XLIII CONGRESSO DA SOBER
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“Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial”
Barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes transgênicas
Kelly Lissandra Bruch
Mestranda em Agronegócios
Centro de Estudos e Pesquisa em Agronegócios – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
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Anelise Graciele Rambo
Mestranda em Geografia
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Jeanice Jung de Andrade
Professora Mestre
Departamento de Administração – Universidade da Região da Campanha
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Orlando Martinelli Júnior
Professor Doutor
Departamento de Economia da Universidade Federal de Santa Maria
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Homero Dewes
Professor Doutor
Centro de Estudos e Pesquisa em Agronegócios – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
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Grupo de Pesquisa: 11
Forma de apresentação: Apresentação com debatedor
Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005
Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural
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“Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial”
Barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes transgênicas
Resumo:
O trabalho analisa quais são as principais barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes
transgênicas. Para tanto se caracteriza este mercado no Brasil, trata-se da teoria das estruturas de
mercado, e faz-se uma breve revisão teórica sobre barreiras à entrada, finalizando com a
apresentação de uma tipologia própria para o mercado de sementes transgênicas. Verificou-se que
as principais barreiras à entrada no mercado analisado são: barreiras tecnológicas,
compreendendo nestas a apropriabilidade, a cumulatividade e a P&D; barreiras de escala, nas
quais se insere a escala de produção, publicitária e extensão do mercado; e barreiras
institucionais, nas quais se compreende os direitos de propriedade intelectual, subdivididos em
patentes e cultivares, a segurança dos alimentos e a biossegurança e a de escopo. Embora se trate
de um mercado incipiente no Brasil, pode-se vislumbrar que este tem uma estrutura que
caracteriza um mercado concentrado, com poucas e grandes empresas, com barreiras à entrada
significativas, possibilitando inclusive a criação de um mercado monopolístico, tanto pelas
barreiras institucionais, quando pelas barreiras tecnológicas e de escala.
PALAVRAS CHAVE: indústria de sementes, sementes transgênicas, agronegócio.
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“Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial”
Barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes transgênicas
1.INTRODUÇÃO
O presente trabalho se propõe a analisar quais são as principais barreiras à entrada no mercado
brasileiro de sementes transgênicas.
Nos anos 70, a biotecnologia moderna possibilitou a criação da engenharia genética, que permitiu
a construção de variedades vegetais que dificilmente seriam obtidas pelos métodos clássicos de
cruzamento, revolucionando os sistemas de melhoramento de plantas e de manejo de culturas. A
manipulação genética em nível celular tem sido direcionada para facilitar os processos de
produção industrial. Os denominados organismos geneticamente modificados (OGMs) são o
resultado de uma construção genética com a inserção ou retirada de pequenos fragmentos de
DNA em organismos vivos, provenientes estes de organismos da mesma ou de outra espécie,
gênero ou reino.
A partir de 1996, as plantas geneticamente modificadas foram introduzidas nas diversas cadeias
do agronegócio, provocando mudanças nas estruturas vigentes e nas trajetórias corporativas dos
negócios. Os OGMs destinados à agricultura foram desenvolvidos focalizando três características
básicas: resistência aos danos causados pelos insetos, resistência às infecções virais e tolerância a
certos herbicidas. A expansão da biotecnologia e as possibilidades comerciais dos resultados
obtidos, fizeram crescer os esforços para manter em sigilo os projetos em andamento, visando os
direitos de patente, fato gerador de um crescente investimento de empresas privadas em
biotecnologia.
Em virtude de manifestações de desconfiança de setores da sociedade e dos putativos potencias
riscos que podem estar ligados à utilização de técnicas de modificação gênica para a produção de
alimentos, foram editadas normas que regulassem a avaliação de risco à saúde do consumidor,
riscos ambientais, bem como o controle e a comercialização dos produtos resultantes da
utilização dos OGMs, estabelecendo regras para rastreabilidade e rotulagem, dentre outras.
No âmbito internacional o Acordo sobre Aspectos Relacionados com Propriedade Intelectual e
Comércio (TRIPs, em inglês), firmado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC),
trouxe novas discussões para este campo, principalmente com a imposição da proteção, mediante
patente, de microorganismos geneticamente modificados, possibilitando o estabelecimento de
monopólios sobre estes organismos.
Para tratar deste tema, sob o ponto-de-vista do seu impacto no campo dos agronegócios, busca-se
aqui caracterizar o mercado de sementes transgênicas no Brasil, trazendo os elementos que
influenciam direta e indiretamente o seu funcionamento. Após, faz-se uma breve revisão teórica
sobre barreiras à entrada, buscando uma tipologia própria para o mercado de sementes
transgênicas. Por fim, trata-se especificamente das barreiras à entrada no mercado de sementes
transgênicas: barreiras tecnológicas, barreiras de escala, barreiras institucionais e barreiras de
escopo.
A finalidade deste trabalho é verificar, preliminarmente, que fatores são preponderantes no
mercado de sementes transgênicas e quais destes podem ser considerados como barreiras à
entrada neste mercado.
2. MERCADO DE SEMENTES: A SEGMENTAÇÃO PELA TECNOLOGIA
A partir da perspectiva tecnológica pode-se considerar que a indústria de sementes brasileira é
composta de dois mercados: híbridos e variedades. Essa segmentação ocorre devido às variáveis
relacionadas aos aspectos produtivo e tecnológico, como reprodutibilidade e, especialmente,
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apropriação dos esforços da inovação. O grau de apropriabilidade que fica incorporado na
semente - que é o veículo de difusão da inovação - é o que justifica a segmentação do mercado.
O mercado de sementes híbridas apresenta um mecanismo natural de apropriação da tecnologia
utilizada para sua criação que é a proteção biológica. Ou seja, a semente híbrida, em virtude da
forma como é obtida – mediante o cruzamento de espécies próximas – impossibilita a utilização
desta semente por mais de um ciclo produtivo sem grande perda de suas qualidades genéticas.
Para Santini (2002), citado por Martinelli e Moura (2004), este é um segmento oligopolizado,
com presença predominante de empresas multinacionais. As empresas deste setor trabalham com
estratégias de diferenciação de preço e liderança na formação de preço.
Ao contrário dos híbridos, as sementes de variedades apresentam uma auto-reprodutibilidade sem
perda das qualidades genéticas originais. Esta característica dificulta a apropriação dos resultados
da pesquisa de forma natural. Para Martinelli e Moura (2004) trata-se de um mercado mais
concorrencial, destacando-se a competição por preços.
O segmento de variedades, por sua vez, apresenta uma subdivisão: sementes genéticas e sementes
transgênicas. A semente genética é obtida pelo processo de melhoramento de plantas sem o
cruzamento ou utilização de genes de outras espécies para promover a obtenção da semente
(MARTINELLI e MOURA, 2004). A semente transgênica provém da manipulação gênica,
envolvendo a modificação direta do DNA de forma a alterar precisamente características
existentes ou introduzir novas características em um organismo vivo (MARTINELLI e MOURA,
2004). Esta manipulação pode se dar tanto com genes da mesma espécie, quanto com genes de
espécies, gêneros e até mesmo reinos diferentes, que resultam nos organismos transgênicos. A
semente transgênica pode ser dividida em três subespécies, conforme a finalidade para a qual é
criada e o tipo de inovação empregada. Segundo Santini (2002), citado por Martinelli e Moura
(2004), elas podem ser agrupadas da seguinte maneira:
“a) as que introduzem características desejáveis à própria indústria de sementes, por
meio do uso de marcadores moleculares e de técnicas de reprodução rápida de material
genético e que, com isto, permitem diversificar ainda mais a agricultura;
b) as inovações de interesse direto das grandes empresas da química fina, como as
variedades de soja tolerantes a herbicidas de uso genérico ou que incorporem genes de
resistência a pragas (usando genes de bactérias produtoras de bioinseticidas);
c) as inovações que alteram a qualidade do produto agrícola, principalmente pelo
enriquecimento protéico (aumento do teor de aminoácidos essenciais) e que demanda
da indústria de alimentos uma adequação aos padrões alimentares e hábitos alimentícios
da população.”
A semente transgênica mais conhecida hoje no Brasil é a semente do tipo do grupo b, resistente
especificamente ao herbicida glifosato, originalmente lançado com o nome comercial Roundap,
que é a semente de soja Roundap Ready da empresa Monsanto LLC.
Além desta divisão decorrente do tipo de inovação da semente, há ainda outra segmentação do
setor sementeiro: a) pesquisa em melhoramento genético e produção de semente básica e b)
produção de semente comercial e certificação. O entendimento desta divisão é importante, posto
que, em muitas situações, as empresas acabam atuando em apenas um determinado segmento do
setor sementeiro, surgindo a necessidade de acordos para promover a integração vertical entre as
diferentes empresas, garantindo a produção de boas sementes e a sua permanência no mercado.
A primeira etapa, consistente na pesquisa em melhoramento genético, objetiva a manipulação
genética com a finalidade de mudar e melhorar determinadas características da futura planta. A
realização deste processo dura de três a cinco anos, sendo realizadas no Brasil tanto pelo setor
público quando pelo setor privado. Esta manipulação pode resultar em sementes genéticas ou
sementes transgênicas. Os resultados da P&D destas sementes geram as sementes básicas
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(MARTINELLI e MOURA, 2004).
Obtida a semente básica, entra-se para o processo de multiplicação da semente, o qual permite
que esta possa ser comercializada. Esta etapa varia de um a três anos, dependendo da
disponibilidade de área para realizar a multiplicação, bem como dos testes que devem ser
realizados nas sementes e do tipo de cultura envolvida. Este processo geralmente é realizado por
empresas diversas daquelas que produziram as sementes básicas. Este repasse se dá mediante
contratos de licença para multiplicação das sementes. Além da multiplicação, as sementes
também passam por um processo de certificação, que pode ser realizado por empresas públicas
ou privadas, credenciadas nos órgãos competentes e que têm a finalidade de atestar a qualidade e
a sanidade da semente mediante testes de laboratório e campo (MARTINELLI e MOURA, 2004).
Em regra, as empresas que atuam no Brasil com desenvolvimento de sementes básicas, testadas e
multiplicadas, registram estas, com a finalidade de proteção de suas criações, no Serviço
Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC), órgão do Ministério da Agricultura, Agropecuária e
Abastecimento (MAPA). Este registro, criado pela Lei 9.456 de 25 de abril de 1997 e
regulamentado pelo Decreto 2.366 de 05 de novembro de 1997, tem por finalidade garantir ao
melhorista o direito de exclusividade da multiplicação da semente que representa uma nova
variedade, desde que esta seja distinta, estável e homogênea. O melhorista pode licenciar a
terceiros a multiplicação da semente e tem o direito de impedir que o terceiro não autorizado
pratique esta multiplicação, com as seguintes exceções previstas no artigo 10 da Lei 9.456/1997.
Segundo este dispositivo, não fere o direito de propriedade sobre a cultivar protegida aquele que:
1) reserva e planta sementes para uso próprio, em seu estabelecimento; 2) usa ou vende como
alimento ou matéria-prima o produto obtido do seu plantio, exceto para fins reprodutivos; 3)
utiliza a cultivar como fonte de variação no melhoramento genético ou na pesquisa científica e 4)
aquele que, sendo pequeno produtor rural, multiplica sementes para doação ou troca
exclusivamente com outros pequenos produtores rurais.
É este direito de exclusividade que garante ao melhorista o monopólio temporário sobre a
semente criada. Segundo a Lei de Cultivares brasileira, esta exclusividade tem duração de 15
anos, exceto para videiras, árvores frutíferas, árvores florestais e árvores ornamentais, cujo prazo
é de 18 anos. Assim, durante 15 anos, a partir do depósito do pedido de registro da cultivar, o
melhorista terá a exclusividade de promover a multiplicação da nova cultivar.
Caracterizado o mercado que se pretende estudar, passa-se às barreiras à entrada, encontradas na
estrutura do referido mercado.
Segundo Martinelli e Moura (2004), os fatores mais importantes para a competitividade neste
setor “são a capacitação e o desenvolvimento tecnológico básicos em melhoramento genético e
em biotecnologia”. Neste sentido, ele aponta como sendo as principais barreiras à entrada neste
mercado:
a) “a capacitação tecnológica das empresas”
b) “a capacidade de geração de economia de escopo (potencial e/ou real), em função
das diversas possibilidades dos diferentes agentes na obtenção de sementes básicas
(novas variedades), resultantes do processo de busca e de adaptabilidade, que podem,
conjuntamente, ser reproduzidas e utilizadas comercialmente.”
Outro fator importante neste setor é a garantia da apropriabilidade das tecnologias envolvidas na
produção da semente, bem como dos produtos complementares a estas, tais como os
agroquímicos. Por fim, atividades complementares, tais como redes de multiplicadores de
sementes básicas, estrutura de marketing (especialmente a distribuição de sementes) e amplitude
geográfica da assistência técnico-agronônica, completam as competências que empresas do setor
devem ter para garantir a sua competitividade no mercado e sustentar barreiras à entrada de novos
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concorrentes (MARTINELLI e MOURA, 2004).
3. BARREIRAS À ENTRADA NO MERCADO DE SEMENTES TRANSGÊNICAS
A partir de uma perspectiva neoschumpeteriana, pode-se conceber que a expansão da empresa
está atrelada à geração e à apropriação de um lucro extraordinário, cuja fonte é uma forma
particular de monopólio, em especial de natureza tecnológica. A geração e a apropriação desse
lucro são, contudo, condicionadas pela inserção da empresa na estrutura de mercado que,
enquanto locus mediador do processo concorrencial, reflete tanto as decisões autônomas e
incertas das unidades de capital, como os aspectos mais particulares da indústria e da demanda.
Desse modo, além de configurar um padrão concorrencial para uma determinada indústria, a
estrutura de mercado expressa também o nível das barreiras à entrada nela existentes e, por
derivação, permite conceituar o oligopólio como uma “classe” de estrutura de mercado em que
estão presentes barreiras à entrada. Estas, manifestam-se pelas formas de diferenciação de
produtos, por vantagens de custos absolutos, pela geração de economias de escala e escopo, por
benefícios institucionais, pela ocupação preventiva de espaços comerciais estratégicos, dentre
outros tipos.
As economias de escala se refletem como barreira à entrada quando o tamanho mínimo “eficiente
de uma firma for grande em relação ao tamanho do mercado e se houver muita desvantagem de
custo em operar abaixo do tamanho ótimo” (GEORGE E JOLL, p. 167, 1981), ou mesmo
quando, segundo Possas (p. 102, 1985) “é decisivo antecipar o efeito que a entrada acarretará
sobre o volume de produção do mercado, e em conseqüência sobre os preços e a lucratividade da
firma em geral”. Neste caso, não basta ter a capacidade de operar com a escala mínima se a
presença no mercado dessa quantidade de produtos faz com que o preço caia abaixo do valor que
garanta um lucro mínimo. Esta escala não trata apenas da produção do produto final, mas da
compra de insumos, distribuição, promoção de vendas e acesso ao mercado.
O estabelecimento de uma vantagem de custo absoluto significa fazer com que os custos unitários
da empresa estabelecida sejam mais baixos em todos os níveis de produção (GEORGE E JOLL,
1981). Esta vantagem pode ser obtida mediante técnicas superiores de produção que sejam
protegidas por patente, segredo industrial ou mesmo conhecimento tácito, tipos de qualificação
do trabalho, insumos, equipamentos, capacidade empresarial, preços favorecidos, crédito mais
barato ou acessível (POSSAS, 1985).
A diferenciação do produto se constitui em uma barreira à entrada na medida em que o entrante
não tenha escala tecnológica para acompanhar as constantes inovações, nem escala de produção
para realizar estas diferenciações no ritmo exigido pelo mercado, ou ainda, não tenha capacidade
financeira de divulgar, mediante publicidade, as constantes alterações que são feitas no produto.
Para George e Joll (1981) esta diferenciação pode estar calcada principalmente na economia de
escala na publicidade. Para Possas (1985) esta se manifesta mediante marcas, desenhos
industriais, sistemas de distribuição protegidos e permanente inovação de produtos mediante
P&D.
O caráter institucional pode se constituir como barreira à entrada de diversas formas. O sistema
de patentes, por exemplo, pode ser um tipo de barreira à entrada num mercado, posto que a
depender se sua estrutura legal, pode não garantir de maneira segura a exclusividade da inovação
que se pretende utilizar em determinado produto e/ou processo. George e Joll (1981) citam ainda
a possibilidade de o governo conceder a uma empresa o direito exclusivo de fabricar ou fornecer
um determinado bem ou serviço, mediante, por exemplo, licitações.
A existência prévia de uma integração vertical ou de acordos horizontais pode se constituir uma
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barreira à entrada quando não houver outra alternativa para aquisição de insumos, distribuição ou
acesso ao mercado consumidor.
Assim, desde que seja possível uma caracterização básica das suas dimensões (tecnológica,
produtiva, comercial, financeira), poder-se-iam tipificar as manifestações em maior ou menor
grau das barreiras à entrada, segundo alguns procedimentos empíricos e metodológicos, em
função das diversas dimensões competitivas das empresas em diferentes estruturas de mercados.
Em seguida faz-se uma breve sistematização das principais barreiras à entrada no mercado
brasileiro de sementes transgênicas.
3.1 BARREIRAS TECNOLÓGICAS
Por barreiras tecnológicas se compreende a necessidade de uso intensivo de tecnologias e
inovações, geralmente apropriadas mediante patentes ou cultivares, associadas à cumulatividade
de conhecimentos tácitos, rotinas e técnicas que uma empresa do setor possui em função de sua
atuação neste mercado.
3.1.1 APROPRIABILIDADE DO CONHECIMENTO
Quando se fala de apropriabilidade, esta deve ser entendia no seu sentido amplo, ou seja, tanto a
apropriação da tecnologia mediante proteção desta por patentes, cultivares, desenhos industriais,
quanto pela manutenção em segredo de uma determinada inovação. Também dentro da
apropriabilidade se compreende a idéia de aprendizagem, processo fundamental para
compreender e fazer uso da tecnologia. Esta aprendizagem se traduz no conhecimento tácito e no
estabelecimento de rotinas dentro de uma empresa.
Segundo Possas (p. 86, 1999) “o conceito de apropriabilidade tecnológica diz respeito ao fato de
que em geral a introdução de avanços deve traduzir-se na apropriação de ganhos extraordinários,
cuja ocorrência é absolutamente fundamental para que ocorra a inovação.” Pois, só é possível
gerar uma remuneração extraordinária com a posse de um ativo não facilmente transmissível ou
reprodutível e com a garantia de que terceiros não tenham acesso à tecnologia, seja pela
existência de direitos de propriedade intelectual, seja pela impossibilidade de acessar às
informações.
Segundo George e Joll (1983) a tecnologia protegida por patentes é uma barreira à entrada, pois
eleva o custo das firmas que objetivam ingressar neste mercado, mediante pesquisa inovativa ou
pagamento de royalties. A tecnologia patenteada se traduz em uma vantagem absoluta de custo
“que as firmas já estabelecidas têm sobre entrantes potenciais, o que faz com que seus custos
unitários sejam mais baixos em todos os níveis de produção” (GEORGE E JOLL, p. 167, 1983).
A existência de proteção mediante patentes e cultivares coloca-se como um incentivo à inovação,
não apenas em razão dos rendimentos oriundos de sua comercialização, mas devido à segurança
da propriedade do conhecimento de forma a permitir o avanço das pesquisas. No entanto,
patentear uma inovação ou registrar uma cultivar não é algo acessível a qualquer firma, havendo
aí um entrave potencial. Este se encontra, em primeiro lugar, na característica das patentes como
direitos territoriais. Por exemplo, a titularidade de uma patente no Brasil não impede que este
invento seja legalmente copiado e reproduzido na Argentina. Se o titular da patente quiser ter
seus interesses protegidos, deve depositar o pedido em todos os países que sejam potenciais
produtores, distribuidores ou consumidores do produto ou processo patenteado. A satisfação
desta necessidade envolve altos custos financeiros, nem sempre acessíveis a pequenas e médias
empresas.
Outro problema no caso específico de proteção de produtos biotecnológicos é a necessidade de
depósito de amostra do novo microorganismo protegido. Este deve se dar em uma Autoridade
Depositária internacionalmente reconhecida, que é uma organização com capacidade científica
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para preservar os microorganismos conforme disposto no Budapest Treaty on the International
Recognition of the Deposit of Microorganisms for the Purposes of Patent Procedure (1977). 1
Contudo, não há no Brasil nenhuma instituição credenciada e desta maneira o brasileiro
requerente do pedido de patente terá a despesa adicional de enviar a uma destas autoridades, com
todos os custos inerentes a isso, o material genético que for o cerne de sua patente de invenção.
Desta maneira, adentrar no mercado de sementes requer ter a possibilidade de produzir e de se
apropriar dos novos conhecimentos gerados.
3.1.2 CUMULATIVIDADE DO CONHECIMENTO
Outro fator que pode se constituir em uma barreira tecnológica à entrada é a cumulatividade do
conhecimento. As empresas que já se encontram no setor possuem um histórico de aprendizagem
que uma entrante certamente terá dificuldades de absorver imediatamente, ou mesmo em um
curto espaço de tempo. Segundo Arrow (1962), citado por Britto (2001) o aprendizado é um
processo cumulativo por meio do qual as firmas ampliam seus estoques de conhecimento,
aperfeiçoam seus procedimentos de busca e refinam suas habilidades em desenvolver ou
manufaturar produtos. Por conseqüência, segundo Britto (2001), o processo de aprendizado
tecnológico amplia estoque de conhecimentos retidos pela firma e conseqüentemente gera
expansão dos lucros empresariais.
Para Possas (p. 90, 1999) “a cumulatividade diz respeito ao fato de o progresso técnico em geral
não se dar de modo aleatório, mas seguir uma trajetória tecnológica, cujas etapas sucessivas
podem ser até certo ponto identificadas antecipadamente.” Ou seja, conhecer uma tecnologia é
fundamental para se ter condições de analisar os desafios que esta apresenta.
Desta maneira, há maior facilidade de uma mobilidade de empresas que atuem na mesma
indústria, mas em mercados próximos, do que uma nova empresa adentrar neste setor. Por
exemplo, uma empresa que atue no mercado de biotecnologia de medicamentos certamente terá
acumulado um aprendizado que possibilitará que esta se insira no mercado de biotecnologia
agrícola. Contudo, quem está longe deste conhecimento necessitará, por vezes, estabelecer
acordos com empresas já atuantes para entrar neste mercado e conseguir manter-se nele.
3.1.3 PESQUISA E DESENVOLVIMENTO, P&D
Para poder apropriar-se e acumular o conhecimento, deve-se produzi-lo. A obtenção de novas
tecnologias requer pesquisa e desenvolvimento, o que significa investimentos em ciência básica e
aplicada, laboratórios e profissionais competentes e criativos. Certamente esta é uma das maiores
barreiras à entrada no mercado de sementes transgênicas, por significar além de economias de
escala, um alto investimento financeiro e a capacidade idiossincrática de criar algo novo em uma
ciência tão nova quanto a biotecnologia.
Neste sentido a diferenciação constante dos produtos é uma barreira à entrada. Os produtos da
indústria de sementes transgênicas teriam, entre outros, seu diferencial na redução do custo de
1
Esta Instituição deve possuir pessoal qualificado e instalações adequadas para realizar a estocagem do
material e manter a viabilidade do material, que ficará estocado por 30 anos, ou por cinco anos após a última
requisição de fornecimento do material biológico (por terceiros que queiram ter acesso a este material), o que for
mais longo, mesmo que a patente tenha sido concedida ou o pedido de patente tenha sido abandonado. Em 31 de
janeiro de 1997, havia 30 autoridades distribuídas nos seguintes países: Reino Unido (sete), Rússia (três), Coréia do
Sul (três), China (duas), Itália (duas), Estados Unidos (duas), Austrália (uma), Bélgica (uma), Bulgária (uma),
República Tcheca (uma), França (uma), Alemanha (uma), Hungria (uma), Japão (uma), Holanda (uma), República
Eslovaca (uma), e Espanha (uma). Não há necessidade de efetuar-se um depósito do microorganismo em cada país
onde o pedido de patente é depositado. Um único depósito é válido para todos os países signatários do Tratado de
Budapeste, concluído em 1977 e modificado em 1980 (CHAMAS, 2004).
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produção, no aumento da rentabilidade e da produtividade, na diminuição do uso de agrotóxicos e
na agregação de propriedades especiais aos alimentos, tais como cor e maior valor nutritivo.
Segundo divulgado pela Monsanto (2004), em uma pesquisa realizada pela economista Maria
Benetti, da Fundação de Economia e Estatística (FEE), constatou-se que nas lavouras de soja
convencional o lucro líquido é de 39% sobre o valor bruto da produção e nas lavouras de soja
transgênica o lucro líquido é de 51%. Segundo este estudo, o ganho provém de uma queda de
17% nos custos da produção, mesmo considerando-se o custo de 25% a mais, pago a título de
royalties para a empresa detentora da tecnologia.
De modo geral, as atividades de P&D requerem grandes investimentos, o que se coloca como
uma barreira à entrada de novas empresas em setores que se balizam pela busca de inovações,
principalmente quando estas forem pequenas e médias - PMEs. Essa constatação leva à
compreensão de que a inovação trazida com a biotecnologia poderia favorecer poucas empresas
de grande porte, geralmente multinacionais, ofertantes desta tecnologia, levando a uma estrutura
de mercado concentrado. Isso teria sérias conseqüências para o setor agrícola, o qual a priori
assimilaria uma situação de passividade frente ao preço dos insumos. Segundo Portugal (2000),
como as sementes transgênicas incorporam um maior volume de conhecimento, elas exigem
maiores volumes de recursos (recursos humanos, financeiros e laboratoriais) para P&D. Sendo
estas condições pouco viáveis para PMEs que compõem a industria nacional brasileira de
sementes, sua sobrevivência seria dificultada à medida que grandes empresas multinacionais,
investindo no Brasil, passassem a incorporar praticamente todas as empresas nacionais que
faziam melhoramento genético, como é o caso da aquisição da Sementes Agroceres Ltda., da
Cargill e da Braskalb, pela Monsanto do Brasil Ltda., que levou a uma grande concentração no
mercado de sementes de milho. Essa concentração pode ser verificada na Figura 1 que, embora
trate do mercado de sementes como um todo, mostra algumas empresas do setor com uma parcela
significativa do mercado, levando a uma estrutura de mercado concentrado e criando
permanentes barreiras à entrada.
PARTICIPAÇÃO DE MERCADO DE EMPRESAS PRODUTORAS DE SEMENTES DE MILHO NO BRASIL
Mercado de sementes de milho no Brasil após 1997
2%
60%
3%
5%
Monsanto
Du Pont / Pioneer
Novartis
Unimilho
Dow/Mycogen
Zeneca
AgrEvo
5%
11%
14%
Figura 1 - Fonte: Wilkinson & Castelli, (2000) – citado por Moura (2003)
A distribuição do mercado mostrada na Figura 1 reporta a Steindl (p. 62-63, 1983) quando afirma
que :
[...] se existem firmas que, devido a economias de escala, ou, falando de maneira geral,
devido à adoção de qualquer inovação técnica que reduza os custos, possuem maiores
margens de lucro líquido do que as firmas marginais, estas firmas muitas vezes
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apresentarão uma tendência natural a expandir-se, em relação as outras firmas (...) As
firmas de custo mais elevado ou com menor flexibilidade financeira, aspectos que em
geral são mais encontrados entre pequenas firmas, não serão capazes de suportar a
tensão, sendo forçadas a abandonar o mercado.
Essas constatações demonstram, portanto, uma relação entre a estrutura de mercado que acaba
interferindo significativamente nos processos de inovação tecnológica no caso das sementes
transgênicas.
As barreiras à entrada tecnológicas referentes à apropriabilidade, cumulatividade e P&D estão
intrinsecamente ligadas, consolidando-se mutuamente como importantes barreiras. Contudo, sem
a existência destas barreiras e de seus reflexos, como as patentes, o próprio mercado poderia não
existir. Por exemplo, embora as patentes coloquem-se como uma barreira à entrada, podendo ser
uma via em direção a uma estrutura de mercado concentrada, elas acabam sendo necessárias na
área de biotecnologia porque representam forte incentivo à inovação e ao desenvolvimento da
pesquisa tecnológica. Sem a salvaguarda oferecida pela proteção legal, as indústrias e outros
inventores não se habilitariam a investir tempo e dinheiro em P&D, especialmente em função dos
altos custos e riscos da pesquisa em biotecnologia. O raciocínio é que pela prevenção da
competição durante a vigência da patente, o dono poderá extrair o máximo retorno pelo uso da
invenção. Para isso, a companhia deverá revelar os detalhes do trabalho. Dessa forma, em retorno
ao pagamento do monopólio de preços, o público recebe o conhecimento contido na invenção,
com o qual outros pesquisadores podem desenvolver novos produtos (Penteado, 2002).
Segundo Zylbersztajn, Lazzarini e Machado (1999), o processo de P&D em biotecnologia
envolve pesados investimentos que, por serem tipicamente irrecuperáveis, acabam determinando
elevados custos de saída de empresas que se aventurem a investir em biotecnologia. O resultado
é, justamente, uma estrutura de mercado mais concentrada. Mas segundo os autores, isto não
implica que, necessariamente, deva ocorrer uma conduta monopolística dos agentes, mesmo
porque várias multinacionais vêm realizando investimentos nesta área, concorrendo por mercados
similares.
Assim, percebe-se que as barreiras tecnológicas exercem grande influência na definição das
estruturas de mercado. Contudo, sem estas mesmas barreiras, este mercado poderia não ter sido
criado, por não haver uma forma de garantir lucros extraordinários aos primeiros inovadores. É a
garantia de lucro extraordinário que possibilita o investimento e, por conseguinte, o surgimento
de inovações que movimentam e mantêm a dinâmica capitalista preconizada por Schumpeter
(1982).
3.2 BARREIRAS DE ECONOMIA DE ESCALA
O alto custo de atividades em P&D exige economias de escala, o que acaba tornando-se uma
barreira à entrada de novas empresas na indústria de sementes transgênicas. O mercado de
sementes transgênicas é praticamente dominado por empresas de alcance global, que detêm
patentes sobre os genes modificados.
3.2.1 ESCALA DE PRODUÇÃO
A escala de produção pode ser uma barreira à entrada, quando a produção mínima requerida para
a geração de lucros exige uma planta industrial de um certo tamanho mínimo. Para se produzir
uma nova variedade de plantas, é necessário um banco de germoplasma 2 . Possuir este banco e
2
Bancos Ativos de Germoplasma (BAG) possuem a finalidade de preservar, multiplicar e caracterizar acessos para
que possam ser usados em atividades de pesquisa, principalmente em melhoramento genético. A principal
característica desse tipo de coleção é a sua dinâmica, pois, os acessos entram e saem de seu inventário de acordo com
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todos os materiais necessários para sua conservação e pesquisa certamente é uma barreira à
entrada por exigirem uma escala mínima que não é passível de obtenção por qualquer entrante. A
empresa Monsanto, por exemplo, quando entrou em 1997 no mercado brasileiro de produção de
sementes de milho, primeiramente adquiriu a Agroceres, e posteriormente a Cargill e a Braskalb,
com a finalidade de se apropriar dos bancos de germoplasmas de plantas brasileiras que estas
empresas possuíam. Sem este insumo, haveria a necessidade de todo um estudo e coleta de
material a partir do zero. A aquisição realizada pela Monsanto, aprovada pelo Conselho
Administrativo de Defesa Econômica - CADE, permitiu que este caminho lhe fosse encurtado e
uma importante barreira à entrada fosse ultrapassada (MJ, 2005).
Outra barreira de escala se refere à multiplicação das novas sementes básicas obtidas através da
pesquisa, com o fim de sua comercialização. Não basta ter o banco de germoplasma, nem o
laboratório para o desenvolvimento, se não houver meios facilitados de multiplicação destas
sementes em escala comercial. Neste caso, muitas empresas de P&D optam por parcerias, por
meio das quais o uso da nova semente básica desenvolvida é licenciado a outra empresa, a qual
tem possibilidade de multiplicá-la mediante os termos de um contrato. Esse tipo de parceria,
segundo Teece (1998), se constitui em uma integração vertical entre empresas, organizações e
instituições, mediante contratos, a qual permite maiores saltos na apropriação e na difusão de
tecnologias, podendo ser uma alternativa às empresas que possuem dificuldades de investimentos
próprios em P&D. Para Teece (1998), fatores como elaboração de contrato, preço a ser pago pela
pesquisa, interação entre as partes, vazamento de informações e não acumulação do aprendizado
são problemas que poderiam ser evitados com a internalização da P&D. Contudo, em mercados
tão complexos como da biotecnologia, muitas vezes os acordos, alianças, redes e joint-ventures
são as únicas possibilidades de se entrar e se manter no mercado.
3.2.2 ESCALA PUBLICITÁRIA
Outro tipo de economia de escala é a publicitária. Os investimentos em publicidade podem ser
entendidos como elemento da estratégia de expansão da firma no mercado, bem como uma
barreira à entrada a novas empresas. Segundo George e Joll (p. 167, 1983), pode-se afirmar que
há economias de escalas na publicidade, pois o aumento do montante de recursos necessários aos
entrantes potenciais, imposto pelas firmas que já se encontram no mercado, leva a uma redução
da rentabilidades que as novas empresas podem esperar de seus investimentos.
Como os gastos em publicidade e marketing por natureza são relativamente elevados e havendo
uma estrutura oligopolística que despende grandes gastos em publicidade, esta coloca-se como
uma barreira à entrada, relativamente difícil de ser transposta por firmas entrantes, ou pelas
firmas marginais num determinado mercado. Essa é uma realidade perceptível no caso da
produção de sementes transgênicas, por que o produtor rural que as adquire o faz pela confiança
que tem na marca da empresa. E esta, além da confiança que desenvolve ao longo de sua
trajetória, também é marcadamente influenciada pela publicidade que faz.
As escalas mínimas de investimentos em publicidade se situam em geral num alto patamar. No
caso de sementes transgênicas o quadro brasileiro tem sido agravado pela resistência que se criou
à plantação e comercialização de sementes com esta tecnologia.
3.3 – BARREIRAS INSTITUCIONAIS
As barreiras institucionais são todas as normas formais que dificultam ou impedem a entrada de
novas empresas no mercado de sementes transgênicas. Estas se dividem em barreiras que
a demanda por parte dos programas de pesquisa; sempre corresponde a um subconjunto da coleção de base.
(BATISTA, 2005)
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garantam a apropriabilidade das inovações, determinando monopólios legais, e barreiras que
normalizam os requisitos mínimos para a produção e comercialização dos produtos. No primeiro
grupo encontram-se os direitos de propriedade intelectual. No segundo grupo, as normas de
segurança dos alimentos e a biossegurança, que determinam o controle e fiscalização para que
certos produtos possam ser comercializados.
Segundo Chamas et al. (2004)
A mera existência de uma patente não garante a chegada de um produto ou processo ao
mercado. Não somente desafios de ordem técnica e produtiva se impõem, como
também outros de ordem legal – leis para aprovação de medicamentos, alimentos etc.
Como afirma Greis et al. (1995), em um estudo sobre as barreiras à inovação em firmas
norte-americanas, as barreiras mais elevadas à comercialização de um produto
encontram-se, em primeiro lugar, na esfera do Food and Drug Administration (FDA) –
órgão responsável pelo controle de medicamentos e alimentos nos EUA – e na esfera do
USPTO (Escritório de Patentes dos EUA).
Os produtos que afetam a saúde humana, tais como os alimentos, devem passar por testes que
garantam a segurança do consumidor. O problema é determinar o limite do rigor dos testes e os
parâmetros que garantam um produto seguro, considerando-se a multitude de variáveis a serem
consideradas experimentalmente. Diante da dificuldade prática de se determinar
experimentalmente os limites biológicos toleráveis de um certo produto, em regra os valores
oficiais resultam de uma ponderação entre dados experimentais e limites derivados de
ponderações e pressões de natureza filosófica, política, social e econômica. Se a falta de controle
pode causar sérios danos à vida do consumidor, o excesso de zelo pode impedir que este tenha
acesso a produtos mais baratos e qualitativamente melhores pelo simples fato de se tratar de algo
novo ou algo que suscite alguma reação de grupos sociais ou grupos de interesse (ref).
3.3.1 – PROPRIEDADE INTELECTUAL
Na consideração do mercado de sementes transgênicas, no âmbito da propriedade intelectual,
dois institutos devem ser analisados: as patentes biotecnológicas e a proteção de cultivares.
Após a assinatura do Ato 1991 da União para a Proteção de Obtenção de Vegetais (UPOV),
possibilitou-se aos países signatários a dupla proteção das novas cultivares provenientes da
engenharia genética. Ou seja, estas podem ser protegidas mediante patentes de invenção e por um
sistema sui generis, que no Brasil é conhecido como registro de cultivares. Esta possibilidade
também encontra respaldo no TRIPs, que determina aos países signatários a proteção da
propriedade de microorganismos geneticamente modificados mediante patentes, e a proteção de
cultivares, mediante patentes ou um sistema sui generis.
Até o ano de 1995 não havia proteção para invenções biotecnológicas no Brasil. Sob influência
do TRIPs, foi promulgado no Brasil, a partir de 1996, o seguinte conjunto de leis que visam
estabelecer a proteção da propriedade intelectual:1) lei n. 9.297 de 14 de maio de 1996, que se
refere à propriedade industrial, nela incluindo-se as patentes de invenção, modelos de utilidade,
desenho industrial, marcas e indicações geográficas, além da repressão à concorrência desleal; 2)
lei n. 9.609 de 19 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a propriedade intelectual de programa
de computador; 3) lei n. 9.610 também de 19 de fevereiro de 1998, que trata dos direitos autorais
e 4) lei n. 9.456 de 25 de abril de 1997, que disciplina a proteção de cultivares. Foi a pressão
resultante da promulgação do TRIPs e exercida por países desenvolvidos como os Estados
Unidos da América, que trouxe ao Brasil este arcabouço legal (LOUREIRO, p. 33, 1999).
3.3.1.1 – PATENTES DE INVENÇÃO
Dispõe o art. 8º da Lei 9.279/1996 que apenas é patenteável a invenção que seja nova, apresente
atividade inventiva e possua aplicação industrial. A novidade é um conceito negativo: para ser
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novo o invento não deve ter se tornado público, não pode estar compreendido no estado da
técnica e não deve ter precedentes. Por exemplo, “uma patente que reivindica um fragmento de
DNA, trata somente do fragmento isolado – e aí pode residir a novidade, e não do fragmento tal
como disposto na natureza” (CHAMAS et al., 2004).
A atividade inventiva é o que não decorre de maneira evidente ou óbvia do estado da técnica,
quando aferida por um técnico no assunto. Segundo Chamas et al. (2004), há um tratamento
diferenciado na análise da atividade inventiva de patentes de seqüências de DNA entre o
Escritório Europeu de Patentes (EPO) e o Escritório de Patentes dos EUA (USPTO), sendo o
segundo menos rigoroso na análise do requisito. Esta diferença de critérios pode ser um problema
para as patentes biotecnológicas por que, se for concedida uma proteção muito ampla, pode-se
dificultar e até impossibilitar novas pesquisas e inovações sobre a mesma seqüência genética.
Por aplicação industrial entende-se a possibilidade de utilização ou produção de uma invenção
em algum tipo de indústria. “A tendência no campo biotecnológico é exigir que se associe uma
função clara à seqüência de DNA – um caráter mais operativo; meras associações não são
aceitas” (CHAMAS et al., 2004).
Em regra, o material biológico encontrado na natureza deve ser associado a uma função para ser
considerado invenção. O gene de uma bactéria, patenteado pela empresa Monsanto LLC, por
exemplo, foi isolado da natureza e inserido na semente de soja, com a função de torná-la
resistente à exposição do herbicida glifosato.
Além dos requisitos básicos apresentados, segundo Chamas et al. (2004) devem ser respeitadas
algumas especificidades para patentes de invenções biotecnológicas: (a) o depósito de
microorganismos que complementa o pedido de patente, (b) as exceções contidas na legislação,
(c) a determinação do que constitui contrafação para estas patentes e (d) os efeitos da “exceção
para uso experimental” das patentes.
A patente também deve descrever de forma clara e suficiente a invenção, de maneira que possa
ser reproduzida por um técnico no assunto, pois este é um dos principais fundamentos do sistema
de patentes: revelar à sociedade o conteúdo da invenção, em troca da proteção da propriedade da
invenção, com a possibilidade de excluir terceiros de sua exploração. Para Carvalho (1983) há
três funções que justificam a existência de patentes: incentivo à pesquisa e retorno financeiro;
divulgação da invenção; transformação do conhecimento tecnológico em um bem
economicamente relevante.
Se a patente biotecnológica é uma barreira à entrada neste mercado, ela também possibilita a
divulgação da pesquisa na descrição da patente, que dá às outras empresas a possibilidade de
conhecer a tecnologia utilizada e buscar alternativas ou complementaridades a esta. No caso da
semente transgênica, o que é protegido pela patente de invenção é uma seqüência genética e sua
finalidade. Não há possibilidade de se patentear a semente, pois no Brasil é proibida a patente de
plantas no todo ou em parte. Esta patente garante um monopólio legal3 do mercado, portanto uma
barreira à entrada, para a utilização daquela seqüência genética com aquela finalidade específica.
Isso não impede que outra empresa utilize aquela seqüência com outra finalidade, nem que se
descubra outra seqüência genética que possa atingir finalidade semelhante à patenteada. Por
exemplo, ao invés de ser resistente ao agroquímico glifosato, pode ser patenteada uma seqüência
genética que torne a semente de soja resistente a outro herbicida, a fungos, ou que possibilite à
planta a maior concentração de uma determinada proteína.
3
O direito de propriedade sobre a patente perdura por 20 anos a contar do depósito do pedido de patente ou por 15
anos a contar da expedição do certificado do registro de patente de invenção, o que ocorrer por último.
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Embora se forme este monopólio legal, é ele que garante às empresas o retorno do investimento
que estas fizeram em P&D. Sem este incentivo estas inovações seguiriam um ritmo muito menor
ou não aconteceriam.
3.3.1.2 – REGISTRO DE CULTIVARES
Outra forma de proteção das sementes provenientes de melhoramentos genéticos é a proteção
mediante o registro de cultivares. Este é regulamentado pela Lei n. 9.456 de 25 de abril de 1997.
Esta se propõe a proteger uma nova obtenção vegetal, definida por Loureiro (p. 39, 1999) como:
a variedade vegetal que seja claramente distinguível de outras variedades vegetais por
um conjunto mínimo de características morfológicas, fisiológicas, bioquímicas ou
moleculares, herdadas geneticamente. Tais características, chamadas de descritores,
devem se mostrar homogêneas e estáveis através das gerações sucessivas.
Esta proteção recai sobre o material de reprodução ou multiplicação vegetativa da planta inteira.
Segundo Loureiro (p. 41, 1999) “a pessoa física ou jurídica que obtiver o certificado de proteção
do cultivar terá o direito exclusivo à reprodução comercial no território brasileiro”.
Esta proteção, como regra, tem a duração de 15 anos e não abrange a planta como um todo, mas
apenas o material de reprodução ou multiplicação vegetativa (LOUREIRO, 1999).
No Brasil, por exemplo, existiam 184 cultivares de soja registradas no Serviço Nacional de
Proteção de Cultivares (SNPC) em 2001. Em 2005 este número passou para 279, sendo que as
empresas mais representativas mantiveram razoavelmente a porcentagem de participação,
conforme mostrado na Figura 2. A EMBRAPA, associada a suas parceiras, passou de 67 para 94
cultivares, tendo um percentual de participação de 37% em 2001, passando para 34% em 2005. A
Monsanto LLC passou de 55 para 81 cultivares protegidos, com participação de 30% em 2001 e
29% em 2005. Surgiram também novas empresas públicas e privadas, com um percentual
significativo de registros, tais como a Universidade Federal de Viçosa e a Naturalle
Agromercantil que, não tendo participação em 2001, contam com 4% e 6%, respectivamente, das
cultivares de soja registradas em 2005.
Este é o quadro do total de cultivares registradas no Ministério de Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA) (2005). Certamente grande parcela deste número se refere a novas
cultivares transgênicas. A Figura 2 ilustra que a criação de novos cultivares também é possível a
novas empresas, posto que várias entrantes se estabeleceram como titulares de novos cultivares
de soja entre 2001 e 2005, com significativo percentual. O eventual reflexo deste fato no mercado
de sementes deve ser devidamente analisado, pois nem todas as cultivares depositadas são
efetivamente comercializadas.
Esta proteção constitui uma barreira à entrada no mercado, pois para que a empresa produza e
comercialize sementes, ela deve obter licença para multiplicação das sementes já registradas ou
criar novas variedades, o que exige um grande investimento em P& D, conforme explanado
anteriormente.
Assim, muitas vezes a melhor maneira de entrar neste mercado de sementes é através de parcerias
por meio da: 1) multiplicação de cultivares de uma empresa que dispõe apenas de aparato
tecnológico para a produção de sementes básicas e 2) aquisição e fusão com outras empresas já
atuantes neste mercado.
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Número de cultivares de Soja protegidas no Brasil
100
90
80
70
60
50
Ano de 2001
Ano de 2005
40
30
20
10
0
embrapa Monsanto Coodetec Naturalle
+
parceiros
FMT
Pioneer
UFV
Milenia
Coopadap
Bayer
Outros
Figura 2 - Cultivares de soja registradas no MAPA em 2001 e 2005, baseado em CARVALHO (2003) e MAPA (2005).
3.3.2 – SEGURANÇA DOS ALIMENTOS E BIOSSEGURANÇA
Tipificar a segurança dos alimentos como uma barreira à entrada no mercado de sementes
transgênicas freqüentemente provoca reações dos grupos de interesse, resistentes à introdução de
culturas agrícolas transgênicas no Brasil. A existência de tal controle é útil e necessário para a
segurança dos compradores destas sementes e dos consumidores finais. Mas o excesso de zelo,
sem fundamentação, pode levar à destruição de um mercado.
Para falar de certificação de alimentos deve-se ter claro por que a legislação prevê disposições
específicas atinentes a esta matéria. A principal delas é a proteção do consumidor, garantindo a
ele um alimento com baixo risco e adequadamente preparado.
Também se deve ter clara a diferença entre os termos: segurança alimentar e segurança dos
alimentos. A primeira “diz respeito à possibilidade de a família ter acesso seguro à quantidade
necessária de alimentos para garantir uma dieta adequada a todos os seus membros” (ABAG, p.
26, 1993). Trata-se de um enfoque quantitativo e “refere-se ao abastecimento adequado de uma
determinada população” (SPERS, p. 284, 2000). No inglês a terminologia é food security. Já a
segurança dos alimentos trata da segurança e da inocuidade dos alimentos a serem consumidos,
ou seja “a garantia de que o alimento é aceitável para o consumo humano de acordo com seu uso
esperado” (RASZL, p. 27, 2001). Trata-se de um enfoque qualitativo, que no inglês tem a
terminologia de food safety, e “significa a confiança do consumidor em receber um alimento que
não lhe cause riscos à saúde” (SPERS, p. 285, 2000).
A instituição internacional que trata e disciplina a questão de segurança dos alimentos é a
Comissão do Codex Alimentarius. Criado em 1962 em uma Conferência da FAO (....) e OMS
(....) sobre Normas Alimentares, tem como objetivo a proteção da saúde do consumidor,
contribuindo ao comércio internacional de alimentos. Suas atividades envolvem assessoria
técnica de aplicação de políticas referentes a alimentos, elaboração de códigos de procedimento,
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diretrizes, recomendações e normas alimentares, com o fim de estabelecer os “limites máximos
de resíduos de pesticidas, resíduos de medicamentos veterinários, composição essencial e fatores
de qualidade, irradiação, medidas sanitárias e fitossanitárias, rotulagem, etc.” que podem estar
contidos nos alimentos (BAENA, 2002).
Sendo o Brasil membro signatário do Codex Alimentarius ele deve seguir, mediante
internalização em seu ordenamento, as recomendações deste Codex. Não por haver sanção pelo
descumprimento, mas por que as recomendações do Codex Alimentarius são padrões
internacionais em termos de segurança dos alimentos. Portanto, para que o Brasil possa exportar
sua produção, ele deve minimamente estabelecer normas que busquem o cumprimento desses
padrões.
Dentre outras disposições apresentadas pelo Codex Alimentarios, encontramos a questão da
biossegurança que, além de tratar da segurança dos alimentos em si, trata da segurança da vida do
ser humano, dos animais e vegetais. Deve-se compreender que a segurança dos alimentos não
depende apenas de inspeção ou fiscalização, mas de um sistema de controle preventivo, que
abrange o acompanhamento de todo o processo de produção dos alimentos, durante toda a cadeia
produtiva. A biossegurança se propõe a disciplinar este controle preventivo dos OGMs, mediante
a exigência de estudos e pesquisas preliminares para aprovar-se a liberação comercial dos
produtos resultantes destes.
No Brasil ainda encontra-se em vigor, desde 24 de março de 2005, a Lei nº 11.105, conhecida
como nova Lei de Biossegurança. Esta lei, que regulamenta os incisos II, IV e V do § 1º do art.
225 da Constituição Federal, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de
Biossegurança – PNB e estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a
criação, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a
exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio
ambiente e o descarte de OGMs e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço
científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e
vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.
Para pesquisar com OGMs, segundo a Lei 11.105/2005, é necessário um parecer técnico
favorável da CTNBio que autorize a atividade, sendo que a sua decisão técnica vincula aos
demais órgãos e entidades da administração. Para comercializar OGMs e derivados, além do
parecer favorável da CTNBio, pode ser necessário um parecer do CNBS, no caso de recurso desta
decisão favorável. Cabe aos órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento, emitir as autorizações e registros, bem como fiscalizar
produtos e atividades que utilizem OGMs e seus derivados destinados a uso animal, na
agricultura, pecuária, agroindústria e áreas afins, respeitado o parecer da CTNBio. Nas atividades
que envolvam OGMs que serão liberados em ecossistemas naturais, cabe ao Ministério do Meio
Ambiente emitir as autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades, bem como o
licenciamento, nos casos em que a CTNBio deliberar que o OGM é potencialmente causador de
significativa degradação ao meio ambiente.
Um dos primeiros OGMs que recebeu um parecer conclusivo de caráter técnico favorável para
comercialização da CTNBio, foi, em 1998, a soja geneticamente modificada tolerante ao
herbicida glifosato, de propriedade da Monsanto do Brasil Ltda, conforme Comunicado n. 54,
publicado no Diário Oficial da União n. 188, de 01.01.98, na seção 3, página 56. Contudo este
parecer foi suspenso por uma decisão judicial que, por entender que a empresa detentora da
cultivar não havia realizado o Estudo de Impacto Ambiental – EIA-RIMA para este OGM,
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deveria ser suspensa a sua comercialização até a promulgação da nova Lei de Biossegurança.
Contudo, desde 24 de março de 2005, estão autorizadas a produção e a comercialização de
sementes de cultivares de soja geneticamente modificadas tolerantes a glifosato registradas no
Registro Nacional de Cultivares - RNC do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento,
bem como o plantio de grãos de soja geneticamente modificada tolerante a glifosato, reservados
pelos produtores rurais para uso próprio, na safra 2004/2005, podendo esta autorização ser
renovada para outras safras, sendo vedada a comercialização da produção como semente. Estas
autorizações mudam o cenário desta cultura e permitem que empresas, por exemplo a Monsanto
LLC, que já tem autorização para produzir e comercializar sementes de soja, o disponibilizem no
mercado.
Em termos práticos isso significa que até 2005 não existia no Brasil um mercado reconhecido de
sementes transgênicas. Mesmo existindo patentes e cultivares registradas que garantiam sua
propriedade, por mais que houvesse P&D e que as empresas estivessem aptas a produzir em
escala comercial as sementes, havia uma barreira legal intransponível para este mercado. Com
esta liberação, produzida pela edição da Lei 11.105/2005, cai a barreira intransponível da
proibição e surgem novas barreiras, tais como a submissão ao parecer da CTNBio e
eventualmente à decisão do CNBS e a autorização e registro no MAPA e no Ministério do Meio
Ambiente dos produtos a serem comercializados. Estes processos de liberação podem levar
meses, dificultam e podendo levar à desistência da entrada neste mercado. Contudo, como já foi
afirmado, são trâmites necessários para garantir a segurança dos alimentos e do consumidor.
3.4 ESCOPO
As economias de escopo se constituem em outro fator que pode ser considerado como uma
barreira a novos entrantes no mercado. Segundo Possas (p. 71, 1999), utilizando a terminologia
de Penrose (1959), entende-se por economias de escopo a produção de um conjunto de bens
“com uma mesma base tecnológica ou incluídos numa mesma área de mercado.” Na
biotecnologia, muitas empresas multinacionais organizam seus departamentos de P&D em escala
global, gerando assim economias de escopo na aplicabilidadade dos resultados científicos, uma
vez que podem utilizar seus laboratórios para desenvolver um conjunto heterogêneo de novos
produtos derivados de processos biológicos, tais como sementes para novas linhagens de plantas,
microorganismos com novos atributos genéticos, novos reagentes e novas drogas, e atuarem em
diversos mercados. Esta possibilidade, que certamente diminui os custos de P&D e dificulta a
entrada de novas empresas que não tenham esta capacidade no âmbito da organizacional da P&D
e na comercialização de novos produtos e/ou processos.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tratou-se no presente trabalho das barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes
transgênicas. Caracterizando este mercado, revisando a literatura sobre estruturas de mercado e
mais detidamente barreiras à entrada, buscou-se um arcabouço teórico que desse suporte a uma
tipologia para estas barreiras.
Esta tipologia compreende quatro grupos de barreiras à entrada: tecnológicas, de escala e
institucionais. No primeiro estão localizadas as seguintes barreiras: apropriabilidade, tais como
patentes e segredos de fábrica; cumulatividade, ligada diretamente ao aprendizado, conhecimento
tácito, rotinas; e P&D. No segundo grupo encontram as barreiras de: escala de produção; escopo;
e publicidade. No terceiro grupo, encontram-se caracterizadas as barreiras de: propriedade
intelectual, compreendidas nesta as patentes e as cultivares; de segurança dos alimentos e
biossegurança. No último grupo de barreiras estão aquelas originadas pela forma de
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organizacional da P&D em escala internacional das grandes empresas e da geração de sinergias
tecnológicas e comerciais dos novos produtos e/ou processos.
A Figura 5 ilustra os principais tipos de barreiras à entrada:
Barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes transgênicas
Barreiras Gerais
Barreiras específicas
Barreiras tecnológicas
- apropriabilidade
- cumulatividade
- P&D
Barreiras de escala
- escala de produção
- escala publicitária
Barreiras institucionais
- propriedade intelectual
- patentes
- cultivares
- segurança dos alimentos e biossegurança
Barreiras de escopo
- forma de organização da P&D e da aplicabilidade
de novos produtos/processos
Figura 3 - Barreiras à entrada no mercado brasileiro de sementes transgênicas.
Embora se trate de um mercado incipiente no Brasil, ele está se desenvolvendo de modo
concentrado, com poucas e grandes empresas, com barreiras à entrada cada vez mais complexas e
de difícil transposição para as empresas menores, especialmente as de capital nacional.
Vislumbra-se inclusive a criação de um mercado monopolístico, tanto pelas barreiras
institucionais, quando pelas barreiras tecnológicas e de escala. Fato este preocupante –e
merecedor de novos e mais aprofundados estudos- frente a importância crescente que a
capacitação tecnológica nacional tem no processo de desenvolvimento dos paises. Desse modo,
não é ocioso destacar que, no plano das políticas públicas, é necessário reforçar os papéis da
pesquisa pública, pois ela pode ser estratégica na formulação de arranjos tecnológicos na
indústria de sementes que diminuam as barreiras à entrada dos grandes grupos multinacionais,
permitindo à sociedade brasileira maiores opções em áreas científicas e econômicas.
5 REFERÊNCIAS
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ABAG, 1993. p. 162.
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