1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2ª Câmara de Direito Público VOTO Nº 11977 AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0111056-58.2011.8.26.0000 COMARCA: SÃO PAULO AGRAVANTE: ENID LOPES RIBEIRO (E OUTROS) AGRAVADA: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO Juíza de 1º grau: Dra. Celina Kiyomi Toyoshima AGRAVO DE INSTRUMENTO. Ação de rito ordinário em que servidores públicos pleiteiam complementação de proventos. Competência da Vara da Fazenda Pública. Causa cujo valor global apurado pelo Juízo supera o montante de sessenta salários mínimos. Critério do artigo 2º, caput, da Lei 12.153/09. Litisconsórcio facultativo. Limitação considerando o valor da causa individualmente, para cada autor. Impossibilidade. Veto ao dispositivo legal que permitia a adoção de tal critério. Litisconsórcio que só pode ser limitado se presentes os requisitos do artigo 46 do Código de Processo Civil, o que não se deu no caso concreto. Recurso provido. I- Trata-se de agravo de instrumento interposto por ENID LOPES RIBEIRO (E OUTROS) contra decisão de fls. 162/163 que, em ação sob rito ordinário que movem em face da FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, determinou a remessa dos autos principais ao Juizado Especial da Fazenda Pública, em razão de os valores pleiteados individualmente não ultrapassassem sessenta salários mínimos. Alegam os autores que tendo sido atribuído à causa valor que ultrapassa sessenta salários mínimos, tal demanda foge à competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, sendo absoluta sua competência apenas nas causas em que este valor não superar aquele patamar. L AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0111056-58.2011.8.26.0000 São Paulo 2 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2ª Câmara de Direito Público Pedido de efeito suspensivo negado. Dispensadas as informações do Juízo e apresentação de resposta da agravada, por desnecessárias. É o relatório. II- Inicialmente, cumpre esclarecer ser dispensável o processamento do presente agravo de instrumento, tendo em vista o fato de a relação jurídico-processual ainda não ter sido estabelecida com a parte contrária. III- No mais, o recurso merece ser provido. Cuida-se de ação sob rito ordinário ajuizada pelos autores em litisconsórcio facultativo, buscando a complementação de proventos. No despacho inicial (fls. 162/163), a MMª. Juíza a quo entendeu por bem remeter os autos ao Juizado Especial da Fazenda Pública, diante dos valores pleiteados não ultrapassassem sessenta salários mínimos por autor. Inconformados, recorrem os requerentes para que se dê prosseguimento ao feito, na forma como proposto, perante a 4ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital, com todos os litisconsortes no pólo ativo. Segundo prescreve o artigo 2º, caput, da Lei 12.153/09, “é de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito L AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0111056-58.2011.8.26.0000 São Paulo 3 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2ª Câmara de Direito Público Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) saláriosmínimos”. E acrescenta o § 4º do mencionado artigo: “no foro onde estiver instalado Juizado Especial da Fazenda Pública, a sua competência é absoluta”. Importante ressaltar que o § 3º do aludido dispositivo, o qual previa que o valor estabelecido no caput fosse considerado por autor, em caso de litisconsórcio, foi objeto de veto 1, e assim promulgada e publicada a lei. Dessa forma, por razões de hermenêutica, por óbvio se entender que o limite de sessenta salários-mínimos deve servir de parâmetro para o valor da causa como um todo, não havendo que se fazer uma análise pormenorizada do proveito econômico pretendido por cada demandante. Diversa também não é a posição da doutrina. Leonardo José Carneiro da Cunha2 ressalta que, “havendo litisconsórcio, o valor da causa deve equivaler ao montante total postulado, não se considerando o valor individual por autor. Em outras palavras, para que se possa postular no Juizado da Fazenda Pública é preciso que o valor total equivalha a até 60 (sessenta) salários mínimos. Não é o valor individual de cada autor que deve ser levado em conta, mas o valor de toda a postulação”. As razões de veto foram as seguintes: “ao estabelecer que o valor da causa será considerado individualmente, por autor, o dispositivo insere nas competências dos Juizados Especiais ações de maior complexidade e, consequentemente, incompatíveis com os princípios da oralidade e da simplicidade, entre outros previstos na Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995”. 1 2 “A Fazenda Pública em Juízo”, Dialética, 8ª ed., p. 724. L AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0111056-58.2011.8.26.0000 São Paulo 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2ª Câmara de Direito Público Importante também deixar clarificado que, não há que se confundir a situação exposta nos autos com o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça em caso aparentemente semelhante. Instada a se manifestar sobre a fixação da competência pelo valor da causa na hipótese de litisconsórcio facultativo, a E. Corte decidiu, no caso do Juizado Especial Federal (Lei 10.259/2001), considerar o valor da causa levando em conta o proveito econômico a ser obtido por cada autor, não importando que a soma de todos eles ultrapassasse o valor de sessenta salários mínimos3. Tal interpretação, num primeiro momento, pode conduzir o intérprete à conclusão precipitada de que o mesmo deslinde seria o aplicável ao Juizado Especial da Fazenda Pública. Com todo respeito àqueles que adotam esse entendimento, a meu ver, não parece ser esta a melhor solução. Isso porque a Lei 12.153/09, como já dito alhures, foi objeto de veto presidencial. E sendo assim, permitir que o Judiciário faça uma 3 "TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE GASOLINA OU ÁLCOOL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. LITISCONSÓRCIO ATIVO FACULTATIVO. COMPETÊNCIA. JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS PARA CADA AUTOR INDIVIDUALMENTE CONSIDERADO. I – Para que incida o art. 3.º da Lei n.º 10.259/2001 e seja, conseqüentemente, fixada a competência dos Juizados Especiais Federais no caso de litisconsórcio ativo facultativo, impende considerar o valor de cada uma das causas individualmente considerado, não importando que a soma de todos eles ultrapasse o valor de sessenta salários mínimos. Entendimento diverso atentaria contra o princípio da economia processual e outros princípios que informam os juizados especiais, como a celeridade e a informalidade, pois cada autor teria de propor uma ação autônoma, solução que multiplicaria o número de feitos a serem apreciados e, em audiências diversas, julgados. II – Recurso especial improvido. (REsp 794806 - PR, Relator Ministro FRANCISCO FALCÃO, Primeira Turma, DJ 10 de abril de 2006)." L AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0111056-58.2011.8.26.0000 São Paulo 5 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2ª Câmara de Direito Público interpretação contrária às razões emanadas pelo chefe do Executivo, seria o mesmo que derrubar o veto, não cabendo ao Poder Judiciário fazê-lo, sob pena de invasão de competência exclusiva do Poder Legislativo. Por conseguinte, patente a impossibilidade de se limitar o litisconsórcio facultativo com fulcro no critério perpetrado pelo artigo 2º, caput, da Lei 12.153/09. A competência do Juizado Especial da Fazenda Pública somente é absoluta nas causas de valor total inferior a sessenta salários mínimos e o litisconsórcio, ainda que facultativo, supera tal limite no caso em análise. Por fim, imperioso ressaltar que nada impede a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, a restringir o litisconsórcio nas hipóteses do artigo 46, quando se constatar que o número excessivo de litisconsorte for dificultar a defesa e o rápido andamento do processo, o que não ocorreu no caso concreto. Portanto, de rigor a reforma da r. decisão agravada, a fim de que se dê prosseguimento à ação nos termos como proposta. Isto posto, dá-se provimento ao recurso. VERA ANGRISANI Relatora L AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0111056-58.2011.8.26.0000 São Paulo