõem; nos
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princípios orientadores dessa formação; na orientação metodológica e na proposta de
ampliação da carga horária para a “parte prática” do currículo.
Entendemos que a epistemologia da prática centrada no desenvolvimento de
“competências” e “saberes da experiência”, esvaziam a formação docente porque reitera
a ênfase na parte prática da formação, desvalorizando a apropriação das teorias que dão
suporte à educação. A nosso ver, essa base epistemológica tem fornecido o suporte para
a defesa da centralidade na docência nos cursos de formação de pedagogos, proposta
atualmente pelo Conselho Nacional de Educação.
A partir desta breve reflexão, entendemos que a formação pedagógica deve
resultar de um projeto que articule a docência e as ciências da educação, construído nos
espaços de contradição do sistema capitalista, para dessa formar, resgatar as relações
entre parte e totalidade, teoria e prática, geral e específico. Trata-se de desenvolver uma
concepção que permita superar o reducionismo do viés pragmático que reforça e
naturaliza o dualismo entre o geral e o específico, o pedagógico e o científico, a teoria e
a prática. Portanto, uma concepção que questione os pressupostos epistemológicos
hegemônicos no campo das políticas educacionais e, conseqüentemente, no campo da
formação de professores e pedagogos, e que se contraponha às perspectivas
pragmáticas, reiteradas ao longo de nossa história educacional.
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