O GERENTE DA PEQUENA EMPRESA:
ALGUMAS DISCUSSÕES DESCONCERTANTES
Luciana de Oliveira Miranda Gomes
Mestre em Administração Pública
Universidade Federal de Viçosa - Departamento de Administração
Campus Universitário - Centro - Viçosa - MG
36.571 - 0 0 0
UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
Departamento de Administração
Introdução
O objetivo deste trabalho é discutir a formação do gerente de uma
pequena empresa no Brasil.
Longe de pesquisas empíricas, que
demonstrariam a realidade do país através de estudos de caso ou
pesquisas de campo, o intuito é muito mais apresentar algumas
percepções da autora ao longo de leituras, pesquisas e curso
ministrado para gestores de organizações de pequeno porte.
Vamos ao princípio: o que é ser dirigente? Poderíamos defini - lo
como “reger uma orquestra, onde as partituras mudam a cada instante, e os
músicos têm liberdade para marcar seu próprio compasso”.
Desta forma, gerir uma organização contrasta definitivamente
com outras funções produtivas, que geralmente têm definições claras
sobre suas atribuições, condicionando comportamentos, normalmente
previsíveis e rotineiros. (In)felizmente, previsão e rotina não fazem
parte do dicionário de um dirigente. Numa visão mais tradicionalista e
rígida, podemos observar o dirigente como um decisor racional, que
coordena, supervisiona e planeja de forma sistemática, sendo eficiente
nas suas atividades organizacionais.
Mas não é este o caso. A realidade nos mostra pressões para
ações de curto prazo, cuja avaliação só se dará a longo prazo, ou seja
diversos fatores não-controláveis do processo decisório organizacional
conduzem a formas diversas ao desejado.
Até recentemente, a teoria gerencial tinha por premissa que se
poderia dominar, por critérios de racionalidade, a vida e os dest inos de
uma organização. Para tanto, bastaria coletar grande quantidade de
informações que, processadas e analisadas segundo critérios também
racionais, produziriam as melhores decisões.
No mundo de hoje,
assombrado com conceitos muito falados e pouco estudados, como
globalização e outros, as habilidades gerenciais se deparam - estáticas
- com um mundo organizacional complexo e ambíguo.
A gerência
existe simplesmente porque existem atividades que um indivíduo não
pode fazer por si só, necessita da cooperação de outros para uma ação
coletiva na busca de um objetivo comum.
Por isso, torna -se necessário simplificar métodos, para melhor
compreender a organização, e conseqüentemente, agir gerencialmente
em tempo hábil. E nada mais simples para “simplific ar métodos” do
que nos voltar para a análise das funções gerenciais, também
denominadas de processo, assim definidas por Henri Fayol tempos
atrás.
A partir disto, poderemos compreender um pouco mais as
áreas funcionais de organizações - no geral - e com o é este
comportamento nas empresas de pequeno porte.
Funções Gerenciais (ou processo administrativo)
Iremos analisar quatro itens do denominado processo
administrativo, e como poderíamos incluí - lo na realidade de pequenas
empresas.
São eles: planejamento, organização, direção (ou
motivação) e controle:
• planejamento: reflexão acerca dos meios necessários para ter os
objetivos organizacionais alcançados, determinando o curso de
ação e fornecendo uma base para estimar o grau do sucesso
provável;
• organização: determinação do tipo de organização requerido para
executar os planos propostos;
• direção: papel de liderança e motivação, interpretando políticas,
fazendo com que as atividades relacionadas com o quadro
organizacional continue em direção ao objetivos propostos;
• controle: mede o desempenho presente em relação aos padrões
esperados e, como resultado, determina se há necessidade de ações
corretivas. É exercida de forma contínua, já que possíveis ações de
correção são consideradas como parte de um ciclo.
Este ciclo é característico do processo administrativo. Planejar,
Organizar, D irigir (ou Motivar) e C ontrolar, devem ser entendidos com
atos contínuos, que se processam de forma unificada, abrangendo
todos os aspectos e funções de uma organização.
Planejamento numa organização de pequeno porte
Como planejar numa organização de pequeno porte? Geralmente,
alguns obstáculos são percebidos, mas não são ultrapassados, como por
exemplo: falta de verba; falta de recursos humanos para a constituição
de um órgão autônomo de planejamento; apreensão de gerar clima
insatisfatório, caso os planos discutidos não sejam implementados.
Desta forma, as tendências mais freqüentes são: os planejamentos
informais; os processo de controle também informais, e a concentração
n um futuro próximo, ou seja, não há idéia formada acerca de
estratégia para médio e longo prazo.
E qual seria uma solução prática? O uso de um formulário básico,
onde poderemos concentrar informações essenciais, já é um bom
começo. Analisaremos de forma única os seguintes itens: condições
competitivas (informações externas); necessidades dos clientes;
recursos da organização (informações internas); e desejos da direção.
Como reunir de forma rápida e útil as informações internas? Um
bom exemplo é orientar os relatórios de curto prazo (semanais ou
mensais) para que sejam elaborados com vistas aos seu uso no
planejamento a longo prazo, ou seja, otimizar as informações internas,
tornando-as fáceis de entender e úteis a toda a organização.
Onde conseguir informações externas seguras e baratas, a fim de
não onerar o caixa da empresa?
Conversas com os próprios
funcionários; fornecedores, concorrência (por que não?) e associações
comerciais são uma boa fonte. Uma análise sucinta do(s) seu(s)
canal(is) de distribuição também. Que tal uma visita às bibliotecas de
Universidades, e um diálogo com professores da área? Também são
grandes interlocutores.
Existem certos elementos numa organização de pequeno porte que
tornam o planejamento mais fácil. Será que algum dirigente já seu
conta disso? Por exemplo: existem menos dados a serem colhidos;
menos camadas administrativas pelas quais precisam passar as
informações; geralmente, as operações do dia - a-dia são menos
espalhadas (em termos geográficos); a real rentabilidade da maioria
das pequenas empresas reside no futuro, desta forma, a direção tem
mais motivos para planejar.
Organização numa organização de pequeno porte
A Organização na pequena empresa significa estruturar os
recursos e as atividades para atingir os objetivos. Desta forma, serão
analisados, os órgãos, os cargos, além da atribuição de autoridade e
responsabilidade.
A abrangência desta função irá, assim do desenho organizacional
(organização linear, organização funcional, organização linha -staff,
entre outras); modo de departamentalização (se for o caso); e o
desenho dos cargos e das tarefas, indo inclusive na descrição e análise
dos cargos.
Como estruturar todas estas responsabilidades? Soluções antigas
e simples, ignoradas pelas grandes e “modernas” organizações, são o
organograma e o fluxograma. Vamos a cada um deles.
O organograma é, em última análise, a representação da estrutura
hierárquica, com órgãos, canais de comunicação, e em alguns casos,
com os nomes dos ocupantes destes.
O fluxogr ama representa o fluxo ou seqüência de procedimentos
ou rotinas de cada setor, ou, sendo mais exato, de cada função. Suas
utilidades estão na simplicidade dos objetivos.
Numa organização de pequeno porte, a visão do organograma ou
seja, da representação visual de uma forma abstrata que é a empresa,
auxiliaria os ocupantes dos cargos no que tange a linha de autoridade
e responsabilidade. Já o fluxograma iria esclarecer qual procedimento
para cada cargo, setor ou órgão, facilitando inclusive a visualiz ação do
cliente interno de cada um.
Direção numa organização de pequeno porte
Dirigir (ou melhor ainda, Motivar) envolve necessariamente dois
aspectos: motivar o comportamento dos subordinados, adequando - os
aos planos e cargos que foram estabelecidos; e compreender os
sentimentos dos seus funcionários, os problemas que eles encaram
quando traduzem os planos anteriormente definidos em ação. Assim,
interpretar os planos para os outros e dar as devidas instruções sobre
como executá - los, é o objetivo a ser atingido.
A pequena empresa, por seu número reduzido de funcionários,
será cada vez melhor dirigida se o seu gestor conseguir dinamizá - la
por inteiro. Com sua estrutura funcional enxuta, a possibilidade de
atingir todo o contingente de funcionários em tempo menor que uma
grande empresa, é uma vantagem que deve ser explorada. Outra é a
comunicação interna, com vistas a orientação sobre os objetivos.
Controle numa organização de pequeno porte
O controle tem como objetivo assegurar que os resultados
defini dos pelo planejamento sejam alcançados, utilizando- se da
estrutura e recursos da empresa. É, em outras palavras, o meio
preventivo para atingir os objetivos da organização. Esta função pode
ser utilizada para:
padronizar desempenhos, proteger os bens
organizacionais, padronizar a qualidade, limitar a quantidade de
autoridade, medir e dirigir o desempenho, entre outras.
A pequena empresa poderá se utilizar deste valioso instrumento
de gestão, através da subdivisão nas seguintes fases: estabelecimento
de padrões ou critérios, definidos em conjunto com o planejamento e
vislumbrando sempre a realidade da sua organização; observação do
desempenho, tanto humano como estrutural; comparação do
desempenho alcançado com o padrão estabelecido; desenvolvimento de
aç ões corretivas que diminuam cada vez mais o desempenho atual e o
esperado.
Observamos desta forma, que o controle não existe como um fim
em si mesmo. Pelo contrário, sua íntima ligação com o planejamento
acima descrito é o fator condicionante para o sucesso do processo
administrativo. Somente um planejamento flexível e um controle
honesto e realista poderão auxiliar o gerente de pequena empresa nas
suas funções específicas.
O ambiente organizacional de uma pequena empresa
Se utilizarmos uma visão glob al do que é administrar, poderíamos
defini - lo como um processo de guiar um sistema organizacional
através de um ambiente que provê recursos, assistência e restrição a
um conjunto de objetivos.
Mas, como construir e gerir este ambiente? Antes de mais nada,
observamos que o ambiente organizacional é composto do ambiente
interno e o ambiente externo.
O ambiente externo deve ser entendido como a agregação de
todas as condições, eventos e influências que envolvem esse ambiente.
Seus componentes são os ambien tes natural (os recursos naturais);
histórico (informações de origens da administração de negócios);
político- legal (situação de órgão governamentais, leis decorrentes);
econômico (mercado interno e externo); social (informações
demográficas pertinentes); cultural ( normas e valores da sociedade).
O ambiente interno é composto de subsistemas que se interagem,
formando o denominado “todo organizacional”. Para ser melhor
entendido, pode ser subdividido em subsistema técnico (tecnologia
utilizada); organizacional (forma de relacionamento entre os membros
da organização); normativo (valores, filosofia e objetivos da empresa);
e humano (tipos de: personalidade, relações grupais, estilo de
liderança).
Qual a importância de identificar estes ambientes? Se isto for
feito, a pequena empresa poderá definir de forma mais coerente sua
política de ação, através de um relacionamento mais realista e efetivo.
Deverá, contudo, manter um sistema de informação que mantenha um
canal aberto entre o ambiente externo e interno, a fim de que
informações importantes não se percam.
As informações sobre o
ambiente externo devem ser utilizadas principalmente para:
identificar políticas opcionais; adicionar outras possíveis estratégias
de ação; identificar programas opcionais; selecionar oportunidades de
atuação ou investimento.
As áreas funcionais
Definir áreas funcionais numa pequena empresa, principalmente
se esta for caracterizada como micro, pode parecer fora de propósito,
já que este tipo de organização prima principalmente pela não
especialização de funções. De qualquer forma, uma análise das
principais áreas (Produção, Finanças, Marketing , e Recursos Humanos)
irá auxiliar o gestor a definir funções e setores de sua organização de
forma mais coerente e ativa.
Função Produ ç ã o
É, em última análise, a atividade de transformação de matéria - prima
em utilidades necessárias ao consumidor. Geralmente se divide em
três subsistemas essenciais: engenharia de produto; planejamento da
produção e engenharia do processo.
Função Financeira
Este setor preocupa -se com todos os problemas que são associados
com a eficiente aquisição e o uso do capital, pela organização. Assim
temos as seguintes áreas de decisão: investimento; financiamento e
distribuição de lucros.
Observamos que os objetivos principais desta área são a obtenção
do montante adequado de capital e sua conservação, a fim de
conseguir maior lucro com o mesmo.
Função Marketing
É a interação de múltiplas atividades organizacionais com o
objetivo de satisfazer desejos específicos e necessidades do
consumidor.
Geralmente, o Marketing se estrutura através dos
seguintes passos: localização e medição da demanda dos consumidores;
tradução dessa demanda em produtos (ou em uma linha de produtos);
desenvolvimento e implementação de um pl ano que torne o produto
acima disponível.
Este setor pode ser compreendido quando dividido nos seguintes
subsistemas: comercialização; distribuição física (estoques, transporte
e canais de distribuição) e atividades auxiliares.
A comercialização do produto se organiza através do
planejamento e desenvolvimento do produto, a criação da demanda
deste produto, suas vendas e finalmente, assistência ao cliente.
Algumas atividades auxiliares são importantes, como a
estruturação do sistema de financiamento através do crédito ao
consumidor, o sistema de informação sobre o mercado e o perfil do
próprio consumidor, e finalmente, o sistema de preço, ou seja: como
compor o preço.
O composto do preço depende do produto, do
mercado competidor e da demanda.
Função Rec ursos Humanos
Administrar recursos humanos nada mais é que coordenar o
esforço da organização no sentido de atrair profissionais do mercado,
prepará - los, adaptá- los, desenvolvê- los e incorporá-los de forma
permanente ao esforço produtivo, utilizando adequa damente o
profissional que a organização necessita.
Esta função é melhor entendida quando entendemos que este
processo é um ciclo, subdividido da seguinte forma: administração de
cargos e salários e benefícios, recrutamento e seleção, treinamento e
desenvolvimento, higiene e segurança no trabalho, avaliação de
desempenho, e sistema de informações.
As funções e o gerente da pequena empresa
Numa pequena empresa, as camadas ou estratos dos níveis
decisórios e se confundem, fazendo com que as decisões estratégicas,
técnicas e processuais de todas estas funções se misturem,
aproximando- as do nível denominado não- decisório, ou ainda,
operacional. Este fenômeno deverá ser encarado como vantagem ou
desvantagem para as organizações em questão?
Chegamos ao ponto do grande desafio.
Para transformar esta
suposta desvantagens das grandes empresas, mais preparadas e
estruturas no que concerne a linhas de autoridade e responsabilidade,
além de outras, é necessário uma reflexão.
Todas as funções acima descritas são el aboradas por funcionários,
ou seja, os recursos humanos citados anteriormente. Por isso, a
primeira questão a ser levantada é exatamente esta: como liderar e
motivar este contingente a fim de que a estrutura enxuta que se
apresenta alcance os objetivos anteriormente planejados, com
correções e controles mínimos? Antes de tudo, que tal conhecer
melhor seus comandados?
Já que estamos falando em pequena
empresa, isto não deve ser tão difícil assim. Um esquema simples
poderá auxiliar o gerente neste moment o.
Abaixo serão citados tipos ideais de funcionários que poderiam ser
encontrados em vários segmentos de pequenas empresas no país, assim
como o tipo de controle sobre os quais deverá ser exercido. Note - se
que são tipos ideais, ou seja, ajudam a identificar características, e não
as definem de forma acabada.
• aprendizes: controle total, com supervisão rígida e descrição das
tarefas de forma determinada;
• frios: devem ser envolvidos no processo decisório, com a devida
atenção pessoal (necessitam saber que inspiram confiança,
necessitando freqüentemente de estímulos afetivos);
• potenciais: controle através de treinamento constante, instruções
claras e acompanhamento técnico muito próximo;
• empreendedores: necessitam de parceria, e não controle, pois
funcionam melhor através de desafios e autonomia.
Em um esquema didático, poderíamos organizar estes tipos ideais
da seguinte forma, observando os tipos de aspirações de cada um,
assim como seu nível de experiência:
Experientes
FRIOS
EMPREENDEDORES
Inexperientes
APRENDIZES
POTENCIAIS
aspirações
simples
aspirações
complexas
Qual é então, o desafio do gerente de uma micro ou pequena
empresa? Transformar todos os seus funcionários em empreendedores,
a fim de que criar o comprometimento no trabalho ou seja, nos nossos
velhos objetivos, traçados anteriormente, lembram?
O
comprometimento se dará através do envolvimento no processo
decisório, no qual o grupo é o veículo que levará necessariamente ao
alcance dos objetivos.
A título de conclusão...
Mas do que definições e conceitos, a idéia deste trabalho foi expor
questionamentos pertinentes acerca da gestão de micro e pequenas
empresas no nosso país.
Se dúvidas e reflexões sobre o assunto
brotaram em algum hipotético leitor dessas páginas, seu objetivo já foi
alcançado, com sucesso.
Bibliografia
CHIAVENATO, Idalberto. Teoria Geral da Administração. São Paulo,
Makron Books, 1993, 4ª edição, V. 1.
DONADIO, Mário. A arte de gerenciar pessoas na pequena empresa.
São Paulo, COMMIT, vídeo, 53 min.
GOMES, Luciana de Oliveira Miranda. A Formação Geral
de Pequena e Média Empresa . Apostila do curso
durante o III Congresso de Ciências Humanas, Letras
Universidades Federais de Minas Gerais.Juiz de Fora,
de 1997, mimeo.
do Gerente
ministrado
e Artes das
UFJF, maio
KAWSNICKA, Eunice Lacava. Teoria Geral da Administração - uma
síntese. São Paulo, Atlas, 1991, 2ª edição.
MAXIMIANO, Antonio Cesar Amaru. Teoria Geral da Administração
- da escola científica à competitividade da economia
globalizada . São Paulo, Atlas, 1997.
MOTTA, Paulo Roberto. Gestão Contemporânea - a ciência e arte de
ser dirigente. Rio de Janeiro, Record, 1991.
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