PARECER CRM/MS N° 1/2015
PROCESSO CONSULTA CRM-MS 17/ 2014
INTERESSADO: Dr. R.R.C.
ASSUNTO: Solicitação de parecer sobre conflitos existentes nas
autorizações de materiais pela Auditoria Médica.
PARECERISTA: Cons. Rosana Leite de Melo
Ementa: As cooperativas médicas são operadoras de saúde onde
o prestador do serviço médico é um cooperado que além de estar sujeito às
normas éticas e disciplinares do CEM e da legislação pertinente, também
deverá ser respeitado em sua autonomia, bem como tem o direito de discutir
e deliberar junto à diretoria as melhores alternativas visando a excelência ao
tratamento cientificamente comprovado a seu paciente.
Palavras chave: auditoria médica, operadora de saúde, órtese e
prótese.
Da Consulta
O Dr. R. R. C. solicita parecer a este Conselho referente à situação de
conflito com a UNIMED. Informa que “tem recebido reiteradas vezes
solicitações de justificativas para materiais (implantes e equipamentos)” para
cirurgias de joelho. São relativas ao “uso de Parafusos de interferência
absorvível, ponteiras de radiofrequência e endobutton curto”.
Dessa forma faz os seguintes questionamentos:
1 - A solicitação de justificativas pela auditoria são sempre repetitivas e as
respostas que eu lhe encaminho são sempre as mesmas....É necessário
isso?
2 – A forma como essas negativas de autorização se baseiam em trabalhos
feitos pela própria UNIMED, onde os critérios “fogem” totalmente dos que uso
para justificar e são ignorados pela auditoria.
3 – Que já se reuniram com o Conselho Técnico sobre o uso da ponteira de
radiofrequência e que acordaram comunicar aos pacientes que a UNIMED
não paga a ponteira e foi orientado explicar aos pacientes e caso o paciente
quisesse o mesmo arcaria com a despesa, entretanto percebeu-se que o
acordo feito com o Conselho Técnico não foi compartilhado com a Auditoria
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- “parece que não se conversam ou o acordo foi rompido sem que eu ficasse
sabendo??”-. “Essa radiofrequência não poderia ser colocada a sua restrição
em contratos da UNIMED com usuários/ Empresa já que a ANS não
normatiza seu uso para essa cirurgia (e olha que a ANS não é nenhuma
detentora de informações científicas e sim uma agência reguladora para nos
basearmos em nossas decisões técnicas)???”
4 – Em função da “ameaça velada que recebi da Dra. Auditora na última
correspondência enviada, por que EU devo ser responsável para pagar um
material ( ponteira de radiofrequência) pedido previamente e autorizado o seu
uso por uma UNIMED de fora ( “Coirmã ) e que posteriormente essa coirmã
pode negar pagar a fatura a UNIMED CG baseando essa negativa num
acordo ( 42a. Ata..) entre Unimeds exclusivamente???”
5- “A resposta final (última) que enviei a Auditoria sobre as ponteira/ parafuso
e pp a ameaça estão no Doc 6, na íntegra”.
Fundamentação
A Auditoria Médica possui um alto grau de especificidade, imposta pelo
mercado, que a define como uma especialidade reconhecida pelas entidades
médicas (Conselho Federal de Medicina e a Associação Médica Brasileira)
sendo citada no Código de Ética Médica, com capítulos orientando,
controlando, ordenando e atribuindo direitos e deveres para o médico em
atividade na área de Auditoria Médico-Pericial.
Notório, portanto, que esta atividade profissional, a cada dia, vem ocupando
lugar de destaque no mercado de trabalho e na manutenção da viabilidade
financeira dos planos de saúde privados e, também, do próprio Sistema
Único de Saúde.
Destarte, a Auditoria Médica ao se constituir em uma atividade profissional
que analisa, controla e autoriza os procedimentos médicos para fins de
diagnose e condutas terapêuticas, propostas e/ou realizadas, deve respeitar
a autonomia profissional e preceitos éticos, que ditam as ações e relações
humanas e sociais.
Portanto, a equipe de Auditoria deve estar atenta a seus limites, claramente
definidos nos CEM e embasada em Normas Técnicas próprias e Pareceres
de Sociedades Científicas. O Auditor deve decidir sempre com respaldo
técnico e científico, honestidade e responsabilidade. Muitos autores
descrevem que “o Auditor ideal deve ser constituído de: 25% de discrição,
25% de ética, 25% de equilíbrio profissional e 25% de conhecimento e
totalizando 100% de bom senso”.
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A Resolução CFM 1.614/01 nos traz que: “auditoria do ato médico constituise em importante mecanismo de controle e avaliação dos recursos e
procedimentos adotados, visando sua resolubilidade e melhoria na qualidade
da prestação dos serviços”. Que “O médico, na função de auditor,
encontrando impropriedades ou irregularidades na prestação do serviço ao
paciente, deve comunicar o fato por escrito ao médico assistente, solicitando
os esclarecimentos necessários para fundamentar suas recomendações”.
O auditor não tem função de fiscal e sim de orientador, pacificador, agente de
mudança, de efetividade, de economicidade e eficiência.
A Auditoria de Serviço em Saúde tem como objetivo básico, conhecendo os
contratos estabelecidos entre as partes, a exigência do fiel cumprimento do
que foi acordado e assim citamos: “Fazer respeitar o estabelecido em
contrato entre as partes envolvidas, ou seja: Usuário X Plano de Saúde X
Prestadores de Serviços, ou seja, Usuário X Legislação e Garantir a
qualidade pelos serviços de saúde oferecidos e prestados”.
Ao nos referirmos ao mercado de planos e seguros privados de atenção à
saúde no Brasil, denominado Setor da Saúde Suplementar, reiteramos que
por quase quarenta anos o mesmo ficou sem regulação. A Agência Nacional
de Saúde Suplementar – ANS - foi criada pela Lei nº 9.961, de 28 de janeiro
de 2000, onde a regulação proporcionou avanços que permitiram que o
ambiente da saúde suplementar esteja melhor hoje do que no período préregulamentação.
Atualmente, existem critérios para a entrada no mercado e para o
funcionamento das operadoras de planos de saúde; acompanhamento
econômico-financeiro e maior conhecimento sobre o setor.
As modalidades de operadoras de planos não-odontológicos, conforme a
ANS são: Cooperativa médica – geralmente possui rede própria de
atendimento, além da rede credenciada contratada (UNIMED). Autogestão
– pode possuir rede própria de atendimento, além da rede credenciada
contratada (CASSEMS). Medicina de Grupo – geralmente tem rede própria,
além da rede credenciada contratada (São Francisco). Filantropia – são
classificadas nessa modalidade as entidades sem fins lucrativos que operam
planos privados de assistência à saúde e tenham obtido certificado de
entidade filantrópica. Seguradora – não conta com rede própria de
atendimento, apenas com rede referenciada contratada, a qual o segurado
pode usar ou não, já que tem a possibilidade de reembolso de despesas
(Bradesco).
Também foi criado o ROL da ANS, ou seja, ANS determina a cobertura
mínima obrigatória a ser oferecida pelos planos de saúde, definindo a
listagem de procedimentos e eventos em saúde. É uma lista de referência de
cobertura mínima obrigatória para cada segmentação de planos de saúde
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(ambulatorial, hospitalar com ou sem obstetrícia e plano referência),
contratados pelos consumidores a partir de 02 de janeiro de 1999. Assim, o
rol define para cada procedimento as segmentações de planos de saúde que
devem ou não cobri-lo. Salientamos que o Rol é atualizado a cada dois anos
por um grupo Técnico de Revisão do Rol composto pelas sociedades de
especialidades, representantes da ANS e sociedade.
O avanço do conhecimento científico, notadamente na medicina, tem ocorrido
de forma acelerada nos últimos anos refletindo diretamente na prática dos
profissionais da saúde desta nova era, em que as demandas da tecnologia
por recursos são cada vez maiores, e os mesmos são finitos (particularmente
no Brasil esses recursos são infinitamente menores do que nos Estados
Unidos, e a demanda tecnológica e político-social são semelhantes). Neste
sentido, a eficiência na gestão de tecnologias em saúde significa obter mais
ou melhores resultados a um menor custo. Um dos principais recursos
utilizado neste fim é a Medicina Baseada em Evidências a qual permite um
“elo entre a melhor ciência disponível e a melhor prática clínica possível.”
Através do conhecimento acumulado em determinada área utilizam-se níveis
de evidência para decidir-se pela melhor terapêutica e dirimir conflitos.
Considerando a Resolução CFM 1956/2010 que disciplina a prescrição de
materiais implantáveis, órteses e próteses e determina arbitragem de
especialista quando houver conflito, em seus considerando nos traz que que
é direito do médico indicar o procedimento adequado ao
paciente,
observadas as práticas reconhecidamente aceitas e respeitadas as normas
legais vigentes no país; que é dever do médico utilizar todos os meios
disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente;
que é imperiosa a garantia de acesso aos médicos e, por conseguinte, aos
pacientes, da evolução tecnológica comprovada cientificamente e liberada
para uso no país.
Lembramos que o Estatuto Social da UNIMED Campo Grande - MS em seu
parágrafo 2o. “que a Cooperativa, baseando-se na colaboração recíproca que
se obrigam seus cooperados, tem por objeto: I- a congregação de integrantes
da profissão médica para sua defesa econômico-social”. No artigo 16. “O
cooperado tem, entre outras, as seguintes obrigações: V- prestar à
Cooperativa quaisquer esclarecimentos sobre os serviços arregimentados por
esta e por ele executados, bem como sobre questões que tenha
conhecimento e que estejam ligadas às atividades da Cooperativa; XIassumir as despesas relativas às demandas administrativas e/ou judiciais
decorrentes de solicitações efetuadas em favor de beneficiários de planos de
assistência à saúde do sistema UNIMED que: a) seja de caráter experimental
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ou desaprovada pelo Conselho Federal de Medicina; b) não tenham sido
consensadas, autorizadas e/ou cadastradas pela Cooperativa”.
No Regimento Interno da UNIMED CG em seu art. 102 – que se refere às
Assessorias de Especialidades (Comitês de Especialidades), a serem criadas
sem vínculos empregatícios ou horários predeterminados, que serão
designadas pelo Conselho de Administração e pelas Sociedades de
Especialidades, “para opinar sobre os assuntos de cada especialidade
médica existente na Cooperativa. Competindo c) Solicitar reuniões ao
Conselho de Administração para solucionar problemas referentes ao
exercício da especialidade”.
Conclusão:
Diante do exposto passo a responder:
1- Sim se faz necessário, haja vista as normas contidas no Estatuto Social da
Unimed Campo Grande e nas resoluções do CFM. Uma forma de diminuir
tais contratempos seria a realização de consensos junto a UNIMED
(cooperativa) pela Sociedade de Ortopedia ou pelo Comitê de Especialidade
da cooperativa parametrizando o uso de tais materiais.
2- Conforme exposto, a Medicina Baseada em Evidências hoje mais
apropriadamente designada como Saúde Baseada e Evidências é um dos
mais frequentes instrumentos que auxiliam e determinam a eficiência na
gestão de tecnologias em saúde com o intuito de se obter mais ou melhores
resultados a um menor custo. São utilizados trabalhos científicos com níveis
de evidência e imparciais. Em relação à utilização dos materiais e técnicas
referidos (parafusos absorvíveis, radiofrequência) no que tange à avaliação
técnico-científica recomendamos que seja solicitado parecer técnico à
Câmara Técnica de Ortopedia do CFM, visto que a deste conselho é
composta por médicos deste estado, minimizando assim eventuais conflitos
de interesse, como bem lembrado pelo requisitante ao se referir aos
trabalhos fornecidos pela própria UNIMED. Reiteramos que o Rol da ANS
refere-se à cobertura mínima obrigatória, não há impedimentos legais que
após consensos entre os cooperados (Administradores e prestadores do
serviço) haja maior cobertura em determinadas áreas.
3 – O Conselho Técnico e a Auditoria Médica fazem parte da Cooperativa,
com prerrogativas distintas e por vezes complementares, em que o Conselho
Técnico, instância responsável por instruir e apresentar processos
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disciplinares no que diz respeito à apuração de conduta de cooperados ou
serviços contratados, para apreciação e deliberação do Conselho de
Administração. Neste sentido o Conselho de Administração é o responsável
por esta “conversa” com a Auditoria. Em relação à ANS reiteramos que por
ocasião da atualização bienal do ROL designa-se um Conselho Técnico de
revisão onde também participam as Sociedades de Especialidade que
possuem expertise técnica pertinente.
4 – Sim, conforme referido no Estatuto Social da Cooperativa o cooperado
deve assumir as despesas relativas quando: b) não tenham sido
consensadas, autorizadas e/ou cadastradas pela Cooperativa.
5 - Conforme o CEM, o médico deve ter para com seus colegas, respeito,
consideração. Caso verifique que algum destes preceitos seja infringido
deverá denunciar às Comissões de ética Médica ou ao CRM.
Campo Grande, 12 de dezembro de 2014.
Rosana Leite de Melo
Parecerista
Parecer aprovado na Sessão Plenária
Do dia 12.12.2014
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