A CRIAÇÃO DA LEI DO SISTEMA MUNICIPAL
DE ENSINO DE PORTO ALEGRE
Jorge Barcellos1
Introdução
O presente ensaio tem por objetivo a definição do lugar da ação do parlamento na constituição do
sistema de ensino de Porto Alegre. Entre os pontos a serem investigados estão a processualidade
no interior do poder legislativo, os dilemas e os desafios na elaboração da lei do sistema municipal
de ensino e o lugar ocupado pelo legislativo na consolidação do regime de colaboração no
município de Porto Alegre.
A lei do Sistema Municipal de Ensino uma das contribuições centrais do legislativo no campo da
formulação de políticas educacionais no município. Ela
deve apontar os caminhos para a
organização da educação e seu modo de produção revela a ênfase do parlamento na defesa da
educação. A razão é que somente a instituição legal de um sistema educacional possibilita e a
defesa do acesso à escola da população que na cidade é excluída do sistema de ensino.
A base deste ensaio é o acompanhamento do caminho que no interior do legislativo percorreu o
projeto 482/97 buscando dar conta dos meandros da sua produção, universo empírico
propriamente dito. Trata-se de partir do processo legislativo para analisar a fonte primária que é o
processo, buscando revelar através de suas anotações e registros suas características principais. O
trabalho de análise registra que está no processo e o que está fora dele, descreve, separa e discute
as possibilidades do trabalho parlamentar como colaborador necessário na constituição de um
regime de colaboração.
As reformas da educação e o sistema municipal de ensino de Porto Alegre
O contexto da instauração da Lei do Sistema Municipal de Ensino em Porto Alegre faz parte de uma
ampla reforma da educação nacional, ora em andamento, caracterizada pela descentralização das
políticas públicas de educação e o estabelecimento de políticas locais correlatas. A forma da
participação da Prefeitura de Porto Alegre nesse processo pode ser verificada pelas diferentes
concepções políticas que tem servido de apoio à gestão do governo municipal na condução dos
1 Doutorando em Educação/Unisinos, Coordenador do Memorial da Câmara Municipal de Porto Alegre.
assuntos educacionais e na defesa de um modo particular de realizar a gestão dos serviços
educativos em nossa cidade. Como pano de fundo, a conjuntura internacional na qual organismos
multilaterais tem divulgado novas abordagens sobre políticas sociais e vem sendo responsáveis pelo
financiamento de vários projetos sociais, impondo critérios para a execução das políticas
educacionais a nível local.
Neste contexto de interdependência entre as questões locais e nacionais, a criação de uma Lei do
Sistema Municipal de Ensino como a que teve palco no legislativo a partir de 1997 tem importância
pois trata de fazer acompanhar a mudança dos referenciais de organização, planejamento e gestão
da educação em Porto Alegre em um instrumento legal com chancela da população. Seu trajeto,
sua construção como instrumento coletivo não pode ser analisado sem a introdução do debate
sobre a participação do legislativo na eficiência governamental no campo da educação. Isso explica
o interesse dos parlamentares na construção da Lei do Sistema Municipal de Ensino e revela
indicadores que legitimam a atual política educacional, atestando o grau de seu desempenho e
servindo de referência para a atuação do governo nestes anos
Nesse pano de fundo está também o debate que se desenvolve desde o contexto da aprovação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e que tamabém foi definido pela Constituição de
1988. É o caso do tema do financiamento da educação, desde a aprovação da LDB, submeteu às
iniciativas da sociedade organizada aos interesses do Executivo. Neste aspecto, definiu um dos
aspectos fundamentais da agenda reformista para educação, qual seja, a concepção universalista
de acesso à educação, a aceitação da função redistributiva quanto aos níveis de responsabilidade
enquanto órgãos federados e democráticos quanto à proposta de gestão da educação. Esta
concepção é reproduzida, como veremos nos termos da lei do sistema municipal de Porto Alegre,
incorporadas diretamente do texto constitucional e objeto de reflexão técnica no interior do
legislativo.
Tal agenda merece a mesma crítica oferecida aposta Ivan Valente 2 ao Plano Nacional de
Educação. Valente cria o conceito de legislação frankensein, para definir toda a legislação nacional
marcada pelo hibridismo. Isto deve-se ao fato de que no processo que levou a produção da lei: por
um lado, da luta entre o movimento pela defesa da escola pública e que congregou amplos
movimentos sociais; por outro, as intenções de redução da participação do estado no
financiamento da educação, encabeçada pelo governo a partir da Era FHC. A conseqüência das
reformas da educação para o contexto municipal é o incentivo a reprodução de estruturas legais
2 Para um balanço do PNE. In: Brasil. Plano Nacional de Educação. Rio de Janeiro, DPA, 2001.
híbridas, onde as leis municipais imitam conceitos fundamentais da legislação federal, e daí,
carregam para as leis dos sistemas municipais os mesmos problemas e vícios da produção
legislativa federal.
O problema, no caso do processo que levou a promulgação da LDB, é que
outorga uma posição
avaliadora ao governo e a defesa do repasse de responsabilidades para os municípios. È o já visto
reforço da idéia de que cabe ao poder executivo o planejamento da educação e que os municípios
ficam em posição subordinada seja aos recursos ou a criação da legislação correspondente. Quer
dizer, ainda que a lei máxima da educação seja fundada por princípios políticos ligados à
democracia, justiça social e na compreensão da defesa do direito à educação em todos os níveis e
modalidades de ensino, ela oferece um modelo frágil para a organização dos sistemas municipais
pois é baseado na idéia de transferência de responsabilidades, pouco definida entre os atores.
Apesar do fato de que a Lei dos Sistemas Municipais de Ensino de Porto Alegre, incorpore no plano
institucional mecanismos e determinações já presentes na LDB, o fato de ela responsabilizar o
municípios por uma série de tarefas na gestão da educação local ainda é motivo de polêmica. Isto
não é objeto aqui. Entretanto, deseja-se mostrar que o acompanhamento e os acertos da
elaboração da Lei do Sistema de Ensino e os debates que se fizeram no Plenário da Câmara
municipal parecem indicar um elevado contexto de conscientização dos parlamentares para os
problemas educacionais.
O sistema municipal de ensino de Porto Alegre
Para a compreensão do significado da criação da lei do sistema municipal de ensino, o ponto de
partida é a caracterização da educação local e seus problemas. Para se ter uma idéia da urgência
da aplicação de tal dispositivo, basta descrever as características de parte da população escolar da
cidade, que ainda não viu os benefícios da lei que institui seu sistema de ensino. Estamos nos
referindo a precaria situação da educação infantil em Porto Alegre, que apesar dos esforços da
Secretaria Municipal de Educação, continua a ser o problema central no diagnóstico do sistema
municipal de ensino. De fato, a população residente em Porto Alegre, segundo dados do INEP/MEC,
na faixa de idade de zero a três anos para o ano 2000 é de 83.064 crianças. Em relação a 1991,
representa uma redução, já que havia cerca de 86.806 crianças. A faixa seguinte, onde os dados
apontam cerca de 63.121 crianças é consideravelmente maior, a faixa de quatro a seis anos e
revela a mesma tendência decrescente em relação há dez anos antes, quando então havia 65.704
crianças.
Nos dados da Secretaria Municipal de Educação3 constam que são atendidas na modalidade
educação infantil cerca de 13.654 crianças, distribuídos em 33 escolas municipais. Ainda prestam
atendimento à criança de zero a seis anos sete jardins de praças e 124 creches comunitárias
conveniadas. O total de crianças beneficiadas em educação infantil chega a 13.654. A menor são
no mínimo 160 mil crianças a serem atendidas, o que significa que população atendida não atinge
10% do total da população alvo. Não temos dados referentes ao percentual atendido em 1999,
podemos apenas supor que era inferior ao atual. O que significa que, durante o seu governo, frente
a uma taxa declinante da população alvo, o atual governo não conseguiu atingir um patamar
mínimo de atendimento.
Os dados cruzados com outra fonte, o Atlas socioeconômico do Rio Grande do Sul, apresentam
similaridades. Segundo o Atlas, a região onde se situa Porto Alegre é uma das que menos oferta de
educação infantil oferece, na faixa de 14%, bem inferior a taxa de 26,57% que pode ser
encontrado na região do Vale do Rio Pardo. O fato da diminuição da população também é apontado
como um fator de destaque pelo Atlas socioeconômico. O problema do município é que justamente
o grau de eficiência do seu sistema de ensino pode ser definido pela sua capacidade de
atendimento do publico alvo da educação infantil. Assim, ainda que caiba ao município a educação
infantil, no quadro de distribuição de responsabilidades, a avaliação preliminar é a insuficiência do
sistema no seu atendimento.
Quais as razões que podem estar levando ao fato que, na prática, há um contexto adverso para a
universalização dos objetivos da Lei do Sistema Municipal, qual seja a expansão da educação
infantil em nosso município? Com efeito, o estado ainda não demonstrou sua eficiência na
ampliação do atendimento da educação infantil. A nova conjuntura política no governo central a
partir de 2002 tem recebido sucessivas críticas pelo fato de ter assumido consensos da agenda
neoliberal, principalmente de teóricos que ajudaram a fundação do partido, que apontam a
repetição da política de redução dos recursos para a educação. Para o governo, conseqüência da
crise fiscal e financeira do Estado, que impõe limites a política redistributiva. É nesse contexto que
o papel da Lei do Sistema Municipal de Ensino ganha reforço, pelo seu caráter de fundador do
sistema e de seus princípios de gestão em longo prazo, que o transformam no instrumento cujo
papel é criar bases dos canais de participação da comunidade e de ampliação dos recursos
educacionais para a educação em geral e infantil, de longe, é o principal problema não resolvido no
âmbito do município de Porto Alegre após sua consolidação.
3 Constantes da página da internet www.portoalegre.rs.gov.br
A Lei do Sistema Municipal de Ensino é o instrumento essencial na construção do bom governo da
educação da cidade: define bons caminhos das estruturações dos sistemas, apresenta as bases
para a construção de boas práticas de gestão da educação municipal. Torna o governo municipal
eficaz e eficiente nas coisas da educação. Não que ele não seja em alguma modalidade de ensino.
De fato o é no que se refere à educação fundamental. De 7 a 10 anos, segundo ainda dados do
INEP/MEC, Porto Alegre possui em 2000 cerca de 80.971 crianças. O número também representa
uma redução em relação a 1999, quando então havia 97.254 crianças. De 11 a 14 anos, os dados
revelam cerca de 86.489 crianças, o que equivale a menor de 1991, quando então era 90.687
crianças. Em todos os indicadores destinados à educação infantil e o ensino fundamental, a
Secretaria Municipal de Educação encontrou dados favoráveis de população.
A Lei do Sistema Municipal de Ensino tem importância por possibilitar a incorporação dos interesses
de vários atores sociais. Apesar da existência na sua elaboração de conflitos que não privilegiam a
educação, seu debate visa produzir um suposto consenso para o desenvolvimento da educação da
cidade. Entendemos que o processo legislativo que leva a elaboração da Lei do Sistema Municipal
de Ensino é o espaço social de lutas pela apropriação de bens educacionais e serviços, por
professores, técnicos e sociedade organizada e por isso constituem luta pelo poder. As discussões
pela sua elaboração, os debates e grupos de es tudo correlatos, tudo enfim é decorrência da luta
que fazem educadores e educadoras para afirmarem seus projetos de acesso aos níveis e
modalidades de ensino.
Apontamentos da trajetória da Lei do Sistema Municipal de Ensino
A explicação de cada etapa do processo legislativo tem razão de ser. Vasco Della Giustina4 assinala
que é justamente na capacidade de autolegislar que está um dos pilares da autonomia municipal. É
o que faz na seguinte passagem ao lembrar que ”O artigo 30 da Carta Magna discrimina a
competência legislativa do município, onde se sobressai a de “legislar sobre assunto de interesse
local” e a de “suplementar a legislação federal e estadual no que couber” dentro do espaço que lhe
foi constitucionalmente assegurado “5. Giustina lembra que o artigo 8o da Constituição Estadual
reforça os princípios desta autonomia municipal. É o que aparece no seguinte depoimento do
Vereador proponente em plenário:
4 no capitulo III de sua obra “Leis municipais” e seu controle constitucional pelo Tribunal de Justiça, no capitulo sobre o município e
o controle de suas leis e atos normativos” Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2001.
5 Idem, p. 74.
Então, o Projeto é bastante simples, ele se baseia numa autorização ou numa permissão
que a LDB estabeleceu no sentido de que os Municípios que assim o desejarem poderão
criar o seu sistema municipal de ensino, coisa que antes não existia, nós só tínhamos o
sistema estadual e os municípios tinham que se adaptar. Pela LDB, os municípios que
desejarem, poderão fazer ter o seu sistema municipal de ensino, obviamente atendendo e
respeitando àquelas diretrizes gerais. O que traz de importância para o Município? O
Município passa a ter mais autonomia, uma série de tarefas, e uma série de deliberações
que, hoje, são tomadas pelo Conselho Estadual de Educação. O Município tendo o seu
sistema, passa a ser deliberado no âmbito municipal.
Entretanto, no parlamento as leis não nascem do nada. É no jogo parlamentar que a legislação
nasce e se efetua. A definição de jogo parlamentar chega a nós a través da leitura de Azevedo6
lembra a definição de Maurice Duverger em Polític Parties: “o objetivo desse jogo é controlar o
governo”. Ou seja, é mecanismo de performance do legislativo todo o movimento e articulação
necessária à elaboração das leis. Azevedo também cita a interpretação de Alexandre de Moraes
para definir processo legislativo: ”o termo processo legislativo pode ser compreendido num duplo
sentido, jurídico e sociológico. Juridicamente, consiste no conjunto coordenado de disposições que
disciplinam o procedimento a ser obedecido pelos órgãos competentes na produção das leis e at os
normativos que derivam diretamente da própria constituição, enquanto sociologicamente podemos
defini-lo como o conjunto de fatores reais que impulsionam e direcionam os legisladores a
exercitarem suas tarefas “····.
O inicio do projeto
A elaboração da Lei do Sistema Municipal de Ensino é fundamental porque ela estrutura as bases
de ação da Secretaria Municipal da Educação, na medida em que legitima e deslegitima
determinadas práticas e concepções dos atores políticos envolvidos. Se hoje, seis anos após sua
aprovação, a educação infantil permanece como aspecto secundário nas políticas públicas de
educação em Porto Alegre, sejam quais forem as razões que levaram a manutenção da oferta em
10%, podemos afirmar que será determinante para reorientar as políticas educacionais na área o
retorno aos seus princípios de base de prioridade da educação infantil.
Primeiro, porque a
descentralização das políticas educacionais em vigor assim o determina; segundo, porque o
6 Márcia Maria Correa Azevedo, Prática de Processo Legislativo, São Paulo, Atlas, 2001.
aprofundamento da democratização da esfera local depende da extensão do acesso à educação, no
reconhecimento do direito a educação em todos os níveis e modalidades.
A legislação do sistema de Porto Alegre começa sua trajetória em quatro de fevereiro de 1997,
data do inicio da tramitação do processo 482/97, Projeto de Lei do Legislativo nº 6 daquele ano.
Iniciativa do Vereador José Valdir7, o projeto tem como objetivo de adequar o projeto desenvolvido
pela Administração Popular à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional “e acima de tudo,
legalizar a experiência que está sendo desenvolvida no âmbito do município”, diz o autor na
apresentação do projeto.
O projeto de lei inicia com 23 artigos divididos em cinco títulos principais: princípios e fins da
educação, estrutura e organização do sistema, organização e administração do ensino, gestão
democrática do ensino público e dos profissionais da educação da rede pública municipal.
A
diferença é que o projeto de lei do sistema municipal de educação de Porto Alegre, além de ter por
base a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, tem também a Lei Orgânica do Município. A
nova proposta de lei
organiza os princípios e fundamentos do sistema municipal, já que a lei
original que organiza o sistema de ensino municipal, lei 1937, de três de janeiro de 1959, precisa
de atualização legal.
O processo tem andamento quando em 27 de janeiro de 1997, a socióloga Margareth
Araújo, da Assessoria Técnica Parlamentar da Câmara, oferece o Parecer 02/97. Ele
sugere a inclusão de dois incisos no corpo do projeto de José Valdir para definir a
abrangência do campo do ensino municipal “disciplina a educação escolar que se
desenvolve predominantemente por meio do ensino em instituições própria”, abrindo
possibilidade para
reconhecer o fato de que “a sociedade civil e o legislativo já
argumentam a possibilidade de criação de uma escola técnica agrícola para o
município”. De fato, a sugestão da socióloga nada acrescenta a mais em termos da
defesa da escola agrícola, simplesmente repete termos já inscritos na LDB. É o que
Araújo fará nas demais sugestões, principalmente a de incluir a necessidade de
estabelecer o Plano Municipal de Educação, este sim um item importante lembrado
pela assessoria.
7 Nascido em São Sebastião do Caí, Zé Valdir formou-se em História e lecionou durante vários anos em escolas públicas. Foi
Presidente da Fundação de Educação Social e Comunitária, fundou o PT na Zona Norte onde gestou a luta pelo ensino
público na Grande Santa Rosa.
Aspectos da tramitação
Entre fevereiro e outubro, portanto mais de sete meses, o projeto repousará na mesa do vereador
até retornar a tramitação original. Apregoado em 31 de outubro de 1997, o projeto logo é
encaminhado à Procuradoria, para a advogada Susiane Mespaquer relatar. É o chamado “Parecer
Prévio”, que estipula limites e horizontes para os projetos. O parecer não poderia ser mais polêmico
“entendemos que há uma invasão da competência privativa do Prefeito, conforme o disposto nos
incisos IV, VII, letra b e c, do artigo 94 da Lei Orgânica Municipal.” Mesmo com parecer contrário
da Procuradoria, o processo segue sua tramitação normal. È encaminhado ao Setor de Comissões
no mês seguinte, e em dezembro chega as mãos do Vereador Reginaldo Pujol, pela Comissão de
Constituição e Justiça.
Cada procedimento do projeto de Lei do sistema municipal deve ser observado. Ele representa de
fato que uma forma de controle da produção da lei está sendo exercido. É o que se observa
quando em dois de dezembro, portanto no mesmo dia em que Reginaldo Pujol dá seu parecer, José
Valdir oferece uma série de emendas ao projeto original. A primeira mudança é apenas uma
adequação vocabular. A segunda é de fato uma emenda de peso, pois define funções do Conselho
Municipal de Educação, já que agora “ao ter suas competências ampliadas é também, a instância
legítima para emitir e para pronunciar-se sobre convênios, acordos ou contratos relativos a
assuntos educacionais”. Outra série de pequenas emendas retoca aspectos técnicos, naquilo que se
convencionou chama de “boa técnica legislativa”. Tudo são formas de controle da produção da lei
do sistema, e o grande número de emendas identifica um projeto polêmico.
Logo após incluir as Emendas, José Valdir solicita a inclusão do projeto na ordem do dia, por força
do artigo 81 da Lei Orgânica Municipal. O projeto é então incluído na Sessão Extraordinária do dia
10 de dezembro. Em Plenário, novas emendas lhe são apensas, de números 8 a 12. A primeira, de
autoria de Lauro Hagemann e Raul Casa delega ao Conselho Municipal de Educação determinar a
qualificação mínima para o exercício do magistério; a segunda, de autoria de Nereu Dávila, propõe
que essa qualificação seja especificada no Plano de Carreira, “dado que tal matéria não é objeto,
pelo menos em sua maioria, de ingerência legal do Conselho Municipal de Educação”8. Há um
evidente conflito de interpretações: uma considera que o CME é um órgão capaz de deliberação
sobre recursos humanos, e outra concepção, restritiva, que propõe que o Conselho seja submetido
ao Plano de Carreira. Esta é certamente uma das emendas mais polêmicas do referido projeto.
8 Emenda no. 9, acrescimenot de artigo 22.
A trajetória do projeto nos discursos de plenário
Na sessão 105, o vereador José Valdir pronuncia-se sobre seu projeto de Lei. Ele revela que as
interpretações das áreas técnicas podem ser divergentes da interpretação política. Isto significa que
o jurídico e o político afetam-se mutuamente na produção da lei. Diz o Vereador
“A Procuradoria da Casa deu um parecer dizendo que esse Projeto é uma
invasão de competência, que é de iniciativa exclusiva do Executivo. Quero, não
contestar o parecer, dizer que essa posição é polêmica, porque eu não estou
criando uma estrutura nova, e sim propondo uma estrutura que é prevista em
uma lei hierarquicamente superior que é a LDB, e a Procuradoria da Casa nem a
menciona. A nova LDB atribui aos municípios, e se entende tanto o Poder
Legislativo como o Executivo, a competência e até o dever de criar os sistemas
municipais de ensino, e esta Casa já legislou sobre esse tipo de matéria.”
Gerson Almeida, líder da bancada do PT apresenta a Emenda 10 que explicita normas para a
elaboração do Lei do Sistema Municipal de Ensino, especialmente sua vinculação a legislação
nacional e a necessidade de qualquer alteração passar pelo Congresso Municipal de Educação. Para
o vereador, “as alterações de princípios já estabelecidas pela Lei do Sistema Municipal de Ensino
deverão passar pela aprovação da comunidade escolar”9.Além de preocupar-se com o PME,
Almeida tem uma outra preocupação: com a seção dos Profissionais da Educação. Sua emenda
renomeia esta parte, chamando todos os profissionais de Trabalhadores em Educação. A motivação
é ideológica: “Esta proposta contempla o espírito, já historicamente defendido pelos sindicatos de
Trabalhadores em Educação de âmbito estadual e nacional, de unificação e luta por avanços
comuns dos membros do magistério”.
O projeto, entretanto apesar dos debates, não chegou a ser votado, sendo arquivado ao final
daquela sessão, em 18 de dezembro de 1997. Neste momento,
chega um documento que é
anexado ao corpo do projeto e que é de grande valor. A Associação dos Trabalhadores em
Educação do Município de Porto Alegre (ATEMPA), ao perceber que o projeto de autoria de José
Valdir não é incluído nas sessões extraordinárias do final do ano, resolve enviar uma
correspondência à Presidência da Câmara, na figura do Vereador Clóvis Ingelfritiz, solicitando sua
inclusão. Para Maria Assunção dos Santos Silva, Diretora Geral da Entidade, “A Atempa entende
que a aprovação do referido projeto é possível ainda no inicio do próximo período legislativo”. A
9 Emenda no. 10, acréscimo no artigo 6.
entidade endossa o projeto do vereador, já que afirma “o posicionamento favorável quanto à
aprovação do projeto”. Isto corrobora a idéia de que o projeto é um ponto de luta da sociedade
organizada.
Em 1998, recomeça o processo legislativo. O projeto retorna a tramitação. A historia parece
arrastar-se. Primeiro é pedido o desarquivamento do projeto de lei em 16 de fevereiro. Novas
emendas são apresentadas pela Ver. Clênia Maranhão. Já chegamos a tantas emendas que José
Valdir, em abril de 1998 apresenta um Substitutivo que mantém a redação original e acrescenta as
emendas. O projeto passa a ter 25 artigos. O Substitutivo vai novamente à avaliação. Primeiro pela
Procuradoria do Município, onde a advogada Susane Mespasque retoma seu argumento de invasão
de privacidade. Neste momento, o substitutivo é o palco das atenções é já recebe emendas da
Vereadora Clenia Maranhão. 10
Depois de receber parecer da Procuradoria, o Substitutivo e suas emendas vão à CCJ para análise.
Fernando Zacchia, relator, assume como seu o argumento da procuradoria e defende a posição de
invasão de competência e acolhe os votos de todos os membros: Eloí Guimarães, João Motta ( PT),
Maristela Maffei e Reginaldo Pujol. A curiosidade: os vereadores do Partido dos Trabalhadores são
contrários ao projeto, e portanto, a regulação do sistema de ensino. Isto significa, em claro e bom
tom, que os vereadores do partido no governo abrem mão de prerrogativas do legislativo em nome
da governança. O problema é que, mesmo que fosse prerrogativa do Executivo, ele não havia
tomado a iniciativa de legislar sobre o próprio sistema.
Em junho de 1998, o processo, que parecia perdido, recebe um sopro de vida com as novas
emendas de autoria do Vereador Adeli Sell. Elas renovam minúcias do texto legal, para dar-lhe
caráter ampliado. José Valdir não parece ceder aos argumentos, inclusive a posição de sua
bancada, e requer inclusão do projeto na ordem do dia. O conflito político é interno ao partido que
está no governo. A partir daí, as emendas seguinte concentram-se mais no item Profissionais de
Educação e visam garantir a qualificação profissional do professor.
Do encaminhamento final
10 De onde sai o interesse da vereadora no projeto? Nascida em João Pessoa, na Paraíba, Clenia Maranhão destaca-se pela
defesa dos direitos da mulher, alertando para problemas como a mortalidade materna e a violência doméstica. De fato,
Maranhão destacou-se mais na área da defesa do consumidor - criou o projeto do Sistema Municipal de Defesa do
Consumidor do que a educação propriamente dita. Só há uma explicação possível: Maranhão vê a distância o potencial do
magistério e resolve investir no campo da ação educacional.
O processo corre pauta na Sessão Extraordinária do dia 30 de julho. O Ver. José Valdir encaminha
a votação do projeto. Na Ata da referida sessão, pode-se ver que ele agradece a presença dos
vereadores, já que a sessão estava se prolongando no horário – é que muitas vezes vencidos pelo
cansaço, os vereadores deixam a matéria para a sessão seguinte. Não foi o caso. E resume toda a
história “
“Tenho certeza que em função de entenderem a importância deste Projeto para a Cidade
de Porto Alegre. Um Projeto que foi protocolado em fevereiro do ano passado, tramitou, foi
discutido aqui nesta Casa, não pôde ser votado no final do ano passado, teve uma série de
Emendas que costuramos no substitutivo e este recebeu mais quatro Emendas. “
Para José Valdir, todas as emendas, inclusive as dos vereadores dos demais partidos vieram a
colaborar no espírito do projeto. Apesar do governismo da iniciativa, acolhe as emendar no sentido
de provocar a aprovação do projeto em plenário. Valdir não tem o apoio de seus colegas de partido
e necessita, para ver aprovado o projeto, colher apoio na oposição, e daí negocia as emendas. Para
Valdir não há como abandonar a Brecha na LDB que aponta a possibilidade do município ser sujeito
de sua lei da Educação e da prerrogativa do parlamento em ser ator nesse processo. Isso de fato
pertuba o Executivo, já que despreza inclusive a gerência que a Secretaria Municipal de Indústria e
Comércio (SMIC)
e o fato de que muitas escolas comunitárias estavam sob a organização da
Secretaria Municipal de Assistência Social. È o que se observa na seguinte passagem:
“Este é um Projeto importantíssimo para a Cidade de Porto Alegre porque se
utiliza de uma brecha criada na LDB onde os municípios possam criar o seu
sistema municipal de ensino e com isso passar a ter uma série de incumbências
e atribuições que hoje pertencem ao Estado ou ao Conselho Estadual de
Educação. Com este Projeto, o Município vai poder gerir melhor a educação e
fazer uso de uma série de atribuições, fortalecerem o Conselho Municipal de
Educação e resolver uma lacuna em relação à questão da educação infantil da
rede particular que passa a integrar o sistema e passa a ser gerenciada também
pela Secretaria Municipal de Educação e não mais pela Secretaria da Saúde e
pela SMIC. Este Projeto se inspira, basicamente, na LDB, apresentada ao
Congresso Nacional pelo Darci Ribeiro e incorpora, também, toda a experiência
de gestão democrática. “
Entre os elementos do projeto de lei que o vereador chama atenção, estão
aqueles relacionados diretamente ao projeto político em andamento na prefeitura.
Como se sabe, o Partido dos Trabalhadores possui seu próprio projeto de educação,
que é produto de sua experiência nacional, por um lado, e por um projeto de educação
popular. Ao longo de 16 anos, um dos grandes projetos foi a implantação das escolas
cicladas11 no município, que representou avanços mas também foi objeto de diversas
críticas. Diz José Valdir em depoimento no Plenário da Câmara:
“Praticamente são essas as inovações que apresentamos, além do artigo sobre
a gestão democrática do ensino público, que também são elementos da
experiência de educação não só em Porto Alegre, de gestão democrática da
escola, que estamos incluindo no Projeto. Portanto, o Projeto, no mínimo, não é
polêmico. Polêmico é a gente considerar que é uma invasão de competência, já
que ele é uma imposição da LDB, e a maior parte dos artigos que estamos
apresentando é simplesmente uma transcrição da LDB.”
O Ver. Carlos Garcia12, do PSB encaminhou a votação do processo juntamente. O PSB, aliado da
base de governo, e, portanto da aliança no legislativo, apóia as iniciativas afins a educação. O
depoimento revela a importância da Comissão de Educação e Cultura da Câmara, como fórum
particular no qual o debate pode anteceder o contexto de plenário.
“Nós, realmente, acompanhamos toda a tramitação do Projeto, as dificuldades, o número
de Emendas, no final do ano. E entrou, com novo Substitutivo, na semana passada, a
Comissão de Educação recebeu inúmeros professores da Secretária Municipal e mais a
ATEMPA. Então, portanto, o nosso encaminhamento, o encaminhamento do PSB e,
acredito, que dos demais Vereadores presentes, é que aprovamos o quanto antes este
Projeto para que o Município possa ter o seu sistema. “
Em votação em 30 de junho, o substitituvo é aprovado, com uma emenda, e todas as
subemendas e o projeto original é prejudicado. A lei é promulgada em 18 de agosto de 1998, por
Raul Pont e José Clóvis Azevedo, Secretário Municipal de Educação. Para José Valdir, é preciso
salientar que a diferença entre os projetos é pequena e que portanto, rejeita os termos dos órgãos
11 A Escola Ciclada é a nova maneira das escolas públicas municipais se organizarem. A antiga organização de 1ª a 8ª série
deu lugar aos ciclos de aprendizagem. Seu objetivo é manter as crianças e os jovens na escola, aprendendo cada vez mais.
O Ensino Fundamental foi estruturado em três ciclos de aprendizagem, e cada ciclo tem duração de três anos:
12
técnicos que participaram da discussão. A idéia é de que “o plenário é soberano”. O conflito fica
evidente, é parte do jogo político que as deliberações de plenário podem ser consideradas
superiores aos dos órgãos técnicos – sendo passível, no caso, de questionamento pelo Prefeito
junto a Justiça. É o que se reconhece no parágrafo seguinte da mesma sessão. Diz José Valdir:
“O Parecer estaria completamente imune a qualquer dúvida se tratasse de um
outro
tipo
de
estrutura
onde
a
sua
criação
está
prevista
numa
lei
hierarquicamente superior, a LDB que determinou que todos os municípios têm
que criar os seus sistemas municipais de ensino. A LDB propõe esses sistemas
municipais de ensino para descentralizar a gestão do ensino público e também
no sentido de conceder autonomia aos municípios para que possam apresentar
os seus projetos político-pedagógicos e resgatar a função social e cultural da
escola, obviamente inovando naquilo que não está previsto na própria LDB
como normas e políticas que têm que existir em todos os sistemas que têm que
ter um caráter nacional. “
Curiosamente, ao final, a defesa política do projeto não é feita a partir de
uma criação original do legislativo. Ao contrário, o legislador reivindica o poder de
imitar a LDB, afirmando que se trata de mera transcrição. Quer dizer, em
determinados momentos do discurso, reivindica-se a autonomia local, noutros, oq que
vale é a imitação da legislação nacional no que significa de avanço na constituição de
um instrumento legal municipal. Esta ambigüidade de posição leva a questão
fundamental: quais os espaços de inovação quando o parlamento abre mão quando de
prerrogativas e apenas contenta-se em reprodução da legislação? Para o vereador,
apenas a determinação do Sistema Municipal satisfaz a este critério. Talvez seja pouco.
Diz:
“A maior parte do Projeto é simplesmente a transcrição do que está já
amarrado à lei maior, a LDB. O art. 1º trata de questões gerais sobre a
educação que recoloca o que, aliás, já está na Constituição: a educação como
um dever do Estado e direito do cidadão. Praticamente é uma transcrição da
LDB, assim como o art. 2º que coloca os princípios que devem ser obedecidos
pelos sistemas municipais; o art. 4º também está dentro, a redação é um pouco
diferente, mas está dentro do espírito da LDB. Toda a estrutura e organização
do sistema é exatamente o que já está previsto na LDB, assim como a
competência do Município, no art. 6º. As únicas inovações que estamos fazendo
é em relação ao papel coordenador, onde a Secretaria Municipal de Educação
tem que ser a gerenciadora de todo o sistema e também o art. 8º quando se
coloca qual o papel do Conselho Municipal de Educação que já existe em Porto
Alegre, funcionando, e obviamente não pode estar fora do sistema municipal. “
Não foi discutido na sessão seguinte, tramitou e apenas correu pauta. Na 28a. Sessão, o vereador
retornou a avaliar seu projeto. De fato, uma das características da tramitação legislativa é a de
exigir que um processo seja submetido a no mínimo três sessões plenárias. Isto sugere que é
preciso um trabalho de memória política para consolidar a imagem e o objeto do projeto. Em
casos como o projeto de lei em pauta, com longos períodos de idas e vindas, esta função aviva na
memória dos parlamentares a intenção do projeto. È o que vereador faz na seguinte passagem.
“Sr. Presidente e Srs. Vereadores, eu pretendo, ainda na próxima Sessão, voltar
a debater Projeto de minha autoria que está em segunda Sessão, que é o
Projeto que institui o sistema municipal de ensino. Por hora, quero apenas
esclarecer a esta Casa alguns pontos preliminares. O primeiro é lembrar que
este Projeto esteve para ser votado ao apagar das luzes do ano passado e,
depois de ter entrado na Ordem do Dia, foi sendo sistematicamente rechaçado
da Ordem do Dia, até que, por fim, se disse que o Projeto não poderia ser
votado por falta de tempo para um maior aprofundamento. O Projeto não foi
votado, embora eu insistisse, na época, que ele não era polêmico porque
praticamente não trazia nada de novo, a não ser o que já está dito na LDB. E, é
em cima dessa lei maior, lei federal - LDB - que este Projeto está sendo
concebido.”
Um projeto de lei numa administração cuja palavra de ordem é a participação social, não pode ser
construído exclusivamente pela iniciativa do legislativo. Faz parte do reforço ideológico, da idéia de
que um vereador é membro de um partido e de uma ideologia política, reforçar continuamente as
bases que produzem a identidade parlamentar. È o caso da menção aos documentos das entidades
de classe. Este ponto é essencial a nossa discussão sobre o regime de colaboração. A razão é que a
aceitação e defesa da construção coletiva dos projetos de lei é justamente o ponto que permite a
articulação do legislativo ao campo do regime de colaboração.
“Outro esclarecimento: este Projeto foi elaborado com todo o cuidado e de
forma coletiva, com a mais ampla participação de todos os setores diretamente
envolvidos ou relacionados com a questão da educação. É um Projeto que foi
discutido com a Associação dos Trabalhadores da Educação do Município; foi
discutido com o Conselho Municipal de Educação; foi discutido, também, com a
Secretaria Municipal de Educação o que demandou várias reuniões. Nós fizemos
quase que uma síntese, e que resultou neste Projeto, que estava na Ordem do
Dia no final do ano passado. Próximo da votação, que acabou não ocorrendo no
final do ano passado, se fez uma série de emendas para aperfeiçoar o Projeto.
“·.
Este depoimento tem ainda a vantagem de apresentar uma visão de processo particular. Pois se de
fato há uma defesa da construção coletiva, por outro, ela é seletiva: escolhe-se quem pode e quem
não pode participar do processo. Basta notar a ausência, no elenco citado, de membros da
comunidade ou de alunos. Aqui, os atores são os professores e os profissionais de ensino. Serão
somente? Dentro da prática parlamentar, a questão da autoria é de grande importância. O projeto
do sistema recebeu diversas emendas, o que fragmenta a autoria do projeto. Valdir antecipou-se a
qualquer vereador de outro partido na garantia de sua autoria, apresentando ele um Substitutivo
ao projeto. È o que ocorre. Isto significa por um lado, a adoção de uma estratégia que visa manter
no mesmo campo aliado a estruturação do sistema municipal, e ao mesmo tempo, garantir a
propriedade sobre o capital eleitoral que dele venha a advir.
“Emendas que também eram fruto de discussões posteriores, e esta é a única
razão para apresentarmos um Substitutivo. Na verdade, o Substitutivo que
estou apresentando, é que incorporou todas aquelas emendas - acho que mais
de meia-dúzia - que visavam aperfeiçoar o Projeto, para que não precisássemos
votar tantas emendas, e também para atender a uma preocupação desta Casa,
que teria mais tempo para discussão, já que se alegava, naquele momento, que
a Casa não tinha conhecimento, que não teve tempo de discutir. Apresentei um
Substitutivo ao meu Projeto, incorporando aquelas contribuições todas, pois se
o Projeto tivesse sido votado no ano passado, iria ser votado com as emendas.”
Conclusão
A definição do lugar da ação do parlamento na constituição do sistema de ensino de Porto Alegre
pode ser vista no processo de elaboração da lei. Se a processualidade no interior do poder
legislativo tem algo a nos dizer é que o modo como é conduzido um projeto no campo da educação
pode revelar se é democrática ou não sua constituição, se os atores envolvidos participam ou não,
se as tensões políticas contribuiem ou não para aprimorar um projeto.
Vimos que os vereadores enfrentam muitos dilemas e os desafios na elaboração da lei do sistema
municipal de ensino: interesses contrários à administração local, a divisão interna do partido e a
necessidade de contar com alianças determinam a aprovação ou rejeição de um projeto de lei.
Uma coisa fica como lição: se executivo, legislativo e comunidade não estabelecerem um “regime
de colaboração interno” próprio, a apartir de uma comunicação ágil, eficaz e democrática, todo o
edifício da proposta de colaboração entre os vários níveis de governo pode vir abaixo.
Outro ponto importante que o acompanhamento do caminho que no interior do legislativo
percorreu o projeto 482/97 é que contraditoriamente, a resposta política tem tanto mérito quanto a
técnica. Quer dizer, é graças a uma consciência da necessidade política de uma lei que, inclusive
argumentos técnicos podem ser rejeitados. Até que ponto isto é benéfico para a sociedade, é um
problema sem resposta.
BIBLIGRAFIA:
AZEVEDO, Márcia Maria Correa. Prática de Processo Legislativo. São Paulo,
Atlas, 2001.
CAMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE. Projeto de Lei do Legislativo
482/97.
Para um balanço do PNE. In: Brasil. Plano Nacional de Educação. Rio de
Janeiro, DPA, 2001.
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GENESE HISTÓRICA DO SISTEMA MUNICIPAL DE