Mecânica dos Fluidos I
(MEMec, MEGE e LEAN)
Problemas da semana 6
20 a 24 de Outubro de 2014
Problema 1
Um reservatório de água, A, cuja superfı́cie livre é mantida a 2 × 105 Pa acima da pressão atmosférica, descarrega para outro reservatório, B, aberto para a atmosfera. O nı́vel no segundo reservatório
está ∆z = 0,5 m acima do nı́vel no reservatório pressurizado. Admita que neste problema a dissipação
de energia na conduta de ligação, devida ao atrito, é desprezável. A conduta de ligação tem diâmetro
constante.
Figura 1: Escoamento de água entre dois reservatórios, no sentido de A para B.
1. Calcule a velocidade da água na conduta de ligação.
2. Se o diâmetro da conduta de ligação não fosse constante, a velocidade à saı́da seria diferente?
3. Se a conduta de ligação for horizontal e de diâmetro constante, qual a diferença de pressão entre
a entrada e a saı́da?
4. Qual é o reservatório que impõe a pressão na conduta? Qual a diferença entre as linhas de corrente no reservatório de entrada da conduta (0–1) e no reservatório de saı́da (2–3), que justifica
a resposta?
5. Não se pode utilizar a equação de Bernoulli stricto sensu entre um ponto 2, à entrada do reservatório de descarga até um ponto da mesma linha de corrente onde a velocidade se possa
considerar praticamente nula, por exemplo 3 ou B, porque os efeitos viscosos são apreciáveis.
Faça um balanço de energia à água do reservatório de descarga e determine o erro da equação
de Bernoulli stricto sensu.
Soluções:
1) A equação de Bernoulli ao longo de uma linha de corrente como a representada na figura 1, entre
um ponto genérico 0 de velocidade nula e um ponto 2 vem: p0 + ρ g z0 + 12 ρ v02 = p2 + ρ g z2 + 12 ρ v22 .
Por sua vez, p0 é a pressão hidrostática do reservatório pressurizado à cota z0 : p0 = pA + ρ g (zA − z0 )
e p2 é a pressão hidrostática do reservatório de descarga à cota z2 : p2 = pB + ρ g (zB − z2 ). Portanto
s
r h
i
2
2 (pA − pB )
v2 =
p0 − p2 + ρ g (z0 − z2 ) =
+ 2 g (zA − zB ) = 20,0 m/s.
ρ
ρ
A velocidade à saı́da não depende do diâmetro da conduta. Como a área da secção transversal é a
mesma, a velocidade média é a mesma ao longo de toda a conduta, por balanço de caudal.
2) A velocidade variava ao longo da conduta de ligação, se a área da sua secção transversal não fosse
a mesma de 1 até 2.
3) Nas condições do problema, a equação de Bernoulli entre as secções 1 e 2 mostra que a pressão
seria idêntica ao longo de toda a conduta.
4) É o reservatório de descarga que impõe a pressão na conduta. Isso resulta de que a água sai em
jacto para esse reservatório, à pressão hidrostática do reservatório de descarga. A pressão na região de
entrada da conduta não é hidrostática, porque as linhas de corrente são radiais (não em jacto, como
à saı́da). A equação de Bernoulli entre 0 e 1 mostra que a pressão em 1 é igual à pressão hidrostática
no reservatório de alimentação menos a pressão dinâmica.
A pressão é hidrostática em todo o reservatório de descarga, incluindo a saı́da da conduta (como o
ponto 2) e a superfı́cie livre (como o ponto B). Portanto, a força de pressão e o peso estão equilibrados
e o trabalho da resultante destas forças é zero.
5) Como a energia potencial de pressão e a energia geopotencial não variam, o balanço de energia
mostra que a energia cinética que atravessa a fronteira em 2 se converte em energia interna no interior
do reservatório, aquecendo a água. O erro da equação de Bernoulli stricto sensu entre 2 e B é ∆p,
p2 + ρ g z2 +
1 2
1 2
ρ v2 = pB + ρ g zB + ρ vB
+ ∆p,
2
2
com ∆p =
1 2
ρv .
2 2
Era de esperar este resultado porque, uma vez que a pressão é hidrostática, p2 + ρ g z2 = pB + ρ g zB
e no ponto B,
1
2
2 = 0.
ρ vB
Problema 2
Um manómetro de tubos em U , contendo água,
está ligado à tubeira de um túnel aerodinâmico aberto para a atmosfera, conforme se mostra na figura 2. A razão de áreas da tubeira
é A2 /A1 = 0,25. Em operação, o manómetro
indica uma diferença de nı́vel h = 94 mm. Nas
condições do ensaio, a massa volúmica da água é
ρag = 1000 kg/m3 e a do ar é ρar = 1,23 kg/m3 .
Figura 2.
2
1. Determine o módulo da velocidade média do ar na secção de saı́da da tubeira, A2 .
2. Represente qualitativamente a distribuição longitudinal de pressão.
3. Descreva a distribuição de pressão na secção de saı́da da tubeira.
Soluções:
s
ρag
gh
= 40,0 m/s.
ρar [1 − (A2 /A1 )2 ]
Atenção: numa equação fı́sica, as variáveis supõem-se expressas num sistema de unidades consistente.
A velocidade média do ar é v2 =
2
Por exemplo, as unidades fundamentais do Sistema Internacional, h = 94 × 10−3 m, etc.
Figura 3: Distribuição de pressão e velocidade na tubeira.
A distribuição de pressão é a representada na figura 3, em que x é a direcção longitudinal e P a
pressão total do escoamento. A distribuição de pressão relativa à hidrostática local é a mesma para
todas as linhas de corrente; a distribuição de pressão absoluta difere de linha de corrente para linha
de corrente por causa da parcela hidrostática da pressão.
Na secção de saı́da, a distribuição de pressão absoluta é hidrostática (portanto, não varia horizontalmente e reduz-se linearmente com a cota). A pressão relativa à hidrostática local é uniformemente
nula.
Problema 3
Um reservatório de água, esquematizado na figura 4, é alimentado por forma a manter constante o
nı́vel H da superfı́cie livre. A saı́da da água do reservatório processa-se através de um difusor de
comprimento ` e pequeno ângulo de abertura (de modo que os efeitos viscosos são relativamente pequenos). Os diâmetros de entrada e de saı́da do difusor são D1 e D2 , respectivamente, conforme é
indicado na figura 4. As dimensões do reservatório são muito grandes, comparadas com as dimensões
do difusor, ou seja, a área da superfı́cie livre do reservatório é muito grande quando comparada com
a área de saı́da do difusor.
3
Figura 4: Difusor de pequeno ângulo de abertura, à saı́da de um reservatório, descarregando para a atmosfera.
1. Determine a velocidade do escoamento à saı́da do difusor, sobre a linha central.
2. Represente qualitativamente a distribuição de pressão ao longo da linha central do difusor, desde
a entrada na tubeira até à secção de saı́da.
3. Represente qualitativamente a distribuição de velocidade na secção de saı́da do difusor no caso
de H D2 . Justifique.
Soluções:
A menos de variações da pressão atmosférica com a cota e de efeitos viscosos, a velocidade à saı́da, no
√
eixo central do jacto, à distância H da superfı́cie livre, é v2 = 2 g H.
Figura 5: Distribuição de pressão e velocidade do escoamento de água num difusor que descarrega para a
atmosfera.
A distribuição de pressão é a representada na figura 5, em que x é a direcção longitudinal e P a pressão
total do escoamento. Repare-se que a secção 2 tem a pressão imposta pela atmosfera que circunda
o jacto. Em consequência, a pressão na secção 1 é inferior à pressão atmosférica. Note também que
4
dentro do reservatório, perto da secção de entrada 1, a pressão não é hidrostática, porque o fluido não
está em repouso. Inclusivamente, como se vê, a pressão é inferior à atmosférica.
Na secção de saı́da, a distribuição de pressão absoluta é aproximadamente a pressão hidrostática da
atmosfera para a qual o jacto descarrega. Como o jacto é de água, a variação de pressão hidrostática do
ar será, em geral, desprezável. Ao contrário do problema anterior, este escoamento não é monofásico
e, portanto, a impulsão (do ar) não equilibra o peso (da água): o problema não pode ser estudado
com base na pressão relativa à hidrostática local. Tomando a pressão atmosférica como uniforme, a
velocidade na secção de saı́da depende da raiz quadrada da distância à superfı́cie livre. Como se viu na
primeira alı́nea, no eixo do jacto essa distância é H; na parte superior da secção de saı́da a distância
seria um pouco menor que H e em baixo a distância será um pouco maior. Em consequência dessas
diferenças na distância à superfı́cie livre, a velocidade à saı́da também aumenta, ligeiramente, de cima
para baixo.
Problema 4
Considere um tubo de Pitot num escoamento de ar no interior de uma conduta. O tubo está alinhado
com o escoamento de modo que a pressão sentida na sua extremidade é a pressão de estagnação. A
pressão estática é medida na mesma secção do escoamento, através de um pequeno furo na parede
(designado por tomada de pressão estática). Qual seria a velocidade do escoamento se a diferença
entre os valores das pressões total e estática for 70 mm de H2 O e a pressão relativa no interior da
conduta for 200 mm de H2 O? A pressão atmosférica é 76,2 cm de mercúrio, a temperatura 16 ◦ C e a
humidade relativa de 70%. A massa volúmica do mercúrio é 13570 kg/m3 .
Avalie a incerteza da velocidade, tendo em conta a incerteza dos dados.
Soluções:
A pressão dinâmica seria 70 mm de H2 O, ou seja, 685 Pa (usou-se 998 kg/m3 para a massa volúmica
da água). A pressão atmosférica nas condições do ensaio é 13570 · g · 0,762 = 1,0134 × 105 Pa; a pressão estática é 1956 Pa superior. Nestas condições, consultando tabelas ou diagramas psicrométricos,
conclui-se que a massa volúmica do ar é ρ = 1,205 kg/m3 . A velocidade do ar é 33,7 m/s.
Se a pressão dinâmica estiver no intervalo 70 ± 0,5 mm de H2 O e ρ = 1,205 ± 0,003 kg/m3 , a
velocidade do ar está compreendida entre 33,5 e 33,9 m/s.
Os problemas seguintes revêem ao mesmo tempo vários capı́tulos da matéria dada até agora.
Problema 5
Um jacto horizontal de água, com 10 cm de diâmetro e velocidade uniforme igual a 8 m/s, incide perpendicularmente numa placa plana fixa, sendo deflectido segundo a tangente à placa, cf. figura 6-a).
Considere que as forças viscosas são desprezáveis e que toda a instalação se encontra à pressão atmosférica, suposta uniforme. Calcule a força f que o jacto exerce sobre a placa. Estime a velocidade da
água depois de ser deflectida pela placa.
5
Figura 6: (a) Jacto perpendicular a uma parede fixa. (b) Jacto perpendicular a uma parede móvel.
Soluções:
Como as forças viscosas são desprezáveis, podemos aplicar a equação de Bernoulli ao longo de
qualquer linha de corrente desde um ponto à saı́da do jacto até ao ponto correspondente na lâmina
deflectida, na periferia da placa. Como a pressão desses dois pontos é a mesma, a velocidade da água
deflectida é igual à do jacto, a menos da influência das diferenças de cota.
Podemos fazer um balanço de forças e quantidade de movimento a um volume de controlo que
engloba a placa e o jacto incidente. Se a fronteira esquerda desse volume de controlo estiver suficientemente afastada da placa, as linhas de corrente do jacto são rectilı́neas nessa parte da fronteira,
em toda a secção transversal do jacto, e portanto a pressão é uniforme, igual à pressão atmosférica
envolvente. A lâmina de água que abandona a placa também tem linhas de corrente rectilı́neas e, pelo
mesmo motivo, a pressão nessa parte da fronteira também é igual à pressão atmosférica envolvente.
Em suma, toda a fronteira do volume de controlo está à pressão atmosférica. O fluido só atravessa a
fronteira do volume de controlo e duas zonas. O caudal de quantidade de movimento do jacto incidente só tem componente ortogonal à placa; o caudal de quantidade de movimento da água deflectida só
tem componente tangencial à placa. Como as forças viscosas são desprezáveis, só há forças de pressão
aplicadas sobre a placa e portanto a força exercida sobre a placa é normal a ela, ou seja, está alinhada
com o jacto incidente. Feito o balanço de forças e quantidade de movimento, conclui-se que, qualquer
que seja a velocidade da lâmina de água deflectida, a força exercida sobre a placa é igual ao caudal de
quantidade de movimento do jacto incidente: |f | = 502,65 N.
Problema 6
Considere agora que o jacto de água horizontal incide sobre uma placa plana que se move à velocidade
constante de 5 m/s na direcção do jacto, como se mostra na figura 6-b).
1. Em que referencial o escoamento é estacionário?
2. Determine a direcção da velocidade da água deflectida pela placa no referencial terrestre.
3. Calcule a força exercida sobre a placa.
4. Se tirar uma fotografia à instalação, obtém a imagem das linhas de emissão: qual a sua geometria? Determine o ângulo que a velocidade absoluta (no referencial terrestre) faz com a placa e
a forma das linhas de corrente.
6
Figura 7: A velocidade relativa da água (no referencial da placa) é v r (3 m/s em módulo); a velocidade
da placa é v p (5 m/s em módulo) a velocidade no referencial terrestre é v a = v r + v p (5,83 m/s em
módulo).
Soluções:
1) O escoamento é estacionário no referencial da placa. No referencial terrestre o problema é
não-estacionário.
2) A velocidade da água deflectida pode ser determinada pela equação de Bernoulli no referencial
em que o escoamento é estacionário, tal como no problema anterior. Nesse referencial da placa, a água
do jacto aproxima-se à velocidade de 8 − 5 = 3 m/s e, como a pressão depois da placa é igual, a equação de Bernoulli mostra que, a menos da possı́vel diferença de cota, a velocidade do jacto deflectido é
igual à velocidade de aproximação, isto é, 3 m/s. A velocidade v a no referencial terrestre calcula-se
por composição vectorial (ver figura 7) da velocidade v r relativa à placa da velocidade v p da placa no
referencial terrestre: v a = v r + v p (5,83 m/s em módulo).
3) O balanço de forças e quantidade de movimento no referencial da placa é semelhante ao do
exercı́cio anterior. A água atravessa a fronteira do volume de controlo com a velocidade relativa de
3 m/s ao entrar e de 3 m/s ao sair na direcção perpendicular. A força exercida sobre a placa é igual ao
caudal de quantidade de movimento do jacto incidente no referencial da placa (3 m/s): |f | = 70,69 N.
3) As linhas de emissão são rectilı́neas, tangentes à placa, como na figura 6-b). A velocidade
absoluta v a faz um ângulo θ = arctan(3/5) = 30,96◦ com o eixo do jacto incidente, como na figura 7.
Como a velocidade absoluta é uniforme no espaço, as linhas de corrente são rectas inclinadas com o
mesmo ângulo θ.
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Aula - 06