fls. 271
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA DE SÃO BERNARDO DO CAMPO
FORO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO
7ª VARA CÍVEL
RUA VINTE E TRÊS DE MAIO, 107, São Bernardo do Campo - SP CEP 09606-000
Horário de Atendimento ao Público: das 12h30min às19h00min
SENTENÇA
Processo Digital nº:
Classe - Assunto
Requerente:
Requerido:
10221XX-X8.2014.8.26.0564
Procedimento Ordinário - Rescisão do contrato e devolução do dinheiro
THELMA M. L.
ACS BETA EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA.
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Edson Nakamatu
Vistos.
THELMA M. L., qualificada nos autos, moveu a presente ação de
rescisão contratual em face de ACS BETA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS
LTDA., alegando que firmou com a ré contrato particular de promessa de compra e
venda de imóvel em 23 de junho de 2011, pelo valor de R$ 235.648,60. Ocorre que o
imóvel não foi entregue até setembro de 2014, conforme acordado, já considerado o prazo
de 180 dias. Além disso, foi-lhe exigido o pagamento de R$ 15.041,40 a título de
comissões de corretagem e SATI. Esclarece que em nenhum momento foi esclarecida
sobre a incidência de tais encargos. Acrescenta que o pacto foi feito diretamente com
a funcionária da empresa, “Jhayne”, alegando que a cobrança consistia em uma
exigência imposta pela ré. Contudo, não havia a necessidade de corretor, pagando a
integralmente, ou seja, R$ 81.050,35, bem como a rescisão contratual, ante a falta de
entrega do imóvel no prazo ajustado. Deu a causa o valor de R$ 235.648,60. Juntou
documentos.
Emenda a inicial (fls. 91).
Citada, a ré ofereceu contestação às fls. 107/125, sustentando, em
preliminar, ilegitimidade passiva no que diz respeito à pretensão de devolução de valores
pagos a título de comissão de corretagem e denunciação a lide a empresa Abyara Brokers
Intermediação Imobiliária. No mérito, alega que o atraso na entrega das chaves foi
insignificante, isto é, de apenas três dias, já que o “habite-se” foi expedido em
03/10/2014, além de contar com previsão contratual, em razão de problemas decorrentes
de construção, paralisação da obra por sindicato, e a saída repentina da Construtora
contratada, além de problemas com a fábrica vizinha, que alteraram o cronograma inicial,
o que caracteriza caso fortuito e força maior. Requereu a total improcedência da demanda,
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contragosto o que lhe foi imposta. Assim, requereu a devolução do valor pago
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subsidiariamente, que seja acolhida a denunciação da lide.
Juntou documentos (fls.
126/142).
Réplica às fls. 146/174.
Instadas a especificarem provas, a autora requereu o julgamento antecipado
da lide, enquanto a ré requereu a oitiva de testemunhas (fls. 268/269 e 270).
É o relatório.
Fundamento e decido.
Julgo a lide antecipadamente, nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de
Processo Civil, pois os fatos encontram-se devidamente comprovados nos autos, não havendo
necessidade de produção de outras provas.
Indefiro a denunciação da lide, porquanto estamos diante de uma nítida relação de
consumo entabulada entre as partes. Destarte, o art. 88 da Lei n° 8.078/90 veda a denunciação da
lide em casos como o presente, facultando-se à segurada posterior ação de regresso em processo
autônomo. Com efeito: “O instituto da denunciação da lide, por ser um complicador processual
por excelência, é incompatível com o objetivo traçado pelo CDC de fornecer proteção rápida e
eficaz a toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário
final, e a mais ninguém (JTJ 148/205)” (apud Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, in
'Código Civil Anotado e Legislação Extravagante', 2ª ed., RT, p. 981).
Rejeito, também, a preliminar de ilegitimidade passiva, uma vez que as suas
argumentações se confundem com o mérito, que será analisado a seguir.
A autora possuí motivos para exigir a resolução do contrato, pois a entrega do
imóvel excedeu o prazo previsto no contrato, o que não fora impugnado em contestação.
A ré, por sua vez, se limitou a mencionar que o atraso foi insignificante, de apenas
três dias, e que não houve culpa de sua parte, sustentando a excludente de caso fortuito ou força
maior, visto que ocorreram problemas devido à fundação da construção, a paralização da obra por
sindicatos e a saída repentina da Construtora contratada, além de problemas com a fábrica vizinha.
Observe-se que o ônus da prova era da requerida, pois estando a patente a relação
de consumo existente entre as partes, é o fornecedor que detém as informações relevantes sobre o
andamento da obra, ele cabendo demonstrar que o empreendimento ficará pronto dentro do prazo
estipulado.
A inversão do ônus da prova, nas ações de consumo, tem como fundamento o fato
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A ação é procedente.
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de o fornecedor ser o controlador dos meios de produção, com acesso e disposição sobre os
elementos de prova, o que geraria, para o consumidor, “dificuldade invencível” de realizar a prova
de suas alegações (João Batista de Almeida, Manual de Direito do Consumidor, 2ª edição, p. 77).
Contudo, ainda que houvesse prova nos autos acerca de tal circunstância, que
poderia até configurar caso fortuito ou força maior, entendo que estas não podem ser admitidas
como excludentes de responsabilidade à luz do Código de Defesa do Consumidor. É que os artigos
12, § 3º, incisos I, II e III, e 14, §3º, incisos I e II, do aludido diploma legal, não preveem em seu
rol taxativo as referidas hipóteses de exclusão. A ausência de previsão do caso fortuito e força
maior como excludentes no estatuto consumerista não foi proposital, eis que deve ter sido a
intenção do legislador impor ao fornecedor a obrigação de arcar com os riscos inerentes ao seu
negócio, não se admitindo a sua transferência ao consumidor, parte hipossuficiente na relação de
consumo.
Outrossim, a previsão do prazo de tolerância já deve abarcar causas externas que
podem acarretar o atraso na conclusão das obras, tais como fatores climáticos, dificuldades na
compra de materiais e outras ocorrências que corriqueiramente comprometem o andamento da
obra, entre outros motivos capazes de comprometer o cumprimento do prazo de entrega.
A ré não cumpriu as obrigações às quais se comprometeu e, portanto, obriga-se a
devolver integralmente os valores, inclusive a título de comissão de corretagem, sendo descabido
qualquer desconto.
Observo que o atraso não foi de meros três dias, conforme alega a ré. Isto porque
Aliás, o documento acostado às fls. 178 (edital de convocação) demonstra que ao menos até
25/11/2014, cerca de dois meses após a previsão de entrega da unidade, o condomínio sequer
estava instalado.
Assim, o descumprimento do prazo para entrega da obra é relevante e suficiente
para ensejar a devolução das parcelas pagas, na forma do art. 475 do Código Civil, reconduzindo
as partes ao estado que vigorava antes da celebração do contrato, pois os efeitos da resolução
operam-se “ex tunc”, daí ser indevido qualquer abatimento.
Nesse sentido:
“Compromisso de compra e venda Rescisão por inadimplemento da vendedora
Atraso na entrega das obras Ação julgada parcialmente procedente pela sentença, que declarou a
rescisão do contrato e condenou a ré a restituir a totalidade dos valores pagos Apelação dela
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não basta a expedição do “habite-se” para que seja considerada efetivada a entrega do imóvel.
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visando sua reforma Obras que realmente se atrasaram por culpa exclusiva do empreendedor,
que deixou de observar a legislação atinente ao meio ambiente e tivera a construção embargada
Rescisão de rigor, bem como a devolução da integralidade das parcelas pagas Inadmissibilidade
de locupletamento ilícito da cooperativa, que é a única parte inadimplente no negócio Correção
monetária que incide a partir de cada desembolso Perdas e danos devidas Sentença mantida
Recurso desprovido” (TJSP Apelação com Revisão nº 2508444500 1ª Câmara de Direito Privado
Relator Desembargador de Santi Ribero 24.08.07).
A autora não está questionando na presente demanda propriamente a ilegalidade
da cobrança dos valores quitados referentes à comissão de corretagem, mas tão somente pretende a
restituição da quantia total que desembolsou em virtude do descumprimento do contrato pela ré, a
qual deverá arcar com a devolução dos aludidos valores, pois deu causa à rescisão. Ainda que não
tenha sido ela a destinatária do pagamento efetuado a este título, não pode pretender empurrar para
o consumidor as consequências de seu inadimplemento.
Em outras palavras, não se busca propriamente a devolução das quantias pagas
intituladas comissão de corretagem, mas a restituição das partes ao “status quo ante”.
Deste modo, a autora faz jus à devolução dos valores.
Referida devolução, por seu lado, deverá ser efetivada de imediato (de uma única
vez), sendo abusivo o seu condicionamento a prazo e pagamento em parcelas, nos termos da
Súmula 2 do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a ação, para declarar a resolução
em virtude do contrato em questão, tanto os que foram desembolsados para a aquisição do imóvel,
quanto os que foram quitados a título de comissão e corretagem e SATI, totalizando a quantia de
R$ 96.091,75, os quais deverão ser corrigidos monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de
Justiça, a partir do desembolso, e acrescidos de juros moratórios legais de 1% ao mês desde a data
da citação.
Por conseguinte, JULGO EXTINTO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO, na forma do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno a ré ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários
advocatícios, que fixo em 10 % (dez por cento) do valor da condenação, com fundamento no art.
20, § 3º, do CPC.
P.R.I.C
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contratual por culpa da requerida e condená-la na devolução à autora, de todos os valores pagos
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DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006,
CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA
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