A diversidade que faz todos na empresa parecerem iguais
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30/06/2014 - 05:00
A diversidade que faz todos na empresa parecerem
iguais
Por Lucy Kellaway
Há pouco tempo participei de uma reunião de funcionários graduados de uma companhia bastante conhecida. Havia 12
pessoas em torno da mesa: dois britânicos, um americano, um sul-africano, dois alemães, um francês, um italiano, um
argentino e três outras pessoas cujos sotaques não consegui identificar.
Todos eram bem-sucedidos e supostamente brilhantes - caso contrário, não teriam sobrevivido em uma companhia que
não emprega pessoas fracas. Todos falavam um bom inglês e discutiam um assunto vital para seus negócios. Mesmo assim,
foi a discussão de negócios mais tediosa e cheia de jargões que já testemunhei.
Acho que ela foi excessivamente chata por vários motivos. Para começar, eles estavam discutindo o "talento", um assunto
que dá manga para muitas tolices. E a presença de uma jornalista, com notebook nas mãos, não era exatamente um convite
para que aquelas pessoas agissem de forma natural.
Mesmo assim, suspeito que o principal problema era algo mais preocupante. O grupo era simplesmente diversificado
demais. A diversidade deveria ser uma coisa maravilhosa. Essa companhia tem negócios em todas as partes do mundo e,
assim, nada mais justo que sua cúpula administrativa reflita isso. Um terço do grupo era formado por mulheres, o que
felizmente é mais que a média geral, enquanto a diferença entre as idades - com o mais jovem parecendo mal ter chegado
aos 30 e o mais velho parecendo ter pelo menos 60 - era mais extensa que o normal.
Mesmo assim, a reunião mostrava algo mais. A diferença pode tornar as coisas mais lentas. Ela pode tornar tudo insípido.
Em vez de levar a decisões mais ágeis, ela pode levar à ausência de decisões.
Aquelas 12 pessoas tinham apenas uma coisa em comum: trabalham para a mesma organização e, assim, agarram-se como
carrapatos à sua estreita maneira corporativa de falar. Em vez de suas diferenças tornarem a discussão mais interessante,
elas a reduziram ao mais baixo denominador comum do tedioso jargão corporativo em inglês global, o popular "globish".
Poucos anos atrás, uma revista científica voltada à psicologia publicou um estudo que concluiu não haver nada de
maravilhoso com as equipes diversificadas por si só. O estudo concluiu que elas são boas quando você quer fazer algo
criativo ou inovador, mas, quando se trata de negócios, as equipes homogêneas se saem melhor.
Fico imaginando se isso está certo mesmo. Minha experiência sugere que pode muito bem ser o contrário. Se você quiser
que sua equipe faça algo bem rotineiro, ter uma grande diversidade de pessoas é bom, uma vez que as tarefas de cada um
estejam bem definidas. Mas, se você quiser que eles façam algo criativo, certamente é muito melhor ter pessoas que se
comuniquem bem o suficiente para que nenhum esforço seja perdido tentando descobrir se, quando um inglês fala "isso é
interessante", na verdade está querendo dizer "isso é um saco".
Quando entrei para o "Financial Times", na metade da década de 1980, essa era uma das organizações menos
diversificadas possível. Quase todos os funcionários no comando eram homens e brancos. E eles não eram só de Oxford e
Cambridge, mas sim da mesma faculdade de Oxford - Balliol. Com um estreiteza dessas, o pensamento único tinha tudo
para vicejar.
Só que isso não acontecia. Eles tinham discussões calorosas sobre os grandes assuntos do dia. Meus colegas podem ter
30/06/2014 11:31
A diversidade que faz todos na empresa parecerem iguais
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origem na mesma tribo educacional, mas também eram originais e dedicados a ver as coisas à sua maneira. Em razão do
que compartilhavam, não se perdia tempo explicando o básico: seus argumentos iam a voltavam, rápidos e furiosos.
De lá para cá, o mundo mudou e o jornal mudou com ele - mas até um certo ponto. O "Financial Times" emprega hoje
muito mais estrangeiros e mulheres, e alguns de nossos melhores jornalistas nunca ouviram falar da Balliol. Isso é bom; é
mais justo e melhor, socialmente falando. No entanto, suspeito que somos menos diversificados que nossos leitores, o que
me parece ser uma vantagem. Os argumentos ainda fervilham, uma vez que ainda há uma base de pensamento suficiente
para isso.
Não estou dizendo que a diversidade não é importante. Passei sete anos no conselho de administração de uma companhia
e sei que isso é vital por uma série de outros motivos. Mas, se o que se quer é realmente melhorar a qualidade das decisões
e evitar o pensamento único, a melhor maneira de fazer isso não é sair por aí buscando pessoas de várias nacionalidades e
gêneros. Diversidade demais significa que fica bem mais fácil concordar do que discordar.
Em vez disso, o que se precisa para conseguir decisões melhores é um tipo diferente de diversidade. Toda equipe criativa
ou conselho de empresa deveria estabelecer uma mistura de otimistas e pessimistas - algumas pessoas que enxergam as
vantagens de cada novo plano proposto, e outras que enxergam as desvantagens. Mas os dois lados precisam ter o
suficiente em comum para poderem resolver as diferenças entre eles.
Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de
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