CAMINHADA DE UMA PESQUISA: PRATICA PEDAGÓGICA E
IDENTIDADE NA EDUCAÇÃO DA CRIANÇA NEGRA NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Daniele Cristina Rosa
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INTRODUÇÃO: Meu projeto de Mestrado intitulado “Prática Pedagógica e Identidade da
Criança Negra na Educação Infantil: o que sou, aprendo através do seu olhar” nasceu das
inquietações e observações realizadas durante os últimos quatro anos (2004 a 2008) nos
Centros Municipais de Educação Infantil de Curitiba – Núcleo de Santa Felicidade,
quando na condição de Coordenadora de Projeto, nos momentos de visita as salas de
crianças de zero a três anos acompanhei e participei do trabalho das educadoras da
infância. Verifiquei que absorvidas pelos rituais do cotidiano e pelas necessidades
manifestas das crianças, expressam em seus diálogos falas sutis, como: “ olha que lindo
este bebe, ele é negro, é o nosso chocolate, é negro... é bonzinho, não bate em ninguém.”
Ao analisar estas falas questiono: Quais as relações entre as práticas pedagógicas da
Educação Infantil e a Identidade da criança? Como estas educadoras vêm contribuindo, em
seus fazeres, olhares e falas na formação das crianças? Pensando que a identidade não é
algo inato Abramovicz (2006) aponta que na escola, trabalha-se como se não houvesse
diferenças, prega-se uma igualdade entre as crianças apesar de existirem efetivamente
praticas de diferenciação de caráter racial e estético. Há um desprestigio as demais
culturas, entre elas a cultura africana e uma falsa cultura da inexistência do racismo na
escola. Este desprestígio se configura desde o material didático a formação dos
professores. Se a escola é espaço de educação, é espaço coletivo de formação, o resgate da
história e da memória do povo africano é uma oportunidade formativa. É com este olhar
que a Lei 10.639/2003 aprova o parecer CNE/ CP3/2004 instituindo as Diretrizes
Curriculares para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africanas. É importante compreender que o trabalho com as orientações
Étnico-raciais, na escola, não visa exclusivamente a valorização do negro e elevação da
auto-estima das crianças afro-descendentes. Tratar de elementos da Cultura e da História
do povo africano e das relações é um componente que vislumbra a formação de todas as
crianças na perspectiva anti-racista demonstrando que diferentes raças contribuíram para a
formação do povo brasileiro, tal como ele é. Quando tratamos da construção da identidade
de crianças pequenas, buscamos em Abramovicz o entendimento que:
ela é a consciência que cada um de nós tem de si próprio, ao ter da
sua comunidade, da sua classe social, do seu grupo de raça, de
gênero, do pais onde vivemos. Consciência essa que se elabora na
vida do dia-a-dia, dando significado as relações que se dão na
família, na comunidade, na escola, no um do trabalho. (2000,p.75)
Esta consciência de si, no universo das crianças muito pequenas é constituída em espaços
coletivos (Centros Municipais de Educação Infantil) pelos múltiplos olhares dos
educadores e outros pares. Dessa forma, as relações estabelecidas com outras pessoas são
fundamentais na construção da identidade de cada um. Quando tratamos sobre a identidade
das crianças negras, vislumbramos que a Educação Infantil, como espaço formativo, deve
trabalhar com vistas a desenvolver a identidade cultural e racial das crianças que dela
participam. Falamos na constituição desta identidade, de praticas pedagógicas que
contribuam para a constituição da mesma. Neste sentido, esta constituição esta atrelada a
dimensão histórica e por vezes certa naturalização. Logo, ao abordar identidade positiva,
compreendemos que esta seja a capacidade de ver-se, reconhecer seu valor e sua beleza
(sua imagem) e aceitar-se diante de si e do grupo a que pertence. É a construção da sua
auto-imagem. Segundo Algarve (2004), a identidade é elaborada e aperfeiçoada no
decorrer da vida nos grupos a que pertencemos e para tanto a não é fixa, vive num
processo em constante construção e recebendo percurso da vida influencias positivas e
negativas de outros grupos e pessoas. A escola pode ser um fator de interferência na
construção da identidade negra, podendo, de acordo com a forma com que se olha o negro
e sua cultura, valorizar as diferentes identidades, ou, discriminá-las. Para a Educação
Infantil, a especificidade da faixa etária exige um tratamento com as questões étnicas
raciais que perpassam a formação plena da criança, conforme cita as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil “a criança como um ser total, integral e
indivisível”. A abordagem étnico-racial na educação infantil se referencia inicialmente no
cuidar e educar, no acolhimento da criança tal como ela é, “respeita a cultura,
corporeidade, estética e presença no mundo” (SECAD, 2006). O entendimento de respeito
traz a baila a dimensão família e religiosidade, na qual é importante perceber as diferentes
nuances existentes e considerar a convivência e compreensão da diversidade. E por fim, a
formação da identidade, como um elemento presente no respeito a cultura e a
corporeidade, e que exigem no trato com a criança pequena olhar sensibilizado do
educador. A postura, as atitudes, as intenções, as falas contribuem significativamente na
formação destas crianças. Reconhecê-las em suas diferenças e singularidades; respeitá-las
como seres diversos e inseridos em uma cultura é papel de profissionais que atuam com
crianças pequenas. As Orientações e Ações para as Relações Étnico-Raciais aponta:
a importância das interações positivas entre educadoras e crianças.
Relações pautadas em tratamentos desiguais podem gerar danos
irreparáveis a constituição da identidade das crianças, bem como
comprometer a trajetória educacional das mesmas. (2006, p.38)
SECAD (2006) dependendo da forma como é entendida e tratada a questão da diversidade
étnico-racial, as instituições podem auxiliar as crianças a valorizar sua cultura, seu corpo,
seu jeito de ser ou pelo contrario, favorecer a discriminação quando silenciam diante da
diversidade e da necessidade de realizar abordagens de forma positiva, ou quando
silenciam diante da realidade social que desvaloriza as características físicas das crianças
negras.
OBJETIVOS: Conhecer as práticas pedagógicas na Educação Infantil e suas relações com
a constituição da identidade da criança pequena de zero a três anos; - Discutir os impactos
das praticas pedagógicas com crianças de zero a três anos sobre a formação da identidade
na infância; - Listar práticas pedagógicas no atendimento da criança negra sob perspectiva
antirracista e não discriminatória contribuitivas na formação de sua identidade.
ATIVIDADES GERAIS DESENVOLVIDAS: Para realização da pesquisa várias
atividades estão sendo realizadas, como: - Identificação de bairros de maior concentração
de população negra em Curitiba para realização da pesquisa no Centro Municipal de
Educação Infantil desta região. - Pesquisa do Centro Municipal de Educação Infantil que
há maior concentração de crianças afro-descendentes e bem como educadoras negras e
residentes no bairro. - Realização de observação participativa, perfazendo um total de trinta
horas nas turmas que compõe a faixa etária de creche – zero a três anos. - Anotações de
notas de campo para composição junto às observações do trabalho. - Uso de filmagens para
a realização das observações como instrumento de técnica observacional. - Realização de
oficina temática para os participantes da pesquisa visando a discussão e proposição de
encaminhamentos quanto a prática pedagógica e a formação da identidade da criança
negra.
RESULTADOS ESPERADOS: O desejo é que esta pesquisa venha contribuir com os
estudos dentro da temática relações etnicorraciais e educação infantil, unindo duas áreas
até então distantes e sem estudos que coadunem elemento de suma importância como a
identidade negra. Outra intenção é conhecer as sutilezas deste universo relacional que é a
prática pedagógica de zero a três anos. Um espaço, que ainda pede muitas pesquisas,
convida estudiosos a adentrar e reconhecer educadores e crianças atuando num cenário que
ainda muito se desconhece como é este fazer e como se dá esta pratica. Seriam as crianças
totalmente manipuladas pelos adultos? Conseguem no meio das rotinas criar seus
contextos, vidas e universos isolados dos desejos adultos? Quais as práticas pedagógicas
que marcam esta identidade negra, que contribuem positivamente? Elas existem como se
dão? É um universo a conhecer verdadeiramente.
REFERÊNCIAS
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