Dr Rodrigo Terra Ministério Público do Rio de Janeiro O Código de Defesa do Consumidor, contrariando as expectativas que rondaram a sua promulgação há dezesseis anos, é considerado hoje uma lei que ‘pegou’. A razão desse fenômeno social em um país como o Brasil, em que pululam leis que a coletividade ignora (rectius, não cumpre), guarda relação com a estratégia legislativa incorporada pelo Código. Primeiro, estendeu o seu espectro de incidência a todas as esferas de responsabilização do fornecedor que violasse os seus deveres, prevendo infrações administrativas, civis e penais. A título de ilustração, a venda casada poderá impor ao fornecedor que a protagonizar tanto penalidade administrativa (multa, interdição etc.), como civil (reparação do dano) e penal (privação de liberdade). Outrossim, para dar vida à concepção teórica que adotou quanto à proteção do consumidor, o Código concebeu esquema de implementação de suas regras que tem permitido que, sob todos os enfoques, a violação respectiva desafie a atuação específica de determinado órgão público. Assim é que vieram à luz os Juizados Especiais Cíveis (sem custas nem honorários), as Delegacias de Defesa do Consumidor, as Promotorias de Justiça especializadas na defesa do consumidor coletivamente considerado e os Procons. A criação de referidos canais institucionais para encaminhar a prevenção e reparação do dano compõe, juntamente com as associações de defesa do consumidor e os órgãos públicos não especificamente destinados a promover a defesa do consumidor a rede de proteção através da qual todos os seus segmentos atuam com função própria, mas visando a objetivo comum. O juiz do TJSP Marcus Vinicius Rios Gonçalves define a estratégia legislativa referida como ‘sistema de proteção em que há atuação integrada de diversos órgãos, com atribuições próprias delimitadas’. A complexidade do mercado de consumo, de que hoje todos são dependentes por necessariamente ostentar a qualidade de consumidor (sobretudo após a conclusão do processo de privatização dos serviços públicos essenciais como energia elétrica), também foi o objeto da preocupação do Legislador Ordinário que concebeu e aprovou o Estatuto Consumerista. O contrato de adesão e a mensagem publicitária são exemplos da vulnerabilidade do consumidor, que o Código reconhece expressamente e declara pretender minimizar. Quanto ao primeiro, regula a prestação do serviço sem que as cláusulas respectivas pudessem ter sido negociadas pelas partes. A autonomia da vontade que sempre destacara a teoria liberal do contrato não pôde mais prevalecer na sociedade de produção em escala e consumo em massa, substituindo­se pelo poder negocial das partes contratantes. Mas é a oferta em geral e a mensagem publicitária em particular que merecem mais atenção para o objetivo desta intervenção. A segurança de produtos e serviços foi erigida a critério de avaliação de adequação dos mesmos. Em razão do desconhecimento técnico e da falta de acesso aos meios de prova respectivos, o consumidor passa a ter dificultada a sua defesa em juízo, pois, ainda que suspeite da correção da informação prestada pelo fornecedor quanto à qualidade e desempenho do produto ou do serviço, não tem como prová­lo.
Por isso, a própria lei previu expressamente a inversão do ônus da prova (ope legis) quando o consumidor alegar defeito do produto ou do serviço, independente do direito básico do mesmo à inversão, decretada por decisão judicial (ope judicis). Em suma, alegado defeito do produto ou do serviço, incumbirá ao fornecedor comprovar que o defeito não existe, utilizando­se, para isso, de inspeções técnicas especializadas – testes. Caso determinada mensagem publicitária propale que um sabão em pó é o que lava mais branco, vindo a ser questionada judicialmente a veracidade da informação, a prova de que o defeito não existe caberá ao produtor do sabão, que deverá apresentar em juízo os testes que fundamentaram a publicidade do seu produto. Entretanto, tão importante quanto o teste é a metodologia do teste. Para contestá­la, todavia, é necessário dispor dos meios técnicos capazes de compreendê­la e, sobretudo, fazer a contraprova demonstrando que o resultado poderia ter sido outro em caso de a metodologia daquele for errada ou inconsistente. Daí a importância da existência da PRO­TESTE, enquanto associação primordialmente voltada para a realização de exames de desempenho e qualidade dos produtos e serviços oferecidos ao mercado de consumo. Para o MP em particular, dada a falta de estrutura específica para ultimar exames daquela natureza, a possibilidade de interagir com a PRO­TESTE contribui para o encaminhamento de soluções em inquéritos civis públicos, dando vida ao ideal legislativo de funcionamento do sistema nacional de defesa do consumidor. Para o mercado de consumo, o teste aparece como fator de conscientização da necessidade de exatidão do teor da mensagem publicitária.
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Código de Defesa do Consumidor