CASO CLÍNICO: Cardiopatias
congênitas cianóticas com
hiperfluxo pulmonar
Apresentação: Betânia Amâncio e Talles Coordenação: Sueli R. Falcão
Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS)/SES/DF
www.paulomargotto.com.br
Brasília, 2 de abril de 2012
IDENTIFICAÇÃO
• KMQCS, feminino, DN:05/02/12, 19 dias de
vida, natural de Formosa- Go, procedente e
residente em Cabeceiras – GO.
• INFORMANTE: mãe
HDA
• QP: dificuldade para respirar há 16 dias
• HDA:
• Mãe relata que desde o nascimento, RN apresenta cianose
central em repouso, com piora com o choro, além de ficar
muito “cansadinha”, interrompendo com frequência as
mamadas. Associado, refere diurese reduzida e edema de
MMII.
• Há 16 dias notou piora da taquidispnéia precipitada pelas
mamadas e durante a noite, com surgimento de tosse seca
esporádica. Nega febre, obstrução nasal, coriza ou outros
sintomas urinários.
• Há 1 dia procurou atendimento médico em Formosa-GO,
sendo orientada a procurar atendimento especializado por
alteração no exame cardíaco. ( mãe relata descrição de que
o coração estava “batendo muito forte”)
ANTECEDENTES PESSOAIS
• GESTACIONAIS: mãe sem cartão de gestante – relata
gravidez sem intercorrências, pré-natal com 7
consultas, realizou todos exames indicados, sorologias
sem alterações. Relata vulvovaginite no terceiro
trimestre. Tem depressão e faz uso de nortriptilina.
• PERI-NATAIS: nascida de parto cesáreo ( médico não
fazia parto normal), a termo, Peso: 2640g,
Comprimento:48cm, APGAR; 9/10. Alta hospitalar com
72h de vida.
• PÓS-NATAIS: vacinação atualizada. Nega internações
anteriores, traumas, cirurgias e transfusão. Cartão da
criança não relata realização de exames de triagem
neonatal. Em AME.
ANTECEDENTES FAMILIARES
• Mãe, 32 anos, depressão em uso de
Nortriptilina
• Pai, 35 anos, rinite alérgica
• Irmão paterno saudável
• Irmã materna falecida aos 6 anos por
feocromocitoma (necropsia), há 4 anos.
HÁBITOS DE VIDA
• Reside em casa de alvenaria, de 7 cômodos,
acesso à água encanada e fossa séptica, com
pai e mãe. Possui cachorro em domicilio. Nega
tabagismo passivo.
EXAME FÍSICO
• BEG, ativa e reativa, corada, acianótica, afebril ao
toque, hidratada, taquipneica.
• AR: MV presente em ambos hemitóraces, sem RA.
FR:77irpm, SatO2: 88% em aa, 97% O2 sob CN a
0,5L/min
• ACV: RCR, 3T(?), B1 hiperfonética, SS 3+/6, FC:147
bpm, pulsos palpáveis e simétricos em MMSS e MMII
• ABDOME: semi-globoso, RHA+, timpânico, flácido,
fígado palpável a 3-4cm do RCD.
• EXTREMIDADES: boa perfusão, edema em MMII, com
cacifo positivo em maléolos mediais
• GENITÁLIA: típica feminina, sem alterações evidentes.
• Fontanela anterior plana, normotensa.
CONDUTA
PRESCRIÇÃO:
- Dieta por SOG: LMO 50 ml 3/3h
- HV 55% do Holliday
- Furosemida 2,74 mg/Kg/dia (8/8h)
- Captopril 1,82 mg/Kg/dia (12/12h)
- Espironolactona 0,91 mg/Kg/dia (24/24h)
- Dobutamina 5mcg/Kg
- Paracetamol SOS
- O2 sob CN
- Oximetria de pulso contínua
- Controle de PA, diurese e peso
SOLICITO EXAMES LABORATORIAIS, ECG E RADIOGRAFIA DE TÓRAX
 INTERNAÇÃO PARA INVSTIGAÇÃO E VIGILÂNCIA CLÍNICA
EXAMES COMPLEMENTARES
• LABORATORIO (26/02)
– Glc: 123/ Na: 136/ K: 5,2/ Cl: 100
– Leuco:11500/ Neut: 63%/ Bast:3%/ Linfo: 21%/
Mono:10%/ Eosi:2%/ Baso: 1%
– Hm: 4,48/ Hb: 15,1/ Ht:43,2%/Plaq: 332mil
EXAMES COMPLEMENTARES
EVOLUÇÃO NA INTERNAÇÃO
• Criança atualmente com 1 mês e 24 dias,
permanece internada aguardando consulta no
INCOR, e com objetivo de ganho de peso para
cirurgia. Quadro estável no período,
mantendo saturação de O2 entre 88-94%, com
piora importante durante choro e esforços.
EXAME FÍSICO ATUAL
• BEG, ativa e reativa, hidratada, hipocorada (+/4), acianótica,
anictérica , sudoreica, afebril.
• FC=159bpm, FR=79irpm, Tax= 36,7°C, SatO2=90% em aa.
• Pele sem alterações. Fontanela anterior plana, normotensa,
com cerca de 3cm de extensão.
• ACV: pulsos palpáveis e simétricos em MMSS e MMII. Tórax
hiperdinâmico, íctus palpável do 6° ao 8° EIC com linha
hemiclavicular E. Não palpo frêmito. À ausculta, RCR em 2T
com hiperfonese de B1, sopro sistólico (3+/6) audível em todos
os focos, mais intenso em dorso e borda esternal esquerda.
• AR: MVF presente em ambos hemitóraces, sem RA , com
discreta TSC, mais evidente durante choro.
• ABDOME: semi-globoso, RHA+, flácido, timpânico, fígado a
1cm do RCD, sem massas palpáveis.
• EXTREMIDADES: bem perfundidas – TEC <3s, sem edema.
ECOCARDIOGRAMA
ANÁLISE SEQUENCIAL SEGMENTAR:
• Situs e posição cardíaca: situs ambigus (isomerismo
atrial esquerdo)
• Conexões venosas sistêmicas: drenagem venosa
inferior realizada através de veia ázigos que parece
drenar em veia cava superior, que encontra-se dilatada.
• Conexões venosas pulmonares: veias pulmonares
conectadas a um tubo coletor posterior ao átrio a
esquerda e que drena em átrio a direita.
• Conexão atrioventricular: concordante através de valva
atrioventricular única
• Conexão ventrículo-arterial: dupla via de saída de
ventrículo direito
ECOCARDIOGRAMA
VALVAS ATRIOVENTRICULARES
• Valva AV única com regurgitação de grau acentuado. O
jato direciona-se para o átrio a direita
SEPTOS
• Septo atrial: comunicação interatrial ampla
(praticamente átrio único)
• Septo ventricular: comunicação interventricularde via
de entrada medindo 6mm
• Septo atrioventricular: defeito do septo atrioventricular
total desbalanceado com predomínio de ventrículo
direito
ECOCARDIOGRAMA
CAVIDADES CARDÍACAS
• Átrio Direito: dilatação de grau acentuado
• Átrio esquerdo: dimensões normais
• Ventrículo Direito: dilatação de grau acentuado
• Ventrículo esquerdo: hipoplásico
VALVAS ARTERIAIS
• Valva pulmonar: anterior e a direita. Anel valvar
mede 14mm
• Valva aórtica: posterior e a esquerda. Anel valvar
mede 7mm
ECOCARDIOGRAMA
ARTÉRIAS
• Artérias pulmonares: confluentes e dilatadas
• Aorta e arco aórtico: arco aórtico desce a esquerda.
Arco aórtico pequeno com hipoplasia do istmo
(4,5mm) Coarctação de aorta justaductal com
gradiente em local de coarctação de 20mmHg
(subestimado). Canal arterial pérvio medindo 4,5mm
com shunt bidirecional
• Coronárias: origem e dimensões normais
PERICÁRDIO
• Aspecto normal
ECOCARDIOGRAMA
CONCLUSÕES
• Defeito do septo atrioventricular forma total
desbalanceado (predomínio de VD)
• Dupla via de saída de VD
• Insuficiência acentuada da valva atrioventricular
única
• Conexão anômala de veias pulmonares
• Coarctação de aorta
• Canal arterial
Cardiopatias Congênitas
Epidemiologia
• 3% dos RN possuem malformação congênita
– SCV mais comum: 4,5-8/1000 nascimentos
– Recorte estimado pelo MS: 9/1000
• 20% cura espontânea
• 7,2/1000 nascidos: correção cirúrgica
• Elevada mortalidade
– Segunda causa de morte (11,2%)
Etiologia
• Fator Genético-Familiar
• Fatores Ambientais
– Rubéola congênita
• Anormalidades cromossômicas:
– Trissomias 13,15,18 e 21
– Sd. Turner
Quando Suspeitar?
• Principais Achados:
1.
2.
3.
4.
Sopro Cardíaco
Cianose
Taquipnéia
Arritmia Cardíaca
Sopro
Cianose
Taquipnéia
Arritmia
Cardíaca
Inocente
Investigação clinica ou
reavaliação cuidadosa
Desproporção AP e seus
ramos
Patológico
Rude, sistólico e
localizado
CIV, PCA, EP e Eao
Cardipatias Complexas
Transitória
2ª bulha desdobrada
em focos P e T.
Hipertensão Pulmonar
Transitória
Persistente
2ª bulha única e
hiperfonética
TGA, Tetralogia de
Fallot, Atresias de valva
pulmonar e tricuspide
TTRN
Patológica
Sopro, alterações de
Coarctação de aorta,
bulhas e pulsos arteriais PCA, EAo, SHCE, TAC,
CVTVP, AT+Vu
TPSV
Irritabilidade e
gemência; >200bpm
Imaturidade do sistema
de condução
2º SWPW
BAV completo
50-70bpm
Miocardiopatias ou Acanti-RO e anti-LA
maternos
Cardiopatias
Congênitas
Acianogênicas
Normofluxo
Pulmonar
(obstrutivas sem
desvio)
Hiperfluxo
Pulmonar
(desvio E-D)
Lado Esquerdo
Coarctação de aorta
(10%)
Interrupção do arco
aórtico (1%)
Estenose mitral
(rara)
Lado Direito
Estenose pulmonar
sem defeito septal
(10%)
CIV (20%)
CIA (10%)
CAP (10%)
Defeito do septo
atrioventricular (25%)
Janela aortopulmonar (rara)
Cianogênicas
Hipofluxo
Pulmonar
Normofluxo
Pulmonar
(obstrutivas com
desvio D-E)
(circulação em
paralelo)
Tetralogia de Fallot
(10%)
Atresia pulmonar
com ou sem CIV
(5%)
Atresia tricúspide
(3%)
Doença de Ebstein
(0,5%)
TGA com ou sem EP
(raras)
TGA simples (5-8%)
Hiperfluxo
Pulmonar
(mistura comum)
Tronco arterial
comum (3%)
Conexão anômala
total das VP (2%)
Hipoplasia do
coração esquerdo
(2%)
TGA com CIV sem
EP (raras)
Cardiopatias Congênitas
Cianóticas
Hiperfluxo Pulmonar
Transposição Das Grandes Artérias
Definições
Fisiopatologia
Quadro Clínico
Exames
Cardiopatia
congênita mais
frequente: 0,20,45/1000
nascimentos
• 3H:1M
• Discordância
ventrículo-arterial
com concordância
atrioventricular.
• Associação com:
Mães diabéticas
ou pré-diabéticas;
Mulheres em
tratamento com
hormônios
sexuais
Completa separação
das
circulações
pulmonar e sistêmica
que se fazem em
paralelo:
sangue
insaturado circulando
pela
circulação
sistêmica e sangue
oxigenado
pela
circulação pulmonar.
A existência de
defeitos associados
(CIA, CIV, PCA) que
permitam a mistura
de sangue das duas
circulações
é
essencial à vida.
Clássica: cianose,
SatO2 30-50% e PaO2
20-30mmHg.
Disfunção ventricular
e IC na primeira
semana de vida,
associada a queda da
RVPu. Hiperfonese de
B2 única em foco
pulmonar.
Complexa: com CIV
garante mistura para
aumentar SatO2. IC
ao fim do primeiro
mês associado a
queda da RVPu.
ECG: SVE ou SBiV.
Rx
de
toráx:
coração
–
“ovo
deitado”,
pedículo
vascular estreito e
cardiomegalia.
Ecocardiograma.
Tratamento
Clínico:
prostaglandina E1 +
O2. ICC: digoxina +
diuréticos
Cirúrgico: JateneTGA clássica.
Complexasprocedimentos mais
complexos.
Hipoplasia do Coração Esquerdo
Definições
Fisiopatologia
Quadro Clínico
Hipoplasia
significativa
ou
ausência
de
ventrículo esquerdo e
hipoplasia de aorta
descendente,
associada a atresia ou
estenose de valvas
aórticas ou mitral.
O fechamento do
canal arterial provoca
restrição do sistema
de perfusão, acidose
metabólica, colapso
circulatório e morte.
Cianose, com sinais
de
insuficiência
cardíaca de evolução
fatal
(estertores
pulmonares,
desconforto
respiratório,
hepatomegalia
e
cardiomegalia).
Discreta predileção
pelo sexo masculino
Morrem entre 1 e 2
semanas de vida.
Incomum sobreviver
até 6 semanas.
Se o canal arterial for
mantido
amplo,
promovem
progressivo aumento
da
circulação
pulmonar,
com
diminuição do DC
sistêmico,
edema
pulmonar,
hipoperfusão
coronariana e morte.
Exames
ECG
Rx de toráx
Ecocardiograma
Tratamento
Cirúrgico:
reconstruções
univentriculares
(operação
de
Norwood, derivação
cavopulmonar,
operação de Fontan).
Tronco Arterial Comum
Definições
Fisiopatologia
Quadro Clínico
Associação à diabetes
materna, a baixa
ingesta de folatos e a
alterações
cromossômicas e Sd.
De DiGeorge.
Tronco arterial único
origina-se
dos
ventrículos,
dando
origem:
• artérias
coronárias
• uma
artéria
pulmonar
• Vasos
braquiocefálicos
Resulta em uma única
e grande artéria que
recebe sangue de
ambos os ventrículos,
que apresentam um
DSV subjacente.
Cianose
sistêmica
precoce, aumento do
fluxo
sanguíneo
pulmonar,
hipertensão
pulmonar irreversível
Exames
ECG
Rx de toráx
Ecocardiograma
Tratamento
Cirúrgico:
mais
precoce
possível
antes de se instalar
IC. Compensado – 23 meses.
Dupla Via de Saída de VD
Definições
Anomalias da
conexão ventrículoarterial: duas grandes
artérias (pulmonar e
aorta) se originam
primariamente do
ventrículo.
Via de saída de VE
ocorre por uma CIV
1 a 1,5% dos
pacientes com
cardiopatia congênita
1:10.000 nascidos
vivos
Fisiopatologia
Promove hiperfluxo
pulmonar implicando
em uma hipertensão
pulmonar.
Sobrecarga de VD.
Há diminuição do DC
com circulação de
sangue
pouco
oxigenado.
Quadro Clínico
Cianose , sopro
sistólico ejetivo;
B2 hiperfonética
Exames
Radiografia:
hipertrofia cardíaca à
direita
Ecografia: dupla via
de saída de VD; CIV;
hiperfluxo pulmonar
– Hipertensão
Pulmonar.
Tratamento
Preservação de
circulação pulmonar
(patência do canal
arterial):
prostaglandina E1
Cirúrgico.
Drenagem anômala das veias
pulmonares
Definições
Comunicação
da
parte pulmonar do
plexo do intestino
anterior
com
o
sistema
venoso
cardinal ou umbílicovitelino, resultando
na conexão das veias
pulmonares com o
átrio direito ou o
sistema
venoso
sistêmico.
1 a 3% das anomalias
congênitas cardíacas
2% das mortes por
anomalias cardíacas
no primeiro ano de
vida.
Fisiopatologia
Dependem da CIA:
CIA pequena: DC é
reduzido
e
há
aumento de AD e da
pressão
venosa
sistêmica
com
hepatomegalia
congestiva e edema
periférico.
Obstrução ao retorno
venoso pulmonar e
hipertensão venosa
pulmonar: conexões
infradiafragmáticas
ou
nas
supradiafragmáticas
Quadro Clínico
Dispnéia,
edema
pulmonar,
cianose,
insuficiência
de
ventrículo direito
Exames
ECG: eixo à direita e
sobrecarga de VD e
AD.
RX tórax: hiperfluxo
pulmonar, aumento
de AD, VD e artéria
pulmonar.
ECO TT - Aumento de
VD com AE reduzido.
Cateterismo cardíaco
- melhor definição de
anomalias
concomitantes.
Tratamento
Cirúrgico:
anastomose do TVP
com o AE.
Então,
como
rastrear?
Mas tem como?
Triagem Neonatal de Cardiopatia
Congênita Crítica
Oximetria de pulso
(MSD e um dos MMII entre 24-48h de vida)
SpO2<95% ou
Diferença ≥ 3% entre membros
SpO2≥95% ou
Diferença <3% entre membros
Realizar outra oximetria em 1h
SpO2<95% ou
Diferença ≥ 3% entre membros
Ecocardiograma
Investigação de cardiopatia
SpO2≥95% ou
Diferença <3% entre membros
Seguimento neonatal de rotina
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
Diagnóstico precoce de cardiopatia congênita crítica: oximetria de pulso
como ferramenta de triagem neonatal – Departamento de Cardiologia e
Neonatologia da SBP – 07/01/2011
Amaral F; Granzotti JA; Manso PH & Conti LS. Quando suspeitar de
cardiopatia congênita no recém-nascido. Medicina, Ribeirão Preto, 35: 192197, abr./jun. 2002.
Farah MCK; Villela GC. Cardiopatia congênita
Santana MVT - Cardiopatias Congênitas no Recém-nascido - São Paulo ,
Atheneu , 2000.
Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia para Gravidez na Mulher
portadora de Cardiopatia . Cardiopatia Congênita. Arq Bras Cardiol 2009;
93(6 supl.1): e110-e178
Júnior VCP – Avaliação da política nacional de atenção cardiovascular de
alta complexidade com foco na cirurgia cardiovascular pediátrica – 2010
Cardiopatias Congênitas complexas: aspectos atuais do tratamento
cirúrgico
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Cardiopatias congênitas cianóticas com