O PAPEL DA HIDROXIURÉIA
NA BETA-TALASSEMIA
INTERMEDIÁRIA
Faculdade de Ciências Médicas
2007
O PAPEL DA HIDROXIURÉIA NA BETATALASSEMIA INTERMEDIÁRIA
Hematologia Clínica
Prf. Dr Fernando Ferreira Costa
Prfa. Dra Sara Teresinha Ollala Saad
Dr. André Fattori
Dra. Fabíola Traina
Hemoterapia
Dra. Simone Gilli
Biologistas
Dra Dulcinéia Martins Albuquerque
Marcos André Cavalcanti Bezerra
Talassemia intermediária - definição
A talassemia intermediária compreende um vasto
quadro clínico. Pacientes leve a moderadamente
afetados podem ser assintomáticos até a vida adulta,
apresentando apenas discreta anemia com
hemoglobina variando entre 7,0 e 10,0g/dl. Estes
pacientes requerem transfusões sanguíneas ocasionais,
se necessitarem. Pacientes com apresentação clínica
mais grave geralmente têm seu diagnóstico entre 2 e 6
anos de idade e, embora possam sobreviver sem
transfusão, o crescimento e o desenvolvimento podem
estar retardados.
Talassemia intermediária - definição
A descrição das variadas formas clínicas de talassemia
é baseada na gravidade da condição mais
importantemente que na anomalia genética subjacente.
A maior parte dos pacientes com talassemia
intermediária são homozigotos ou duplo-heterozigotos
para beta-talassemia, significando que ambos alelos de
beta são afetados.
Fatores genéticos implicados com alteração da
expressão fenotípica são as mutações de AHSP, coherança de alfa-talassemia, triplicação do alfa, presença
do polimorfismo Xmn1.
Critérios que para o diagnóstico de talassemia maior e
intermediária. Norteiam o diagnóstico, porém não são
absolutos.
Critérios para diferenciação entre talassemia maior e intermediária na apresentação.
Clínicos:
Apresentação (anos)
Níveis de hemoglobina (g/dl)
Hepatoesplenomegalia
Hematológicos:
HbF (%)
HbA2 (%)
Genéticos:
Pais
Moleculares:
Tipo de mutação
Persistência hereditária da
hemoglobina fetal
δβ-Talassemia
Polimorfismo do GγXmn1
Talassemia maior
Talassemia intermediário
<2
<7
grande
>2
8-10
moderada a grande
>50
<4
10-50
>4
Ambos são portadores do
traço talassêmico com
elevada HbA2
Podem ser portadores de
formas genéticas silenciosas
ou atípicas
Grave
Não
Leve/silenciosa
Sim
Não
não
Sim
Sim
Incidência de Traço Talassêmico β no Brasil
Local
Freqüência (%)
Rio Grande do Sul1
Minas Gerais2
S.J. do Rio Preto3
Ribeirão Preto4
Campinas e Região5
Salvador6
1,1
0,13
1,29
0,8
1,3
0,3
Recife7
0,68
1– Freitas & Rocha, 1983; 2- Melo et al., 2000; 3-Viana-Baracioli et al., 2001; 4- Zago et al., 1983;
5- Ramalho et al., 1999; 6- Fonseca etal., 2005; 7- Almeida et al., 2005
Distribuição das mutações da β-Talassemia Maior e
Intermediária no Hemocentro da UNICAMP n= 180 alelos (90
pacientes)
Genótipo
Códon 39 (C→
→T)
IVS1-6 (T→
→C)
IVS1-110 (G→
→A)
IVS1-1 (G→
→A)
IVS1-5 (G→
→C)
IVS1-5 (G→
→A)
IVS2-745 (C→
→G)
-29 (A→
→G)
-87(C→
→G)
-88 (C→
→T)
-101 (C→
→T)
Códon 44 (-C)
Cd Inic. (ATG →GTG)
N° de alelos
77
40
38
9
4
2
2
2
2
1
1
1
1
Freqüência
77/180
40/180
38/180
9/180
4/180
2/180
2/180
2/180
2/180
1 /180
1 /180
1 /180
1 /180
%
42,8
22,2
21,1
5,0
2,2
1,1
1,1
1,1
1,1
0,5
0,5
0,5
0,5
Combinação Genotípica da β-Talassemia Maior e Intermediária
no Hemocentro da UNICAMP (n=90 pacientes)
Combinação Genotípica
Freqüência
%
Códon 39(C→
→T)/Códon 39(C→
→ T)
25/90
27,8
IVS1-110(G→
→A)/Códon 39(C→
→T)
14/90
15,6
IVS1-6(T→
→C)/Códon 39(C→
→T)
8/90
8,9
IVS1-6(T→
→C)/IVS1-110(G→
→A)
8/90
8,9
IVS1-6(T→
→C)/IVS1-6(T→
→C)
8/90
8,9
IVS1-110(G→
→A)/IVS1-110(G→
→A)
7/90
7,8
IVS1-1(G→
→A)/Códon 39(C→
→T)
3/90
3,3
IVS1-1(G→
→A)/IVS1-1(G→
→A)
2/90
2,2
IVS1-1(G→
→A)/IVS1-6(T→
→C)
2/90
2,2
IVS1-5(G→
→C)/IVS1-6(T→
→C)
2/90
2,2
-87(C→
→G)/IVS1-6(T→
→C)
2/90
2,2
Combinação Genotípica da β-Talassemia Maior e Intermediária
no Hemocentro da UNICAMP (n=90 pacientes)
Combinação Genotípica
Freqüência
%
IVS1-5(G→
→C)/IVS1-5(G→
→C)
1/90
1,1
IVS1-5(G→
→A)/Códon 39(C→
→T)
1/90
1,1
-29 (A→
→G)/IVS1-110(G→
→A)
1/90
1,1
-29 (A→
→G)/IVS1-5(G→
→A)
1/90
1,1
-101(C→
→T)/Códon 39(C→
→T)
1/90
1,1
-88(C→
→T)/IVS1-6(T→
→C)
1/90
1,1
Cd Inic.(ATG →GTG)/IVS1-6(T→
→C)
1/90
1,1
IVS2-745(C→
→G)/Códon 44(-C)
1/90
1,1
IVS1-110(G→
→A)/IVS2-745(C→
→G)
1/90
1,1
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
Luzzatto and Notaro, 2002
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
B
Negative
Control
AHSP
shRNA
α-globin
β -actin
Overlay
with DAPI
3 dyes
together
Haplótipos βtal
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
Paciente I
Paciente II
Hm (106mm3)
5,01
3,22
Hb (g/ dL)
10,2
7,0
Ht (%)
30,2
23,9
VCM (fL)
60,3
74,1
HCM (pg)
20,2
21,6
RDW (%)
15,5
22,1
Ret. (%)
1,6
3,6
HbA2 (%)
6,1
4,2
HbF (%)
2,0
9,3
Fe (µ
µg/dL)
115
110
Ferritina (ng/mL)
413
1820
BT (mg/dL)
1,9
5,20
BI (mg/dL)
1,6
4,30
β-Globina
Códon 39 (C
T))
Códon 37 (G
A)
UGT1 A1
H6 / H7
H6 / H6
AHSP
Normal
Normal
Xmn I
-/-
-/-
-α
α3.7 kb
Normal
Normal
Heterozigoto
Heterozigoto
αααanti-3.7 kb
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
cd 39
cd 37
CAG>TAG
TGG>TGA
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
M 1
2
3
4
M - Marcador de peso molecular (DNA λ Hind III)
1 - Controle normal (αα /αα)
2 – Controle - Heterozigoto ( αα α
2,1 kb
1,9 kb
anti 3,7 /αα)
3 – Paciente I - Heterozigoto ( αα α
anti 3,7 /αα )
4 – Paciente II - Heterozigoto ( αα α
anti 3,7 / αα )
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia – mutações do gene beta.
Deleções de segmentos gênicos (fenótipo β0);
Mutações transcricionais, envolvendo seqüências da região
promotora, na extremidade 3´do “cap site”(CCAAT box e
ATA box)(fenótipo β+);
Mutações relacionadas ao processamento do RNA,
principalmente envolvendo os dinucleotídeos GT(5´) e AG(3´)
com abolição do sítio de “splicing” (fenótipo β0) ou criação de
novos sítios de “splicing”preferencial (fenótipo β+);
Mutações provocando erros de tradução do RNA, como
mutações “frameshift” e criação de códons de parada de leitura
(fenótipo β0).
Combinação Genotípica da β-Talassemia Maior e Intermediária
no Hemocentro da UNICAMP
As mutações na extremidade 5´do “cap site”, em região
promotora, estiveram relacionadas com um fenótipo
talassêmico β+ leve e todas as combinações genotípicas
tiveram um correspondente comportamento clínico de
talassemia intermediária;
Reduz a transcrição por diminuição da
afinidade por fatores transcricionais,
principalmente SpI e EKLF.
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
Dados
Paciente
Pai
Mãe
Irmão
Hm
(106mm3)
2,02
6,63
5,27
7,33
Hb (g/dL)
5,1
13,8
10,2
14,2
Ht (%)
14,3
42,3
33,3
45,3
VCM (fL)
71,0
63,9
63,3
61,7
HCM (pg)
25,2
20,9
19,4
19,3
RDW (%)
28,0
14,2
16,5
15,1
Ret (%)
4,1
1,5
2,6
1,5
HbA2 (%)
2,1
5,3
6,2
5,0
HbFetal (%)
38,5
0,2
0,9
0,3
+20 / Cd39
N / +20
N / Cd 39
N / +20
Xmn I
−/−
−/−
−/−
−/−
α3.7 kb
Normal
Normal
Normal
Normal
β-Globina
αααanti 3.7 kb
Normal
Normal
Normal
Normal
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia.
B
A
cd 39
C
T
Promotor +20
(C
T)
Figura 1: Seqüenciamento automatizado: A – Gene β_fita sense, normal (superior) e mutante (inferior – cd 39
CAGTAG); B - Gene β_fita antisense, normal (superior) e mutante (inferior – promotor +20 CT).
Variáveis genéticas que interferem na expressão fenotípica da
beta-talassemia – mutações do gene beta.
β Talassemia em Pernambuco Comparação entre 2 Genótipos
•
IVSI-5 (G→
→C): resulta em talassemia β+ Grave com marcante
redução da quantidade de RNAm normal; é tida como a
mutação de maior prevalência no sub-continente indiano;
•
IVSI-6 (T→
→C): produz talassemia β+ Leve com níveis
relativamente altos de produção de RNAm normal; citada
como a “forma portuguesa” de β talassemia e faz parte da
maioria das mutações leves encontradas em talassêmicos do
mediterrâneo.
Combinação genotípica da β-Talassemia Intermediária nos
pacientes estudados (n = 34 indivíduos) - Pernambuco
Combinação Genotípica
Freqüência
%
IVS1-6/IVS1-6
23/34
67,7
IVS1-6/IVS1-1
4/34
11,8
IVS1-6/IVS1-5
2/34
5,9
IVS1-6/Códon 39
2/34
5,9
IVS1-6/IVS1-110
1/34
2,9
IVS1-1/Códon 30
1/34
2,9
Códon39/Códon39
1/34
2,9
Combinação Genotípica da β-Talassemia Maior e Intermediária
no Hemocentro da UNICAMP
Todos os pacientes portadores da combinação IVS1-6/IVS1-6
apresentaram quadro clínico de talassemia intermediária
(n=8), enquanto portadores da combinação IVS1-5/IVS1-6
(n=2) e IVS1-5/IVS1-5 (n=1) comportamento clínico de
talassemia maior, evidenciando fenótipo mais agressivo da
mutação em IVS1-5;
Reduz a eficiência do sítio normalmente
esperado de “splicing”.
Sβ
β Talassemia em Pernambuco Comparação entre 2 Genótipos
•
S/IVSI-6 (T→
→C): 20 (28,5%)
•
S/IVSI-5 (G→
→C): 18 (25,7%)
•
Mutações
em
determinados
nucleotídeos
em
regiões
conservadas (seqüências consenso) resultam em bloqueio
parcial do sítio normal de “splicing” do RNAm;
•
Mutações que ocorrem nessas seqüências reduzem a eficácia
do “splicing” em vários graus e produzem fenótipos que
variam de leves a graves.
Comparação dos Dados Hematológicos de Pacientes βS/β
βtal IVSIβtal IVSI-6 (T→
→C)
5 (G→
→C) e βS/β
Genótipos
(β
βS/β
βtal)
Hb
(g/dL)
HbS
(%)
HbA
(%)
HbF
(%)
S / IVSI-5
(G → C)
n = 18
7.4±1.0 72.9±8.2 5.2±1.3 17.6±9.1 4.3±0.8 8.8±4.7
S / IVSI-6
(T → C)
n = 20
11.6±0.9 67.4±1.7 26.3±1.4 1.8±1.2
HbA2
(%)
Ret
(%)
4.5±0.5 2.7±0.9
Todos os valores (com exceção da HbS e HbA2) foram estatisticamente diferentes entre
os 2 grupos (p<0.001, Wilcoxon rank sum test).
Indutores farmacológicos da HbF – histórico.
5-azacitidina: primeira droga a ser estudada como indutor da
HbF. É um inibidor da DNA metiltransferase, foi utilizada
para induzir hipometilação do gene da gama-globina na vida
adulta;
Decitabina: análogo da 5-azacitidina, demonstrou elevar os
níveis de HbF em pacientes com anemia falciforme;
Biturato: é um inibidor de histona deacetilase, acredita-se
aumentar a expressão do gene da gama-globina através do
aumento da acetilação das histonas nos sítios promotores dos
genes.
Indutores farmacológicos da HbF – histórico.
A hidroxiuréia é um agente citostático bem tolerado, inibidor
da via da ribonucleotideo redutase e que provoca, por
mecanismos ainda não esclarecidos, elevação da HbF.
A experiência é maior quanto ao seu uso no tratamento da
anemia falciforme, mostrando neste grupo de pacientes
redução das crises álgicas e declínio da mortalidade (40%)
(Carache, 1995; Zimmerman, 2004; Steinberg, 2003)
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
18,5
36,3
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
7,7
8,6
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
Estudo de Yavarian M, 2004.
N=133 pacientes
Dependentes de transfusões,
Anemia, hepatoesplenomegalia, retardo de crescimento;
Início das transfusões entre 2 e 3 anos de idade,
Iniciaram transfusões quando nível de hemoglobina <6,0g/dl;
Apresentavam HbA indetectável à época di diagnóstico;
Necessidade de transfusões mensais para manter nível de hemoglobina
em 10,0g/dl;
Pelo menos 8 anos de idade, com ao menos 5 anos de terapia quelante
com desferoxamina.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
Boa resposta (61%): passaram ao estado de independência
transfusional, com níveis de hemoglobina acima de 9,5g/dl;
Resposta moderada (23%): mantiveram necessidade
transfusional, porém com mais distância entre as transfusões
(em média a cada 6 meses), mantendo níveis de hemoglobina
que oscilaram entre 7,5 e 9,5g/dl;
Ausência de resposta (16%): sutentaram níveis de
hemoglobina abaixo de 7,5g/dl.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
Estudo de karimi M, 2005.
N=163 pacientes
Grupo 1: recebem transfusões regulares depois dos 2 anos
de idade;
Grupo 2: sem história de transfusões sangüíneas ou
transfusões com longo intervalo.
Dose hidroxiuréia de 8-12mg/kg/dia
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
Grupo 1: 120 pacientes
83 evoluíram sem necessidade de transfusões,
23 receberam apenas 2 transfusões durante todo o tempo
de estudo
Hb=9,5g/dl
Grupo 2: 43 pacientes
16 que recebiam transfusões ocasionais, não mais
precisaram de transfusões
27 se mantiveram sem transfusões
Hb=8,68 baseline, Hb=9,64 após HU
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
8,7% dos pacientes não responderam (Hb<7,0g/dl,
crescimento inadequado para a idade ou presença de
alterações faciais);
91,4% responderam;
97% descreveram um aumento na tolerância ao
exercício físico e sensação de bem estar, quando
comparados ao início do tratamento.
A hidroxiuréia como modulador da HbF na beta-talassemia
intermediária – efeitos práticos.
Decréscimo da eficiência do tratamento com hidroxiuréia após
longo tempo de evolução.
Hidroxiuréia no controle de sítios de hematopoese
extramedular?
Hidroxiuréia no controle de sítios de hematopoese
extramedular?
Hidroxiuréia no controle de sítios de hematopoese
extramedular?
Conclusões
O conhecimento das mutações mais frequentemente presentes
em determinadas populações podem explicar diferenças de
resposta ao tratamento específico com hidroxiuréia;
A presença de mutações relacionadas a um comportamento
clínico mais agressivo não exclui a possibilidade de tratamento
com hidroxiuréia;
Não se conheçe ainda o efeito de terapia de longo prazo e de
instituição precoce em talassêmicos intermediários.
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