GOAL ATTAINMENT SCALLING – GAS – Uma forma de avaliação do trabalho
musicoterapêutico.
Magali Dias1
RESUMO
Na pratica musicoterapêutica temos evoluído e nos concentrado em criarmos e
validarmos protocolos de atendimento, intervenção, anamnese, relatórios, avaliações
neuromusicais, planos de alta, encaminhamentos, etc. Mesmo assim não temos um
protocolo de avaliação quantitativo que nos forneça dados numéricos que possam ser
apresentados, comparados e colocados em gráficos comparativos. A GAS (Escala de
Realização de Metas, em tradução livre) poderá nos ajudar a ter uma metodologia para
avaliação do atendimento, uma padronização de dados e um feedback mensurado a ser
oferecidos ao paciente, seus familiares e outros profissionais da equipe envolvida no
processo de tratamento do mesmo. Em março de 2012 ao participar de um workshop
em São Paulo, tomei conhecimento deste modelo de avaliação e iniciei em minha
pratica a utilização do mesmo. O artigo a seguir tem um resumo conceitual do que vem
a ser a GAS, como aplicar e qual o melhor meio de demonstrar esta análise. Os textos
seguidos foram sugeridos pela Dra Priscila Crove do Centro Paulista de
Neuropsicologia, Coordenadora do CPN REAB - Serviço de Reabilitação
Neuropsicológica de Adultos São Paulo.
PALAVRAS CHAVES: Escala de Reavaliação de Metas, GAS.
GAS, ou melhor, traduzindo: Escala de Objetivos alcançáveis é um meio de
mensuração efetivo do tratamento de pacientes em reabilitação neurológica
desenvolvida a partir de estudos realizados pelo Dr. Prof. Lynne Turner-Stockes, na
Inglaterra no King’s College London – University of London, publicado em 2009. Este
projeto foi iniciado tendo em vista a dificuldade de se mensurar efetivamente os ganhos
ou melhoras dos pacientes com lesões cerebrais devido a sua diversidade, tanto em tipo
quanto em grau e qualidade, sem contar com a heterogeneidade de pacientes envolvidos
(Tuner-Stockes, 2009).
A primeira vez que se aplicou a GAS foi em 1960 por Kirusek e Sherman com
pacientes saídos do coma nos ambulatórios de saúde mental. Depois se iniciou uma
1
Musicoterapeuta formada pela FAP em 2010, especialista em Abordagem Plurimodal em
Musicoterapia, Educação e Saúde (UNIFAE, 2009), Práticas Pedagógicas (UNICENP, 2005) e pós
graduando em Dependência Química pela UNICENP. Musicoterapeuta contratada da UNIICA – Unidade
Intermediária de Crise e Apoio à Vida em Curitiba desde 2011. Atual secretária geral da Ubam.
ampliação e modificação na GAS para utilização em outros campos como: dores
crônicas, reabilitação cognitiva, pós-amputação, tratamento de idosos, etc. Hoje já faz
parte da rotina clinica de diversas instituições e centros de tratamento por todo o mundo.
Com isto se estabeleceu um processo de comunicação e colaboração entre os membros
das equipes multidisciplinares e um maior envolvimento dos pacientes ao perceberem
sua melhora (Tuner-Stockes, 2009).
Os autores perceberam que quanto mais formalizados os processos de
reabilitação e mensuração dos ganhos estiverem, mais claros e definidos eram os
objetivos estipulados. Então qual é a definição de GAS:
“GAS é um método de avaliação de resultados, individuais, para entenderem-se quais as metas
ou objetivos são atingíveis durante o tratamento. Cada paciente tem seu resultado pessoal, mas estes são
avaliados como sendo analisáveis estatisticamente (Tuner-Strokes, 2009)2”.
COMO ESTABELECER METAS
Antes de entramos no estabelecimento de metas em si, gostaria de retomar um
conceito que as vezes nos foge ao conhecimento ou é erroneamente interpretado:
Reabilitação. Reabilitação “é um processo ativo mediante o qual as deficiências por
lesões ou enfermidades conseguem uma recuperação completa, no entanto, se esta
recuperação completa não for possível, reconhece o potencial alcançado, tanto no
campo físico como no mental e social, além de integrar o paciente a um ambiente mais
adequado (Wordl Helth Organization apud Pfeiffer e Alberti, 2010)”. Posta esta
definição precisamos agora saber quais as metas a serem estabelecidas, sendo que as
mesmas tem que ser centradas no pacientes; que as mesmas são determinadas através
das queixas pelo paciente levantadas, onde vamos chegar com estas metas, formulando
uma boa hipótese e níveis de execução alcançáveis. Resumindo as metas tem que seguir
o modelo SMART de execução, ou seja, as metas tem que ser :
S – specific – específicas
M – mensurable – mensuráveis
A – achievable – alcançáveis
2
Tradução da autora deste artigo do texto baixado no Mendeley Desktop em agosto de 2012 do autor
citado.
R – relevant – relevantes
T - time base – tempo determinado
Então temos que saber quem é o nosso paciente, como ele e o meio reagem a seu
problema ou doença, qual o papel da família e suas expectativas, ou seja: o que fazer e
como fazer.
QUADRO RESUMIDO DE PLANEJAMENTO DE METAS
Quem é nosso paciente e
qual seu problema no
cérebro?
Processo de pensamento –
memória, concentração ou
planejamento?
Processo de comunicação,
linguagem, linguagem
corporal, leitura, escrita ou
fala?
Habilidades físicas e/ou
equilíbrio?
Humor, ansiedade,
frustração, agressividade,
enfrentamento?
CIF – Classificação
Internacional de
FuncionalidadesTranstorno ou Doença
Funções e estruturas
do corpo
ATIVIDADES
FATORES AMBIENTAIS
“Não podemos mudar o CID3, mas melhorar a CIF.”
3
Classificação Internacional de Doenças.
PARTICIPAÇÃO
FATORES PESSOAIS
COMO PLANEJAR METAS
Passo 1 – Especificar: comportamento alvo a ser atingido; quantidade e
desempenho (tempo, distância, frequência); especificar tempo para alcançar a
meta.
Passo 2 – Ponderar as metas: pela importância de cada uma para o paciente,
nenhuma importância (0), pouca importância (um), moderada (2), muito
importante (3). Qual o grau de dificuldade analisando os critérios clínicos e a
opinião do paciente: sem dificuldade (0), pouca dificuldade (1), moderada (2),
muito difícil (3).
Passo 3 – Definição de níveis de mensuração da reabilitação. É importante a
principio estabelecr critérios de avaliação alcançáveis para cada individuo. Estes
são discutidos e elencados juntamente com o paciente e sua família, logo após o
inicio da intervenção; tendo em vista que estes devem ser realistas, alcançáveis e
serem objetivos ou metas pelos quais vale a pena trabalhar. Cada meta ou
objetivo é escalonado em cinco níveis de acordo com o grau de realização, ou
seja:
- se o paciente alcança o nível esperado, sua pontuação é zero (0);
- se o paciente atingiu um nível maior que o esperado, sua pontuação será de mais um (+1), para
melhor ou mais que o esperado e mais dois (+2) para muito melhor que o esperado;
- se o desempenho do paciente for menor do que o esperado sua pontuação será de menos um (1), caso seja muito pior que o esperado será de menos dois (-2) (Tuner-Stokes, 2009)
FÓRMULA DA GAS 4 = 50 + 10 ∑ (W I XI)
√[ 0,7∑W I² + 0,3 (∑WI)²]
ONDE:
WI= O PESO ATRIBUÍDO PARA CADA A META (SE O PESO FOR IGUAL , WI = 1)
XI = o valor numérico alcançado (entre 2 e +2)
4
Formula copiada do artigo Goal Attainment Scaling (GAS) in Reabilition – A pratical guide – Lynne
Turner-Strokes DM FRCP via web em agosto de 2012.
DIFICULDADES DE ESTABELECIMENTO DE METAS
Por que é tão difícil se estabelecer metas atingíveis? Os pacientes e os familiares
tem dificuldade em estabelecer o definir o que é realidade e o que é expectativa, pela
própria dificuldade de auto percepção e negação dos déficits gerados pela lesão.
Também se tem dificuldade de elaborar metas que estejam associadas ao processo de
reabilitação, estabelecendo datas fixas. Para tanto se devem modificar as metas sem
desconsiderar as possibilidades e esperanças dos pacientes e familiares. Temos que
avaliar as metas que mais prejudicam a autonomia, autoestima e participação social do
paciente, trabalhando para que este se sinta o mais a vontade possível em sociedade sem
ter o pensamento ‘estou atrapalhando, ou estou dando trabalho a todos’. Quando
trabalhamos com pacientes com déficits cognitivos esta dificuldade e maior ainda.
A fim de estabelecermos metas atingíveis é necessário o conhecimento da
Identidade do paciente. A Identidade se refere as múltiplas maneiras de como o
individuo percebe a si mesmo (valores, metas, habilidades, impulsos, atitudes e seus
papeias sociais), seu senso de continuidade de vida e do self. Para que isto ocorra é
necessária uma avaliação neuropsicologia fidedigna e um planejamento de reabilitação
onde se abarquem a psicoeducação, o treino cognitivo, as atividades diárias de vida
(ADVs)
orientados e trabalhados com as habilidades sociais com um terapeuta
treinado.
Uma das técnicas utilizadas para o reconhecimento da Identidade é a M.I.M
(Metaphoric Identity Mapping) – mapeamento metafórico da identidade; o qual
pretende auxiliar na reestruturação da identidade. Para tanto podem ser utilizadas várias
técnicas como: Técnica do Herói, metáforas e working memory, terapia dos valores,
teoria dos construtos pessoais, etc.
a)Exemplo técnica de Metáforas – metáforas são formas de compreensão
compartilhada.
Pica Pau, Princesa, Sherek
b)Exemplo Teoria dos Constructos – metodologia qualitativa que permite explicar os
significados individuais dentro do âmbito particular da experiência. Cada constructo
pessoal equipara-se a umacompetencia. Não é porque e quanto da minha memória eu
perdi, mas, como esta perda de memória afeta minha vida hoje. Comparar como eu era
versus como eu sou; como eu era versus como eu gostaria de ser e finalmente como eu
sou versus como eu gostaria de ser.
c) Exemplo da Técnica do herói:
1 – Pensar nos valores e papeis deste Herói;
2 – O que esta pessoa vê no mundo e transformar em metas.
Fatos
conhecidos
sobre o
Herói
Estratégias
para atingir
estas metas:
Como?
HERÓI:
Pessoa a
quem se
admira
Como você
se sentiria
sendo este
herói?
Como seria
ser este
Herói?
Quais as
metas do
herói?
Para finalizar daremos um exemplo desta técnica:
Paciente homem de 68 anos com sequelas AVC à 12 anos aposentado, hemiparesia
esquerda leve.
Queixas: “Quero voltar a trabalhar”, “Me sinto sozinho, sem motivação”, “Sou um
estorvo, não faço nada direito”.
Analisando as queixas e conversando com o paciente e a família, no caso esposa
e filho verificou-se que no fundo a única coisa que ele queria era ter um contato social
maior, igual ao que tinha quando trabalhava: conversava com muitas pessoas, passeava
sozinho, era alegre e comunicativo. O que impedia esta pessoa de estar no mundo como
antes?
Para ele a falta de domínio da mão esquerda e o andar mancando o faziam um
‘aleijado’. Trabalhamos esta parte através das técnicas de escuta e recriação musical,
pretendendo uma melhora da autoestima através da valorização do self e de suas
canções preferidas. Aceitação do paciente em utilizar uma bengala, pois esta lhe traria
charme e segurança. Com a parte psicológica estabilizada montou-se uma GAS onde os
principais objetivos seriam:
- autonomia ao caminhar
- socialização
- exercícios físicos
A meta estabelecida foi a de: o paciente sair de casa sozinho, caminhar com a
ajuda da bengala, fazendo o percurso até a praça perto da mesma, onde existe uma
academia ao ar livre. Esta etapa seria cumprida em quatro fases: 1- andar meio
quarteirão; 2- andar todo o quarteirão; 3- andar todo o quarteirão e atravessar a avenida;
4- andar todo o quarteirão atravessar a avenida e chegar até a praça. Em uma segunda
fase ele iniciaria os exercícios de fortalecimento de braços e pernas nos aparelhos da
academia ao ar livre em companhia do filho que estaria de férias. A socialização do
paciente viria através de encontros causais com vizinhos e frequentadores da praça.
Sendo ele uma pessoa muito carismática e comunicativa esta seria a parte mais fácil.
Pretendendo dar ao paciente mais segurança ao caminhar iniciamos um
treinamento de marcha através da RAS – Rhythmic Auditory Stimulation (estimulação
auditiva rítmica), Michael Thaut.
A fim de termos números comparativos fizemos a seguinte mensuração:
- numero de passos dados por minuto pelo paciente;
- velocidade empreendida neste trajeto (metros/minuto)
- largura dos passos dados.
Verificou-se que este paciente era fã de carnaval e samba, desta forma treinamos
marchinhas de carnaval lentas, samba bolero, e boleros dançando em pares. O pulso
determinado para tanto foi do lento para o natural. Em uma segunda fase as canções se
tornaram mais rápidas e alegres necessitando de um maior equilíbrio, balanceio dos
braços, diferentes larguras de passos e simetria ao dançar. A seguir introduzimos a
técnica STOP/GO alternando inclinações e escadas. Finalizamos com uma reavaliação
dos dados anteriormente coletados: numero de passos, velocidade e largura dos passos.
Ao compararmos foi possível verificar uma melhora acentuada na média
alcançada, o que deu ao paciente mais segurança em desenvolver as metas estabelecidas
e alcançar seu objetivo que era o de ter mais autonomia, socialização e saúde. Em anexo
a GAS estabelecida para visualização dos resultados. Após alta o paciente vem se
mostrando cada vez mais confiante e responsável pela sua homeostase, voltando apenas
para adequação medicamentosa e visita de cortesia aos terapeutas.
REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICAS
TUNER-STOKES, Lynne – Goal Attainment Scalling (GAS) in reabilitation: a practical
guide. Clinical rehabilitation, 23(4), 362-70, 2009- Site Mendeley acessado em agosto
de 2012.
ALBERTI, Maria Letícia e PFEIFFER, Camila – Curso de Especialização em
Musicoterapia e Neurorreabilitação on line, cursado em 2010, site
www.neuromusica.org.
CROVE, Priscila – Workshop ministrado em 24 de fevereiro de 2012 no Centro
Paulista de Neuropsicologia – material disponibilizado no curso.
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GOAL ATTAINMENT SCALLING – GAS – Uma forma de avaliação