UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
DOUTORADO EM ENSINO DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
O ENSINO DE ESTATÍSTICA NA FORMAÇÃO INICIAL
DO ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO
GERALDO BULL DA SILVA JÚNIOR
Orientadora: Profa. Dra. Celi Aparecida Espasandin Lopes
Tese apresentada ao Doutorado em Ensino
de Ciências e Matemática, da Universidade
Cruzeiro do Sul, como parte dos requisitos
para a obtenção do título de Doutor em
Ensino de Ciências e Matemática.
SÃO PAULO
2014
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR
QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA,
DESDE QUE CITADA A FONTE.
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA
BIBLIOTECA CENTRAL DA
UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
S58e
Silva Júnior, Geraldo Bull da.
O ensino de estatística na formação inicial do engenheiro de
produção / Geraldo Bull da Silva Júnior. -- São Paulo; SP: [s.n],
2014.
213 p. : il. ; 30 cm.
Orientadora: Celi Aparecida Espasandin Lopes.
Tese (doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Ensino de
Ciências e Matemática, Universidade Cruzeiro do Sul.
1. Estatística 2. Análise de conteúdo 3. Engenharia de produção
4. Educação estatística -Processo de ensino–aprendizagem 5.
Estatística – Ensino superior. I. Lopes, Celi Aparecida Espasandin.
II. Cruzeiro do Sul. Programa de Pós-Graduação em Ensino de
Ciências e Matemática. III. Título.
CDU: 519.2(043.2)
UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
O ENSINO DE ESTATÍSTICA NA FORMAÇÃO INICIAL
DO ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO
Geraldo Bull da Silva Júnior
Tese de doutorado defendida e aprovada
pela Banca Examinadora em 05/12/2014.
BANCA EXAMINADORA:
Profª. Dra. Celi Aparecida Espasandin Lopes
Universidade Cruzeiro do Sul
Presidente
Prof. Dr. Juliano Schmiguel
Universidade Cruzeiro do Sul
Profaª. Dra. Cintia Aparecida Bento dos Santos
Universidade Cruzeiro do Sul
Prof. Dr. Celso Ribeiro Campos
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Profª. Dra. Eliane Scheid Gazire
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
A Isaura, pelo apoio desde sempre,
companheira de todos os momentos,
conselheira, incentivadora e leitora
primeira de tudo que escrevo.
Para Ana Carolina, sempre presente
e ainda inspiração para o pai.
Também para Clara, pois é uma nova vida
continuando a vida.
Há muitas filosofias perigosas por aí.
Por que elas são perigosas?
Porque contém elementos
que paralisam o nosso julgamento [...]
Uma filosofia, no fim das contas,
não é como uma peça musical
que pode ser fruida por si mesma.
Espera-se que ela nos oriente
por meio da confusão
e talvez proporcione
um esquema para a mudança.
(Paul K. Feyerabend)
A evolução do conhecimento científico
não é unicamente de crescimento
e de extensão do saber,
mas também de transformações, de rupturas,
de passagem de uma teoria para outra.
As teorias científicas são mortais
e são mortais por serem científicas.
(Edgar Morin)
AGRADECIMENTOS
A Isaura, por tudo e para sempre.
À Profa Dra Celi Espasandin Lopes, por ter acreditado e pela nova amizade que
fica para a vida.
Aos professores do programa de Pós-Graduação em Ciências e Matemática da
Universidade Cruzeiro do Sul.
Aos funcionários do programa de Pós-Graduação pela atenção.
À Prof a Dra Eliane Scheid Gazire, à Profa. Dra Cintia Ap. Bento dos Santos, ao
Prof. Dr. Celso Ribeiro Campos e ao Prof. Dr. Juliano Schmiguel, pelas
contribuições para a finalização deste trabalho.
À Prof a Dr a Maria Delourdes Maciel, pela leitura cuidadosa e contribuições
para a realização deste trabalho.
Aos colegas do GEPEEM.
Aos colegas da EAMES.
Aos colegas do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e
Matemática da Universidade Cruzeiro do Sul, pelos laços de amizade criados e
que ficarão mesmo com o distanciamento.
Aos professores e funcionários da FAESA, pelo apoio e incentivo durante a
realização do doutorado.
Ao professor Samir Aride, pelo precioso apoio oferecido em relação à História
das engenharias, além do incentivo durante a realização do doutorado.
À professora Maria Alice V. F. de Souza, cujo apoio foi fundamental para que a
pesquisa se iniciasse.
À professora Daniela Bertolini Depizzol pela inestimável compreensão e a
paciência dispensada.
À Profa Dra Aureni da Silva Magalhães revisão de ortografia e redação.
SILVA JR, G. B. O ensino de estatística na formação inicial do engenheiro de
produção. 2014. 213 f. Tese (Doutorado em Ensino de Ciências e Matemática) Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2014.
RESUMO
Esta tese apresenta uma pesquisa qualitativa e interpretativa, cujo trabalho de
campo foi desenvolvido em uma Instituição Federal de Ensino da Grande Vitória,
Espírito Santo. Seu objetivo foi investigar como se dá a formação estatística de
estudantes de um Curso Superior na área de Engenharia de Produção, a partir de
um referencial teórico baseado na Filosofia da Ciência e nas áreas de Educação
Crítica e Educação Estatística. A coleta de dados contou com depoimentos de cinco
alunos escolhidos e/ou sorteados, além da professora de Estatística de uma turma
desse curso. A partir das questões norteadoras buscou-se conhecer três aspectos:
as demandas de formação explicitadas pelos estudantes de Engenharia de
Produção em relação à Estatística; quais fragilidades e concepções equivocadas
referentes ao conhecimento estatístico são reveladas e percebidas em alunos da
Engenharia de Produção; como o Plano de Curso e as aulas de Estatística dialogam
com as necessidades dos futuros engenheiros de Produção. Na construção e
análise dos dados, colhidos por meio de um questionário e de entrevistas
semiestruturadas gravadas em áudio, utilizou-se a Análise de Conteúdo. Tais
entrevistas foram realizadas no decorrer do segundo semestre de 2013 e do
primeiro de 2014, sendo três sessões com cada aluno e duas com a professora. Do
processo de análise dos dados emergiram onze subcategorias, indicando um
contato com a Estatística anterior à graduação dentro de padrões tradicionais, que
resultou em concepções e fragilidades reforçadas pelas práticas do Nível Superior.
As principais demandas verificadas são: a maior necessidade de articular saberes
dos componentes da matriz curricular com a Estatística, de orientar seu ensino para
o domínio da literacia e de desenvolver o pensamento estatístico, vencendo a
fragmentação de saberes que pode ser constatada. A Educação necessita superar a
tarefa de tornar o indivíduo hábil para manipular conceitos, desafiando-o
constantemente a romper o estágio de conhecimento em que se encontra.
Palavras-chave: Ensino superior, Engenharia de produção, Ensino de estatística,
Formação inicial, Análise de conteúdo.
SILVA JR, G. B. The statistical education in initial training production engineer.
2014. 213 f. Tese (Doutorado em Ensino de Ciências e Matemática) - Universidade
Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2014.
ABSTRACT
This thesis presents a qualitative and interpretative research, which was developed
in a Federal Institution of Education of Vitória, Espírito Santo. Its objective was to
investigate how a statistical program of students of a Degree in Production
Engineering area is produced from a theoretical point of view based on the
philosophy of science and also in the areas of Critical Education and Education
Statistics. Data collection included five chosen and / or drawn students, and also the
statistic teacher of this specific class. From the guiding questions we tried to
investigate three aspects: training demands explained by students of Industrial
Engineering in relation to Statistics; what kind of weaknesses and misconceptions on
the statistical knowledge are revealed and realized by students of Production
Engineering; the way the Course Plan and Statistics classes dialogue with the needs
of the future production engineers. The construction and analysis of data were
collected through a questionnaire and semi-structured interviews and recorded in
audio by the use of Content Analysis Methodology. These interviews were conducted
during the second half of 2013 and the first of 2014, three sessions with each student
and two with the teacher. Eleven subcategories emerged from the data analysis
process, which indicated a prior contact whith Statistics among traditional graduation
patterns, which resulted in conceptions and weaknesses reinforced by practices of
Higher Education. The main verified demands are: a greater need to articulate
knowledge of the components of the curriculum with Statistics, to guide its teaching
to the skill of literacy and to develop statistical thinking, overcoming the fragmentation
of knowledge that could be noticed. Education needs to overcome the task of making
an individual able to manipulate concepts, challenging him constantly to break the
state of knowledge in which he lies.
Keywords: Academic practices, Industrial engineering, Teaching statistics, Initial
education, Content analysis.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1
Quantificação pelo nível de ensino que a pesquisa abordou. ....... 30
Quadro 2
Objetivos descritos nas pesquisas encontradas na revisão
bibliográfica. ....................................................................................... 32
Quadro 3
Termos e ideias relacionados à Estatística. .................................. 107
Quadro 4
Termos ligados à representação gráfica adequada ao tipo de
variável. ............................................................................................. 109
Tabela 1
Resumo da faixa etária dos respondentes. ................................... 106
Tabela 2
Totais de alunos que conheciam a melhor representação de
variáveis qualitativas e quantitativas. ............................................ 108
Tabela 3
Totais de alunos que conheciam a melhor representação de
variáveis discreta e contínua. ......................................................... 108
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABEPRO
Associação Brasileira de Engenharia de Produção
ASA
American Statistics Association
BDTD
Biblioteca Brasileira de Teses e Dissertações
CAPES
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior
CEQ
Controle Estatístico da Qualidade
CNE/CES
Conselho Nacional de Educação/ Câmara de Ensino
Superior
EJA
Educação de Jovens e Adultos
EM
Engenharia de Métodos
EMC
Educação Matemática Crítica
EP
Engenharia de Produção
ENCE
Escola Nacional de Ciências Estatísticas
GAISE
Guidelines for Assessment and Instruction in Statistics
Education
GQ
Gestão da Qualidade
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MEC
Ministério da Educação
MF
Mecânica dos Fluidos
MS Excell
Microsoft Excel
MTE
Ministério do Trabalho e Emprego
PCP
Planejamento e Controle da Produção
PDCA
Plan, Do, Check, Act
PIB
Produto Interno Bruto
PNAD
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PUC
Pontifícia Universidade Católica
RH
Recursos Humanos
TCC
Trabalho de Conclusão de Curso
TICs
Tecnologias de Informação e Comunicação
UFRJ
Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRN
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UNIFRA
Centro Universitário São Francisco
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 17
CAPÍTULO 1 - O PERCURSO DA PESQUISA ........................................................ 27
1.1
Introdução ................................................................................................... 27
1.2
A Revisão Bibliográfica .............................................................................. 27
1.2.1
Considerações ............................................................................................ 40
1.3
O referencial teórico ................................................................................... 41
1.4
A metodologia ............................................................................................. 44
1.5
O Contexto da pesquisa ............................................................................. 48
1.6
Instrumentos para coleta de dados .......................................................... 48
1.6.1
Sobre a aplicação do questionário ........................................................... 49
1.6.2
Sobre as entrevistas................................................................................... 49
1.7
A análise do conteúdo ............................................................................... 53
1.8
Considerações sobre o capítulo ............................................................... 58
CAPÍTULO 2 - CONHECIMENTO MODERNO,
AS ENGENHARIAS E
A
ESTATÍSTICA. .......................................................................................................... 59
2.1
Introdução ................................................................................................... 59
2.2
A Revolução Científica e a Ciência Moderna ........................................... 60
2.3
A Revolução Industrial e a organização das cadeias produtivas ........... 62
2.4
As Engenharias e a Ciência Moderna ....................................................... 63
2.5
Alguns elementos dos desenvolvimentos histórico e sociológico da
Estatística .................................................................................................... 68
2.6
O conhecimento científico diante aos movimentos da sociedade......... 71
2.7
Considerações sobre o capítulo ............................................................... 74
CAPÍTULO 3 - O ENSINO DE ESTATÍSTICA NO NÍVEL SUPERIOR .................... 75
3.1
Introdução ................................................................................................... 75
3.2
A fragmentação do conhecimento: algumas consequências................. 76
3.3
A complexidade do ensino de conceitos científicos ............................... 79
3.4
A formação acadêmica fragmentada ........................................................ 84
3.5
Conhecimento, Educação e relações de poder. ...................................... 86
3.6
Educação Crítica: um cenário alternativo à Educação tradicional ........ 89
3.7
Propostas de mudança .............................................................................. 91
3.8
Articulações do GAISE com alguns teóricos ......................................... 100
3.9
Considerações sobre o capítulo ............................................................. 102
CAPÍTULO 4 - A CONSTRUÇÃO DOS DADOS .................................................... 105
4.1
Introdução ................................................................................................. 105
4.2
Dados das respostas do questionário .................................................... 106
4.3
Dados das respostas da entrevista......................................................... 111
4.4
Respostas à pergunta 1 ........................................................................... 111
4.4.1
Considerações e subcategorias .............................................................. 113
4.5
Respostas à pergunta 2 ........................................................................... 114
4.5.1
Considerações e subcategorias .............................................................. 121
4.6
Respostas à pergunta 3 ........................................................................... 123
4.6.1
Considerações e subcategorias .............................................................. 126
4.7
Respostas à Pergunta 4 ........................................................................... 126
4.7.1
Considerações e subcategorias .............................................................. 131
4.8
Respostas à Pergunta 5 ........................................................................... 133
4.8.1
Considerações e subcategorias .............................................................. 135
4.9
Respostas à Pergunta 6 ........................................................................... 136
4.9.1
Considerações e subcategorias .............................................................. 142
4.10
Respostas à Pergunta 7 ........................................................................... 144
4.10.1 Considerações e subcategorias .............................................................. 148
4.11
Considerações sobre o capítulo ............................................................. 149
CAPÍTULO 5 - A ANÁLISE DOS DADOS .............................................................. 151
5.1
Introdução ................................................................................................. 151
5.2
Os documentos oficiais ........................................................................... 151
5.3
Análise das respostas do questionário .................................................. 154
5.3.1
Considerações .......................................................................................... 156
5.4
Análise das repostas das entrevistas ..................................................... 157
5.4.1
Aplicabilidade ........................................................................................... 157
5.4.2
Repasse e comunicação de dados e informações ................................ 160
5.4.3
Controle ..................................................................................................... 163
5.4.4
Previsão ..................................................................................................... 164
5.4.5
Manipulação .............................................................................................. 166
5.4.6
Pensamento fragmentado ........................................................................ 168
5.4.7
Desenvolvimento de habilidades ............................................................ 171
5.4.8
Mudança de comportamento ................................................................... 173
5.4.9
Relevância ................................................................................................. 174
5.4.10 Complexidade ........................................................................................... 176
5.4.11 Relatividade .............................................................................................. 177
5.5
Considerações sobre o capítulo ............................................................. 178
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 180
Introdução ................................................................................................. 180
Resultados e reflexões ............................................................................. 181
Perspectivas, implicações e/ou recomendações................................... 185
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 191
ANEXOS ................................................................................................................. 199
ANEXO A Plano de curso de Estatística I .............................................. 199
ANEXO B Plano de curso de Estatística II ............................................. 202
ANEXO C Lista de exercícios ................................................................. 204
ANEXO D Prova ....................................................................................... 207
APÊNDICES ........................................................................................................... 209
Apêndice A Termo de consentimento livre e esclarecido .................... 209
Apêndice B Questionário de perfil estudantil ........................................ 210
Apêndice C Entrevista semiestruturada ................................................. 212
17
INTRODUÇÃO
Temos finalmente de perguntar pelo papel de todo o
conhecimento científico acumulado no
enriquecimento ou no empobrecimento prático das
nossas vidas, ou seja, pelo contributo positivo ou
negativo da ciência para a nossa felicidade
(Boaventura de Souza Santos).
Início da trajetória profissional
Em 1979, ao iniciar carreira de professor de Matemática em turmas
preparatórias para exames supletivos, a necessidade de buscar articulações entre
os conteúdos do currículo escolar e a realidade sociopolítica não tinha oficialmente a
importância que atualmente lhe é dada no Brasil. Nessa época, tais ideias não eram
tão consideradas nas propostas de ensino quanto nos dias atuais, principalmente no
que diz respeito a aspectos sociopolíticos. No caso da Matemática, por exemplo,
ainda predominava como legado do Movimento da Matemática Moderna, o uso da
linguagem da teoria dos conjuntos e a preocupação com as estruturas matemáticas
em si.
Fui aluno em um curso de graduação em Matemática Pura, no qual os
fundamentos das disciplinas foram tratados com extremo zelo pelos professores. O
conteúdo de cada uma delas era exposto e explorado em profundidade, sem
considerar a necessidade de aplicações numéricas imediatas. Além disso, não se
vislumbravam possibilidades de verificar a articulações entre o conhecimento
matemático e a realidade fora da Universidade. Dentro desse quadro, as disciplinas
não guardavam relações entre si além do fato de serem pré e/ou co-requisito de
outras. Passar por um curso no qual as atenções foram direcionadas para os
fundamentos científicos foi importante. Ajudou a avaliar e a sustentar a crítica em
relação a diferentes ideias que professores e pedagogos consideraram inovadoras
nas décadas de 1980 e 1990 e que, posteriormente, foram vistos como modismos
educacionais passageiros.
Apesar de concluir um curso que legava um conhecimento matemático bem
estruturado, a minha formação inicial para o magistério teve limitações em relação a
18
conhecimentos sobre Didática da Matemática, por exemplo. Na época do início da
carreira, o modelo didático vigente era baseado no planejamento de aulas em que
se dava especial destaque aos detalhes técnicos de cada conteúdo e ao
funcionamento das propriedades. Além de não se considerar necessário articular
saberes matemáticos aos de outros campos, sequer se pensava em utilizar o
conhecimento de origem matemática como instrumento de crítica da realidade fora
da escola. O usual (e assim eu também procedia) era o professor listar e organizar
os tópicos de um tema a ensinar. Normalmente a escolha era a partir do currículo
estabelecido pela escola ou pelo livro didático e não se cogitava tratar de fatos
sociais e políticos que existem fora do universo da Matemática denominada pura.
A retomada dos estudos: do começo da transformação de ideias à chegada ao
Doutorado
Em 1992, cursando a Licenciatura em Matemática1, tive oportunidade de
entrar em contato com disciplinas diferentes daquelas contempladas nas matrizes
curriculares dos cursos de Matemática da década anterior, o que me ajudou a
perceber diferenças entre as profissões de Matemático e de Professor de
Matemática. Estudei História e Filosofia da Matemática e fui aluno de uma
professora de Prática de Ensino2 ligada ao Projeto Fundão3, que funciona na
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A partir de então passei a ver
possibilidades de mudar a abordagem dos conteúdos de ensino sem necessitar abrir
mão do rigor e dos fundamentos. Inicialmente, busquei novos métodos para abordar
conteúdos que tornassem meu próprio trabalho mais agradável e a aprendizagem
dos alunos mais prazerosa.
Em 1995, ao mudar do Rio de Janeiro para fixar residência em Vitória,
Espírito Santo, pude mudar a sequência de desenvolvimento dos conteúdos de
1
Licenciatura em Matemática na Faculdade de Humanidades Pedro II, Rio de Janeiro.
2
Neide Parracho Sant' Anna.
3
O Projeto Fundão contribui principalmente na atualização de professores em relação à inovação
metodológica e aprofundamento do conhecimento de Matemática, Física e Biologia. No Projeto
Fundão existem grupos temáticos responsáveis por elaborar, testar, reformular e divulgar propostas
inovadoras para o ensino das áreas citadas. Das ações do Projeto Fundão resultam publicações de
livros, apostilas e organização de encontros para professores.
19
Matemática no segundo ano do Ensino Médio de um colégio em que trabalhei. Isso
foi feito visando um melhor suporte matemático ao ensino de Genética. Nesse
colégio, até 1994, os conteúdos de Análise Combinatória e Probabilidades eram
abordados apenas no fim do ano. Enquanto isso, a Biologia que necessitava desse
suporte, não era auxiliada pela disciplina de Matemática. Esse cruzamento de
caminhos durou mais de uma década, com resultados satisfatórios para as duas
disciplinas. Enquanto a Biologia passou a se apoiar mais na Matemática, esta por
sua vez passou a ter outros contextos de utilização, possibilitando emergir suas
relações com disciplinas de outros campos de estudo.
No Brasil, o trabalho do professor das diferentes Ciências apresenta
consequências de uma visão fragmentada e especializada de como o conhecimento
científico deve ser desenvolvido. No caso das Engenharias, por exemplo, existem
currículos fragmentados, nos quais não se explicitam ligações entre as diferentes
áreas de conhecimento. Sobre a fragmentação de saberes e o excesso de tópicos
de ensino, Aguiar Junior et al. (2003) comentam sobre um importante aspecto dessa
realidade:
a fragmentação é normalmente o resultado de uma tentativa de se
promover o ensino de um excesso de conceitos e detalhes que, numa
primeira abordagem, impedem o estudante de compreender aquilo que é
essencial [...] além disso, um excesso de conteúdos, o que traz uma ideia
enganosa de “aprofundamento” [...] trata-se de um falso aprofundamento
[...] que dificulta a formação de uma visão sistêmica e relacional dos
processos [...] faz-se necessário selecionar ideias-chave que melhor
organizem a compreensão (AGUIAR JUNIOR ET AL, 2003, p. 4-5).
Esse quadro de fragmentação faz com que se mantenham as fronteiras
entre campos de saber praticamente intactas e vistas como intransponíveis. Um
exemplo é a abordagem da Probabilidade, que tem aplicações na Genética. Quando
ambas são estudadas separadamente, suas articulações não são evidenciadas, nem
facilmente percebidas pelos estudantes.
O passo seguinte na consolidação de minhas ideias sobre a aproximação de
saberes foi dado ao cursar duas especializações, na área do magistério em Vitória,
Espírito Santo. Nas duas ocasiões consegui apresentar formas de associar o saber
matemático ao de outros campos. Na primeira, obtive o título de especialista em
20
docência do Ensino Superior (em 2004)4, na qual associava o ensino da função afim
aos conteúdos de Cinemática (mais precisamente o movimento uniforme e o
uniformemente variado). Em 2006 obtive o título de especialista em Educação
Matemática, na Faculdade Saberes5, tratando de possibilidades de ligar saberes da
Biologia e da Matemática. Nesse trabalho procurei apresentar formas de aproximar o
ensino dessas Ciências.
Entre o primeiro e o segundo trabalho de especialização foram feitas leituras
importantes que ajudaram a amadurecer a ideia sobre como tratar o saber escolar, o
conhecimento científico e formas de articular diferentes disciplinas. As leituras me
auxiliaram a perceber como as criações matemáticas são ligadas ao contexto
histórico de cada época. Essas obras lidas entre as duas especializações chamaram
a atenção para o fato do ensino de Matemática poder romper com a prática de
organizar e/ou classificar o conhecimento científico em campos excessivamente
delimitados. Além disso, ajudaram a perceber que por trás de um procedimento
tradicional podem estar ocultas formas de perpetuação de poder de um grupo social
ou maneiras de conceber instrumentos com objetivo de ocultar aspectos
sociopolíticos do conhecimento.
No caso do ensino das Ciências, surgiu a curiosidade de saber quais seriam
as intenções que sustentam as tradições por trás de práticas fragmentadas, que
tratam o conhecimento disciplinado e com rígidas fronteiras a serem respeitadas.
Isso me alertou para a principal consequência da fragmentação, que é o
reducionismo cada vez maior e a criação de mais disciplinas para tratar aspectos
cada vez mais particulares.
O primeiro trabalho de especialização, que tratava das articulações entre o
Ensino da Física e da Matemática, foi o início de uma trajetória que continuou no
segundo trabalho, no qual buscava ligações da Biologia com a Matemática. Após
esses dois trabalhos, cheguei à dissertação produzida durante o Mestrado
Profissional em Ensino de Ciências e Matemática, que foi cursado na Pontifícia
4
SILVA JÚNIOR, G. B. O ensino de função do primeiro grau. Monografia (Especialização) Universidade Candido Mendes, Vitória, 2004.
5
SILVA JÚNIOR, G. B. Biologia e Matemática: a necessidade de religar saberes. Monografia
(Especialização) - Faculdade Saberes, Vitória, 2006.
21
Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), sob a orientação da Doutora
Eliane Scheid Gazire. A dissertação6, aborda a possibilidade de articular temas de
Biologia e Matemática, além de também discutir implicações didáticas dessas
articulações ao longo do Ensino Médio. Os trabalhos das especializações e do
mestrado ampliaram meus horizontes sobre a articulação de saberes e a
complexidade do conhecimento, a partir da percepção da necessidade de articular o
ensino de diferentes Ciências, favorecendo a compreensão de relações e
objetivando evitar fragmentações.
Após o término do mestrado, nos intervalos entre as apresentações dos
frutos da dissertação e as atividades profissionais, um novo ciclo de leituras foi
iniciado. Originalmente o objetivo era satisfazer a curiosidade sobre temas que
ficaram pendentes, pois o tempo de mestrado é curto, não permitindo a entrega a
todas as leituras que temos vontade de realizar.
Nesse período de leituras após o mestrado, primeiramente foi feita uma
passagem pelas obras de Fazenda (1995, 2006 e 2008). Com essas leituras e
reflexões pude consolidar as ideias sobre a interdisciplinaridade, sua importância e
mesmo a existência de limitações em relacionar disciplinas escolares de campos
diferentes.
Após percorrer as obras de Fazenda, foi a vez de ler as obras de Pena-Vega
e Nascimento (1999), Morin e Terena (2000), Morin Ciurana e Motta (2003), Morin,
Pena-Vega e Pailard (2004) e Morin (2005a e 2005b). Essas obras tratam do
conhecimento como elaboração complexa e me orientaram melhor ainda em relação
à complexidade do conhecimento frente às diferentes formas pelas quais ele foi
fragmentado. A obra de Morin, intitulada “Ciência com consciência”, publicada em
português no ano de 2005, causou-me grande impacto por chamar atenção para o
fato de que a fragmentação de saberes, além de proporcionar o surgimento de
grande quantidade de campos científicos, ocasionou a perda de consciência do
profissional em relação às implicações sociais do próprio ofício. A obra de Morin e
Terena
(2000)
serviu
para
despertar
minha
curiosidade
sobre
o
termo
transdisciplinaridade.
6
SILVA JÚNIOR, G. B. Biologia e Matemática: diálogos possíveis no Ensino Médio. Dissertação
(Mestrado) - PUC Minas, Belo Horizonte, 2008.
22
Os contatos com a interdisciplinaridade e a concepção do conhecimento
como algo complexo, aliado às primeiras obras sobre a transdisciplinaridade,
levaram-me a ler outros quatro livros: Weil, D’Ambrosio e Crema (1993), Random
(2000), D’Ambrosio (2001) e Sommerman (2006). Além da complexidade e das
possibilidades de aproximações entre disciplinas, agora estava diante do
conhecimento como uma elaboração que pode, com propriedade, atravessar o
pensamento de diferentes seres humanos. Além disso, orientou-me para também
perceber o conhecimento como aberto e inconcluso.
Outro autor com o qual tive contato ainda durante o mestrado foi Paul
Feyerabend. A primeira obra que li, publicada em 2001, intitula-se Diálogos sobre o
conhecimento. Ainda no mestrado, este livro me fez refletir sobre importantes
questões, tais como: para que serve o conhecimento? Para quem ele é elaborado?
Qual o seu lugar no mundo habitado pelos seres humanos tidos comuns? A quem
interessa que ele seja tratado conforme querem os positivistas? Outras perguntas
também começaram a surgir e não poderia parar para responder devido ao
envolvimento no trabalho de mestrado, mas acabaram norteando a busca de novos
esclarecimentos em relação ao conhecimento científico e sua elaboração. Quando
tive chance, li a autobiografia de Feyerabend, publicada em 1996 e pude entender
melhor a sua proposta filosófica e científica. A leitura da biografia foi seguida das
obras publicadas em 1991, 2007, 2010 e 2011, sendo que este último ano coincide
com minha aceitação no Doutorado em Ensino de Ciências e Matemática da
Universidade Cruzeiro do Sul.
Depois de ler esses livros de Feyerabend, aquilo que eu via como complexo,
podendo se fazer pela aproximação de diversas disciplinas e que atravessaria o
pensamento de diferentes seres humanos de forma aberta e inconclusa, possuía
outro elemento para o qual eu não fora preparado durante a graduação: o
conhecimento não é formulado por um método absoluto e também é carregado de
interesses por trás da sua produção e disseminação. Diferentes aspectos sociais do
conhecimento, que já me haviam sido apresentados em leituras anteriores, agora se
tornaram novos elementos insistentemente presentes em minhas ideias. A visão
idealista de conhecimento como desenvolvimento de uma vocação foi por terra
definitivamente.
23
Ao ser admitido no Doutorado em Ensino de Ciências e Matemática da
Universidade Cruzeiro do Sul, uma das primeiras obras estudadas foi Skovsmose
(2001). Eu já havia lido esse livro em outra época, mas após o acesso a mais textos
de outros autores, a nova leitura resultou em uma visão diferente da que até então
construíra. Agora, diversos contextos sobre a História da Matemática, as noções de
fragmentação e complexidade, a inter e a transdisciplinaridade, juntamente com a
ideia de relativismo do conhecimento, encontram-se com a presença do conteúdo
político e de relações de poder que podem estar por trás da criação científica (e das
formas de ensinar e perpetuar conteúdos de diferentes Ciências). As obras de
Skovsmose (2007 e 2008) e de AlrØ e Skovsmose (2010) completaram um quadro
de leituras e aumentaram a inquietação com diversos desdobramentos do
conhecimento científico e suas relações com a Educação.
Esse quadro teórico e de inquietações levou-me a considerar uma disciplina
com a qual jamais pensei trabalhar: a Estatística. Esse campo científico tornou-se
um novo desafio apontando-me diferentes aspectos, tais como a possibilidade de
utilizar o conhecimento estatístico como elemento de percepção de fatos da
realidade ao meu redor. Esse instrumento de leitura da realidade ligado à Estatística
é um dos elementos que mais pesou na hora de decidir qual desafio deveria
enfrentar na elaboração da tese do doutorado.
Neste momento, o conhecimento apresenta-se como algo elaborado
complexamente, na aproximação entre disciplinas, atravessa o pensamento
humano, é aberto, inconcluso e não tem método absoluto de elaboração. Além
disso, é desenvolvido disfarçando interesses por trás da sua produção,
disseminação e apropriação. A partir desse panorama, comecei então a levantar
novas questões: como fazer para verificar se futuros profissionais de uma área
técnica são capazes de perceber o envolvimento com um conhecimento qualificado
de objetivo, direto e exato? Estariam os futuros profissionais de uma área técnica
aptos a perceberem-se envolvidos por um discurso que reveste o conhecimento de
objetividade e exatidão? E ainda: eles aceitarão a ideia de que o conhecimento com
o qual lidam não é exclusivamente objetivo, nem direto, tão pouco exato e muito
menos isento de interesses políticos por trás da sua produção, disseminação e
apropriação?
24
Antes de prosseguir, uma explicação faz-se necessária. A escolha do curso
de Engenharia de Produção (EP) não foi aleatória, pois trata-se de uma modalidade
de formação na qual trabalho desde agosto de 2008, ano de término do Mestrado na
PUC Minas. Na instituição em que trabalho, Produção foi a primeira modalidade de
Engenharia autorizada a funcionar e, na época em que fui admitido como professor,
era o curso com o maior contingente de alunos entre os da área tecnológica.
Inicialmente, percebi ser necessário mostrar aos alunos as diversas ligações entre
as matemáticas do curso de Engenharia e as demais disciplinas da formação de
engenheiros.
Objetivos, questionamentos e desafios
Com o passar dos períodos e a atuação como professor de Matemática nos
cursos de Engenharia, percebi que uma das disciplinas mais citadas em comentários
dos alunos era a Estatística. Por outro lado, colegas das disciplinas dos semestres
finais da Engenharia comentavam que os temas de Estatística são importantes para
desenvolver o seu trabalho. Além dessa diversidade de menções à Estatística, outro
fator justifica a escolha do tema e a abordagem dada no presente trabalho: trata-se
de uma disciplina presente no desenvolvimento de trabalhos de diferentes
especialidades, que tanto encontra aplicações na área tecnológica como também
pode ser utilizada em outras pesquisas, como na área médica, por se constituir em
elemento auxiliar da descrição de realidades.
Compreender formas de como o conhecimento estatístico pode ser
diretamente aplicado a rotinas de trabalho é uma tarefa diferente de tentar captar
significados para a Estatística na vida dos estudantes de áreas técnicas. Será que
futuros profissionais de uma área técnica como a Engenharia de Produção se
percebem envolvidos por um conhecimento apresentado como objetivo, direto e
exato? Esses futuros profissionais percebem no conhecimento científico um
instrumento de compreensão de aspectos sociais do exercício de sua futura
profissão?
O objetivo do presente trabalho é investigar a formação estatística de
estudantes de um Curso Superior na área de Engenharia de Produção.
25
A partir desse objetivo, formula-se o problema central, que se pretende
responder por meio do presente trabalho: como ocorre a formação estatística de
futuros engenheiros de Produção?
Outro desafio ainda maior se coloca, agora na qualidade de questões
norteadoras a serem respondidas nesta tese: 1) quais demandas de formação são
explicitadas pelos estudantes de Engenharia de Produção em relação à Estatística?
2) quais fragilidades e concepções equivocadas referentes ao conhecimento
estatístico são reveladas e percebidas em alunos da Engenharia de Produção? 3)
Como o Plano de Curso e os instrumentos de ensino e de avaliação da Estatística
dialogam com as necessidades dos futuros engenheiros de Produção?
A estrutura do texto
O texto da presente tese é uma pesquisa qualitativa, feita a partir da análise
interpretativa dos dados construídos. Ela foi organizada em uma introdução, cinco
capítulos e considerações finais, cuja distribuição é apresentada a seguir. O capítulo
1 apresenta a trajetória da pesquisa, suas características, a busca do referencial
teórico e a metodologia utilizada. No Capítulo 2 são apresentados aspectos da
Revolução
Científica
Moderna.
Além
de
conteúdo
histórico,
mostramos
características da profissão de Engenheiro e a proposta de 2001 da Associação
Brasileira de Engenharia de Produção (ABEPRO) para a formação profissional.
Nessa parte, ainda relacionamos Ciência Moderna e Engenharias e apresentamos
aspectos históricos e sociais da evolução da Estatística. No capítulo 3 são
apresentadas as ideias dos principais pensadores que dão a sustentação teórica à
presente tese. O capítulo 4 é dedicado à construção e apresentação dos dados
obtidos na turma em que se desenvolveu o trabalho de campo. No capítulo 5 é feita
a análise dos dados à luz do referencial teórico e, logo após, o término da tese com
as considerações finais.
27
CAPÍTULO 1 - O PERCURSO DA PESQUISA
Vivemos o que alguns chamam de “novo alfabetismo”
- porque é capaz de explicar, mas não entender -,
típico dos discursos econômicos (Emir Sader).
1.1 Introdução
Esta pesquisa começou a ser delineada ao questionar as formas pelas quais
se elabora o conhecimento estatístico. Buscou-se entender quais objetivos existem
ao elaborá-lo de acordo com um padrão, a quem ele atende e porque é concebido
seguindo determinadas formas e não outras. A continuidade das indagações
culminou na busca de compreensão do lugar do conhecimento no mundo habitado
por pessoas que em sua maioria não é de cientistas.
O presente capítulo destina-se a descrever como se materializou esta tese,
desde a revisão bibliográfica, a escolha do referencial teórico e a opção
metodológica. Serão explicados o contexto da pesquisa, os instrumentos utilizados e
o que foi necessário à execução das ações.
1.2 A Revisão Bibliográfica
Lüdke e André (2003) consideram importante o confronto de dados,
evidências, informações coletadas do que foi previamente acumulado sobre o tema
da pesquisa. A pesquisa é uma atividade “[...] de interesse momentâneo e
continuada, por se inserir numa corrente de pensamento acumulado, nos remete ao
caráter social da pesquisa [...] a construção da ciência é um fenômeno social por
excelência [...]” (LÜDKE; ANDRÉ, 2003, p. 2). O interesse momentâneo está no
desejo de responder à questão que move este trabalho e a corrente de pensamento
acumulado é representada pelos autores da área, cujos trabalhos precederam esta
pesquisa.
O referido acúmulo está presente em uma breve revisão, realizada com a
busca do que foi produzido sobre a Educação Estatística. A criação de cursos de
pós-graduação e a disseminação de eventos da área expandiu a relação de temas e
28
a quantidade das pesquisas em Educação. Sob o tema Educação Matemática, por
exemplo, abordam-se diversos temas sob diferentes referenciais teóricos e
metodológicos. Essa grande quantidade de temas e trabalhos gerou a necessidade
de verificar o que foi produzido na área de Educação Estatística, que tem trabalhos
provenientes dos programas de Educação Matemática.
Para levantar os conteúdos dos trabalhos foi utilizado o procedimento de
fichamento sugerido por Fiorentini (2002, p. 2), que destaca a necessidade de
apurar os seguintes elementos: ano, autor, instituição de origem, foco temático,
referencial
teórico,
objetivo(s),
procedimentos
metodológicos,
resultados
e
contribuições. Os dados da revisão foram extraídos na leitura e análise dos resumos
de dissertações e teses, objetivando identificar elementos norteadores de uma
categorização. Em alguns casos foi necessário recorrer ao texto completo, pelo fato
do resumo não conter claramente alguns elementos citados. Feito o levantamento
inicial, foram escolhidas as categorias e subcategorias de análise apresentadas mais
adiante. As categorias utilizadas também são emergentes.
O resumo é um gênero discursivo que, segundo Ferreira (2002), tem na
busca da abrangência sua principal característica. Os resumos têm temas e
conteúdos próprios, além de estrutura e organização na composição, sendo dotados
de estilo verbal característico. Este foi um importante motivo para utilizar resumos ao
invés de trabalhos completos.
A exploração dos resumos foi o ensaio inicial para utilização da Análise de
Conteúdo na presente tese. Foi realizada uma pré-análise dos dados, a exploração
do material e a sua análise propriamente dita. Na pré-análise foram escolhidos
textos referentes à palavra-chave “Educação Estatística” e aqueles referentes ao
Ensino Superior formam o corpus da análise dos resumos. A escolha da palavrachave foi a primeira tentativa de obter elementos de caráter homogêneo. Esgotadas
as possibilidades do banco de teses e dissertações da CAPES, foram procuradas
pesquisas na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e no site
da Universidade Cruzeiro do Sul.
Durante a exploração do material, elementos que aparentavam ser
desconexos devido à sua dispersão nos diferentes trabalhos, começaram a se
29
aproximar, dando sentido a cada categoria e ajudando a integrá-las na classificação
das pesquisas. A análise começou a ganhar clareza quando os objetivos das
pesquisas foram examinados. Quando os resultados e as contribuições para a área
foram explorados, foi possível tecer uma teia como também verificar a riqueza de
propostas, procedimentos além do legado das pesquisas para comunidade.
No levantamento de teses e dissertações nos bancos citados, a partir das
palavras-chave “Educação Estatística”, foi identificada a existência de trabalhos
sobre o tema. O intervalo pesquisado foi o de 2004 até 2013. O período corresponde
a dez anos seguidos de trabalhos de pós-graduação no país, o que é suficiente para
ter um bom panorama da produção na área. O corte no ano de 2013 deve-se ao fato
deste ser o ano imediatamente anterior à qualificação e defesa da tese, além dos
bancos de dissertações e teses ainda não terem disponíveis a produção referente a
2014.
Um motivo para recorrer aos bancos de teses e dissertações da CAPES e
da BTDT foi o fato deles atenderem a um quesito apontado por Ferreira (2002), que
é informar à comunidade acadêmica a produção em andamento nos programas de
pós-graduação do país. Isso permite rastrear rapidamente a produção científica,
apesar da grande quantidade de dados presentes nos portais consultados. A busca
no site da Universidade Cruzeiro do Sul deveu-se à necessidade de consultar a
produção do próprio Programa de Pós-Graduação da instituição que me acolheu no
Doutorado. No portal, os trabalhos estão separados em dissertações e teses por
ordem regressiva de ano de publicação.
Os resumos até 2011 já haviam sido levantados no portal da CAPES em
2012, restando, portanto, a tarefa de buscar os trabalhos publicados em 2012 e
2013. Na época do levantamento desses dois últimos anos, o portal da CAPES
apresentava apenas os trabalhos referentes a 2012 e os trabalhos publicados em
2013 foram levantados nas páginas da BTDT e da Universidade Cruzeiro do Sul.
Considerando o nível de ensino ao qual as pesquisas destinavam-se, foi
possível estabelecer um panorama da produção no quadro a seguir.
30
Nível de ensino
Fundamental
Médio
Superior
Dissertações
18
23
22
Teses
4
0
10
Total por nível de ensino
22
23
32
Quadro 1: Quantificação pelo nível de ensino que a pesquisa abordou.
Fonte: quadro elaborado pelo próprio autor.
O número de pesquisas referente ao nível Fundamental, somado ao de
trabalhos para o nível Médio, supera a quantidade de trabalhos dedicados ao Ensino
Superior. Porém, este último nível é isoladamente detentor do maior número de
dissertações e teses.
Foram analisadas as 32 dissertações e teses encontradas no levantamento
dos trabalhos sobre Educação Estatística no Nível Superior. O quadro descrito não é
capaz de abarcar a totalidade das pesquisas sobre o tema abordado e está sujeito a
eventuais omissões por tratar-se apenas e tão somente de uma parte das
publicações (as oriundas de programas de pós-graduação no Brasil). O que se
desejava era uma aproximação com a produção brasileira em Educação Estatística.
Por tratar-se de pesquisa voltada ao ensino de Estatística no Brasil, na revisão
bibliográfica não foram procuradas dissertações e teses escritas em outros países.
No quesito objetivo da pesquisa, foi encontrada uma grande variedade e,
apesar de alguns trabalhos terem sido categorizados da forma a seguir, nada
impede outras categorizações. Isso depende do olhar lançado sobre o material e
ainda existe outro problema: alguns pesquisadores buscaram esclarecer mais de
uma questão com o mesmo trabalho. O quadro a seguir apresenta uma visão geral
dos objetivos de pesquisa apurados. A partir da organização de acordo com os
objetivos, temos basicamente 5 categorias.
31
CATEGORIA
Pesquisas
sobre ensino e
aprendizagem
de Estatística.
Estudos sobre
os sujeitos
envolvidos em
processos de
ensinoaprendizagem
de Estatística.
Verificação da
validade de um
instrumento de
OBJETIVO
• Repensar o ensino de Estatística e Probabilidade nos diversos níveis;
• Realizar um estudo teórico dos fundamentos da didática da
Estatística; Investigar como a metodologia de projetos pode ser
alternativa para ensinar Estatística no nível superior;
• Analisar potencialidades e possibilidades didático-pedagógicas do
trabalho de projetos na formação estatística do Pedagogo administrador
escolar;
• Investigar que possibilidades a Modelagem Matemática oferece à
aprendizagem contextualizada e significativa de conceitos matemáticos e
estatístico;
• Compreender como o projeto pedagógico pode contribuir para o
desenvolvimento profissional;
• Pesquisar sobre como vem sendo abordada a Estatística em Cursos
de Pedagogia e Licenciatura em Normal Superior nas Instituições
Superiores;
• Investigar que conhecimentos básicos tinham um grupo de alunos em
relação a leitura e interpretação de gráficos e tabelas estudados em
Estatística;
• Desenvolver material didático em R para utilização em cursos de
bioestatística aplicada à análise epidemiológica, com inclusão de
funções adicionais;
• Estudar as características de atividades que favoreçam a
compreensão do conceito de variabilidade de um conjunto de dados;
• Discutir a aprendizagem da Estatística na formação do Professor de
Matemática;
• Analisar o processo de aprendizagem de Estatística;
• Analisar se os alunos de um curso superior de Tecnologia em
Turismo mobilizam de forma eficaz conceitos e concepções construídos
na resolução de problemas práticos de sua área de atuação e detectar
erros e dificuldades após a aprendizagem;
• Verificar se os egressos da disciplina de Estatística de um curso de
Administração estão aptos a utilizar a noção de variabilidade para
resolver problemas práticos dentro da área de atuação;
• Investigar a construção de conhecimento de Estatística por alunos do
curso de Pedagogia;
• Estudar à compreensão e construção de ideias e conceitos
matemáticos e/ou estatísticos em torno do Teorema Central do Limite;
• Identificar atitudes, espaços e ações de professores e alunos;
• Observar, compreender e caracterizar saberes e conhecimentos que
professores formadores acreditam ser necessários para a prática ao
ministrar cursos introdutório da disciplina de Estatística;
• Identificar concepções de professores e licenciandos em Matemática
sobre processos de ensino e aprendizagem de noções básicas de
Estatística;
• Verificar as atitudes e ideias de licenciandos de uma instituição
privada em relação aos temas estudados em Estatística;
• Avaliar a satisfação dos alunos do Departamento de Estatística em
relação a atuação de professor, infraestrutura e à disciplina de
Estatística;
• Avaliar atitudes em relação à Estatística entre alunos da instituição;
• Analisar imagens e atitudes dos alunos de cursos superiores em
relação à Estatística;
• Investigar o uso intencional de estratégias de memória, atenção e
interação em processos de auto regulação da aprendizagem e
estabelecer relação com níveis de letramento estatístico;
• Buscar evidências de validade da Escala de Autoconceito Acadêmico
em Estatística e verificar associações entre atitudes, autoconceito e
desempenho acadêmico em Estatística;
32
pesquisa.
• Verificar evidências de validade de uma prova de compreensão de
leitura de um texto com informações estatísticas;
Relacionamento
entre Educação
Estatística e
diferentes
tecnologias
• Apresentar e analisar uma estética para a Educação Bimodal;
• Desenvolver metodologia de gerenciamento de base de dados que
permita ao usuário alterar suas bases de dados e em tempo real;
• Apresentar uma arquitetura de recursos digitais de aprendizagem
adaptativos para ensino e aprendizagem de Tópicos de Estatística em
complementação ao ensino presencial em cursos do nível superior;
• Investigar o uso do software GEOGEBRA aplicado ao ensino e
aprendizagem da distribuição normal de probabilidade;
• Apresentar nova metodologia para identificar relações entre dados do
desempenho de aprendizagens por meio de uma ferramenta visual
interativa;
Estudo de
Estado da Arte
• Levantar a produção acadêmica dos níveis de mestrado e doutorado
no banco de teses da CAPES que versam sobre ensino de Estatística e
Probabilidade, no período de 2000 a 2008;
Quadro 2: objetivos descritos nas pesquisas encontradas na revisão
bibliográfica.
Fonte: quadro elaborado pelo próprio autor.
Em relação à metodologia de pesquisa, somente uma seguiu caminho
quantitativo, sendo as demais qualitativas. Dentre as teses e dissertações de perfil
qualitativo, há uma diversidade de métodos para construção dos dados, destacandose:
 Registros escritos virtuais em webfolios;
 Pesquisa bibliográfica;
 Utilização de relatórios dos alunos;
 Dados coletados por entrevistas semiestruturadas;
 Apresentação de situações problema do cotidiano dos professores de
Matemática;
 Análise de livros texto do ensino superior;
 História Oral para a recolha de dados;
 Dados provenientes de base eletrônica de dados;
 Pesquisa qualitativa com análise interpretativa dos dados produzido a partir de
observações de depoimentos gravados em áudio e vídeo;
 Aplicação de sequência de ensino;
33
 Aplicação de situações problema típicos da área e gravação individual das
atuações para análise;
 Documentação das produções dos participantes;
 Dados coletados por questionário de questões abertas e fechadas;
 Criação de interface gráfica;
 Aplicação de atividade diagnóstica escrita para construção dos dados a partir dos
registros;
 Aplicação de escala de autoconceito acadêmico em Estatística;
 Aplicação de escala de atitudes em relação à Estatística;
 Diário de campo do pesquisador e dos alunos;
 Observação participante; pesquisa interpretativa; utilização da escala Likert e
análise multivariada;
 Aplicação de provas de compreensão;
 Pesquisa a problematizações originárias de situações reais;
 Aplicação de atividades investigativas estruturadas;
 Aplicação de sequência didática para gerar cenário de aprendizagem;
 Busca por palavras chave; estudo teórico; Estudo comparativo da visão anterior e
da posterior dos alunos ao cursarem a disciplina de Estatística;
 Utilização de escala de estratégias de memória;
 Utilização de escala de estratégias de atenção e de interação.
 Da mesma forma que no caso dos objetivos, havia pesquisas que envolviam mais
de um método de construção dos dados.
Foram encontrados trabalhos com foco apenas sobre os alunos, outros
apenas com professores e ambos os personagens. Sobre os alunos, temos
estudantes dos cursos de Pedagogia, Ciências Econômicas, de Ciências Contábeis,
licenciandos com conhecimentos de Estatística Básica, estudantes de Estatística
matriculados em disciplina on line, sujeitos que já haviam cursado a disciplina,
egressos da disciplina de Estatística de um curso de Administração, Nutrição,
34
Educação Física, Engenharia, Psicologia, de licenciatura em Matemática da UNIFRA
(Santa Maria), de um departamento de Estatística de Modelagem Estatística de
Dados, da disciplina de Instrumento de Aferição em Epidemiologia I, alunos
escolhidos aleatoriamente dentro da mesma instituição, alunos que cursaram dois
semestres de Estatística em semestres consecutivos, de graduação tecnológica em
gestão da Produção Industrial, de Sistemas de Informação, e de Gestão Financeira e
Logística. Uma das pesquisas teve estudantes do curso de Licenciatura em
Matemática e professores egressos do mesmo Centro de Estudos Superiores e
ainda outra envolveu professores que já lecionaram ou lecionam Estatística e alunos
matriculados em Cursos de Pedagogia e Licenciatura em Normal Superior. Um
trabalho teve a participação de formadores de professores selecionados por terem
obtido graduação em Matemática ou Estatística, outro porque os professores eram
atuantes no ensino de Estatística e um último reuniu professores de Engenharia
Elétrica. Em relação à dependência administrativa, as pesquisas ocorreram tanto em
instituições públicas quanto privadas.
O referencial teórico também foi variado, com destaque de diversas teorias:
 Teoria dos Campos Conceituais;
 Teoria da Transposição Didática;
 Engenharia Didática;
 Teoria Antropológica do Didático;
 Construtivismo;
 aportes de teoria da área de Informática;
 Interacionismo;
 Representações Sociais;
 Teoria da Aprendizagem Significativa;
 Aprendizagem Situada;
 Teoria das Situações;
 Teoria da Resposta ao Item;
 Registros de Representação Semiótica;
 Modelos de Mapeamento de Estilos de Aprendizagem;
 Design Experiments, Modelagem Matemática;
 Documentos de Grupos de Pesquisa;
35
 Enfoque Ciência, Tecnologia e Sociedade;
 Educação Crítica;
 filósofos de variados matizes;
 autores da área Educação Estatística da envergadura de Lopes, Batanero, Gal,
Garfield e Curcio, entre outros.
No rol das teses que têm elementos próximos às intenções do presente
trabalho, podem ser citadas as pesquisas de Ara (2006), Campos (2007), Rodrigues
(2009), Pamplona (2009) e Costa (2012). Em relação às dissertações, temos Moreno
(2010) e Sperrhake (2013), com especial destaque para esta última.
Para elaborar sua tese, Ara (2006) partiu da própria experiência como
docente de Estatística em Engenharias e da observação das dificuldades de
entendimento de conceitos enfrentadas por seus alunos, gerando falta de motivação
e grande quantidade de reprovações. Inicialmente, verificou que os alunos têm
pouca familiaridade com fenômenos aleatórios, apesar destes fazerem parte do
cotidiano. Segundo o pesquisador, esse aspecto mostraria uma visão equivocada da
realidade, determinada em parte pelos currículos de ensino. O seu trabalho tinha por
objetivos explicitar uma concepção de realidade onde existisse equilíbrio entre
determinismo e aleatoriedade, para repensar o ensino de Estatística e Probabilidade
nos diversos níveis. A partir desse equilíbrio seria proposta uma nova organização
do ensino de Estatística nos cursos de Engenharia.
O autor buscou na Filosofia e na História do desenvolvimento da Física a
concepção predominante sobre os conceitos dos termos determinístico e aleatório
dos fenômenos naturais, constatando que tais conceitos são de convivência e
interação permanente, o que seria intrínseco à natureza. Apresentando reflexões
sobre Probabilidade e conhecimento estatístico, destaca a importância desse
conhecimento para a compreensão da realidade, que segundo sua visão é tratado
deficientemente nos diversos níveis, acarretando distorções de percepção. O livro
didático é considerado importante indicador da concepção do professor a respeito da
Estatística, tendo consequências para a atuação docente e, além disso, salvo
exceções, os materiais didáticos examinados tendem a apresentar uma concepção
determinística da realidade, priorizando aspectos matemáticos e aplicações técnicas
no momento da construção de conceitos. A partir da verificação desse desequilíbrio,
36
emergiu a proposta de restaurar o equilíbrio perdido. A aleatoriedade foi
apresentada como componente da realidade, indicando que a organização do
ensino de Estatística deve partir de exemplos contextualizados de áreas de interesse
do engenheiro em formação.
Ficaram evidentes para Ara (2006) o valor do trabalho em grupo, da
utilização de computadores e dos programas estatísticos para incentivar a
participação ativa do aprendiz. Para viabilizar a implantação dessas práticas, o
pesquisador indica a necessidade de incluir o estudo de fenômenos aleatórios na
Educação Básica e na formação do professor.
Campos (2007) apresenta uma tese com dois objetivos principais: 1) realizar
um estudo teórico dos fundamentos didáticos da Educação Estatística e a integração
desta com Educação Crítica e a Modelagem; 2) desenvolver e executar projetos
pedagógicos para aplicar essa integração na sala de aula, considerada como um
microcosmo. O autor levantou fundamentos teóricos da didática da Estatística e
verificou, a partir dos trabalhos de diferentes autores, a importância do planejamento
instrucional possibilitar o desenvolvimento da literacia, do raciocínio e do
pensamento estatístico. Sem elas, Campos considera que não é possível o sucesso
na aprendizagem de Estatística.
A Modelagem Matemática e os projetos formaram a estratégia pedagógica
na concepção do ensino objetivando alcançar e desenvolver as três competências já
citadas. Já a Educação Crítica foi o elemento essencial na problematização e
tematização do ensino. Foi a partir dessa inspiração que trabalhou com dados reais
e contextualizados, ao mesmo tempo em que estimulou o debate democrático na
sala de aula e a quebra de hierarquias. Isso favoreceu o incentivo da capacidade
crítica, a valorização do conhecimento reflexivo e a preparação do estudante para
interpretar o mundo. Paralelamente, incentivou-se a prática da responsabilidade
social, o desenvolvimento da linguagem crítica, da liberdade individual, da ética e da
justiça social. Por fim, emergiu a concepção da Educação Estatística crítica.
Rodrigues (2009) discute a construção de ideias e conceitos matemáticos e
estatísticos ligados ao Teorema Central do Limite em relação aos licenciandos de
Matemática, futuros professores da Educação Básica. No seu quadro teórico aborda
37
a Teoria da Transposição Didática sob a visão da Teoria Antropológica do saber e
do didático. Procedendo metodologicamente de acordo com o design didático de
pressupostos alinhados com a Engenharia Didática, apresentou a um grupo de
estudantes com conhecimento prévio de Estatística um conjunto de situaçõesproblema. Supostamente, as situações seriam pertinentes ao cotidiano de
professores de Matemática e relacionadas a problemas existentes na Educação
Básica com respeito à literacia estatística. Também analisou livros didáticos do
Ensino Superior apoiado na Teoria Antropológica do Didático, detectando limitações
e restrições nas obras estudadas. Reitera a importância do ensino da Estatística
para a formação dos futuros professores de Matemática realizar-se sob
diversificadas aplicações, pois estes vivem em um mundo de avanços tecnológicos
que influenciam a leitura de informações.
Pamplona (2009) discute o ensino e a aprendizagem de Estatística na
formação de Professores de Matemática e as práticas envolvidas. O processo
utilizou a Narrativa Biográfica como instrumento de recolha de dados. Os sujeitos da
pesquisa são professores que ensinam Estatística em cursos de licenciatura em
Matemática em universidades paulistas. A análise das narrativas foi embasada na
ideia de comunidade de prática, Teoria Social da Aprendizagem e também na
perspectiva histórico-cultural. Professores e alunos foram considerados membros da
mesma comunidade de prática. A análise permitiu a verificação das práticas que os
professores formadores citaram e que tornam evidentes como foi a sua formação
estatística e a formação pedagógica.
Professores e licenciandos compartilharam problemas, escolhas, trajetórias
e perspectivas no exercício da profissão e no ensino de Estatística. Foram
questionadas práticas discursivas e não discursivas que consolidam relações
desiguais de poder na formação em Matemática e Estatística e na formação
pedagógica. Uma dessas práticas resulta como sugestão o uso de diferentes
abordagens para ensino de conteúdos estatísticos e também a análise das
contribuições para que cada abordagem seja empregada no ensino de um conteúdo
específico.
Para
Pamplona
(2009),
atitudes
como
essas
favorecem
o
desenvolvimento da imaginação do licenciando sobre seu pertencimento a uma
comunidade de práticas, além de aumentar o conhecimento das abordagens
também leva a perceber não existir caminho único em todas as situações.
38
Costa (2012) considera que as mudanças de paradigmas científicos deram
novos significados ao papel representado pelas Ciências no pensamento humano.
Acreditando a ocorrência de interação da cognição com a afetividade, sua pesquisa
investigou a metodologia de projetos como alternativa no ensino de Estatística no
Ensino Superior. Considerou aspectos afetivos da relação professor-aluno durante a
formação do nutricionista e o trabalho de campo deu-se por meio de um projeto
interdisciplinar integrando as disciplinas de Saúde Pública, Avaliação Nutricional e
Bioestatística.
A pesquisa foi apoiada em estudiosos da Pedagogia de Projetos, da
Psicologia, de Estudos Interdisciplinares, da Educação Crítica, da Análise do
Discurso, da Antropologia, da Educação Matemática e da Educação Estatística. A
análise interpretativa dos dados apresentou indícios de que o trabalho propiciou a
compreensão e a aplicação de conceitos estatísticos em situações semelhantes às
que os alunos encontrariam ao exercer sua profissão. Foram constituídos valores e
significados que fundamentam o aprendizado de conceitos que contribuíram para o
protagonismo da aprendizagem. Além disso, ocorreu mobilização, modificação e
ressignificação de fatores sociais e afetivos, ideias e atitudes em relação ao
conhecimento que são adquiridas ao longo da escolaridade.
Em sua dissertação, Moreno (2010) considera como recente a inclusão da
Estatística em currículos da Educação Básica e escassas as pesquisas sobre a
compreensão
da
variabilidade;
também
aborda
a
dificuldade
dos
alunos
compreenderem o conceito de desvio padrão e a existência de problemas em
articular conhecimentos matemáticos e estatísticos para aplicar em situações
diferentes.
Foram estudadas as características das atividades que favorecem aprender
o conceito de variabilidade de um conjunto de valores durante um curso de formação
com alunos de uma licenciatura em Matemática. Além de utilizar como referência do
trabalho os cenários de aprendizagem e os pressupostos da Engenharia Didática,
Moreno lançou mão de autores ligados à Didática da Estatística e à Educação
Matemática.
39
O resultado da sua pesquisa confirmou elementos citados em outros
estudos. Uma das possíveis causas estudadas recaiu sobre as elaborações dos
enunciados. Outro problema registrado foi em relação à compreensão de elementos
expressos por meio de gráficos. Essas duas últimas observações se referem a usos
de linguagens, o que pode ser ainda mais problemático quando não se dispõe de
elementos suficientes a respeito de um campo de conhecimento além de uma língua
local.
Na sua dissertação, Sperrhake (2013) buscou compreender como o saber
estatístico constitui-se em um discurso da verdade e produz os discursos referentes
aos termos alfabetização, analfabetismo e letramento. Tomou como referência os
Estudos Culturais em Educação. Além de buscar indícios de como é dada forma de
verdade aos números, a autora elencou aspectos históricos e técnicos que conferem
à Estatística o estatuto de verdade. No trabalho também podem ser encontradas
maneiras pelas quais os saberes de leitura e escrita são quantificados (além da
análise das formas de produção de estatísticas sobre alfabetização, alfabetismo e
letramento). O suporte teórico fica por conta de escritos filosóficos sobre a sociedade
ocidental e seus diversos mecanismos de vigilância, controle e punição, que se
tornam em instrumentos de desequilíbrio social e geração de desigualdades.
Na composição do material da pesquisa constam referências a artigos
acadêmicos de revistas de Educação e de Estatística, resumos de dissertações e
teses, matérias de jornalismo impresso e publicações digitais. Esse conjunto de
dados foi utilizado para mostrar que a produção discursiva da alfabetização ocorre
sob três aspectos: produção de material empírico, procedimento metodológico e na
referência às estatísticas (ou ao saber estatístico). As práticas acadêmicas e
jornalística são vistas como produtoras do discurso sobre analfabetismo estatístico.
A produção discursiva é operada com dados estatísticos expressos por percentuais,
dados brutos e como matéria de comparações e classificação.
A autora mostrou estratégias utilizadas para dar voz aos dados, no caso
deles serem expostos por especialistas. A formação de professores foi vista
simultaneamente como causa e solução dos problemas relativos aos baixos índices
de alfabetização, alfabetismo e letramento, além de discutir níveis para esses
índices.
40
1.2.1 Considerações
O que essas dissertações e teses possuem em comum com a presente
pesquisa é o fato de lidarem com problemas relativos à Educação Estatística,
enveredando por caminhos que não seriam possíveis trilhar caso tivessem abraçado
pressupostos positivistas.
Os trabalhos apresentam reflexões sobre o ensino de Probabilidade e
Estatística e destacam que essa Ciência é importante para compreender a realidade.
Há um elemento comum, que é a necessidade de desenvolver a capacidade crítica,
valorizar o conhecimento reflexivo e preparar o aprendiz para interpretar o mundo e
não apenas assimilar as técnicas de trabalho proporcionadas pelo conhecimento
estatístico
Reitera-se também a importância da Estatística para a formação intelectual e
não apenas como instrumento de trabalho em uma sociedade que convive com
avanços tecnológicos e suas influências sobre a leitura de mundo. As discussões
levantadas pelos autores incluem a importância que as relações entre os indivíduos
têm para a aprendizagem de Estatística, pois elas podem favorecer ou prejudicar a
compreensão de conceitos e aplicações.
Em todas as pesquisas, o conhecimento estatístico de certa forma emerge
como veículo de discussão de aspectos sociais, históricos e técnicos de um
conhecimento ao qual é conferida a qualidade de instrumento de percepção de
diferentes realidades. Todos os pesquisadores debruçaram-se sobre ocorrências
culturais para interpretar fatos que ocorrem dentro de grupos sociais, cujos
indivíduos que os compõem podem não ter consciência, por estarem imersos em
situações rotineiras de uma cultura própria. O que une esses trabalhos ao nosso é
uma busca da interpretação de valores culturais (e também ideias e ritos, porque
não?) e assim tentar compreender perspectivas de vida e aspectos culturais, mesmo
que ligados a um microcosmo social específico.
O que diferencia a presente tese dos demais trabalhos é que,
primeiramente, ela aborda um grupo específico: uma turma de Engenheiros de
Produção em formação. Outra particularidade é que observamos demandas de
formação explicitadas a partir dos estudantes dessa modalidade de Engenharia,
41
verificando fragilidades e concepções equivocadas apresentadas em relação ao
conhecimento estatístico. Também buscamos verificar de que formas o plano de
curso, os instrumentos de ensino e avaliação relacionavam-se com as necessidades
de formação de futuros Engenheiros de Produção. Mais um aspecto que destaca
este trabalho dos demais é o fato de apoiar-se em um referencial composto por
diferentes abordagens, tais como a Epistemologia, a Filosofia da Ciência, a
Educação Estatística, a História da Estatística e a sua sociologia.
1.3 O referencial teórico
Conforme afirmou Sader (2008), a Educação nos dias atuais é mais uma
peça do complexo quebra-cabeças no processo de acumulação capitalista. Entre
outras utilidades, serve de instrumento para reproduzir essa acumulação dentro de
sistemas de classes, cujas injustiças decorrem do primado do capital sobre o
elemento humano. A Educação da qual ele fala,
[...] em lugar de instrumento de emancipação humana, agora é mecanismo
de perpetuação e reprodução desse sistema [...] um sistema que se apoia
na separação entre trabalho e capital, que requer uma enorme massa de
força de trabalho sem aceso a meios para sua realização, necessita, ao
mesmo tempo, socializar os valores que permitem a sua reprodução [...]
(SADER, 2008, p. 15).
A partir da definição do tema da pesquisa e da abordagem da investigação
realizada, percebemos o teor sócio político que as discussões poderiam tomar. Seria
inadequado, portanto, prender-se a um referencial teórico formado apenas por
autores que discorrem temas técnicos, fossem eles sobre Ensino ou Estatística.
A elaboração do marco teórico da presente tese iniciou-se com a escolha de
elementos da Educação Crítica e da Educação Matemática Crítica, apontados por
Skovsmose (2007) e por AlrØ e Skovsmose (2010).
Skovsmose (2007) discute como o conhecimento matemático dos currículos
escolares de diferentes países é utilizado como instrumento de estratificação social e
ocultação de aspectos sociais, políticos e culturais. Em AlrØ e Skovsmose (2010) a
discussão aponta existência de uma ideologia escolar dominante, fundamentada no
racionalismo científico que levou a Educação para os caminhos hoje considerados
tradicionais. Os autores partiram dos currículos existentes, estudaram situações
42
externas à escola e discutiram ligações entre conhecimento matemático e
democracia em sociedades altamente impregnadas por diversas tecnologias. Além
disso, apresentam e descrevem a sua proposta de cenários de investigação.
Na continuidade das discussões sobre o conhecimento científico como
instrumento de controle social, Feyerabend7 (2007) faz-se presença importante. Ele
contrapõe-se ao ensino de Ciência que é realizado de forma simplificadora e que
leva à delimitação de campos cada vez mais específicos. Como exemplo, mostra a
separação entre a História e o ensino de conceitos ligados a determinado campo
científico. Isso condiciona os estudantes a perceberem apenas a lógica de cada
setor e também contribui para que as novas gerações considerem cada Ciência um
instrumento de justificativa do triunfo do pensamento ocidental.
O autor também se opõe à ideia de que o conhecimento moderno é
resultado de um desenvolvimento harmonioso, baseado em descrições e
descobertas que revelam a ordem racional de um universo, aparentemente imerso
no caos. Reflete também sobre a necessidade de relativizar o potencial de
explicação atribuído às Ciências e que as formas utilizadas para elaborar e fazer a
disseminação do conhecimento ocultam intenções e relações de poder.
Demo (2000) é outro autor cujas ideias alinham-se aos dos outros teóricos e
suas ideias ajudaram a melhor coordenar as discussões teóricas. Ele considera que,
pelo fato do conhecimento estar em permanente reconstrução em redes de
interações, os fios dessa trama tendem a ser tensionados por diversos interesses
nas comunidades científicas. Além disso, reconhece que existem métodos de
controle da produção e disseminação do conhecimento. Isso é um fenômeno político
das sociedades contemporâneas, e faz do conhecimento científico mais uma força
produtiva e crucial para a reprodução do capital.
Em relação aos fatos históricos e sociológicos, Camargo (2009) mostra que,
além de instrumento de trabalho, a Estatística serve para moldar visões de mundo e
a imagem de cada um em relação ao seu semelhante. Ele também alerta para um
importante fato: desde sua fase embrionária o conhecimento estatístico apresenta
7
* Viena, Áustria,1924; † Genolier, Suíça, 1994.
43
sinais de especialização e foi utilizado por parcelas restritas de diferentes
sociedades.
Lopes (2013) considera que a análise de dados é importante componente
curricular desde a educação infantil até os cursos de graduação e que o professor
trabalha com alunos que atualmente têm acesso cada vez mais cedo a diferentes
estatísticas. A formação matemática centrada na aplicação de fórmulas seguida de
exercícios de fixação não é suficiente para as demandas de ensino. A autora
considera urgente repensar os programas de curso e as formas de desenvolver o
ensino da disciplina nos cursos de licenciatura em Matemática, ponto de vista que
pode ser estendido a outras modalidades de graduação em que a Estatística esteja
presente.
Da mesma forma que Lopes (2013), Gal e Garfield (1997) apresentam metas
que consideram comuns à Educação Estatística nos níveis de ensino préuniversitário e de graduação: 1) o aluno deve tornar-se um cidadão informado, capaz
de compreender e lidar com a incerteza, a variabilidade e a informação estatística no
mundo ao seu redor (para poder participar de uma sociedade da informação); 2) o
ensino de Estatística deve contribuir para capacitar o aluno a tomar parte na
produção, interpretação e comunicação de dados referentes a problemas em sua
vida profissional. A Estatística deve ser apresentada como Ciência dotada de modos
característicos de pensar e que transcendem a aplicação de métodos de cálculo
específicos. Os autores também discutem diferentes desafios para a avaliação da
aprendizagem de Estatística.
Curcio, Friel e Bright (2001) pesquisaram sobre a capacidade de ler e
compreender dados expressos por gráficos e tabelas estatísticas. Destacam que a
dominar a compreensão de informações escritas ou de outra natureza simbólica é
uma necessidade que para completa alfabetização nos dias atuais. Entre outros
assuntos, o trabalho trata de elementos necessários para compreender a informação
transmitida por meio de gráficos.
Ao longo do seu desenvolvimento, a Estatística desenvolveu linguagem,
conceitos e símbolos próprios. Para aprendê-la, é necessário desenvolver a
capacidade de entender suas ideias fundamentais e a linguagem utilizada em sua
44
comunicação. O GAISE College Report8 (FRANKLIN et al., 2005), publicado pela
American Statistics Association (ASA - Associação Americana de Estatística) traz um
histórico das modificações ocorridas no ensino de Estatística ao longo do século XX.
Sua elaboração foi realizada a partir do estudo de normas e orientações para o
ensino e avaliação de aprendizagem da Estatística. Seus autores apresentam uma
série de recomendações que consideram importantes para o aluno conseguir um
bom desempenho em cursos introdutórios de Estatística. As recomendações
enfatizam que o ensino da disciplina deve desenvolver o pensamento estatístico e a
literacia estatística (capacidade de compreender as ideias fundamentais da
Estatística e a sua linguagem).
Como a pesquisa foi realizada com indivíduos de uma turma de EP, foi
necessário discutir aspectos da formação do Engenheiro de Produção. Para tal,
apresentamos as propostas de diretrizes curriculares para a graduação elaborada
pela ABEPRO (2001). Outros autores incluídos durante a elaboração da tese foram
importantes porque apresentam elementos necessários à fluidez e continuidade do
texto.
1.4 A metodologia
Ao assumir o que Bortoni-Ricardo (2008) denominou compromisso com a
interpretação de ações e significados atribuídos por sujeitos que frequentam uma
instituição de ensino, não faria sentido buscar relações lineares de causa e
consequência. Muito menos dever-se-ia generalizar e buscar quantificações,
procedimento partilhado pelas diferentes Ciências Naturais. Planejava-se interpretar
fatos ligados a contextos nos quais se formam Engenheiros de Produção.
Na introdução, a tese foi apresentada como uma pesquisa qualitativa, feita a
partir da análise interpretativa dos dados construídos. Porém, o que seria uma
pesquisa qualitativa? Antes de descrever os procedimentos utilizados, existe a
necessidade de explicar porque a metodologia utilizada adequa-se ao trabalho.
A metodologia, de acordo com Demo (2006) refere-se à forma instrumental,
aos procedimentos, às ferramentas e aos caminhos por meio das quais uma
8
Guidelines for Assessment and Instruction in Statistics Education.
45
pesquisa é executada. O autor ressalta que, a princípio, a metodologia pode ser
vista a partir de duas principais vertentes. A mais usual é utilizada nas Ciências
Naturais e deriva de uma teoria do conhecimento, “[...] geralmente voltada para a
questão da causalidade, dos princípios formais da identidade, da dedução e da
indução [...]”. A segunda é ligada à sociologia do conhecimento, “[...] acentua mais o
débito social da ciência, sem no entanto desprezar a outra” (DEMO, 2006, p. 21- 22).
Um importante alerta é o fato de que não se pode cair no erro de superestimar a
metodologia, cuidando mais desta que do objeto de estudo (no presente trabalho, o
ensino de Estatística na formação de Engenheiros de Produção).
Ainda que se trate do ensino de uma disciplina que prima pelo aspecto
quantitativo, não seria adequado à proposta de pesquisa utilizar uma metodologia
baseada em testes experimentais, tal como nas Ciências Naturais. Não seria
possível abraçar uma proposta positivista e reduzir as análises a seus componentes
isolados, submetendo-os a um processo linear. Nosso objetivo é investigar a
formação estatística de estudantes de um Curso Superior de EP e, qualquer que
seja o nível de ensino, o curso não se faz apenas com currículos e meios materiais.
Ao longo de um período de formação estão envolvidas diferentes relações sociais e
o primeiro passo, portanto, é reconhecer sua existência em um ambiente de ensino,
admitindo que elas ocorrem meio a uma
[...] trama complexa, não linear [...] o mais importante, porém, é visualizar a
qualidade como expressão complexa e não linear [...] ao mesmo tempo
indicativa de sua incompletude ostensiva e potencialmente pretensamente
ilimitada [...] (DEMO, 2000, p. 147).
Portanto, reduzir os componentes de uma trama a fragmentos isolados,
conforme os ditames inspirados nas Ciências Naturais, excluiria pontos de vista,
opiniões e subjetividades do pesquisador em relação ao objeto de estudo. Por outro
lado, o que se descreve por meio de pesquisa em um ambiente restrito não pode ser
generalizado e diretamente utilizado na compreensão daquilo que ocorre em todos
os locais onde se ensina Estatística.
Uma pesquisa qualitativa deve “[...] fazer jus à complexidade da realidade,
curvando-se diante dela, não ao contrário, como ocorre com a ditadura do método
ou a demissão teórica que imagina os dados evidentes [...]” (DEMO, 2000, p. 152). A
modalidade qualitativa permite apresentar elementos da própria cultura e sociedade
46
onde a pesquisa é realizada. Devemos ainda estar alertas para não tratar
dicotomicamente a relação entre qualidade e quantidade, já que a
[...] qualidade provém também de bases quantitativas [...] há realidades que
talvez pudéssemos chama-las de mais qualitativas, e outras mais
quantitativas, mas todas são mesclas de ambas as dimensões [...] qualitas,
do latim, significa essência. Designaria a parte mais relevante e central das
coisas, o que ainda é vago, pois essência não se vê [...] sinalizaria
horizontes substanciais, mesmo que pouco manejáveis metodologicamente
[...] qualidade sinaliza a perfectibilidade das coisas, sobretudo nos seres
humanos [...] processa-se na matéria que, entretanto, não se comporta
como acúmulo quantitativo justaposto e linear [...] qualidade pode coincidir
com a complexidade emergente, e apareceria especificamente na relação
não linear [...] qualidade aponta para a dimensão da intensidade, para além
da extensão. Fenômenos qualitativos caracterizam-se por marcas como
profundidade, plenitude, realização, o que aponta para sua perspectiva mais
verticalizada do que horizontalizada [...] não expressa apenas justaposição
cumulativa, mas também o resultado não linear de processo não linear
(DEMO, 2000, p. 146-148, grifos do autor).
Devidamente organizadas, as quantidades permitem a emergência de
qualidades de um conjunto de dados.
Um aspecto importante da pesquisa qualitativa é ela ter se originado de
trabalhos das Ciências Sociais, dedicados ao estudo da pluralidade de aspectos da
vida social, exigindo “[...] uma nova sensibilidade para o estudo empírico das
questões [...]” (FLICK, 2004, p. 18). O autor considera que, sob a denominação de
pesquisa qualitativa, podem ser abrigadas diferentes abordagens, posicionamentos
teóricos, focos metodológicos e modos de compreender um objeto.
Em estudos de natureza sociológica, fenômenos e fatos são muitas vezes
complexos a ponto de seus diferentes aspectos poderem ser estudados
pormenorizadamente. Para trabalhos dessa natureza, não cabe apenas buscar
relações diretas de causa e efeito, o que é marca das Ciências Naturais, que
descrevem seus objetos a partir de modelos ideais. É necessário considerar
cuidadosamente contextos e situações complexas. O termo complexidade, no caso,
deve ser compreendido como “[...] um tecido (complexus: o que é tecido junto) de
constituintes heterogêneas inseparavelmente associadas [...] se apresenta com os
traços inquietantes do emaranhado [...]” (MORIN, 2006, p. 13, grifos do autor).
Tentamos evitar a fragmentação excessiva, pois ela pode fazer com que os
resultados não sirvam para avaliar novas situações. Ao lidar com uma pesquisa
qualitativa, deve-se
47
[...] planejar métodos tão abertos que façam justiça à complexidade do
objeto em estudo [...] fator determinante para a escolha de um método e
não o contrário. Os objetos não são reduzidos a variáveis únicas, mas são
estudados em sua complexidade e totalidade em seu contexto [...] os
campos de estudo não são situações artificiais em laboratório [...] (FLICK,
2004, p. 21).
Uma pesquisa qualitativa deve estar aberta à busca do novo, desenvolvendo
empiricamente teorias adequadas às situações que descreverá, ao invés de ater-se
ao teste de situações concebidas que ratifiquem alguma teoria. Por não se constituir
em torno de um único eixo teórico e metodológico, a pesquisa qualitativa tem ponto
de partida subjetivo, mesmo que possua um objetivo explícito a cumprir. A pesquisa
qualitativa presta-se a analisar conhecimentos, práticas e interações dos
personagens a partir de diferentes perspectivas subjetivas.
Acrescentamos o ponto de vista de Lüdke e André (2003), baseados em
Bogdan e Biklen (1982). Elas apresentam características que configuram uma
pesquisa qualitativa: 1) o ambiente natural é a fonte direta de dados e o pesquisador
é o principal instrumento; 2) os dados coletados têm predominância descritiva; 3)
preocupação maior com o processo do que com o produto; 4) os significados
atribuídos pelas pessoas são foco especial de atenção do pesquisador; 5) a análise
dos dados tendem a seguir um processo indutivo.
No início da década de 1920, a Escola de Frankfurt (nome dado a um grupo
de pensadores), apresentou as primeiras críticas ao pensamento positivista. A partir
dessas críticas, os pensadores buscaram alternativas para pesquisas científicas,
constituindo um novo paradigma: o paradigma interpretativista (BORTONIRICARDO, 2008). O ambiente escolar é justamente um espaço privilegiado para
pesquisas baseadas no interpretativismo, denominação sob a qual podem ser
encontradas diversas formas de pesquisas qualitativas.
Dessa forma, apoiados nas ideias de Demo (2000 e 2006), Lüdke e André
(2003), Flick (2004) e Bortoni-Ricardo (2008), consideramos a presente tese
enquadrada na modalidade de pesquisa qualitativo-interpretativa.
48
1.5 O Contexto da pesquisa
O trabalho de campo foi realizado em 2013 (segundo semestre) e 2014
(primeiro semestre) em uma turma de EP, em uma Instituição Federal de Ensino,
localizada no município de Cariacica, na Grande Vitória, Espírito Santo, composta
por 35 alunos. Nessa instituição, além da EP (cursada em turno integral e regime
semestral), atualmente são ministrados outros cursos de diferentes níveis: cursos
técnicos com duração de dois anos, cursos técnicos integrados ao Ensino Médio
Regular, cursos técnicos subsequentes ao Ensino Médio, Licenciatura em Física,
além de Pós-Graduação Latu Sensu em EP. O prédio onde funcionam os cursos
técnicos foi inaugurado em 2012 e ainda há obras em andamento. As salas de aula,
assim como as destinadas ao uso de professores, são climatizadas.
Obtido o consentimento do coordenador do curso, que acolheu a ideia sem
impor obstáculos e permitindo a pesquisa, esta foi iniciada imediatamente, com a
distribuição e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice
A). O trabalho de campo foi desenvolvido a partir do momento em que o pesquisador
entrou em um ambiente já ocupado por outros elementos e repleto de interpretações
dadas por eles.
A Estatística, disciplina em foco, é lecionada em dois semestres, sob as
denominações de Estatística I (carga horária de 30 horas, oferecida no terceiro
período) e Estatística II (carga horária de 45 horas, oferecida no quarto período). A
íntegra dos planos de ensino está nos anexos da Tese.
1.6 Instrumentos para coleta de dados
Para a coleta de dados foram escolhidos dois instrumentos: o questionário e
a entrevista, apresentados nos apêndices. Apenas os alunos da turma pesquisada
responderam ao questionário, ainda durante o curso de Estatística I. Já a entrevista
foi aplicada inicialmente aos alunos sorteados e/ou escolhidos e à professora
regente da turma, durante o curso de Estatística I. Posteriormente foram colhidos
mais dois depoimentos dos alunos: durante o curso de Estatística II e após o seu
término, quando já cursavam disciplinas que aplicam o conhecimento Estatístico. A
49
professora foi entrevistada mais uma vez, após a terceira entrevista dos alunos.
Todos os entrevistados responderam às mesmas perguntas.
1.6.1 Sobre a aplicação do questionário
Em relação à aplicação do questionário serão feitas algumas observações
iniciais com base no trabalho de Moreira e Caleffe (2006). Os autores afirmam que
não há instrumento totalmente adequado ou inadequado, mas sim melhor ou pior
para o momento em que se trabalhe. Inicialmente existem duas limitações para a
aplicação de questionários: a tendência dos dados levantados é descrever e não
explicar o porquê de determinados fenômenos ou comportamentos; além disso,
esses dados podem ser superficiais.
Surge, então, um questionamento: por que aplicar um questionário e não um
outro instrumento? Apesar do risco de superficialidade dos dados, essas respostas,
como primeira análise, apresentam indícios representativos da composição da turma
e do perfil escolar dos indivíduos, que serão apresentados no capítulo de construção
dos dados. As questões do questionário foram redigidas para não dar margem a
divagações dos respondentes e, apenas na última pergunta, houve maior liberdade
para construção das repostas.
A partir do questionário foi possível obter dados importantes sobre a
escolarização dos alunos e o seu entendimento da Estatística. Como o universo de
aplicação desse instrumento de pesquisa foi limitado aos alunos da turma, não se
correu o risco de perder o controle sobre a representatividade da amostra, pois isso
poderia acarretar uma análise tendenciosa do quadro inicial. Como vantagem sobre
a escolha do instrumento, verificou-se que não foi preciso estratificar a amostra.
1.6.2 Sobre as entrevistas
A pesquisa qualitativa não depende apenas da performance do pesquisador,
pois também está ligada a outros elementos, como os vários cenários, o problema a
ser investigado e as suas contingências. No nosso caso, as técnicas de coleta de
dados e as estratégias de análise foram padronizadas para evitar perdas de dados.
Optou-se por registrar as entrevistas por meio de gravação em áudio. Após cada
50
entrevista, os depoimentos foram transcritos na íntegra. O objetivo no caso foi
viabilizar a análise do conteúdo desses depoimentos e a construção dos dados.
A entrevista, momento de interação de alta complexidade, pode ser
classificada em padronizada e não padronizada. Entre as formas não padronizadas
está a forma semiestruturada que facilita a aplicação pelo próprio pesquisador. Uma
vantagem é que ela favorece a análise de quem está diretamente envolvido no
processo de pesquisa (MOREIRA; CALEFFE, 2006).
Em relação ao formato semiestruturado, existem algumas questões iniciais a
justificar: Por que utilizá-la? Onde realizá-la? Quem e quando entrevistar?
Também deve-se considerar alguns elementos capazes de influenciar o
resultado de uma entrevista. Os envolvidos nessa interação têm uma identidade
pessoal, um passado e vários elementos que os destacam dentro do seu grupo
social. Um deles é o entrevistador (no caso o próprio pesquisador), que possui
características pessoais. No nosso caso não seria prático deixar o entrevistado
divagar ilimitadamente e era necessário exercer algum controle sobre as discussões.
Analisando como pesquisador, pesquisado e entrevistador podem influenciar o
resultado de uma entrevista, a forma semiestruturada tem a vantagem de reduzir as
influências geradas pela presença dos três elementos. “[...] Qualquer que seja o tipo
de entrevista [...] quanto mais o entrevistador envolver-se com a situação, maior será
o potencial de sua influência” (MOREIRA; CALEFFE, 2006, p. 183).
Foi necessário preparar um roteiro de entrevista, pois não bastaria ir a
campo e conversar com os sujeitos da pesquisa. As perguntas foram organizadas
em blocos de temas, inspiradas na resolução número 11 do Conselho Nacional de
Educação/ Câmara de Ensino Superior (CNE/CES). Chamaram a atenção três itens
de um dos artigos:
Art. 4º A formação do engenheiro tem por objetivo dotar o profissional dos
conhecimentos requeridos para o exercício das seguintes competências e
habilidades gerais [...] IX - atuar em equipes multidisciplinares; X compreender e aplicar a ética e responsabilidade profissionais; XI - avaliar o
impacto das atividades da engenharia no contexto social e ambiental
(NCE/CES, 2002, p.1).
Os três itens citados definem importantes aspectos de atuação profissional.
51
Ainda em relação às entrevistas, cabem algumas explicações.
O
procedimento metodológico de entrevistas dá-se comumente em duas etapas, sendo
a segunda para análise das repostas dadas na primeira. Escolhemos fazê-lo em três
etapas, sendo a terceira objetivando um maior aprofundamento das análises. Como
resultado da opção, pode-se observar as mudanças de percepção dos estudantes
em relação à Estatística e as suas relações com as demais disciplinas do curso.
Sobre a escolha dos alunos, por não se tratar de trabalho para estimar
parâmetros populacionais, os entrevistados não foram sorteados aleatoriamente. A
lógica de escolha não foi a mesma da probabilística aplicada à Estatística, mas
constituindo-se em um processo intencional, seguindo os seguintes critérios: a)
entrosamento com a professora no andamento das aulas (os dois alunos mais
entrosados com a professora já faziam parte do grupo com notas mais altas); b) na
primeira prova do semestre a nota não deveria ser a mais alta, mas acima da média
da instituição (nota 6,0); c) um aluno reprovado em Estatística I completou a
composição do grupo de entrevistados. Esse aluno foi escolhido porque pensamos
ser importante o depoimento dos extremos (tanto em relação ao melhor
entrosamento quanto em relação à reprovação). Além disso, ainda pudemos contar
com o que pensam dois alunos que se encontram em situação confortável com
relação à nota para aprovação, mas que usualmente não têm destaque por estar em
uma zona intermediária de classificação.
O Aluno 1 foi escolhido para entrevista por se destacar na interação com a
professora durante as observações de aulas e pela facilidade com que dialogava
sobre os conteúdos. Ele nasceu em 1994, não havia feito outro curso superior, mas
havia cursado Estatística no Nível médio. Primeiramente o que o motivou a escolher
o curso de EP foi por querer uma engenharia e ver a EP como forma de lidar mais
com as pessoas, considerando essa modalidade uma engenharia mais humana e
uma forma de ter mais em contato com as pessoas. O aluno constatou por pesquisa
própria que gerir a produção seria uma forma de ter mais contato com as pessoas,
ao invés de realizar tarefas burocráticas ou se ver à frente de um computador
criando instruções e definindo programas, concebendo ferramentas e fazendo
simulações.
52
O Aluno 2 foi escolhido para a entrevista pelo mesmo motivo do anterior: o
destaque na interação com a professora, tanto ao perguntar sobre os procedimentos
quanto pela facilidade com a qual dialogava sobre os conteúdos. Nascido em 1991,
estava no terceiro semestre do curso quando a pesquisa foi iniciada. Não havia feito
outra graduação, mas havia cursado técnico em Administração durante o Ensino
Médio Regular e estudado Estatística no Ensino Médio. O que inicialmente o motivou
a escolher o curso de EP foi se tratar de modalidade com amplas possibilidades de
atuação. Também pesou o fato de estudar conteúdos de várias áreas das
engenharias ao mesmo tempo, o que permitiria ter diante de si um leque maior de
opções no mercado de trabalho.
O aluno 3 foi sorteado para entrevista entre os alunos cuja nota estava
acima da média na primeira prova e, entretanto, não figurava entre as mais altas.
Nascido em 1994, estava no terceiro período sem ter passado por outro curso
superior. Não havia feito curso técnico, seu Ensino Médio foi regular e estudou
Estatística nessa época. O que o motivou a escolher o curso de EP na instituição em
que se matriculou foi cursar as disciplinas ligadas à Matemática para posteriormente
pedir isenção em outra universidade, caso fosse aprovado em novo exame
vestibular.
O Aluno 4 foi sorteado pelo mesmo motivo do aluno 3: nota acima da média
sem, entretanto, estar entre as maiores. Nascido em 1992, também estava no
terceiro período quando do início da pesquisa. Não fez curso superior nem técnico
anteriormente e já havia cursado Estatística no Ensino Médio Regular.
O Aluno 5 foi escolhido por ter sido reprovado na disciplina no semestre em
que o trabalho foi iniciado. Nascido em 1984, também estava no terceiro período
quando a pesquisa foi iniciada. Havia cursado gestão empresarial em curso técnico
no Ensino Médio Regular, no qual estudou Estatística. Já havia cursado parte da
graduação em EP em uma instituição privada.
Completando o grupo de pessoas entrevistadas, temos a professora de
Estatística, que logo após terminar o Ensino Médio (aos 17 anos) ingressou no curso
de Matemática e concluiu apenas o bacharelado, no período de 2000 a 2004.
Graduada em Matemática, foi aprovada no mestrado em Engenharia Ambiental e ao
53
término dessa pós-graduação resolveu retornar à Universidade, graduando-se em
Estatística. Seu ingresso no quadro de professores da Instituição Federal em que
atua deu-se após terminar a segunda graduação. Na época da segunda entrevista
cursava o Doutorado em Engenharia Elétrica, pesquisando a aplicação da
Estatística a redes ópticas. No trabalho, utilizou maciçamente o conhecimento
estatístico.
1.7 A análise do conteúdo
Pelo fato da tese basear-se em uma pesquisa qualitativa, a escolha do viés
qualitativo da Análise de Conteúdo não foi por acaso. Essa opção tem origem nas
Ciências Sociais e Humanas, na década de 1970, época em que aprofundou-se a
discussão do primado do método científico das Ciências Naturais. Havia a
necessidade de responder a algumas perguntas relacionadas às preocupações com
um estudo para o qual o método experimental das Ciências Naturais não é
adequado:
[...] como estar à escuta cientificamente e com rigor, de palavras, de
imagens, de textos escritos e discursos pronunciados? Como passar do uno
ao múltiplo? Como compreender, analisar, sintetizar e descrever inquéritos,
artigos de jornais, programas de rádio ou de televisão, cartazes publicitários,
documentos históricos e reuniões de trabalho? (BARDIN, 2011, p. 11)
Na Física, por exemplo, é possível reproduzir experimentos sob condições
praticamente idênticas, o que não ocorre nas Ciências Sociais. No nosso caso era
necessário agir cientificamente e tratar com rigor as falas dos entrevistados. Tanto
as respostas do questionário (Apêndice B) quanto as da entrevista (Apêndice C)
necessitaram ter os conteúdos analisados qualitativamente.
Dessa forma, a análise das respostas dadas às perguntas do questionário e
da entrevista foram organizadas pela Análise de Conteúdo, pois seria necessário
tratar os elementos de análise em sua complexidade e também por não ser possível
utilizar um procedimento simplificador diante da realidade estudada. Tratava-se,
portanto, “[...] de exercer um pensamento capaz de lidar com o real, de com ele
dialogar e negociar” (MORIN, 2006, p. 6).
A Análise de Conteúdo possibilita diferentes modos de conduzir o processo
de construção de dados. Moraes (1999) a caracteriza como metodologia dotada de
54
uma sequência de passos a serem aplicados. Hsieh e Shannon (2005) não a
consideram um método único, mas uma técnica flexível de pesquisa qualitativa,
passível de abordagens distintas. Bardin (2011) considera a Análise de Conteúdo
um método a ser utilizado para analisar materiais resultantes de alguma forma de
verbalização. Os procedimentos propostos por esta última foram adotados na
análise dos dados da tese.
Hsieh e Shannon (2005) consideram que a Análise de Conteúdo pode ser
convencional, direcionada ou sumativa. Na primeira modalidade, as categorias de
codificação derivam diretamente de dados do texto. Caso se adote a abordagem
direcionada, a análise é feita embasada em uma teoria (ou resultados de pesquisas
consideradas relevantes). Já a análise sumativa envolve contagem e comparações
de palavras-chave (ou conteúdo), a partir da qual os contextos são interpretados. A
abordagem específica, escolhida pelo pesquisador, deve estar de acordo com seus
interesses teóricos e o problema que será abordado.
Como em nosso caso, partimos de quadros teóricos pré-existentes, a
segunda modalidade é a mais adequada à construção, descrição e análise dos
dados. A principal vantagem da abordagem direcionada é que a teoria na qual se
apoia pode ser estendida e a Análise de Conteúdo tende a ser mais estruturada do
que a convencional (HSIEH; SHANNON, 2005). Ao optar pela abordagem
direcionada, a ideia foi fazer da categorização um processo dedutivo a partir de
conceitos do quadro teórico.
O trabalho de análise foi realizado entre a objetividade e a subjetividade,
tratando de aspectos qualitativos sem ignorar a frequência com a qual se
encontraram os elementos no texto (aspecto quantitativo). Isso foi importante para
chamar a atenção, localizar e evidenciar esses elementos. Porém, a análise
qualitativa tende mais a usar métodos intuitivos, porque se adapta melhor à
observação e ao estudo de elementos que não foram definidos previamente. A
análise qualitativa serviu para classificar sistematicamente os depoimentos segundo
categorias. Isso possibilitou interpretar elementos subjetivos das falas transcritas,
codificar e identificar padrões nas respostas.
55
Ao optar pela vertente qualitativa, assumiram-se pressupostos tanto
epistemológicos quanto de pesquisa, ainda que em alguns momentos eles não
fossem explicitados. Quando se exercita a análise de conteúdo, os fenômenos
sociais não devem ser considerados transparentes e de intepretação óbvia. Nesses
casos, seria indevido considerar uma transparência epistêmica9, capaz de dotar o
pesquisador da capacidade de analisar diferentes contextos de forma direta e
objetiva. Não existe tal transparência, capaz de prover uma certeza que elimine a
dúvida, estabelecendo a verdade dentro de padrões claros, cujo domínio é universal
e indubitável.
Diante de um quadro complexo como é o estudo na área de Educação, o
pesquisador também não deve se deixar envolver pelo instrumento utilizado, ao
mesmo tempo em que lembra constantemente das limitações de sua utilização.
Procuramos superar compreensões espontâneas e evidências imediatas, ao mesmo
tempo em que se buscava evitar raciocínios extremamente simplificados ao
interpretar a realidade. Procuramos utilizar a Análise de Conteúdo como um
instrumento para
[...] estabelecer [...] uma correspondência entre as estruturas semânticas [...]
e as estruturas psicológicas ou sociológicas [...] a leitura efetuada pelo
analista [...] não é unicamente, uma leitura ‘à letra’, mas antes o realçar de
um sentido que figura em segundo plano [...] (BARDIN, 2011, p. 47, grifos
da autora).
Essa leitura deveria, portanto, passar da superfície do texto e, por meio de
um trabalho de aprofundamento, descrever e analisar diferentes elementos
responsáveis pelas características deduzidas. O objetivo foi chegar à diversidade de
significados dos elementos encontrados na mensagem.
A partir dos objetivos traçados e da utilização de sistematizações, busca-se
descrever o conteúdo da mensagem, refletindo que a Análise de Conteúdo tem dois
objetivos de trabalho importantes a destacar: 1) explicitar e sistematizar o estudo do
conteúdo de uma mensagem por meio de deduções e justificativas, procurando
superar a incerteza e enriquecer a leitura; 2) obter e validar elementos
generalizáveis para esclarecer significados de aspectos cuja compreensão não é
9
Skovsmose (2007) - Com este termo o autor refere-se à possibilidade de apresentar claramente a
natureza do conhecimento e suas diferentes formas de elaboração, apoiada principalmente na
simplificação e no estreitamento de domínios científicos, com a primazia do método dedutivo e da
abstração da realidade como instrumentos de alcance da verdade.
56
imediata. Ela também possui duas funções consideradas indissociáveis: 1) a
heurística: que enriquece a exploração dos significados; 2) a administração da
prova, que dirige a análise ao buscar a confirmação da veracidade, pois as questões
levantadas sempre são consideradas provisórias. Os objetivos e funções são
necessários à descrição analítica e as hipóteses levantadas durante a análise
também são consideradas provisórias, dirigindo o trabalho para a busca de
confirmações. Objetivos e funções são necessários à descrição analítica e à
elaboração de sistematizações para descrever o conteúdo de uma mensagem.
Durante a análise do conteúdo dos dados, a categorização consistiu em
dividir os componentes das mensagens a partir de diferenciações e reagrupamentos
de elementos análogos, com o objetivo de facilitar a compreensão dos dados brutos.
Para delimitar as unidades de codificação e registro, procuramos subcategorias que
tivessem o máximo das seguintes qualidades: mutuamente exclusivas (um elemento
não poderia figurar em mais de uma delas); homogeneidade (cada subcategoria
possuía elementos afins); pertinência (existência de nexo entre os elementos
categorizados); fidelidade (as diferentes partes do mesmo material tiveram a mesma
codificação); produtividade (cada subcategoria produziu resultados importantes).
A organização da análise cumpriu três fases ordenadas cronologicamente:
pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados (onde ocorreram
inferências e a interpretações). Na pré-análise o material foi organizado para
favorecer a sistematização. Nessa fase, a partir da leitura dos documentos,
formulou-se algumas hipóteses e objetivos iniciais de exploração, do material,
elaborando indicadores para uma primeira interpretação.
Na pré-análise, os produtos e efeitos do trabalho foram simultaneamente
“[...] causas e produtores do que os produz [...]”, caracterizando um processo
recursivo (MORIN, 2006, p. 74). As escolhas de documentos possibilitaram
interpretar significados, originando novas formulações. No caso das entrevistas, o
contato com o documento e a pré-análise deram-se após as transcrições, quando da
organização das respostas para a tessitura das primeiras considerações, a partir da
leitura flutuante. Após esse contato com as transcrições para escolha do universo de
documentos e composição do corpus (conjunto de documentos a serem analisados),
constatou-se que a simples organização individual das entrevistas não seria o
57
procedimento ideal para a categorização. Após a primeira abordagem, a opção foi
estudar as respostas agrupadas de acordo com a sequência de perguntas da
entrevista.
Os arquivos com as respostas produziram textos nos quais manifestaram-se
indicadores, explicitados durante a análise. A escolha e organização desses
indicadores serão explicadas no capítulo dedicado à construção dos dados.
A organização para análise e codificação dos dados deu-se a partir da
ordenação das respostas em blocos e, na fase seguinte (a codificação), os dados
brutos das entrevistas foram transformados para expressão de seu conteúdo. O
procedimento seguiu a orientação de Bardin (2011): o recorte (e a escolha das
unidades); a enumeração (escolha das regras de contagem); a classificação e a
agregação (escolha das categorias).
As unidades de registro utilizadas foram as respostas dadas pelos
entrevistados, justamente a opção considerada melhor para iniciar a preparação do
material. Assim, a unidade de registro tratou o conjunto de respostas dadas a cada
questão. A escolha da unidade de registro e de contexto possibilitou categorizar e
contar frequências, embora esta última não fosse a principal intenção. Em cada
unidade de registro foram identificados conteúdos, a partir dos quais formulamos a
categorização.
Definida a unidade de registro, as unidades de contexto que serviram para
compreender e codificar as unidades de registro foram os recortes das declarações
dos alunos sobre cada tema. O próximo passo foi verificar a ausência e/ou presença
de elementos nas falas dos entrevistados, assim como a existência (ou não) de
repetições de termos nas declarações de diferentes indivíduos.
Ao categorizar, lança-se mão de processos de classificação para organizar
as informações em conjuntos de características comuns. As respostas dadas às
perguntas do questionário e da entrevista originaram as categorias e subcategorias.
As subcategorias utilizadas para classificar os dados são emergentes (FIORENTINI;
LORENZATO, 2006), recebendo essa denominação por serem estabelecidas
durante a organização e interpretação dos dados.
58
1.8 Considerações sobre o capítulo
Conforme já antecipado, a questão central desta tese é verificar como ocorre
a formação estatística de futuros Engenheiros de Produção. O engenheiro, por sua
vez, é um profissional que tem na Estatística um importante instrumento para aplicar
no seu campo de atuação. O desafio, portanto, é investigar a formação estatística de
estudantes de um Curso Superior na área de EP.
Até agora discorremos sobre o motivo da pesquisa, a obtenção do material
para o corpus do trabalho, da escolha da metodologia e da forma usada para
construir e descrever os dados. A partir da formulação do objetivo e da questão
central, temos as nossas questões norteadas pela Análise de Conteúdo, que além
de um procedimento metodológico, serve como elemento de ligação entre o
referencial teórico, a construção de dados e a elaboração das categorias de análise.
Antes de apresentar os dados e as categorias de análise, trataremos da
História das Engenharias e do conhecimento estatístico, tarefa dividida nos capítulos
2 e 3, que são complementares. O próximo capítulo foi reservado à apresentação de
aspectos históricos do conhecimento moderno e da origem da profissão de
Engenheiro. Discutiremos também algumas relações entre o Conhecimento
Moderno, a Revolução Industrial e o desenvolvimento de diferentes ramos das
Engenharias.
59
CAPÍTULO 2 - CONHECIMENTO MODERNO, AS ENGENHARIAS E A
ESTATÍSTICA.
Talvez não sejamos a medida de todas as coisas,
como propôs o grego Protágoras, em tempos présocráticos, mas somos as coisas que podem medir
(Marcelo Gleiser).
2.1 Introdução
Este capítulo foi elaborado com o objetivo de apresentar algumas relações
entre o conhecimento moderno, a Estatística e a Engenharia. A partir do século
XVIII, após diversas transformações nas formas de tratar o conhecimento existente,
chegou-se a uma forma denominada de método científico.
Vários grupos sociais, em diferentes períodos, desenvolveram formas
distintas de formular conhecimento e disseminar saberes. Em seus primórdios, os
padrões matemáticos eram registrados e disseminados a partir do próprio local de
elaboração (MIORIM, 1998). São conhecidos registros matemáticos que datam de
aproximadamente cerca de 2400 antes de Cristo (DAVIS; HERSH, 1985).
Inicialmente, o conhecimento matemático e os saberes técnicos não eram
especializados, não havendo uma nítida separação entre o ambiente de criação, o
de registro e o de ensino. O afastamento entre a produção e o ensino da Matemática
ocorreu posteriormente, devido ao crescimento da quantidade e da complexidade de
saberes, além de mudanças nas condições sociais, econômicas e políticas em
determinados lugares e períodos históricos. No Egito governado pelos Faraós, por
exemplo,
existiam
sacerdotes,
funcionários
públicos,
militares,
artesãos,
comerciantes, camponeses e escravos, cada um deles exercendo papéis específicos
na sociedade da época. A partir da separação entre as atividades manual e
intelectual, passou a existir entre os povos da antiguidade uma intencional
diferenciação entre o ensino voltado para a prática cotidiana e aquele direcionado à
formação de uma elite dirigente.
60
2.2 A Revolução Científica e a Ciência Moderna
Henry (1998) considera que o ponto de partida para ocorrer a Revolução
Científica foi a Filosofia Natural. Os desdobramentos dos trabalhos de indivíduos
conhecidos como filósofos naturais representam a base para a elaboração do
Conhecimento Moderno e das diferentes Ciências, nos moldes em que são
atualmente desenvolvidas. As explicações que a Filosofia Natural dava para
diferentes fenômenos contou cada vez mais com a aplicação do conhecimento
matemático. Progressivamente foi-se criando condições para que a Matemática se
tornasse elemento de formulação e sustentação do discurso científico moderno.
A Revolução Científica foi, na verdade, uma teia de eventos com auge no
século XVII, na Europa Ocidental. Foram alterados métodos de elaborar
conhecimentos e legar novos saberes à posteridade. Entraram em cena pensadores
como Galileu, Descartes, Leibniz e Newton que, por meio de seus trabalhos,
consolidaram de vez a quantificação como instrumento científico. O conhecimento
matemático tornou-se um meio de descrição de fenômenos e resolução de
problemas, combinando experimentação, dedução e conhecimento matemático.
Com isso, rompe-se
[...] com a barreira existente entre a tradição artesanal e a culta, entre a
razão e a experiência, [...] as matemáticas passaram a desempenhar um
novo e importante papel: o de ferramenta necessária à explicação dos
fenômenos [...] como elemento fundamental para a formação, comprovação
e generalização de resultados que podem, ou não, ser confirmados na
prática (MIORIM, 1998, p. 41).
Nessa ruptura, homens que inicialmente eram filósofos da natureza levaram
parte do mundo a modificar suas formas de ver o universo, descrevendo-o e o
compreendendo por meio do uso de conhecimento matemático. Os fenômenos
passam a ter outro padrão para descrevê-los, por meio de fórmulas e aplicações
numéricas. A Matemática passou a ser um instrumento para atribuir precisão na
descrição de fenômenos, certificando e validando novos saberes.
A inserção cada vez maior de instrumentos matemáticos em diferentes
campos impulsionou seu desenvolvimento. A cumulatividade da Matemática, por sua
vez, acarretou um novo problema para o profissional da área: ele trabalha com uma
quantidade crescente de saberes, o que o impossibilita de dominar cada setor da
61
Ciência e conhecer detalhadamente seus conteúdos. Isso fez com que cada
diferente setor da Matemática crescesse, guardando ou não relações com os
demais.
O progressivo destaque do conhecimento matemático na Ciência Moderna
suscitou discussões sobre a legitimidade de seu alcance. Para Santos (2004), a
relação entre Ciência Moderna e Matemática vai além do fato desta servir de
instrumento para desenvolver o conhecimento de outros campos. Ela tornou-se guia
de conduta em setores que, originalmente, dela não se utilizavam. Além disso, a
Matemática propicia à Ciência Moderna uma lógica investigativa, um modelo de
representação de estruturas e um
[...] instrumento privilegiado de análise [...] deste lugar central da
matemática na ciência moderna derivam suas consequências principais [...]
conhecer significa quantificar [...] as qualidades intrínsecas do objecto são
[...] desqualificadas e em seu lugar passam a imperar quantidades em que
eventualmente se podem traduzir. O que não é quantificável é
cientificamente irrelevante [...] o método científico se assenta na redução da
complexidade [...] conhecer significa dividir e classificar para depois poder
determinar relações sistemáticas entre o que se separou [...] (SANTOS,
2004, p. 26 e 27).
O quadro de relações criado a partir da Revolução Científica foi
posteriormente reforçado pelo Positivismo e o conhecimento matemático tornou-se
elemento centralizador do discurso científico. A quantificação adotada como
sinônimo de excelência na redação do discurso científico ultrapassou o ponto de
elemento disponível para a resolução de problemas. Ao descrever fenômenos não
matemáticos, transformou-se em instrumento de reducionismo, adentrando o
discurso científico moderno para simplificar e formular leis descritoras de fenômenos
naturais.
Dentro do conhecimento científico moderno, a quantificação passou a ser
um instrumento para elaborar regras em diferentes contextos, como quando se aliou
à Estatística na busca de leis simplificadas, objetivando descrever comportamentos
de grupos sociais. Fenômeno análogo ocorreu no relacionamento da Matemática
com a Física.
62
2.3 A Revolução Industrial e a organização das cadeias produtivas
Conforme Germer (2009) e Barros (2012), o conceito de modo de produção
é uma elaboração marxista que designa a maneira pela qual um grupo social se
organiza para produzir meios de atender as suas necessidades materiais. Esse
conceito constitui-se em um conjunto de relações segundo as quais uma sociedade
produz, distribui e utiliza as mercadorias e a prestação de serviços. Trata-se de um
instrumento criado com objetivo de compreender a realidade, orientando a análise
das relações sociais e, ao longo do tempo, passou por reelaborações feitas por
historiadores que presenciaram mudanças socioeconômicas (BARROS, 2012).
Basicamente, o pensamento marxista considera a História feita por pessoas
reais, atuando de acordo com suas condições materiais de vida. Os grupos sociais
são constituídos, portanto, por atores históricos que formulam concepções de mundo
em decorrência da sua prática material. Uma vez que os seres humanos necessitam
de meios para suprir suas necessidades, tornam a própria vida associada às
condições materiais de produção para a subsistência. Assim, os indivíduos
participantes da vida econômica de uma sociedade encontram-se envolvidos em
relações de produção, distribuição e consumo. Além da prestação de serviços,
também são consideradas atividades econômicas o extrativismo, a agricultura e a
produção industrial. Em uma sociedade, o modo de produção é formado pelas suas
forças de produção, organizadas de acordo com determinadas relações de
produção, que correspondem às ligações entre os elementos envolvidos no
processo produtivo.
As forças produtivas são compostas pelos meios de produção, a força de
trabalho e os elementos necessários ao processo de produção. Nelas estão
incluídos o local físico da produção, os meios utilizados no processo produtivo e a
força de trabalho. No exemplo da indústria, os meios de produção constituem-se em
recursos como ferramentas, maquinaria, matéria-prima e instalações. A força de
trabalho é formada por força física, habilidades e conhecimento técnico dos
produtores. A partir da Revolução Industrial, progressivamente, os donos dos meios
de produção têm se apropriado tanto do conhecimento técnico quanto do científico,
tornando-os, dessa forma, elementos associados à cadeia produtiva (via
aperfeiçoamento de máquinas e de processos produtivos).
63
Quando a propriedade dos meios produtivos é privada, os indivíduos
possuem somente a força de trabalho para oferecer. A característica principal do
modo de produção capitalista é o trabalho assalariado, e as relações de produção
baseiam-se na propriedade privada dos meios de produção pela classe social
dominante, a burguesia. No capitalismo, trabalhadores e burguesia são classes
sociais antagônicas em relação à propriedade do modo de produção.
Ao longo do tempo, portanto, as relações de produção se alteram conforme
as forças produtivas desenvolvem-se, ajustando-as ao modo e às relações de
produção. Ao mesmo tempo, diferentes formas de expressão cultural, ideológica, de
elaboração
do
conhecimento
e
de
técnicas,
também
podem
promover
transformações sobre as estruturas sociais existentes. Um exemplo é o domínio de
técnicas agrícolas e de pastoreio, que contribuíram para a fixação de grupos sociais
em determinados territórios. Com isso, não foi mais necessário deslocar populações
em busca de alimentos.
A História, portanto, é feita pela sucessão de modos de produção e a
sociedade capitalista é fruto de um desenvolvimento histórico, resultante do
relacionamento do ser humano com as suas formas de produzir. Por outro lado, o
capitalismo é o primeiro modo de produção da História em que existe a
intencionalidade da inovação tecnológica, o instrumento com o qual se procura
vencer a concorrência no mesmo setor produtivo. Enquanto a quantidade de
inovações aumenta e acirra-se a competição, mais complexa torna-se a tecnologia e
maior é a velocidade com que ocorrem as inovações (GERMER, 2009).
2.4 As Engenharias e a Ciência Moderna
Cunha (2002) esclarece funções e modos de atuação da EP e da formação
do Engenheiro de Produção. Seu trabalho apresenta as diretrizes curriculares e as
habilitações previstas nessa área. Também trata da especialização da referida
profissão, surgida no decorrer do Século XX, em decorrência do avanço da
organização das cadeias produtivas na indústria.
Desde os primeiros passos da Revolução Industrial, a organização da
empresa industrial evoluiu, buscando níveis cada vez maiores de produtividade. Os
64
esforços iniciais focalizavam o processo de produção e as Engenharias, de uma
forma geral, tratavam de conceber e pôr em funcionamento os meios de fabricação
industrial. Posteriormente, veio o aperfeiçoamento dos processos de produção, a
partir da mecanização do trabalho, com o uso intensivo de máquinas. Nesse
momento, as atenções voltaram-se para a organização do chamado chão-de-fábrica,
visando o aumento da rentabilidade dos investimentos. Evoluíram as abordagens
relacionadas à logística de produção, com o surgimento do Taylorismo, introduzindo
a noção de otimização do trabalho. O passo posterior dessa evolução da produção
industrial foi dado após a Segunda Guerra Mundial, objetivando o aperfeiçoamento
do produto.
Paralelamente à demanda cada vez maior pela melhoria da qualidade dos
produtos ocorreu a massificação da informação e da automatização de maquinário e
equipamentos, facilitado pelo avanço da informatização. Portanto, existe um histórico
por trás do desenvolvimento das Engenharias, e o seu ensino acompanhou os
avanços dos processos industriais.
Até a Revolução Industrial (CUNHA, 2002), a Engenharia era subdividida em
dois ramos: o militar e o civil. O próprio caráter evolutivo das Engenharias levou ao
surgimento de outros, tais como Mecatrônica, Telecomunicações e Alimentos,
gerando ramos cada vez mais especializados. A evolução do conhecimento e as
novas subdivisões que surgiram, por exemplo, Mecânica, Elétrica e de Minas, foram
acompanhadas por mudanças no ensino. A EP nasceu voltada para o
desenvolvimento de métodos e técnicas, com objetivo de otimizar a utilização dos
recursos produtivos, buscando a constante evolução da gestão dos meios de
produção.
O perfil do egresso da graduação em EP é o de um profissional conhecedor
de técnicas de otimização e que, ao mesmo tempo, organiza a gestão da produção.
Além disso, deve ser capaz de estabelecer interfaces entre diferentes áreas e
sistemas técnicos e entre essas áreas e os setores administrativos na empresa.
Sendo assim, deve ser apto a decidir de forma coerente a adoção de abordagens
gerenciais sem que, entretanto, descuide dos sistemas técnicos. Também deve
manter vivo o espírito de solucionador de problemas, sendo este um comportamento
considerado típico dos engenheiros.
65
A atuação do Engenheiro de Produção contempla seu envolvimento com
seres humanos, materiais, tecnologias de informação e utilização de energia. Ele
deve especificar, prever e avaliar os resultados da produção, além de prestar contas
diante de diferentes grupos sociais. Também é responsável por avaliar a produção
frente a questões ambientais. Para isso, utiliza princípios e métodos de análise de
projetos de Engenharia, aliado a conhecimentos de Estatística, Matemática, Física e
Ciências Humanas e Sociais.
O Engenheiro de Produção deve ser capaz de utilizar ferramentas
matemáticas e estatísticas para modelar sistemas de produção, prevendo a
evolução dos cenários produtivos. Além disso, deve ter a capacidade de
compreender sob quais formas os sistemas de produção se inter-relacionam com o
ambiente, tanto em situações de escassez de recursos quanto à consideração do
destino final de resíduos e rejeitos. É possível verificar que aspectos econômicos,
sociais e ambientais no exercício da profissão acabam imprimindo um viés social à
atuação do Engenheiro de Produção, mesmo que o profissional não perceba isso.
A proposta para a criação da Grande Área e Diretrizes Curriculares para a
Engenharia de Produção, divulgada em 2001, começou a ser elaborada nas
reuniões do grupo de trabalho de graduação em EP da ABEPRO, promovidas em
1997 e 1998. Essa proposta apresenta uma lista de competências necessárias ao
exercício da profissão de Engenheiro de Produção. Ei-las:
1. Ser capaz de dimensionar e integrar recursos físicos, humanos e financeiros a fim
de produzir, com eficiência e ao menor custo, considerando a possibilidade de
melhorias contínuas;
2. Ser capaz de utilizar ferramental matemático e estatístico para modelar sistemas
de produção e auxiliar na tomada de decisões;
3. Ser capaz de projetar, implementar e aperfeiçoar sistemas, produtos e processos,
levando em consideração os limites e as características das comunidades
envolvidas;
4. Ser capaz de prever e analisar demandas, selecionar tecnologias e know-how,
projetando produtos ou melhorando suas características e funcionalidade;
66
5. Ser capaz de incorporar conceitos e técnicas da qualidade em todo o sistema
produtivo,
tanto
nos
seus
aspectos
tecnológicos
quanto
organizacionais,
aprimorando produtos e processos, e produzindo normas e procedimentos de
controle e auditoria;
6. Ser capaz de prever a evolução dos cenários produtivos, percebendo a interação
entre as organizações e os seus impactos sobre a competitividade;
7. Ser capaz de acompanhar os avanços tecnológicos, organizando-os e colocandoos a serviço da demanda das empresas e da sociedade;
8. Ser capaz de compreender a interrelação dos sistemas de produção com o meio
ambiente, tanto no que se refere a utilização de recursos escassos quanto à
disposição final de resíduos e rejeitos, atentando para a exigência de
sustentabilidade;
9. Ser capaz de utilizar indicadores de desempenho, sistemas de custeio, bem como
avaliar a viabilidade econômica e financeira de projetos;
10. Ser capaz de gerenciar e otimizar o fluxo de informação nas empresas utilizando
tecnologias adequadas.
Nesse documento, também consta uma série de habilidades, listadas a
seguir:
 Compromisso com a ética profissional;
 Iniciativa empreendedora;
 Disposição para auto-aprendizado e educação continuada;
 Comunicação oral e escrita;
 Leitura, interpretação e expressão por meios gráficos;
 Visão crítica de ordens de grandeza;
 Domínio de técnicas computacionais;
 Domínio de língua estrangeira;
 Conhecimento da legislação pertinente;
 Capacidade de trabalhar em equipes multidisciplinares;
 Capacidade de identificar, modelar e resolver problemas.
67
 Compreensão dos problemas administrativos, sócio-econômicos e do meio
ambiente;
 Responsabilidade social e ambiental;
 Pensar globalmente, agir localmente;
A lista de habilidades é seguida por outra, na qual constam os conteúdos
básicos, que devem ser comuns a todas as Engenharias. Dentre elas, constam
Matemática e Probabilidade e Estatística.
Por outro lado, a Resolução CNE/CES10 11, de 11 de março 2002, instituiu
as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia. No
artigo 4º são listadas as seguintes competências e habilidades gerais:
I - aplicar conhecimentos matemáticos, científicos, tecnológicos e instrumentais à
engenharia;
II - projetar e conduzir experimentos e interpretar resultados;
III - conceber, projetar e analisar sistemas, produtos e processos;
IV - planejar, supervisionar, elaborar e coordenar projetos e serviços de engenharia;
V - identificar, formular e resolver problemas de engenharia;
VI - desenvolver e/ou utilizar novas ferramentas e técnicas;
VI - supervisionar a operação e a manutenção de sistemas;
VII - avaliar criticamente a operação e a manutenção de sistemas;
VIII - comunicar-se eficientemente nas formas escrita, oral e gráfica;
IX - atuar em equipes multidisciplinares;
X - compreender e aplicar a ética e responsabilidade profissionais;
XI - avaliar o impacto das atividades da engenharia no contexto social e ambiental;
XII - avaliar a viabilidade econômica de projetos de engenharia;
10
CNE: Conselho Nacional de Ensino; CES: Câmara de Ensino Superior.
68
XIII - assumir a postura de permanente busca de atualização profissional.
O parágrafo primeiro do artigo 5 apresenta explicitamente que durante o
curso do aluno deverá elaborar trabalhos de síntese, que e integrem os
conhecimentos adquiridos.
Em relação à proposta da ABEPRO há uma diferença entre os conteúdos
científicos do núcleo básico da Resolução do Ministério da Educação (MEC). No
parágrafo primeiro do artigo 6 consta apenas Matemática. Probabilidade e Estatística
não é citada como conteúdo específico que caracterize a área.
A
necessidade
de
compreender
diferentes
tipos
de
problemas
(administrativos, socioeconômicos e ambientais), além de sua responsabilidade
social e ambiental, requerer do egresso o reconhecimento de sua importância dentro
da sociedade à qual pertence. Dessa forma, o Engenheiro de Produção é um
profissional de quem se espera o desenvolvimento de múltiplos e diferentes saberes,
não lhe cabendo uma formação fragmentada. Portanto, o conhecimento científico
necessário à sua formação deve capacitá-lo a agir tanto em relação às tecnologias
quanto frente à sociedade da qual participa.
2.5 Alguns elementos dos desenvolvimentos histórico e sociológico da
Estatística
A partir de seu desenvolvimento histórico, a Estatística apresenta-se como
Ciência, cujos primeiros indícios, de acordo com Bayer et al (2013), remontam à fase
embrionária da Matemática. Nos dias atuais ela possui, entre suas aplicações, a
formulação de políticas públicas e projeções econômicas. Além disso, subsidia a
elaboração de hipóteses em pesquisas acadêmicas, ajudando a construir nossa
percepção da realidade.
Existe um aspecto importante do ponto de vista histórico: a partir do
momento em que diferentes populações passaram a ser vistas como recursos
fundamentais de poder do Estado, começou a existir interesse dos governos locais
em desenvolver e controlar saberes específicos. Por conseguinte, era necessário
capacitar os administradores a descreverem a movimentação e a composição dos
estratos sociais nos territórios. Isso fez das estatísticas um elemento vital para a
69
construção dos espaços que o estadista deveria conhecer para melhor agir. Daí a
necessidade de acesso a esta área do conhecimento, pelo menos por uma parcela
da sociedade, sem que necessariamente todos os indivíduos assim o façam, já que
as estatísticas se tornaram uma tecnologia de governo.
O desenvolvimento do conhecimento estatístico em diferentes locais e
épocas ocorreu paralelamente à presença dos primeiros trabalhos matemáticos.
Diferentes métodos de contagem, formas de armazenar dados e os propósitos de
levantá-los foram elementos de uso comum aos dois campos (MARTIN, 2001). Os
primeiros levantamentos estatísticos conhecidos da Idade Antiga ocorreram em
territórios como Egito, Mesopotâmia e China (grandes impérios da Antiguidade com
fortes estruturas administrativas) e apresentaram características próprias. Os
poderes imperiais locais eram centralizados, e existia a necessidade de se conhecer
as características do território e da população. Isso era importante tanto por motivos
estratégicos de defesa quanto pela necessidade de planejar a produção de
alimentos. Portanto, esses levantamentos estatísticos foram complexas atividades
de estado, invariavelmente marcadas pela utilização do método de contagem
concebido localmente.
Desde os primeiros censos demográficos, as populações desconfiavam dos
objetivos militares e fiscais dos estados. Na Europa, o temor do recenseamento foi
um forte aliado da presença política da Igreja Católica, que se opunha a essa
atividade. A fragmentação e a fragilidade dos Estados durante o predomínio feudal
também dificultaram a realização de sensos demográficos na Idade Média. Esses
obstáculos só começaram a ser vencidos por volta do século XVII, com o
fortalecimento dos estados nacionais na Europa. Os censos do século XVII tinham
como objetivo contabilizar os homens e os seus bens materiais. Os objetivos da
época eram de caráter administrativo ou militar e, “[...] em certos aspectos, tratavase mesmo de um instrumento de polícia, porque, até então, [...] o estabelecimento
de conhecimentos científicos não era sua finalidade” (MARTIN, 2001, p.14).
A consolidação da Estatística como campo de conhecimento específico
tem como importante marco: a criação, em 1708, daquele que é formalmente
considerado o primeiro curso de Estatística no Ocidente, na Universidade de Iena,
Alemanha (BAYER et al., 2013). Em relação ao Brasil, segundo a Universidade
70
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN, 2013), os primeiros cursos superiores
dedicados ao conhecimento estatístico datam de 1953, com a implantação de dois
cursos. Um deles foi estabelecido na Escola Nacional de Ciências Estatísticas (na
ENCE), à época, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal. O outro funcionava na
Escola de Estatística da Bahia, mantido pela Fundação Visconde de Cairu, em
Salvador.
A partir desses dados, pode-se verificar algumas características da
Estatística em relação ao tempo decorrido em seu desenvolvimento histórico: 1) os
primeiros passos foram dados na Antiguidade, junto com o desenvolvimento da
Matemática; 2) a consolidação dos censos estatísticos inicia-se no século XVII; 3) o
ensino da Estatística passa a ser formalmente organizado em instituições de Ensino
Superior, no Ocidente, há pouco mais de 300 anos (particularmente no Brasil, há
pouco mais de 60 anos). Desse modo, em se tratando da formalização do ensino de
Estatística e de seu desenvolvimento no campo científico nos moldes atuais
apresentam-se muito recentes em termos históricos, ocorrendo em meio à
consolidação do pensamento científico moderno. Este, por sua vez, contribuiu com a
simplificação de raciocínios e com a separação de diferentes aspectos do mesmo
objeto em relação às formas de proceder.
Quanto às modificações dos processos de trabalho estatístico a partir do
século XVII, devem ser consideradas em meio a uma série de fatos que alteraram
profundamente as Ciências ao longo dos séculos XVIII, XIX e XX. O conhecimento
empírico acumulado levou à necessidade de organizar e sintetizar métodos de
trabalho em diferentes campos. As aproximações entre os olhares de diversos
especialistas e o cruzamento de suas diferentes metodologias de trabalho
originaram uma nova modalidade científica: a Estatística como instrumento científico
moderno.
Além de avanços na Matemática e no campo das Probabilidades (que
impulsionaram a Estatística) na França, na Inglaterra e na Alemanha, passam a ser
publicadas obras dedicadas à abordagem do conhecimento probabilístico. As
abordagens dadas nesses três países são a origem da Estatística nos moldes
atuais. Com isso, surgiu a necessidade de padronizar os processos estatísticos,
gerando um campo de trabalho diferente, tanto da Matemática quanto das técnicas
71
de levantamentos demográficos existentes. As primeiras mudanças ocorreram com o
desenvolvimento da Estatística Descritiva, que trata da elaboração de instrumentos
de organização, comparação e compreensão de dados. Esta, por sua vez, é uma
disciplina presente em diversos cursos de graduação em Engenharia no Brasil
contemporâneo.
No período correspondente aos séculos XVIII e XIX, a Sociologia era uma
Ciência que começava a destacar-se como campo de estudos específicos, tendo
sua constituição apoiada na Estatística. A partir de então, iniciou-se uma mútua
impregnação entre Sociologia e Estatística, com esta última Ciência constituindo-se
em elemento importante das Ciências Sociais então emergentes. A Estatística
avançou como um conhecimento capaz de descrever fenômenos sociais e, ao
mesmo tempo, a Sociologia contribuiu para desenvolver procedimentos estatísticos
e criar categorias para normatizar e homogeneizar os métodos estatísticos. Além
disso, essas categorias também servem para enumerar, classificar e verificar o que
é norma e o que dela se desvia dentro de grupos sociais (MARTIN, 2001).
2.6 O conhecimento científico diante aos movimentos da sociedade
As formalidades de uma área de conhecimento e a linguagem utilizada em
seus trabalhos devem ser consideradas quando a objetividade e a subjetividade
científicas se confrontam. Essa é a razão pela qual a linguagem utilizada em
trabalhos científicos e comunicação de resultados é contaminada por elementos
desconhecidos pelo próprio profissional (DEMO, 2000). Feyerabend (2007) afirma a
existência de uma ideia arraigada na tradição das Ciências Naturais: considerar que
os sentidos utilizados nas observações, em condições de desempenho normal,
fornecem dados confiáveis. Tal ideia pode impregnar a linguagem científica, afetar
as noções de verídico e ilusório, amplamente utilizadas, influenciando as escolhas
de metodologias de trabalho. A ideia de que primeiramente o pesquisador observa e
depois descreve o percebido tratar-se-ia, portanto, de uma situação abstrata e de
caráter psicológico, constituindo-se em outra forma de fragmentação.
A descrição e o objeto descrito são elementos indissociáveis, envolvidos na
narração do que se percebe, a partir de uma linguagem pré-existente, reconhecida
pelo pesquisador. Mesmo porque não faz sentido “[...] recorrer à observação se não
72
se sabe descrever o que se vê [...] como se se tivesse acabado de aprender a
linguagem na qual ela é formulada [...]” (FEYERABEND, 2007, p. 95). Ao descrever
uma observação e apresentar seus resultados, a linguagem científica é utilizada em
associação com uma linguagem não científica.
Pode-se dizer, portanto, que a percepção do objeto descrito depende da
forma pela qual o indivíduo internaliza os resultados, gerando relações e
propriedades durante a descrição do que se considera verdadeiro. Mesmo cercada
de regras e critérios técnicos, a escolha do objeto e das formas de descrevê-lo são
também carregadas de subjetividades, impregnando a cadeia de produção de
dados.
A ideia de contaminação da linguagem científica é partilhada por Demo
(2000) e Feyerabend (2007). Ambos consideram que escolhas subjetivas também
afetam o conhecimento racionalmente determinado. Isso deixa evidente que é
inconsistente defender a Ciência como elaboração exclusiva, feita a partir de
instrumentos puramente racionais e isentos de preferências.
Mesmo cercada de critérios técnicos, a escolha de como divulgar resultados
estatísticos também pode ser subjetiva. A subjetividade, por sua vez, é agregada ao
longo de uma cadeia de processamento de números e, segundo
[...] números, tabelas [...] classificações, são tomados como realidade do
quadro que descrevem, o que é indispensável para os discursos de verdade
que sustentam, incluindo aí a construção dos conceitos científicos. Graças à
linguagem bastante estável e amplamente reconhecida das estatísticas,
confundem-se realidade e convenção [...] (CAMARGO, 2009, p. 914).
Ao mesmo tempo em que a convenção pode ser confundida com a
realidade, a linguagem estável do discurso científico também pode ser utilizada para
naturalizar fatos que são, na realidade, construídos por um grupo social restrito.
Outro aspecto da Estatística são seus elementos de aleatoriedade, pois ela também
se apoia no cálculo de Probabilidades. Por isso é necessário considerar a presença
da incerteza e da aleatoriedade, não se podendo afirmar e evidenciar por si mesmo
o discurso da Estatística como Ciência exata, imparcial, essencialmente racional e
isenta de subjetividades.
73
Skovsmose (2007, p. 71) considera importante compreender as dinâmicas
dos usos do conhecimento dentro da sociedade. Ele argumenta que apenas na
solidão e isolamento dos locais de pesquisa, “[...] quando a Matemática é posta em
ação, é fácil agir como se o que ela apenas re-apresenta fosse de fato uma
representação [...]” (grifo do autor). Não se deve, portanto, exacerbar as
potencialidades abertas pelo uso do conhecimento matemático, o que também pode
ser estendido à Estatística. Não se pode delegar ao conhecimento a autoridade de
decisão final sobre as soluções que devem ser dadas a diferentes problemas. Se o
conhecimento matemático pode ser pensado como capaz de dar forma a
experiências cotidianas e ao convívio dentro da sociedade, ao mesmo tempo podese levantar alguns questionamentos. Por exemplo:
[...] a matemática oferece uma maneira conveniente de ver o mundo, na
medida em que estruturas materiais tornam-se espelhadas por estruturas
matemáticas? Ou estamos lidando com um sofisticado exemplo de projeção
de estruturas matemáticas sobre o mundo, de tal modo que ele aparenta ser
formado por estruturas matemáticas? Estamos confundindo propriedades
matemáticas projetadas com propriedades do mundo material? [...]
(SKOVSMOSE, 2008, p. 92).
De forma semelhante ao que ocorre com o conhecimento matemático, a
utilização da Estatística no cotidiano tem servido para moldar visões de mundo. Uma
delas ocorre ao pensá-la como instrumento neutro, objetivo e racional. Existe o risco
de se considerar o mundo administrável a partir da utilização massiva do
conhecimento científico. A intenção é criar uma visão unificada, deixando cada vez
mais os posicionamentos pessoais de lado, abandonando valores sociais
importantes, os quais acabam sendo deixados de lado pelo conhecimento científico
moderno. Um exemplo disso é a preocupação com os rumos da ética na utilização
do conhecimento. Essas interrogações podem ser estendidas à realidade de
atuação de um Engenheiro de Produção. Existiria o homem médio operário
concebido por Adolphe Quételet11 na concretude de uma linha de produção? O
tratamento estatístico dos dados referentes ao desempenho desse operário seria
uma forma de observar sua produtividade ou moldaria um objetivo conveniente ao
capital? O cotidiano de um Engenheiro de Produção é determinado por parâmetros
estatísticos ao invés deles serem apenas mais um instrumento disponível para o seu
11
* 1796; † 1874. A ele é atribuída a criação do termo “homem médio”.
74
trabalho? As atividades econômicas e os fenômenos sociais e naturais presentes
dentro ou fora da fábrica são determinados ou descritos estatisticamente?
2.7 Considerações sobre o capítulo
Neste capítulo foi apresentada parte da evolução da Engenharia, sendo visto
que, a partir do século XIX, as Ciências desenvolveram diferentes técnicas,
especializando-se cada vez mais e rapidamente. Em meio a tal cenário, a
Engenharia iniciou seu processo de dispersão em diversos ramos, passando por
mudanças ainda mais aceleradas no século XX, gerando o atual quadro de
especialização.
Também vimos que, paralelamente ao desenvolvimento técnico e científico,
a Matemática e a Estatística tornaram-se linguagens cada vez mais utilizadas para a
resolução de problemas e expressão de resultados de pesquisas em outros campos.
Neste capítulo foi apresentado parte do desenvolvimento histórico e sociológico da
Estatística que, como campo de pesquisa independente, possui pouco mais de
trezentos anos, sendo que, nesse intervalo, passou por importantes transformações
de conceitos, procedimentos e aplicações.
Resta-nos discutir as implicações que o quadro de transformações do
conhecimento científico, fragmentado e simplificado, representa para a Educação. O
próximo capítulo também será dedicado ao exame das consequências da
concepção moderna de Ciência e propostas de reconciliar o conhecimento com a
sua complexidade, incluindo as que dizem respeito ao ensino de Estatística.
75
CAPÍTULO 3 - O ENSINO DE ESTATÍSTICA NO NÍVEL SUPERIOR
É um erro conferir ao conhecimento científico real um
único sentido. Para apreendê-lo em sua função
dinâmica, é preciso ter a coragem
de colocá-lo em no seu ponto de oscilação
(Gaston Bachelard).
3.1 Introdução
Ao fim do século XIX e início do século XX, em meio a mudanças
socioeconômicas na Europa (continente em acelerada fase de industrialização),
ocorreu uma divisão entre campos científicos. Vivia-se tempos em que se cultivava
uma grande expectativa acerca do conhecimento científico. Em decorrência dos
avanços das Ciências, acreditava-se possível solucionar os problemas existentes e
melhorar as condições econômicas e sociais.
A influência do pensamento positivista fez-se presente na tendência em
assumir um posicionamento epistemológico, segundo o qual reflexões e críticas
deveriam recair sobre a validade ou não das descobertas de então. Deixou-se de
lado o debate sobre as consequências sociais e éticas, em detrimento dos avanços
científicos. Ao mesmo que tempo surgiam diversas especializações, os currículos
foram revistos para que fossem adequados às necessidades tecnológicas da época.
O ideal de formação técnico-científico passou a ser o sujeito especializado, com seu
profissionalismo a serviço dos ideais de sua própria comunidade. O ensino científico
passou por reformulações e, com o advento da Era Espacial12, as discussões sobre
a necessidade de alterar o ensino de Matemática ganharam impulso.
O
presente
capítulo começa
com uma
discussão
sobre algumas
consequências da fragmentação do conhecimento decorrentes da influência do
pensamento moderno. Logo, verificamos que, na Educação, os saberes e currículos
acabaram fragmentados. Também foram apresentadas evidências de relações de
poder por trás da elaboração curricular. Surgem ainda alguns pensadores que se
contrapõem à Educação guiada por uma concepção moderna de conhecimento. Ao
12
Iniciada com o lançamento do satélite soviético Sputnik 1.
76
final do capítulo são apresentados princípios da Educação Crítica e alternativas à
abordagem tradicional.
3.2 A fragmentação do conhecimento: algumas consequências.
As formas de desenvolver o conhecimento foram impactadas principalmente
pela expansão da quantidade de campos científicos a partir do século XIX. Além
disso, “[...] o prodigioso enriquecimento das variadas tecnologias de pesquisa tem
por contrapartida a multiplicação de tarefas e o advento da especialização [...]”
(FAZENDA, 2002, p. 26), o que influencia a formação para o exercício de diversas
profissões. Esse desenvolvimento em meio à crescente especialização ocorreu com
base no primado da análise em relação à síntese, de acordo com padrões
determinados pelo que se convencionou chamar de Ciência Moderna. Uma
consequência da radical especialização foi a formação de um indivíduo que tende a
agir mecanicamente, esquecendo a própria condição de elemento na sociedade.
Sabe-se que todo conhecimento tem de ser organizado, demandando
seleção de dados significativos, por meio de algum critério. Deixa-se de lado o que
não tem significado, enquanto as informações, por núcleo de interesse continuam
sendo organizadas. Nessa organização existe uma determinada lógica que,
comandada por paradigmas, de alguma forma orienta a nossa visão dos objetos,
das pessoas e do mundo. Sendo assim, todo e qualquer paradigma carrega em si
significados culturais e históricos. No caso da Ciência Moderna, esse fato acarretou
uma
série
de
problemas
para
a
elaboração
do
conhecimento,
tornado
excessivamente simplificado. Dessa forma, ao invés de esclarecer, o que era
produzido resultava em não domínio do assunto, pois a construção de saberes
ocorria apenas para “[...] dissipar a aparente complexidade dos fenômenos, a fim de
revelar a ordem simples a que eles obedecem” (MORIN, 2006, p. 5).
Nesse momento, submeteu-se excessivamente o conhecimento a uma
tríade composta de disjunção, redução e abstração. Tal quadro levou o ser humano
à patologia do saber e a uma consequência ainda mais grave: o desenvolvimento de
uma inteligência cega, separando a Filosofia e a Ciência. As consequências disso
foram mais intensamente discutidas no século XX, e esse distanciamento privou a
Ciência das reflexões sobre si mesma, isolando radicalmente as Ciências Exatas
77
das Ciências Naturais e Humanas. Havia ainda o agravante da Ciência perder “[...]
sua capacidade de controlar, prever e até mesmo conceber seu papel social, em sua
incapacidade de integrar, articular, refletir sobre seus próprios conhecimentos [...]”
(MORIN, 2006, p. 52).
Feyerabend (2007) foi um autor considerado controverso por seus
contemporâneos, por considerar a que a Educação Científica simplifica, delimita e
determina campos excessivamente específicos. Entre outros argumentos, considera
que a distância entre a História e o treinamento científico condicionam seus
participantes à lógica de cada setor. Também afirma que o conhecimento moderno
não se desenvolveu harmoniosamente, inspirado em experimentos capazes de
descrever e descobrir dados que desvelam a ordem racional do universo, em meio a
um caos aparente. Considera necessário relativizar o potencial explicador atribuído
ao conhecimento científico, alertando para o fato de que as formas de elaboração e
disseminação dos saberes também ocultam intenções e relações de poder.
Um discurso próximo ao de Feyerabend (2007) é o de Demo (2000), que
lembra o fato de, ao passar a teoria dominante, uma proposta metodológica leva
diferentes campos científicos a alinharem-se metodologicamente com ela. Alguns
temas passam à preferência em detrimento de outros e, dessa forma, o
conhecimento se encontra em redes de interações, com os fios dessa trama
tensionados por diferentes interesses nas comunidades científicas. Mas, a
prevalência do pensamento científico ocidental sem a crítica necessária de métodos
e conteúdo proporciona o chamado “chauvinismo científico” (FEYERABEND, 2007,
p. 67), um dos responsáveis por afastar elementos tradicionais de uma cultura. Para
ele, se o conhecimento científico é absorvido de forma incontestada, cada nova
geração tende a reconhecer como justa a superioridade material e intelectual do
Ocidente. Portanto, os problemas históricos de uma Ciência não constituem dados
acessórios. Sendo assim, a presença da história da disciplina científica no currículo
ajudaria os educandos a compreenderem as maneiras pelas quais as teorias
evoluíram e chegaram ao estágio atual, mostrando que o ser humano deve ser um
elemento decisivo na evolução do conhecimento.
Como se sabe, a produção do conhecimento vem sendo desenvolvida ao
longo de períodos históricos em diferentes locais e por indivíduos que têm visões de
78
mundo totalmente diferentes. Por isso é que conflitos e contradições estão presentes
nessa constituição teórica, como resultado de processos históricos, heterogêneos e
complexos. É quando surgem tanto concepções inovadoras (que podem ser
consideradas incoerentes) quanto sistemas teóricos complexos e formas de
pensamento consolidadas. Portanto, ao confrontar a hipótese de um desses
teóricos, é necessário considerar o contexto do local e da época da formulação de
sua hipótese - ou tese, pois visões de mundo demandam tempo para
estabelecerem-se e/ou serem superadas.
As bases sobre as quais o conhecimento ergue-se também não são
atemporais, livres de aspectos linguísticos, sob os quais os enunciados são
redigidos, além de não estarem isentas das formas de pensar dos respectivos
elaboradores. Então, ao argumentarmos cientificamente, é necessário utilizar
afirmações ainda não validadas, pois é impossível passar cada objeto em estudo por
uma cadeia de definições e explicações de outrem. Há ainda a questão de que um
discurso em estágio inicial incorpora argumentações já disponíveis, muitas vezes
sem questionar o que se utiliza (DEMO, 2000). Um exemplo dessa realidade é a
formalização das teorias matemáticas e a necessidade de tornarmos consistentes
alguns de seus enunciados. Geralmente essas elaborações começam com a
escolha de conceitos primitivos (que não são definidos para evitar raciocínios
circulares) e continuam com a redação dos axiomas (enunciados considerados
verdades, sem que tivessem sido demonstrados), buscando-se atribuir sentido aos
conceitos primitivos.
Sendo assim, por existirem termos não definidos articulados em enunciados
não contestados, não há como uma Ciência classificada como exata fugir de suas
próprias inexatidões teóricas em termos de linguagem. Além disso, o núcleo de uma
definição deve ser considerado provisório, pois inicialmente pode ser difícil
reconhecer com precisão o aspecto a ser definido. Portanto, as definições também
necessitam de revisões, em decorrência da complexidade na elaboração de todo e
qualquer conhecimento.
Outra consideração deve recair sobre as formas de legar os saberes de
diferentes Ciências à posteridade, pois o discurso herdado da Revolução Científica
aprisiona as Ciências sob um revestimento racional, legando-lhes imagens
79
congeladas de uma Ciência que, de diferentes formas, serve “[...] para aterrorizar as
pessoas não familiarizadas com a sua prática” (FEYERABEND, 2007, p. 21). O uso
de linguagens inacessíveis faz com que as pessoas não especialistas no assunto
tendam a se afastar da discussão sobre os avanços científicos e do potencial que
eles têm de afetar suas vidas. Assim, expõe-se um paradoxo no desenvolvimento
científico: ao mesmo tempo em que os saberes são vistos como instrumentos de
evolução e liberação humana, os resultados científicos também podem ser utilizados
para controle social. Por sua vez, cada Ciência deveria ser ensinada como uma
forma de concepção do conhecimento, e não o único caminho para se conhecer a
realidade do mundo.
3.3 A complexidade do ensino de conceitos científicos
Skovsmose (2007) apresenta sua preocupação com o papel da Matemática
na Graduação pelo fato desse nível ser responsável por reconfigurações do saber e
formulação de novos conhecimentos, sendo também o momento no qual ocorre o
desenvolvimento de outras Ciências e, de diferentes tecnologias. Nesse nível,
acentua-se a responsabilidade dos profissionais, sendo-lhes necessário atentar para
o fato de que
[...] preparar para a ação também é preparar para a responsabilidade, e [...]
educação em ciência e matemática tem que ser desenvolvida sem a
proteção da suposição de progresso que forneça garantia de segurança de
uma conexão intrínseca entre ciência e progresso social [...] esse é um
desafio substancial, não apenas para a ciência na universidade e para a
educação matemática, mas, para todas as formas de educação superior [...]
(SKOVSMOSE, 2007, p. 186-187).
Esse desafio aumenta porque, tradicionalmente, os currículos de Matemática
das áreas técnicas e desenvolvedoras de tecnologias são predominantemente
voltados ao desenvolvimento de habilidades para a manipulação e o controle de
procedimentos rotineiros. Não existe a preocupação explícita em relação às
consequências sociais de transformações e aplicações do conhecimento.
Existem casos em que a Matemática aparece explicitamente, como na
aplicação do Cálculo Diferencial e Integral ao projetar as estruturas de um prédio.
Em outros, ela age implicitamente, sem que sua presença direta seja percebida. Um
exemplo é o dos engenheiros que utilizam planilhas prontas que foram preparadas
80
por outros indivíduos, sem a possibilidade de intervir na elaboração do que é
apresentado como pronto e acabado.
A formação pautada apenas na eficiência operatória do saber adquirido pode
resultar em falta de preparo para o confronto com decisões, nas quais não é apenas
a técnica que deve ter peso: “[...] a matemática está em todo lugar - se não em cena,
atrás da cena [...]” (SKOVSMOSE, 2007, p. 114). Como exemplo destaca-se a
criptografia de mensagens, utilizada tanto em atividades militares quanto no
cotidiano civil. Nos processos criptográficos, o conhecimento matemático é aplicado
para codificar uma mensagem de maneira a não ser compreendida por qualquer um.
O alheamento da realidade social é um aspecto do jogo de poder que
envolve o desenvolvimento e a utilização do conhecimento científico como
instrumento de manutenção de relações sociais. Mesmo tendo noção de que existe
grande quantidade de conhecimento científico utilizado na elaboração de tecnologias
para uso cotidiano, nem todos os indivíduos de uma sociedade têm poder de decidir
sobre o que será ou não incluído na pauta de desenvolvimento (e mesmo sobre a
discussão de benefícios e riscos envolvidos). Como exemplo pode-se citar o uso do
conhecimento estatístico na elaboração de projeções econômicas, utilizadas para
sustentar tomadas de decisões governamentais frente à opinião pública. Tal
imposição de decisões pode ocorrer sem que a população seja chamada a discutir
seus benefícios e riscos.
É necessário que, durante a formação especializada, os estudantes reflitam
sobre significados e consequências das ações futuras. Quando a Matemática é
posta em ação no planejamento e execução de projetos, “[...] é possível estabelecer
um espaço de situações hipotéticas na forma de alternativas (tecnológicas) para
uma situação presente [...]” (SKOVSMOSE, 2007, p. 124, grifos do autor). A
Matemática torna-se um instrumento para desenvolver raciocínios hipotéticos e criar
alternativas para a elaboração de novas tecnologias. Estas, por sua vez, podem
fazer com que o conhecimento matemático retorne para a prática diária, estando ou
não explícita nessas situações. O termo imaginação tecnológica é utilizado pelo
autor para referir-se aos espaços abertos pela Matemática, ao se conceder liberdade
de identificar tecnologias aplicáveis a determinadas situações.
81
Outra utilidade para um modelo matemático seria a de justificar o anúncio de
uma decisão previamente tomada quando o conhecimento serve à sua legitimação e
torna-se mero instrumento para explicá-la. Porém, deve-se ter cuidado, pois um
modelo com soluções hipotéticas excessivamente restritas favorece a apresentação
e a imposição de apenas uma alternativa.
O envolvimento do profissional com o conhecimento matemático também o
capacita a formular estratégias, investigar fatos e levantar contingências. Isso é
evidente ao ver esse conhecimento utilizado em atividades de planejamento e na
elaboração de novas tecnologias, assim como em sua distribuição. Outro aspecto do
alcance do conhecimento matemático é a fabricação de fatos, quando ele é utilizado
no tratamento de informações divulgadas em diferentes mídias. Dependendo da
manipulação que se faça, pode-se descrever ou ocultar riscos potenciais para os
indivíduos de um grupo social e justificar ações.
Outra discussão refere-se ao uso de conhecimento na formulação de
modelos para tomadas de decisões capazes de afetar desde pequenas coletividades
até as populações de um país inteiro. Buscando decidir baseando-se apenas em
resultados de modelos matemáticos e estatísticos, sem refletir sobre o caráter
socioeconômico das opções, os danos podem ser irreversíveis ou demandar muitos
anos para repará-los.
Portanto, a preparação de um profissional para utilizar mecanicamente o
conhecimento pode acarretar sérias consequências sociais, em decorrência da
percepção do conhecimento como instrumento objetivo, definitivamente formulado,
não necessitando de adequações, reflexões e discussões. Pode-se exemplificar com
a análise de riscos nos procedimentos de engenharia. O analista não pode
considerar-se isento de culpa das falhas no projeto apenas por ter utilizado
corretamente procedimentos padronizados e já consagrados em seu campo de
atuação. Nos cursos de Engenharia é necessário favorecer discussões sobre
possíveis consequências da utilização da Matemática e da Estatística em processos
de decisão e a abordagem da importância desses conhecimentos para o
desenvolvimento de TICs e sistemas de informação também não podem ser
esquecidas.
82
A adaptabilidade da Estatística a diversos estudos foi importante para o
desenvolvimento de seus conceitos e aplicações. Sua evolução como Ciência
autônoma aproximou-a de diferentes saberes, tornando-a capaz de adequar seus
instrumentos a várias modalidades de pesquisas. Porém, o ensino de Estatística não
escapou ao paradigma científico moderno. Apesar das aproximações com outros
campos de conhecimento, há livros introdutórios ao tema em que as inter-relações
com o conhecimento estatístico não transparecem. É o caso de exemplos e
exercícios nos quais os dados para a sua resolução são apresentados de forma
descontextualizada, objetivando ilustrar imediatamente a aplicação de fórmulas.
Skovsmose (2007) chamou esse procedimento de paradigma do exercício. Também
há outra modalidade de ensino em que os exercícios enquadram-se em outro
modelo, denominado pelo autor como semirrealidade. Este termo refere-se às
situações artificiais descritas em enunciados que não apresentam qualquer dado ou
aspecto externo ao exercício, limitando-se apenas ao que é considerado importante
para resolvê-lo e obter uma resposta.
O paradigma do exercício e o uso de semirrealidades são formas de ensino
fragmentadas que dificultam a aproximação entre o conhecimento estatístico e
outras disciplinas. Tanto o primeiro quanto o segundo favorecem a assimilação de
procedimentos mecanizados de maneira não reflexiva. Para a EP exemplifica-se a
dissociação dos temas estatísticos da análise de cenários socioeconômicos no
exercício da profissão. O futuro engenheiro é preparado para resolver problemas
técnicos específicos de sua área, sem que dele se exija a capacidade em associar
sua atuação à geração de soluções para diferentes problemas de um grupo social.
Com isso, o aluno é acostumado à submissão de procedimentos e rotinas de
ordens e a aceitar a dualidade certo-errado, sem que seja exposto à argumentação
sobre situações reais. Assim, a Educação Superior em moldes tradicionais
condiciona o aluno a essa dualidade, estendida às demais atividades cotidianas.
Essas práticas servem à formação, diferenciação e classificação de indivíduos
submissos às diversas formas de autoridade, incluindo condições impostas pelo
mercado de trabalho (SKOVSMOSE, 2008).
Sobre
os
currículos,
o
professor
D’Ambrosio
(2002)
afirma
que
historicamente eles são organizados de forma hierárquica. A situação de poucas
83
articulações entre disciplinas pode aprofundar a fragmentação a partir de como elas
forem tratadas. Para o autor, é necessário mudar as estruturas curriculares e existe
um ponto crítico que necessita ser ultrapassado que dar-se-ia na
[...] passagem de um currículo cartesiano, estruturado previamente à prática
educativa, a um currículo dinâmico, que reflete o momento sociocultural e a
prática educativa nele inserida. O currículo dinâmico é contextualizado no
sentido amplo (D’AMBROSIO, 2002, p. 88).
A expressão currículo cartesiano é referência a uma estratégia de resolução
de problemas utilizada pelo Filósofo e Matemático Reneé Descartes, que
considerava a análise um instrumento fundamental de seu trabalho 13. Com o passar
do tempo, a valorização excessiva da análise, em detrimento da síntese, refletiu na
Educação. Desde o Ensino Básico até a formação profissional, recorre-se ao uso de
parcelas desconexas de diferentes conhecimentos para se elaborar currículos e
planos de ensino de diferentes disciplinas. Na prática, são concebidas estruturas
fragmentadas, hierarquizadas e pouco dinâmicas, seja em relação à articulação de
saberes entre si, seja na ligação com o mundo fora do ambiente da escola.
O currículo dinâmico proposto por D’Ambrosio (2002) requer o tratamento do
conhecimento em sua complexidade e, para isso, são necessárias estratégias
adequadas. Uma perspectiva de ação a partir de estratégias é apresentada por
Morin (2006), ao considerar a complexidade do conhecimento. A ação por meio do
uso de estratégias é diferente daquela que utiliza um programa previamente
determinado e aplicado, sem variações ao longo do tempo. A estratégia
[...] permite, a partir de uma decisão inicial, prever certo número de cenários
para a ação, cenários que poderão ser modificados segundo as informações
que vão chegar ao curso da ação e, segundo os cursos que vão suceder e
perturbar a ação [...] a estratégia aproveita-se do acaso [...] o acaso não é
apenas o fator negativo a ser reduzido, é também uma chance que se deve
aproveitar (MORIN, 2006, p. 79-80).
É possível refletir sobre um problema ao iniciar-se uma ação baseada em
determinada estratégia: o rumo dos acontecimentos pode escapar às intenções
iniciais.
A partir do momento em que começam as interações, há o risco do
ambiente criado apossar-se da situação, dando rumo oposto ao que se planejara. As
13
A partir da subdivisão de um problema a ser resolvido em partes menores (aplicação da análise),
ele via uma possibilidade de estudar detidamente cada componente de uma situação.
Posteriormente, a retomada das soluções parciais em um processo de síntese daria uma solução ao
problema.
84
discussões de D’Ambrosio (2002) e Morin (2006) convergem para um ponto: o
currículo cartesiano não obriga os envolvidos a se lançarem rumo ao desconhecido
e nem a se preocuparem com inovações. Nesse caso, o ideal seria escolher temas e
fazer pequenas programações, deixando a estratégia e a ação determinarem os
avanços do conhecimento.
3.4 A formação acadêmica fragmentada
Uma vez que geralmente há fragmentação na formação acadêmica no Nível
Superior de ensino, uma especialização passa a ter contornos inevitáveis, o que
também acontece com o Engenheiro de Produção. A própria estrutura do referido
Curso possui aspectos dessa fragmentação, refletindo o olhar positivista do século
XIX, época na qual iniciou-se o processo de dispersão e especialização das
Engenharias.
A respeito do pensamento positivista, afirma-se que Augusto Comte14
considera a possibilidade de
[...] classificar todos os fenômenos segundo um pequeno número de
categorias naturais [...] os fenômenos, os mais simples, são também
necessariamente os mais gerais [...] é pelo estudo dos fenômenos [...] mais
gerais ou mais simples que se deve começar, indo progressivamente para
os mais complicados ou particulares [...] (SILVA, 1999, p.41).
Mantida essa preocupação em classificar e progressivamente apresentar os
elementos
simplificados
em
seus
detalhes
particulares,
chega-se
a
uma
fragmentação que inviabiliza articular entre si os diferentes saberes. No caso do
conhecimento estatístico, perde-se a chance em abordar aspectos da realidade da
própria profissão e, também de fora dela. A perda de capacidade em articular
saberes pode fazer do formando um indivíduo com problemas de coordenar ações
baseadas em diferentes conteúdos aprendidos nas disciplinas em que ele foi
aprovado.
Além do desenvolvimento científico e do surgimento de diferentes
tecnologias a partir do século XIX, ocorreu outro fato, que foi a separação entre
ensino e pesquisa. Com base em disciplinas fragmentadas, passou-se a formar
14
Considerado o principal articulador da Filosofia Positivista.
85
profissionais extremamente especializados, muitas vezes com dificuldades em
comunicar-se com outros indivíduos da própria área, como é o caso da Física.
Em meio a discussões sobre causas e consequências da fragmentação do
conhecimento, existe o papel da Academia, considerada responsável pelo
surgimento
de
barreiras
disciplinares,
estimulando
a
uniformização
de
procedimentos e o reducionismo. Ela, “[...] em certos casos, passa a ser camisa-deforça. Estrutura, formaliza, rotula e direciona em uma única, mas restrita direção”
(FAZENDA, 1991, p. 19). Também são observados exageros de fragmentação e
especialização, levando a situação a tal ponto que, para se obter mais rigor, o objeto
em questão é fragmentado ao extremo, obedecendo-se a uma concepção de que
[...] o conhecimento é tanto mais rigoroso quanto mais restrito é o objecto
sobre que incide [...], sendo um conhecimento disciplinado [...]para policiar
fronteiras entre as disciplinas e reprimir os que quiserem transpor [...] os
males desta parcelização do conhecimento e do reducionismo arbitrário que
transporta consigo são hoje reconhecidos [...] criam-se novas disciplinas
para resolver os problemas produzidos pelas antigas e [...] reproduz-se o
mesmo modelo de cientificidade (SANTOS, 2004, p. 73-75).
Essa concepção disciplinar ocorre nas Engenharias, o que também acontece
no Ensino Básico, no qual são trabalhados conteúdos de Matemática e Estatística
necessários a outras Ciências. Porém, os conceitos são tratados abstratamente,
sem articulação com os demais saberes desse nível de ensino.
Como outro aspecto da fragmentação cita-se o afastamento entre sujeito e
objeto para dar objetividade ao trabalho científico. Feyerabend (2007) e Demo
(2000) opõem-se à ideia de naturalizar a separação de sujeito e objeto. Lévy (2006)
também se contrapõe a essa naturalização, considerando o conhecimento uma
elaboração de diferentes sujeitos históricos, que se apresentam munidos de
tecnologias. Dessa forma, sujeito e objeto não são livres de influências de
linguagens, de formas de armazenar dados e dos modos de elaboração de
informação e conhecimento. Além de não considerar sentido na separação radical
de sujeito e objeto, o autor também pondera que o pensamento não ocorre
isoladamente no indivíduo, mas resulta de uma elaboração coletiva. Tanto a
inteligência quanto a cognição resultam
[...] de redes complexas onde interagem [...] atores humanos, biológicos e
técnicos. Não sou “eu” que sou inteligente, mas “eu” como grupo humano no
qual sou membro, com minha língua, com toda a herança de métodos e
86
tecnologias intelectuais [...] fora da coletividade, “eu” não pensaria. O
pretenso sujeito inteligente nada mais é que um dos microatores de uma
ecologia cognitiva que engloba e restringe [...] o pensamento se dá em
numa rede na qual neurônios, módulos cognitivos, humanos, instituições de
ensino, línguas, sistemas de escrita, livros e computadores que se
interconectam, transformam e traduzem as representações (LÉVY, 2006, p.
135).
Portanto, o próprio desenvolvimento tecnológico e a utilização de novas
invenções tanto modificam o trabalho em geral (e o do estatístico em particular)
quanto podem alterar as formas de ensinar diferentes conteúdos (idem para a
Estatística). Assim, são necessários elementos materiais e sociais para que ocorra o
desenvolvimento da inteligência e da aprendizagem individual. É necessária a
inserção de cada um no grupo social para haver o encontro de uma língua,
diferentes tecnologias e indivíduos singulares (embora semelhantes entre si).
Podemos então afirmar que o conhecimento como elaboração individual
solitária faz sentido apenas para aqueles que consideram a cognição um privilégio
pessoal. Partindo do princípio de que sujeito e objeto não devem ser radicalmente
separados, resta considerar que a Ciência Moderna, ao tentar isolar objeto,
observador e processos históricos visa apresentar o conhecimento como elaboração
individual, separando-a do resto do universo por meio de uma “cortina de ferro
epistemológica” (LÉVY, 2006).
3.5 Conhecimento, Educação e relações de poder.
Para Skovsmose (2007), a Matemática é utilizada como instrumento de
estratificação quando nos currículos escolares ignoram-se aspectos sociais, políticos
e culturais. Os procedimentos tradicionais de ensino também influenciam o
desempenho individual do aluno, pois, enquanto a minoria consegue adaptar-se a
processos rotineiros (que favorecem a adequação ao exercício de profissões
valorizadas socialmente), a maioria excluída pelos processos formais de
escolarização é posta à disposição da sociedade (e sujeita à execução de atividades
com remuneração e condições de trabalho precárias). Dessa forma, o conhecimento
cumpre o papel em ser um instrumento para a seleção social, demarcando
competências e legitimando a segregação dos indivíduos incapacitados de lidar com
a cadeia produtiva.
87
Apresentado em sua forma tradicional, o conhecimento matemático não
ajuda os estudantes a expressarem ideias e, a posicionarem-se diante do mundo
(SKOVSMOSE, 2007). É importante vincular a Educação Matemática à formação do
indivíduo crítico e, nesse ponto, vale ressaltar dois fatos marcantes: 1º) o
conhecimento matemático serve para desenvolver tecnologias concebidas com
diferentes propósitos de utilização nas sociedades contemporâneas; 2º) a Educação
Matemática, em sua forma tradicional, se constitui em tecnologia de exclusão e
controle social, ajudando a preservar a ordem estabelecida. Enquanto alguns
indivíduos são dotados de mais possibilidades de ajuste às mudanças na demanda
por mão de obra, outros são excluídos, devido à falta de conhecimentos, ficando
diante de oportunidades às quais não terão acesso.
Ao considerar as relações entre competência democrática e conhecimento
matemático reflexivo, a EMC vê a escola como uma instituição que pode servir a
dois propósitos opostos. O primeiro, é a construção de um cenário de reprodução e
fixação de condições sociais, ao invés de promover equidade. O segundo, o papel
da escola como local para desenvolver competências, objetivando agir democrática
e conscientemente em diferentes sociedades tecnológicas. Também há uma sintonia
não declarada oficialmente entre Educação, Matemática, necessidades econômicas
e formação de mão de obra especializada em larga escala. A preparação do
estudante para dominar e usar racionalmente os conteúdos acadêmicos é
consumada por meio de currículos fragmentados, nos quais isola-se o conhecimento
matemático de outros campos do saber.
A formação fragmentada ocorre mesmo quando a Matemática recebe
grande peso e presença na matriz curricular de cursos superiores, tais como os de
Física, Economia e Engenharias. A competência em Matemática é importante e
necessita de outros elementos, além dos que geralmente aparecem nos programas
escolares tradicionais. Para ser desenvolvida como elemento de crítica, a Educação
necessita lidar com conceitos em meio a diferentes contextos, possibilitando ao
aprendiz refletir sobre as implicações de diferentes usos da Matemática para seu
grupo social.
Além de instrumento de compreensão do desenvolvimento científicotecnológico, a Matemática pode ajudar a discutir questões relativas ao modo de
88
produção capitalista. Desde a afirmação do capitalismo como modo de produção no
século XIX, capital e trabalho foram considerados elementos essenciais ao
funcionamento de sistemas produtivos.
Para Skovsmose (2007), o desenvolvimento de novos saberes associado à
capacidade cada vez maior de determinados grupos da sociedade controlarem o
conhecimento científico, elevaram esse conhecimento à condição de primordial fator
econômico, em detrimento à importância social do trabalho científico. Atualmente, o
conhecimento exerce o papel de “[...] força produtiva crucial, já mais decisiva que
simples trabalho, e, aos poucos, talvez mais decisiva que o próprio capital [...]”
(DEMO, 2000, p. 32).
O controle sobre a produção e a disseminação do conhecimento é marcante
nas sociedades contemporâneas, servindo como elemento condutor da História.
Nessas sociedades, o conhecimento é produzido, reproduzido, consumido, destruído
e até mesmo tornado obsoleto, a ponto de ser considerado obstáculo ao
melhoramento de processos produtivos. Portanto, no capitalismo, mais que uma
elaboração desinteressada, o conhecimento é obtido e tratado em complexas redes
de relacionamentos, não sendo apenas fruto do esforço de indivíduos solitários e
isolados em seus locais de pesquisa. Dessa forma, de acordo com Demo (2000),
noções como sociedade do conhecimento, sociedade da aprendizagem e economia
da aprendizagem passam a fazer sentido diante da transformação do conhecimento
em um bem de produção. Na economia da aprendizagem, o conhecimento em ação
possui valor econômico, representa um item de produção e um bem comercializável,
submetido à lógica de demanda.
A Estatística, ao longo de séculos, também foi transformada em instrumento
de controle e exercício de poder. Em seus primórdios, ela era um instrumento de
contabilidade de populações e recursos, mas sua evolução levou a aplicações
diferentes. Além de instrumento contábil, aplicado na Economia, em políticas
públicas e pesquisas acadêmicas, a Estatística é um instrumento de trabalho que
presta-se à moldagem de visões de mundo e da imagem que cada um tem de seu
semelhante. Podemos “[...] nos ver no outro, graças às equivalências comparativas
criadas pelas classificações estatísticas [...]” (CAMARGO, 2009). A partir de
89
diferentes dados, as pessoas podem imaginar a sua situação em relação à
sociedade.
Outro aspecto tecnológico da Estatística que vale salientar é a sua
capacidade de, virtualmente, aproximar diferentes elementos sociais dos indivíduos
que devem decidir quais ações governamentais devem ser tomadas. Esse aspecto
de aplicação do conhecimento estatístico constitui-se em uma tecnologia de
governo. As tecnologias de governo são meios materiais e imateriais que, a partir da
construção de imagens coletivas, mesmo agindo a distância, cumprem objetivos de
aproximar
diferentes
realidades,
“[...]
tornando-as
pensáveis
e,
portanto,
potencialmente governáveis [...] (CAMARGO, 2009, p. 917). Além disso, o
conhecimento que emerge das estatísticas produzidas encontra-se na fronteira entre
a Ciência e as tecnologias de governo. O trabalho cientificamente desenvolvido
fornece elementos para apoiar decisões políticas práticas. Mas, depois dos
resultados divulgados, os pesquisadores já não mais têm controle sobre a sua
produção.
A partir de categorizações, a realidade passa a ser descrita por meio de
instrumentos de identificação do indivíduo com um grupo, colocando frente a frente
elementos que têm suas qualidades particulares abstraídas. Na década de 1830,
Adolphe Quételet buscou na Estatística um instrumento de previsões estáveis,
objetivando formular leis científicas para as regularidades numéricas encontradas
em diferentes realidades sociais estudadas. Quételet via nos métodos estatísticos
elementos unificadores que possibilitariam identificar a ordem natural dos
fenômenos. A ele é atribuída a definição de “homem médio”, elemento abstrato que
representa a média dos indivíduos de uma sociedade (BESSON, 1995 e
CAMARGO, 2009). Logo, há menos de duzentos anos, o conceito de média tem sido
utilizado como elemento de comparação e homogeneização de dados.
3.6 Educação Crítica: um cenário alternativo à Educação tradicional
As críticas ao desenvolvimento científico afastado de preocupações com a
sociedade intensificam-se principalmente na segunda metade do século XX. Há os
que se opõem ao discurso de que o progresso científico em si mesmo acarrete a
distribuição de benefícios a todos e conduza ao progresso social. Esses opositores
90
destacam aspectos omitidos pelos defensores de que a evolução científica ocorre
sem influência de fatores políticos e econômicos. Os críticos observam que a
pesquisa básica concentra-se por vezes em temas distantes das necessidades
sociais básicas. Observa-se, por exemplo, o controle econômico do capital sobre a
produção científica. Para esses críticos,
[...] a ciência e a tecnologia visam atender às necessidades das classes
dominantes e dos governos que representam empresas poderosas, de
modo que somente uma pequena parcela da população pode usufruir de
seus serviços e inovações, acentuando a desigualdade social, ao mesmo
tempo em que garante o lucro de um seleto grupo de empresas. Se
visarmos ao bem-estar geral e não ao lucro máximo, devemos mudar o
critério para o desenvolvimento científico-tecnológico e, consequentemente,
o econômico. É necessário haver uma modificação radical do lugar da
ciência na sociedade, de forma a abrir as portas do mundo científico e
tecnológico a toda a população e não somente a uma “elite”, vinda das
classes dirigentes ou por eles selecionada, que tem tido o monopólio da
ciência desde o início da civilização (SILVEIRA; BAZZO, 2005, p. 11).
A EMC constitui um campo de pesquisas voltado para questões políticas da
Educação
e
da
Matemática,
alinhando-se
à
discussão
do
conhecimento
desenvolvido sem considerar suas consequências para diferentes grupos sociais.
Ela examina, por exemplo, relações de poder dentro da sociedade e interesses por
trás dos currículos de Matemática. A crítica é relacionada à necessidade de
alternativas aos modelos de Educação que tornam o indivíduo passivo dentro de seu
próprio grupo social.
De acordo com Skovsmose (2001), as reestruturações na Educação levadas
a cabo após os movimentos de 1968 iniciadas pelas Ciências Sociais influenciaram
a Educação Matemática e serviram de inspiração à Educação Crítica e à EMC. No
fim da década de 1960, as discussões sobre a didática da Matemática eram
essencialmente direcionadas à busca de melhoria de técnicas e metodologias para o
ensino e a adaptação do aluno à sociedade. Diferente da ideia daquela época, a
Educação Matemática firmou-se como campo de pesquisas ligado a diferentes
áreas, lançando mão de métodos de pesquisa heterogêneos. Essa preocupação
com os papéis sociopolíticos da Educação diante da sociedade pode ser estendida à
Educação Estatística.
Existe uma ideologia escolar dominante, alimentada pelo racionalismo
científico (SKOVSMOSE, 2007), e a EMC busca desenvolver competências
democráticas em contraposição à serventia do conhecimento para a formatação
91
social. Como sugestão indica-se a utilização de currículos para o estudo de
situações externas à escola, favorecendo a ligação do conhecimento matemático à
discussão da democracia em sociedades altamente impregnadas pela tecnologia.
Considera-se que as práticas tradicionais de ensino15 não desenvolvem os
horizontes do estudante além da aquisição de habilidades técnicas para ao
manuseio de conteúdo específico.
A Educação Crítica considera que a Matemática Escolar, da maneira que é
ensinada, muitas vezes não permite ver como o conhecimento é utilizado podendose citar, por exemplo, o conhecimento usado especificamente a serviço de
interesses econômicos. A Matemática Escolar tem servido como instrumento para
ajustar o indivíduo às funções exigidas pelos empregadores da força de trabalho,
mas pode, igualmente, prover os cidadãos de competência crítica. Isso os ajudaria a
entender que o conhecimento tanto pode servir ao aprendiz no mundo tecnológico
quanto, contrariamente, excluí-lo desse ambiente.
3.7 Propostas de mudança
Batanero (2013) considera a Estatística ensinada atualmente em todos os
níveis uma importante ferramenta para a vida pessoal e profissional. Mas a autora
também constatou que, mesmo no nível universitário, os estudantes possuem ideias
deturpadas ou são incapazes de interpretar adequadamente os resultados
estatísticos que lhes são apresentados. Segundo a autora, uma possível explicação
encontrada seria a submissão do aluno a rotinas de aplicação de definições e
fórmulas, sem uma adequada atenção à interpretação dos contextos que originaram
os dados. Para ela, a melhor forma do aluno desenvolver o senso estatístico é
apresentá-lo às diferentes fases do processo estatístico (formulação do problema,
decisões ligadas à coleta e análise de dados e conclusões) por meio de projetos que
contextualizem o ensino da disciplina.
Outra discussão sobre a importância do conhecimento estatístico foi
apresentada por Lopes (2013), ao tratar da Estatística em cursos de formação de
professores de Matemática. Porém, alguns elementos da discussão podem ser
15
O termo tradicional deve ser entendido como modalidade de ensino na qual é mais importante o
cumprimento de um currículo e de um plano de ensino.
92
associados à problematização do desenvolvimento teórico e metodológico da
disciplina na formação de Engenheiros. A autora considera que a Estatística, uma
Ciência de análise de dados, não pode ser tratada como uma cadeira de Matemática
Aplicada.
No século XXI, considerado Era da Informação, a análise de dados tornouse componente essencial do currículo em diferentes níveis. A realidade repleta de
dados levou educadores a repensar o currículo da Educação Básica ao Nível
Superior. Um aspecto relevante é a necessidade de tratar a Educação Estatística
diferentemente do que se faz com o ensino da Matemática voltada a atividades de
uso de fórmulas, algoritmos e exercícios de fixação.
Em relação à convivência com a Estatística, os alunos atualmente são
diferentes, inclusive, de seus professores, pois têm no seu cotidiano o acesso a
informações estatísticas. A Estatística deve ser compreendida como uma ciência
distinta da Matemática, pois tem objetos de estudo diferentes. De maneira diversa,
enquanto a Matemática não depende de situações externas a si mesma para
desenvolver-se, a Estatística necessita diferentes contextos para aplicar seus
instrumentos de trabalho.
Existem, portanto, diferenças qualitativas entre os pensamentos matemático
e estatístico. Um diferencial marcante é a Estatística possuir instrumentos que
permitem tratar os dados e resolver situações em que se considera a presença da
variabilidade. Com isso, podem ser apresentados diferentes cenários como
respostas para o mesmo problema. Dessa forma, a distinção da Ciência Estatística é
que ela “[...] requer um tipo diferente de pensar, porque não são apenas números;
eles são números com contexto [...]” (LOPES, 2013, p.905). Por outro lado, “[...] o
foco principal do pensamento matemático centra-se em padrões abstratos, ou seja, o
contexto é parte irrelevante [...] em matemática o contexto obscurece a estrutura [...]”
(idem, ibidem).
Enquanto uma situação resolvida matematicamente parte de padrões para a
obtenção de respostas, inversamente a Estatística munida de seus instrumentos
busca nos dados a existência ou não de algum padrão. Este será encontrado caso o
contexto estudado permita verificar algum significado nos dados.
93
Um importante trabalho sobre o ensino de Estatística é o GAISE College
Report (FRANKLIN et al., 2005). Seus autores partiram do estudo de normas e
orientações para ensino de Estatística existentes na época, considerando as
diversas modificações pelas quais passou o ensino de Estatística no século XX. No
documento consta que a clientela à qual o ensino de Estatística se destina
modificou-se ao longo de décadas. Historicamente, a disciplina era ensinada
seguindo a mesma metodologia: aplicavam-se os mesmos conteúdos, com a
utilização de uma bibliografia única em cursos superiores bem distintos:
Administração, Engenharias, Matemática, Psicologia. O mesmo também ocorria em
pós-graduações, sendo que variava apenas a etapa do curso na qual essa Ciência
era apresentada.
Com o tempo, elementos de Estatística sob diferentes denominações
passaram a fazer parte tanto dos currículos da Educação Básica quanto no de Nível
Médio16. A partir de então, estudantes que iniciam o Nível Superior supostamente já
teriam passado por algum contato prévio com o conhecimento estatístico.
Na redação do GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) também
foram consideradas pesquisas sobre ensino e aprendizagem dessa disciplina. É
apresentada uma lista de recomendações consideradas importantes e que deveriam
ser seguidas em cursos introdutórios de Estatística no Nível superior de Ensino. São
elas:
1) enfatizar a literacia estatística e desenvolver o pensamento estatístico; 2)
utilizar dados reais; 3) enfatizar o entendimento conceitual ao invés de
concentrar o ensino apenas na apreensão de procedimentos de cálculo; 4)
promover a aprendizagem ativa na sala de aula; 5) utilizar a tecnologia para
o desenvolvimento da compreensão conceitual e análise de dados; 6)
utilizar as avaliações como instrumento de melhora da aprendizagem dos
alunos (FRANKLIN et al., 2005, p. 5).
A lista enfatiza elementos importantes para o estudante obter um bom
desempenho na aprendizagem em cursos introdutórios de Estatística. Nesta Ciência,
assim como em outros campos, existem linguagens, conceitos e símbolos próprios.
16
No Brasil, temos os PCNs e PCN+. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental, consta o bloco de conteúdos sobre o Tratamento da Informação (com a recomendação
de ser desenvolvido por intermédio de coleta, organização e descrição de dados). Nos PCN+, entre os
temas estruturadores para o Ensino de Matemática no Nível Médio, consta o eixo (ou tema
estruturador) denominado Análise de Dados (com as unidades temáticas Estatística, Contagem e
Probabilidade).
94
O desenvolvimento da literacia estatística, de acordo com o documento,
ocorre ao associar-se a capacidade de compreender as ideias fundamentais da
Estatística ao entendimento da linguagem utilizada em sua comunicação (termos
estatísticos, símbolos de escrita e gráficos). Estabelecendo um paralelo entre a
aprendizagem da Estatística e a de um idioma, verifica-se a necessidade de leitura,
construção e atribuição de sentido. Para desenvolver a literacia estatística, sugerese pedir aos alunos a interpretação ou a crítica de artigos, notícias e matérias da
mídia em geral.
De acordo com o GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005),
pensamento estatístico pode ser definido como aquele utilizado pelos estatísticos na
abordagem ou resolução de problemas da própria área. Ele inclui a necessidade de
compreender dados e reconhecer a importância de sua produção. Essa forma de
pensar é utilizada por quem necessita compreender, produzir e verificar a
consistência dos dados. Também faz parte do cenário de formação do pensamento
estatístico perceber a presença da variabilidade (considerado importante conceito
estatístico), sua quantificação e explicação.
O GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) aponta a necessidade das
atividades de aula abordarem a compreensão de conceitos, sugerindo desenvolver o
pensamento estatístico a partir de exemplos explicativos dos processos utilizados na
resolução de problemas. Para avaliar o pensamento estatístico, o documento da
ASA sugere realizar projetos e tarefas investigativas abertas.
Em relação às atividades investigativas, Skovsmose (2008) apresenta um
conceito importante: o cenário de investigação. Esse cenário consiste em qualquer
ambiente que dê suporte a um trabalho investigativo. Propor um cenário de
investigação viabiliza a oportunidade para os alunos refletirem sobre o assunto,
desenvolvendo atividades diferentes das proporcionadas com a prática da resolução
rotineira de exercícios. Uma qualidade importante desses cenários é a capacidade
em atrair os aprendizes para formularem questões e, a partir delas, alcançarem
conclusões próprias sobre o tema tratado. Os alunos podem questionar, identificar
caminhos de resolução, auxiliarem-se mutuamente e tomar decisões a partir dos
significados por eles produzidos.
95
Os cenários de investigação não são adaptáveis à exploração de listas de
exercícios-padrão, diferindo, portanto, do paradigma do exercício. Também existem
situações complexas fora das semirrealidades, em que o conhecimento estatístico
pode auxiliar a compreender fatos capazes de afetar os indivíduos de um grupo
social. Em situações concretas, podem ser elaborados significados para conceitos.
Nesse aspecto, diferentes relações entre Ciência, tecnologia e sociedade podem ser
contempladas.
Alro e Skovsmose (2010) lembram que as propostas dos cenários de
investigação devem ser concebidas para aproximar os alunos e a investigação ser
consumada. As situações devem proporcionar a associação de significados, além da
adequação à capacidade de compreensão dos aprendizes. Além disso, a transição
do paradigma do exercício para o cenário de investigação pode mudar padrões de
comunicação tradicionais e favorecer a cooperação para a aprendizagem.
A abordagem proposta no GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005)
requer que os aprendizes tenham atitude ativa. Consideram-se dois aspectos: servir
à aprendizagem da comunicação, utilizando a linguagem da estatística; contribuir
para promover a colaboração entre os alunos e desenvolver a capacidade de
trabalhar em equipe. Além disso, a aprendizagem ativa favorece a descoberta, a
compreensão de conceitos estatísticos e o desenvolvimento de formas de pensar
estatisticamente. Atividades de campo para resolver situações reais devem ser
realizadas porque demandam a mobilização de diversas habilidades ligadas à
resolução de problemas.
Para alcançar os objetivos, sugere-se utilizar laboratórios, estudos em grupo,
resolução de problemas e atividades que promovam a discussão de conjuntos de
dados. Práticas em laboratórios e demonstrações de resultados a partir de dados
levantados pelos próprios alunos servem para elaborar respostas a perguntas por
eles formuladas, evitando, com isso, a coleta puramente mecânica. Os alunos
também devem ser incentivados a realizarem previsões a partir desses dados,
justamente por favorecer a discussão e mobilizar o pensamento para responder com
base no que foi coletado. A utilização maciça de TICs é incentivada para gerenciar e
explorar dados, realizar e compreender os processos de inferência e também para
agilizar os trabalhos de professor e alunos.
96
O acesso a dados reais mediante a utilização de TICs também serve para
automatizar cálculos, trabalhar com modificações em gráficos e realizar simulações.
Isso possibilita aos alunos interpretar resultados e não apenas assimilar
mecanicamente o trabalho estatístico. Concomitante à utilização de tecnologias
diversificadas, a recorrência ao desenvolvimento de projetos pedagógicos é
necessária para viabilizar situações nas quais os alunos sejam colocados frente a
situações que exijam a decisão sobre quais técnicas utilizarão na formulação de
respostas para as questões de pesquisa.
O GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) destaca que o uso de
dados reais tem diversas serventias: ajuda a compreender as formas pelas quais se
produz e/ou coletam dados; possibilita relacionar a análise estatística com o contexto
de uma situação; estimula o pensamento em relação à relevância dos dados e às
ligações destes com os conceitos da Estatística; podem ser utilizados para envolver
o estudante com o processo de aprendizagem e aproximá-lo do professor. Os dados
hipotéticos dos livros didáticos podem atender a fins específicos, tais como
exemplificar como são aplicadas as fórmulas, esclarecer conceitos, ou até mesmo
avaliar a compreensão imediata que o aluno tem sobre o tema estudado.
Dados reais podem ser buscados na internet ou obtidos em pesquisas feitas
diretamente pelos alunos. Esses dados obtidos em diferentes contextos devem ser
relevantes, a ponto de gerarem perguntas condizentes com cada situação estudada.
No Brasil, por exemplo, o portal do Ministério do Trabalho e Emprego (TEM) possui
grandes conjuntos de dados, muitos deles organizados em séries históricas,
permitindo comparar situações relativas a diferentes profissões e épocas.
Ao invés de concentrar a preocupação nas tarefas que envolvem o
desenvolvimento apenas de diferentes técnicas de cálculos, recomenda-se
aprofundar as ideias centrais da análise de dados. A ênfase maior no trabalho de
compreensão dos conceitos parte do princípio que, diante do excesso de materiais e
tarefas, o entendimento dos elementos que fundamentam o trabalho estatístico pode
ficar na superficialidade. Como elementos aprendidos mecânica ou apressadamente
tendem a ser perdidos na memória, acredita-se que a melhor alternativa é valorizar a
utilização do conhecimento estatístico na resolução de problemas, a partir de uma
sólida compreensão inicial dos conceitos.
97
O GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) sugere que a avaliação
ocorra paralelamente ao processo de aprendizagem. A ideia principal concentra-se
na afirmação de que o ato de avaliar não deve ser esporádico. Além disso, é
necessário que, desde o início, os instrumentos avaliativos estejam alinhados aos
objetivos e concentrados na compreensão de ideias-chave. Além de ser formativo e
somativo, o processo de avaliação também não deve se deter somente nas
habilidades de uso dos algoritmos necessários aos cálculos estatísticos. São feitas
duas importantes observações em relação ao processo avaliativo: 1) sua realização
imediatamente após o processo de ensino é mais eficiente que após grandes
intervalos de tempo; 2) suas modalidades devem ser diversificadas ao máximo.
Desenvolver a capacidade de ler e compreender dados expressos por
gráficos e tabelas estatísticas tornou-se necessário para completar um processo de
alfabetização nos dias atuais. Curcio, Friel e Bright (2001) comentam que a OCDE
(Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), em documento de
1995, considera a alfabetização completa com o desenvolvimento da capacidade de
compreender representações gráficas. Também é necessário atentar para três
aspectos da obtenção da informação: localizar, integrar e gerar informações. A
localização é a capacidade de obter a informação dentro de condições específicas.
A integração corresponde à habilidade de reunir dois ou mais elementos de
informação. A geração é a habilidade de compreender as informações de um
documento e inferir baseado no que ele contém.
No Brasil, Lopes e Coutinho (2009) discorreram sobre a fragmentação em
relação à construção e leitura de gráficos e tabelas nos níveis Fundamental e Médio.
Segundo as autoras, a maioria dos textos de livros didáticos dedicados à introdução
da Estatística básica considera que
a leitura dos gráficos limita-se a uma leitura dos eixos para responder
questões específicas, sem a preocupação de levar o aluno a uma
interpretação do que efetivamente foi representado naquele gráfico, em
termos de variação em um conjunto de dados observados. Alguns enfocam
as medidas estatísticas apenas como cálculos matemáticos isolados, sem
uma preocupação em também relacionar, interpretar essas medidas
(LOPES; COUTINHO, 2009, p. 41).
Essa forma de ensinar Estatística pode consolidar a ideia da disciplina como
conjunto de instrumentos simples e destinados a agrupar e representar dados em
98
linguagem pictórica para a mera realização de cálculos da mesma forma que ocorre
em Matemática. Trata-se de uma atitude que restringe e fragmenta, ao invés de
expandir articuladamente os usos de um instrumento de comunicação. A
consolidação dessa imagem da Estatística ao final do Nível Médio pode prejudicar
sua compreensão no Nível Superior.
Tratando da aprendizagem da comunicação por meio de gráficos, Curcio,
Friel e Bright (2001) reuniram pontos de vista de diversos professores. Identificaram
fatores críticos que influenciam a compreensão de diferentes representações
gráficas,
destacando
a
importância
de
dominar
processos
de
tradução,
interpretação, extrapolação e interpolação para compreender informações expressas
por meio de elementos escritos ou de outra natureza simbólica. A interpretação de
uma representação gráfica necessita de reorganizações e classificações de fatos (ou
fenômenos) de acordo com hierarquias. Na extrapolação e na interpolação
(consideradas extensões da interpretação), busca-se compreender a essência da
mensagem que se tenta transmitir por intermédio de um gráfico, em prol da
identificação de consequências para o fato (ou fenômeno) descrito na figura.
Os autores consideram a compreensão gráfica em três níveis, separados em
duas classes de propósitos para a utilização de gráficos. A compreensão começa de
forma elementar (extração de dados de um gráfico, localização e tradução de seu
conteúdo) e pode ser desenvolvida até um nível intermediário (interpolação e
relacionamento entre os dados do gráfico), chegando até a um estágio avançado
(prever a partir da extrapolação dos dados do gráfico). No terceiro nível, ocorre a
compreensão aprofundada dos dados representados graficamente.
Os dois propósitos para a utilização de gráficos são a análise e a
comunicação de dados. Na análise, os gráficos são ferramentas de primeiras
descobertas do sentido e das características dos dados. É importante observar que,
se o ensino recair sobre a construção, pouca atenção será dada à análise dos
propósitos da elaboração de gráficos. Se o estudo voltar-se para a análise de dados,
considera-se possível alcançar uma compreensão elevada, garantindo flexibilidade,
fluidez e generalização na compreensão de usos dos gráficos. Quando utilizados
para a comunicação, suas imagens destinam-se a informar sobre números e
99
relações entre eles (além de exibir padrões, geralmente resumos estatísticos, em
vez dos dados originais).
Mesmo sendo necessária e importante para a compreensão de gráficos, a
decodificação visual não é suficiente. Como a Estatística envolve o estudo
sistematizado de dados (coleta, descrição, apresentação e conclusões a partir de
dados), seus temas podem ser desenvolvidos em associação com outras disciplinas,
utilizando conceitos e ferramentas associadas à compreensão de gráficos. O tipo de
dado, sua variação, o tamanho do conjunto de dados e as formas de representação
podem facilitar ou não o entendimento. Considera-se ainda que a capacidade de
atribuir sentido é desenvolvida gradualmente, com o uso de gráficos prontos, ligados
a diferentes problemas e contextos.
Ainda tratando do ensino de Estatística, Gal e Garfield (1997) assinalam que
a disciplina é muitas vezes ensinada no nível pré-universitário como parte do
currículo de Matemática, sendo abordada em capítulo específico do livro didático ou
no estudo de funções e gráficos. No Nível Superior a Estatística (junto com a teoria
das probabilidades) constitui-se geralmente em um curso autônomo, tratado como
introdução ou orientado para aplicações de campos específicos como o da
Engenharia.
Os autores apontam uma meta global de Educação Estatística: consiste em
fazer dos alunos cidadãos informados, capazes de compreender e lidar com a
incerteza, a variabilidade e a informação estatística, além de tomar parte na
produção, interpretação e comunicação de dados. Esta concepção pode ser
estendida a diferentes níveis escolares. Também apresentam oito metas básicas e
inter-relacionadas, a saber: 1) Entender o propósito e a lógica das investigações
estatística; 2) Compreender o processo de investigação estatística; 3) Dominar
habilidades processuais; 4) Compreender as relações matemáticas; 5) Compreender
a probabilidade e o acaso; 6) Desenvolver habilidades de interpretação e de literacia
estatística; 7) Desenvolver a capacidade de se comunicar estatisticamente; 8)
Desenvolver dispositivos estatísticos úteis.
Também é importante que os alunos desenvolvam a compreensão do papel
do acaso e da aleatoriedade no mundo, além de entender que os métodos
100
estatísticos são ferramentas úteis em experimentos científicos e tomadas de
decisões, sejam elas pessoais, sociais ou empresariais. Além disso, o aluno deve
compreender que processos de pesquisa estatística podem ajudar a obter
conclusões melhores do que aquelas baseada apenas em intuições ou nas próprias
experiências subjetivas. Outro desafio é os alunos aprenderem a elaborar
estatísticas, ao invés de serem apenas consumidores.
3.8 Articulações do GAISE com alguns teóricos
As considerações de Lévy (2006) sobre a inteligência e a cognição como
elaborações sociais utilizando tecnologias corroboram com o que foi apresentado no
GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005). A simples acumulação de dados
não significa que uma informação foi formulada. É necessário fazer com que os
dados originalmente recolhidos passem por processamentos que lhes deem sentido,
pois, para que a comunicação ocorra, é essencial existirem contextos comuns e
conhecidos pelos indivíduos envolvidos.
Os sentidos atribuídos coletivamente, o contexto e a compreensão de
mensagens são elementos da comunicação, possuindo valor didático para a
Educação Estatística. A formulação de sentidos e a aprendizagem ocorre quando o
objeto estudado é compreendido dentro de contextos que servem para situar o aluno
frente ao que deve aprender. Dessa forma, ao avaliar as aprendizagens
paralelamente ao processo de ensino, deve-se verificar se os contextos de utilização
de conceitos foram ou não compreendidos.
Segundo Lévy (2006), a transmissão de informações é uma função de nível
fundamental no ato de comunicação, ocorrendo quando se definem situações que
dão sentido às mensagens trocadas. Na elaboração de sentido da mensagem, o
contexto é o elemento central da comunicação e a compreensão realiza-se ao
realinharem-se os sentidos anteriormente elaborados pelo receptor. Além de existir
uma língua comum aos sujeitos do processo,
[...] os atores de comunicação produzem [...] continuamente o universo de
sentido que os une ou que os separa [...] se o assunto em questão é, por
exemplo, comunicação verbal, a interação das palavras constrói redes de
significados transitórios na mente de um ouvinte. Quando ouço uma palavra,
isto ativa imediatamente em minha mente uma rede de outras palavras, de
101
conceitos, de modelos, mas também de imagens, sons, odores, sensações
proprioceptivas, lembranças, afetos, etc (LÉVY, 2006, p. 23).
Portanto, os contextos favorecem a criação de redes, nas quais diversos
significados são articulados, originando uma teia de significações e não apenas uma
corrente, que perde sua utilidade ao quebrar um dos elos. Comparando com a
aprendizagem de significados dos conceitos estatísticos, a elaboração de raciocínios
e elementos de linguagem favorecem o entendimento do objeto de estudo. Do
GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) pode-se compreender que, em um
primeiro momento, devem ser criadas relações entre conceitos estatísticos
estudados e o processo de exame de situações reais.
Os argumentos de Lévy (2006) e do GAISE College Report (FRANKLIN et
al., 2005) sobre os usos de uma linguagem dentro de um meio social têm ligação
com o que foi expresso por Luria (1986), estudioso do pensamento lógico-conceitual.
A compreensão dos significados de dados e enunciados em Estatística também
passa por processos complexos, assim como ocorre com palavras, frases e
significados por trás de textos. Seria “[...] errôneo pensar que a comunicação ou o
texto consiste somente em uma cadeia de frases isoladas, separadas, e que, para
compreendê-lo, é suficiente compreender o significado de cada frase isolada [...]”
(LURIA, 1986, p. 189). Da mesma forma que existem motivos para redigir e divulgar
um texto, há uma série de propósitos para elaborar e disseminar formas de
representações científicas.
Em uma sociedade cujas atividades cotidianas baseiam-se no uso de TICs
em larga escala, a divulgação de análises quantitativas por diferentes mídias tem se
pautado cada vez mais em representações gráficas, como forma de traduzir
visualmente a organização de dados. O uso dessas tecnologias pode servir para
dinamizar a análise de dados, pois facilita a exploração e a experimentação com
gráficos, fato apontado por Curcio, Friel e Bright (2001). Os instrumentos
informacionais também podem ajudar a desenvolver pensamento flexível na análise
de
dados,
apoiando
o
desenvolvimento
da
compreensão
de
diferentes
representações gráficas.
O GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) sugere que a leitura de
tabelas e gráficos divulgados por diferentes meios de comunicação pode colaborar
102
no desenvolvimento da capacidade de julgar os dados processados por outros
indivíduos. A associação dessa prática à da troca de experiências de interpretações
entre os alunos também ajuda a melhor compreender esses instrumentos. Tal ponto
de vista vem ao encontro às ideias de Lévy (2006) sobre o desenvolvimento da
inteligência e da aprendizagem. As formas de representar dados também resultam
de desenvolvimento coletivo e, para serem compreendidas, necessitam de trocas de
significados dentro de um grupo social. Isso também pode ser associado ao
pensamento de Luria (1986) em relação ao desenvolvimento da capacidade de
compreender elementos de linguagem previamente estabelecidos por outra pessoa.
Voltando à ideia de conhecimento como elaboração simultaneamente
resultante e impulsionadora de mudanças num campo de conhecimento em uma
determinada época, pode-se dizer que esse aspecto imprime aos resultados obtidos
a imagem de obra inacabada. Abre-se a possibilidade para a coexistência de ideias
diferentes e contrastantes sobre o mesmo objeto, além de novas concepções
emergirem. Feyerabend (2007) nos lembra que é necessário existir a pluralidade de
metodologias. Além disso, os problemas não resolvidos por uma Ciência podem
demandar novas formas ainda por elaborar (o que pode levar ao surgimento de
outras teorias e formas de estudo para um mesmo objeto).
3.9 Considerações sobre o capítulo
As expectativas em relação ao conhecimento entre o fim do século XIX e
início do XX começaram a se desfazer quando suas contradições foram apontadas e
discutidas. Entre outros elementos expostos está a limitada capacidade que a
Ciência Moderna tem para explicar o mundo fora de bases de raciocínio
quantitativas. Outra discussão recorrente é a da Ciência Moderna cada vez mais
distanciada das necessidades sociais cotidianas, preservando interesses de grupos
dominantes e acirrando desigualdades sociais.
Tomando por base as ideias da EMC, o conhecimento estatístico do
Engenheiro de Produção deve ajudá-lo a perceber consequências sociais de seus
atos e provê-lo das competências crítica e democrática. Seu envolvimento com o
conhecimento estatístico também deve promover sua compreensão de mundo.
103
A partir do referencial teórico, temos elementos para argumentar sobre a
necessidade de superar duas ideias: 1) cada disciplina, em seu isolamento cognitivo
e epistemológico, é capaz de sozinha desvelar a realidade de forma unívoca e
precisa; 2) o conhecimento científico é uma obra acabada.
No próximo capítulo verificaremos concepções dos alunos de uma turma de
Engenharia de Produção sobre a disciplina Estatística a partir das respostas a um
questionário e a uma entrevista. Os dados construídos a partir desses dois
instrumentos serão confrontados com o referencial teórico e um quadro de análise
será então apresentado.
105
CAPÍTULO 4 - A CONSTRUÇÃO DOS DADOS
Tendemos a viver num mundo de certezas,
de solidez perceptiva não contestada,
em que nossas convicções provam
que as coisas são somente como as vemos
e não existe alternativa para aquilo
que nos parece certo.
(Maturana e Varela)
4.1 Introdução
Este capítulo é dedicado à análise do material resultante do levantamento
das respostas ao questionário e das transcrições das entrevistas. Os primeiros
resultados foram tratados com o objetivo de obter significações que permitissem
analisar, interpretar e fazer inferências sobre o material.
Durante a formação, os futuros profissionais de EP são submetidos a rotinas
de treinamento e adequação a determinadas práticas que passam a fazer parte do
seu cotidiano. Ao mesmo tempo em que as atividades rotineiras condicionam a
atuação de um profissional, elas dão conformidade a um cenário de trabalho. É
comum retratar o Engenheiro como alguém envolvido em pensamentos lógicoabstratos ou então debruçado sobre projetos nos quais existem dados para analisar
e isso requer que ele conheça Estatística. Esse profissional também pode
acrescentar novos padrões e rotinas à profissão, ou tentar alterar esse quadro,
tendo em vista que é um ator histórico e capaz de modificar situações materiais de
sua existência.
Dessa forma, a Estatística torna-se instrumento importante para o
profissional de EP. O ensino da disciplina deve habilitá-lo a participar ativamente da
produção, interpretação e comunicação de dados. Isso será rotineiro em sua carreira
e ele deve ser preparado com vistas a não ser um simples apreciador passivo da
produção estatística de terceiros.
106
4.2 Dados das respostas do questionário
O questionário ofereceu dados sobre o perfil estudantil dos componentes da
turma, além de garantir o anonimato e o sigilo. Até o momento, ninguém além do
pesquisador teve acesso aos questionários. Na época, a turma era composta de 35
estudantes. Vinte e um alunos responderam, o que representa uma taxa de retorno
de 60%. O trabalho com a maior parte das respostas padronizadas facilitou o
levantamento do perfil da turma.
Dois indivíduos erraram o ano de nascimento (escrevendo 2013). A tabela 1
a seguir resume o perfil de idade dos que responderam ao questionário.
Tabela 1: resumo da faixa etária dos respondentes.
Ano de
nascimento
1981
1986
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
Número de
indivíduos
1
1
1
2
4
1
3
5
1
Total
-
-
-
-
-
-
-
-
19 17
Fonte: Tabela elaborada pelo próprio autor
Com exceção de um aluno, que escreveu o período cursado de forma
ilegível, verificou-se que os demais cursavam o terceiro período. Ao verificar a
escolaridade anterior à entrada na Graduação, constatou-se que um aluno estudou
Tecnologia em Redes de Computação, outro cursou Tecnologia em Petróleo e Gás e
um terceiro chegou a iniciar Economia, desligando-se do curso sem tê-lo
completado.
Entre os que passaram por curso técnico antes da EP, verificamos um
estudante para cada área a seguir: Administração, Informática Industrial, Segurança
do Trabalho e Estradas. Um aluno passou pelo curso de Estradas, mas saiu para
cursar o terceiro ano em outra instituição e se preparar para o exame vestibular.
Dois estudantes cursaram técnico em Mecânica e em Eletrônica. Os demais não
17
Lembrando que dois alunos assinalaram 2013 como ano de nascimento, o total de respondentes é
21.
107
cursaram qualquer modalidade de formação técnica e ninguém passou pela
modalidade EJA. Ninguém havia cursado Estatística em qualquer semestre anterior
da graduação em EP.
O significado atribuído à Estatística teve respostas variadas, classificadas
nas subcategorias do quadro a seguir.
SUBCATEGORIA
EXPRESSÕES ENCONTRADAS
NOÇÃO DE ESTATÍSTICA COMO
DISCIPLINA CURRICULAR
Disciplina que ...; Estudo de ..., uma Capacitação para
...
APLICABILIDADE
Analisar aspectos sociais para obter melhorias
(soluções) para situações reais; é uma simplificação;
ferramenta que auxilia o engenheiro para tomada de
decisões; conhecer seu comportamento e poder prever
sua variação; melhor entendimento de um processo;
demonstração de informações; seguir uma linha de
raciocínio; importante para o nosso dia a dia.
REPASSE E COMUNICAÇÃO DE
DADOS E INFORMAÇÕES
Método para análise mais eficiente dos dados; coleta e
análise de dados para obter informações; análise dos
dados de uma amostra; análise de informações;
DISCIPLINA DE CARÁTER
MATEMÁTICO
Disciplina que utiliza linguagem matemática; um
conjunto de ferramentas matemáticas; análise
matemática de dados; uma área da Matemática; cálculo
de probabilidade; gráficos, matrizes, entre outros.
Quadro 3: Termos e ideias relacionados à Estatística.
Fonte: Quadro elaborado pelo próprio autor
A Estatística como disciplina curricular apresentou respostas repetidas.
Alguns informantes associaram a disciplina à eficiência. Também observa-se que,
inicialmente, o grupo de alunos apresentava ideias vagas a respeito da Estatística e
da relação dela com outras disciplinas, como por exemplo, a Matemática.
Respondendo às perguntas sobre variáveis qualitativas, quantitativas,
discretas e contínuas, houve alunos que não souberam conceituá-las e outros
desconheciam a melhor representação. Outros não sabiam conceituar as variáveis
qualitativa e quantitativa, também ocorrendo casos em que não se conhecia uma
forma de representá-las graficamente. A tabela a seguir apresenta as quantidades
de alunos que correspondem aos casos descritos:
108
Tabela 2: totais de alunos que conheciam a melhor representação de variáveis
qualitativas e quantitativas.
TIPO DE VARIÁVEL
QUALITATIVA
CONHECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO
1
PROBLEMAS COM A CONCEITUAÇÃO
-
QUANTITATIVA
-
AMBAS
10
-
8
Fonte: Quadro elaborado pelo próprio autor.
A maioria dos alunos desconhecia como conceituar as variáveis discreta e
contínua e suas representações gráficas. A tabela a seguir apresenta as
quantidades de alunos que correspondem a esses casos:
Tabela 3: totais de alunos que conheciam a melhor representação de variáveis
discreta e contínua.
TIPO DE VARIÁVEL
DISCRETA
CONTÍNUA
AMBAS
CONHECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO
-
-
19
PROBLEMAS COM A CONCEITUAÇÃO
-
-
19
Fonte: Tabela elaborada pelo próprio autor.
Houve alunos que conheciam diferentes modelos de gráficos sem saber,
entretanto, especificar os usos e dois deles declararam que era a primeira aula à
qual compareciam. Porém, o questionário foi aplicado após a primeira prova e os
gráficos se constituíram em um dos temas avaliados.
Quando o aluno não soube conceituar o tipo de variável também não
associou a forma de representar graficamente (variáveis qualitativa e quantitativa). A
maioria
dos
estudantes
não
percebia
motivos
para
utilizar
determinadas
representações gráficas associadas às variáveis estudadas.
A partir das repostas, formulou-se o quadro com as subcategorias a seguir,
tomando a representação gráfica de uma variável como categoria.
109
Quadro 4: termos ligados à representação gráfica adequada ao tipo de
variável.
SUBCATEGORIA
REPRESENTAÇÃO DE
VARIÁVEL QUALITATIVA
REPRESENTAÇÃO DE
VARIÁVEL QUANTITATIVA
TERMO ENCONTRADO NA RESPOSTA
Ogiva; Coluna; Pizza; Barras.
Polígono de frequência; Colunas; Ogiva de Galton; Curva de
frequência; Gráfico de barras; Histograma; Depende do tamanho
da amostra: com classe, histograma. Sem classe, coluna.
REPRESENTAÇÃO DE
VARIÁVEL CONTÍNUA
Curva de frequência; histograma; Gráfico de barras.
REPRESENTAÇÃO DE
VARIÁVEL DISCRETA
Gráfico de barras.
Fonte: Quadro elaborado pelo próprio autor.
De acordo com a literatura de Introdução à Estatística, a ogiva é um tipo de
gráfico adequado à representação de frequências acumuladas de variáveis
quantitativas. No caso de variáveis quantitativas, faltou citar o boxplot, o gráfico de
dispersão e o gráfico de linha. Sobre os gráficos de barras, de colunas e de setores
(pizza), é correto relacioná-los com as variáveis qualitativas. Porém, no caso de
variável contínua, melhor seria utilizar o histograma, com as suas colunas
justapostas. Por outro lado, foi respondido que o gráfico de barras deve ser utilizado
para representar variáveis discretas, porém ele seria mais adequado para descrever
variáveis qualitativas.
Doze indivíduos não souberam atribuir significado à palavra variabilidade e,
em relação à Estatística e à Matemática como instrumentos com potencial de
influenciar comportamentos de setores da sociedade (e profissionais de diferentes
áreas), três indivíduos não se posicionaram e três apresentaram respostas
redundantes.
Ao considerar as influências sobre o comportamento de profissionais de
diferentes áreas, foram citados a alteração na linha de produção, a redução de
custos, a redução de erros, a avaliação da produção fabril e a linha de produção.
Sobre se determinados usos da Estatística influenciariam a sociedade, apareceram
respostas tais como “a necessidade de policiamento”, “necessidade de escolas”,
“conhecer a opinião de uma comunidade”, “nortear a venda de um produto”,
“levantamento de dados sobre a educação”, “levantamento de dados sobre a
110
saúde”, “levantamento de dados sobre o consumo”, “avaliação de serviços públicos”,
“necessidade de construção de quadras de esporte”, “controle demográfico”,
“crescimento regional”, “oportunidade de emprego”, “taxa de natalidade”, “taxa de
mortalidade”, “prever comportamentos” e “rejeição a produto defeituoso”.
O levantamento de dados sobre analfabetismo e a pesquisa eleitoral
também foram citados duas vezes, não havendo referências às influências sobre o
comportamento. Em relação aos usos da Estatística e da Matemática para
reconhecer aspectos sociais e políticos da sua futura profissão, temos as seguintes
respostas: “a presença do profissional” e a “qualidade do emprego”. A pesquisa
sobre renda também foi uma das repostas apresentadas e a oferta de emprego
também foi lembrada. Nenhum aspecto político foi citado e quinze indivíduos não
souberam responder.
A pergunta sobre sugestões para as aulas de Estatística teve as seguintes
respostas: “visita técnica”, “mais interatividade”, “estudo de caso”, “sair de sala para
fazer pesquisa de campo”, “uso de informática”, “aplicações práticas”, “mais
dinamismo na aula”, “apresentar mais aplicações” e “uso de dados verdadeiros”.
A partir das respostas iniciais, pode-se perceber que havia alunos incapazes
de associar Estatística com a análise de dados e diferentes aplicações. Ao mesmo
tempo, outra parte do grupo a considerava apenas uma disciplina a mais em sua
formação profissional, ou mesmo parte da Matemática. Existe, portanto, a
necessidade do professor observar e demarcar as diferenças entre duas
modalidades de conhecimento em questão, pois trata-se de Ciências dotadas de
objetivos específicos. Ao mesmo tempo em que alguns alunos veem na Estatística
um instrumento para tratamento de informações com utilidades específicas, outros
veem a disciplina capaz de embasar a compreensão da realidade. Nesse caso,
abrem-se perspectivas para usar o conhecimento estatístico na compreensão e
crítica de uma realidade social.
Parte da turma considerava a Estatística pelo aspecto utilitário no cotidiano
empresarial, ou seja, para analisar o desempenho e tomar decisões, apresentando
aí outra forma de, cotidianamente, servir à compreensão de diferentes situações.
Nota-se que, na época de aplicação do questionário, os alunos apresentavam
111
deficiências no estabelecimento de redes de significações, que são necessárias à
análise e compreensão de situações por meio da Estatística.
4.3 Dados das respostas da entrevista
A resposta de cada uma das perguntas constituiu-se em uma unidade de
registro para codificação de significados e, a partir delas, iniciou-se uma
categorização. O agrupamento e formulação de categorias deu-se a partir das
percepções passadas pelos entrevistados. As categorias ligadas a cada resposta
não foram formuladas intencionalmente, mas apenas no momento da análise o fato
foi registrado.
4.4 Respostas à pergunta 1
O que o(a) motivou a escolher o curso de Engenharia de Produção?
A motivação inicial do Aluno 1 foi buscar uma modalidade mais humana. Ele
considera as outras ligadas mais a fatores materiais específicos. O fato da EP
trabalhar com a organização da produção e projetos de gerenciamento leva o
profissional a lidar mais com as pessoas. A administração de uma fábrica reúne
diferentes indivíduos e, para o aluno, esse contexto da EP uma atividade mais
humana. Na terceira entrevista persistia a concepção da Produção como área que
envolve mais as pessoas do que as outras modalidades. Ressaltou que isso não
significa deixar de se envolver com Matemática e Estatística, pois ambos se
relacionam com o delineamento e a implementação de um projeto, a produção e a
previsão de demanda.
O Aluno 2 primeiramente foi motivado a escolher a EP por considerar essa
modalidade muito ampla e que possibilita estudar conteúdos de diferentes áreas ao
mesmo tempo. Ao comparar a Produção com as demais, percebe que os outros
campos têm atuação muito específica. A versatilidade favorece atuar juto às demais
Engenharias, desenvolver diferentes habilidades e escolher na pós-graduação uma
especialização na área de maneira mais segura. Também considera que as várias
possibilidades de emprego favorecem o acesso a mais oportunidades no mercado
de trabalho, o que é ratificado pela ABEPRO. O crescimento do curso foi outro
112
estímulo, pois há mais chances de empregabilidade. Agora a modalidade está em
evidência e o mercado de trabalho encontra-se em ascensão. Dois pontos reforçam
a percepção: o número de vagas de trabalho e a empregabilidade do Engenheiro de
Produção. No mesmo anúncio de jornal pode ver que havia vagas Engenheiro Civil
e, caso não se conseguisse alguém com essa habilitação, a vaga seria preenchida
por um Engenheiro de Produção.
O que motivou o Aluno 3 a escolher o curso de EP na Instituição em que
estuda foi cursar as disciplinas de Matemática para posteriormente aproveitar os
créditos e pedir isenção em outro estabelecimento (também do âmbito federal),
quando conseguisse aprovação em Engenharia Civil. Foi aprovado no processo
seletivo para a instituição na qual estuda e, ao iniciar o curso de EP, passou a gostar
das áreas de produção e gerenciamento de processos.
O Aluno 4 disse que a motivação na escolha do curso foi um sonho que
sempre teve. Tentou diversos exames vestibulares e foi aprovado na instituição em
que estuda. Foi cursando a disciplina de Introdução à EP que começou a gostar do
curso. Anteriormente não tinha ideia do que se tratava e apenas sabia que esse
campo cuida do gerenciamento da produção. Ao iniciar o curso é que foi saber de
mais detalhes relacionados a essa modalidade. Agora tem noção de quanto ele é
amplo e das várias áreas nas quais poderia trabalhar. A partir da compreensão
desses fatos diz que gosta cada vez mais. O sonho continua e foi um fato marcante
na sua vida estudantil trabalhar este ano na organização da Semana de Engenharia
do Espírito Santo. O incentivo dos professores e as experiências que eles contam
também têm servido de estímulo.
O Aluno 5 também foi levado a cursar Engenharia pelas atuais condições do
mercado de trabalho para os engenheiros da modalidade. São muitas oportunidades
e vagas abertas. O seu pensamento é que alguém até pode se formar no curso que
mais desejar, mas é importante terminar a graduação e conseguir trabalho. O fato de
que atualmente o Brasil necessita muito de engenheiros também pesou na decisão
tomada. Considera a Matemática um desafio pessoal e não enquadra a si como
pessoa com facilidade para compreender e assimilar conceitos matemáticos.
Necessita estudar muito e vê a Matemática um pouco mais complexa na formação
básica das Engenharias do que a Estatística. A justificativa do aluno foi que, por não
113
se tratar da formação de um profissional de Ciências Estatísticas, o estudo da
disciplina voltado para as Engenharias não é tão profundo e limita-se aos conceitos
básicos de cada tópico. Apesar do Engenheiro de Produção desenvolver a
competência para administrar, a EP não forma administradores com diploma de
Engenharia. Mesmo adquirindo a competência administrativa ao longo do curso, sua
profissão é bem diferente do que a do Administrador. Na terceira entrevista, disse
que voltou a cursar EP no semestre passado, interrompeu novamente, mas não
havia retomado a Estatística. Seus problemas relacionaram-se ao estado de saúde,
o que acarretou prejuízos também no semestre anterior. Elogiou a professora e
atribuiu o seu insucesso ao excesso de faltas. Os desafios de aprender Estatística e
Matemática continuam e persiste a concepção inicial de que a EP é uma
especialidade voltada para a administração e o controle.
4.4.1 Considerações e subcategorias
Considerando que na pergunta 1 a motivação do estudante (relacionada aos
fatos que determinaram a presença de cada um no curso de EP) enquadre uma
categoria, temos três subcategorias: concepções sobre o curso e suas disciplinas,
empregabilidade e possibilidades de atuação.
Na primeira subcategoria, a EP é percebida como um desafio, mas também
algo que pode servir à realização de um sonho e vislumbrar o futuro atuando na
profissão. Também é modalidade capaz de atrair alunos, devido às características
de elo entre o setor administrativo, o de produção e os outros ramos das
Engenharias.
A relação entre EP e empregabilidade deve-se ao fato de proporcionar mais
chances no mercado de trabalho em expansão e também à necessidade de
engenheiros no país. A expansão do número de vagas no Nível Superior e a
versatilidade na atuação constituem-se em outros dois fatores de atração para o
curso.
Os alunos também percebem possibilidades de atuar em uma modalidade
que não se restringe a trabalhos específicos, e possibilita conviver com diferentes
114
profissionais na indústria. O desenvolvimento de diferentes habilidades e o
relacionamento interpessoal também são importantes para os entrevistados.
4.5 Respostas à pergunta 2
Nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia de
Produção constam diversas habilidades que devem desenvolvidas durante a
formação do Engenheiro de Produção: comunicar-se eficientemente nas formas
escrita, oral e gráfica; atuar em equipes multidisciplinares; compreender e aplicar a
ética e a responsabilidade da profissão; avaliar o impacto das atividades da
engenharia
no
contexto
social
e
ambiental.
Você
vê
possibilidades
de
ligações/conexões/relações entre a Estatística aprendida nas aulas e as habilidades
citadas? Se sim: Quais são as ligações/conexões/relações que você vê? Se não:
Você pensa que o que aprendeu (ou a forma) em (como) Estatística não permite a
você estabelecer essas ligações/conexões/relações?
Sobre as diversas habilidades desenvolvidas durante a graduação,
inicialmente o Aluno 1 pensava na utilidade da Estatística para direcionar o
gerenciamento das pessoas. Prever elementos da relação com as pessoas pode
evidenciar como ocorrem suas relações sociais. Declarou que o conhecimento
estatístico pode ajudar a prever comportamentos que deve ter ao se relacionar com
determinado grupo social. Sua percepção do conhecimento estatístico era ligada
essencialmente à previsão e comunicação de dados, não vendo aplicações diretas
no trabalho em equipes interdisciplinares. Considerava necessário saber de um todo
para se comportar eticamente e comunicar-se verbalmente de acordo com padrões
da maioria das pessoas. Ao tratar com líderes, a comunicação é diferente daquela
que ocorre com outros trabalhadores. Prever comportamentos gerais pode facilitar
uma melhor comunicação e, portanto, a Estatística serve para levantar o perfil das
pessoas. Por exemplo, se uma pesquisa verificar que a escolaridade de um grupo é
baixa, não é adequado utilizar com elas um vocabulário rebuscado. Justificou o uso
repetido de palavras relacionadas a previsão, porque via na Estatística em
instrumento para prever probabilidades. Saber que algo pode ocorrer permite pensar
o que acontecerá no futuro e a possibilidade dele se concretizar. Características
gerais de um grupo potencializam a previsão de comportamentos gerais.
115
Considerava plausível articular a Estatística com todos os tópicos citados na primeira
parte da pergunta, mas não via, a princípio, a aplicabilidade nesses contextos. Na
terceira entrevista, persistiu a concepção das ferramentas estatística utilizadas como
instrumento de previsão de comportamentos. Ao identificá-los, pode-se prever e
trabalhar a partir dos resultados. Voltando à comunicação escrita, oral e gráfica,
ainda vê prevalência da terceira e não sabe como articular o conhecimento
estatístico com a primeira. Além disso, não pensa muito a respeito da questão ética.
Aprendeu que ferramentas estatísticas aplicadas à Gestão da Qualidade (GQ)
podem ser usadas na questão ambiental. Seu ponto de vista é que a Estatística tem
importante uso da na prevenção de defeitos que geram desperdício. Lembrou do
diagrama de Pareto, que ajuda a verificar quais atividades e defeitos têm maior
impacto na produção e fazem a máquina e parar mais vezes, gerando mais
resíduos. Essa rotina pode ser aplicada em relação aos produtos químicos que mais
causam impacto no ambiente. As disciplinas técnicas possibilitam avanços na
compreensão da necessidade de lidar com impactos ambientais gerados pela
empresa.
A princípio, o Aluno 2 percebeu ligações entre os elementos de comunicação
citados na entrevista e o seu curso. As informações repassadas pelo engenheiro
dizem respeito a mensurações e uso de dados estatísticos. Nesse caso, a principal
ligação é relacionada à expressão gráfica, maneira mais fácil de exprimir e
compreender as informações, pois facilita a visualização e é importante na
comunicação e discussão das melhorias de uma situação. Não viu a princípio
ligações entre atuação em equipes multidisciplinares e Estatística. Considerou
compreender e aplicar a ética e responsabilidade da profissão com a ideia de que,
em cada instituição, existem relações e códigos sobre o tema. Tratando das
habilidades de avaliar o impacto de atividades da engenharia no contexto social e
ambiental, explicou que existem diferentes formas de cada organização lidar. Esse
trabalho consiste em analisar o ambiente e os grupos dentro de cada setor da
organização, mensurando as informações para compreender como tratar a atuação
de cada equipe. Sobre impactos social e ambiental, acha importante notar que as
atividades humanas afetam de diferentes maneiras o ambiente e os grupos sociais.
Para a indústria, por exemplo, a análise dos impactos possibilita saber se
determinada
instituição
age
ou
não
dentro
da
legalidade.
Nas
116
ligações/conexões/relações
entre
Estatística
e
habilidades
da
pergunta,
a
mensuração de dados estatísticos é tão importante, que não haveria melhor forma
de expressar resultados. Disse também que existem outras maneiras de fazer isso,
mas utilizar dados e números facilita mais visualizar e entender as informações do
que ler o texto de um relatório. Quanto a presentar resultados na forma de gráficos e
tabelas, pensa que facilita compreender e identificar dados e informações. Na
terceira entrevista, seu posicionamento sobre as aplicações da Estatística mudou em
relação às anteriores. Agora considera a Estatística um instrumento de
aprofundamento de análise e compreensão. Cursar novas disciplinas fez com que
percebesse mais utilizações da Estatística. No período que se encerrava, quando
usou o conhecimento estatístico em Planejamento e Controle da Produção (PCP),
deparou-se com novas utilidades e formas de apresentar informações. O aluno
concorda que as relações da Estatística com a comunicação escrita existem e,
dessa forma também é possível apresentar informações. Na disciplina de PCP, a
Estatística serviu para representar os acompanhamentos de ciclos de trabalho e
suas etapas. Percebe que a comunicação oral, a partir do que se demonstra e
escreve, facilita e torna a apresentação precisa e mais clara. Acha que a
representação gráfica também é importante e possibilita apresentar todas as
informações geradas com mais clareza. Atualmente compreende que os dados
devem ser utilizados com ética e responsabilidade, além de perceber que pode
utilizar as informações estatísticas para verificar como é o impacto industrial sobre o
ambiente (e como isso afeta as pessoas até mesmo dentro de uma organização).
Considera válido associar vários conhecimentos, pois consegue-se melhora no
desempenho e a Estatística contribui para informar de maneira mais clara o que se
deve buscar e estudar para determinar o que uma equipe deve fazer. Na resolução
de problemas, a Estatística permite obter informações mais claras sobre diversos
aspectos da mesma situação, avaliar suas partes e compreendê-las mais facilmente.
A partir daí pode-se avaliar as partes, desmembrar o problema e descobrir diferentes
elementos que o influenciam.
Inicialmente, o Aluno 3 considerava que fatores de impactos ambientais e
sociais poderiam ser descritos por cálculos estatísticos. Ao articular a descrição de
impactos aos cálculos, lembrou que a gestão de uma empresa pode causar
desemprego, como no caso a aquisição de uma nova máquina. Se ela diminuir em
117
metade a mão de obra, isso causa demissão de operários e não é justo pensar de
forma parcial, pois o desemprego impacta o ser humano. O operário também não
deve ser tratado como massa, pois cada trabalhador é um ser humano e não apenas
um equipamento. Citou os princípios de administração empresarial de Taylor, que
considera o trabalhador mais um elemento da produção e útil pela sua força de
trabalho. Segundo o aluno, trabalhadores não podem ser transformados em robôs,
pois todos têm limitações e uma pesquisa Estatística pode identificá-las. Pensa
também que o valor da mercadoria vendida é um aspecto social. Quem pode adquirir
é rotulado de forma diferente daquele que não tem dinheiro suficiente para consumir
a mesma marca. Sobre ética social, disse que a Estatística é útil para desenvolver
pesquisas entre os funcionários de uma empresa e demais membros da sociedade,
com o objetivo de saber o que eles pensam que é ser ético. Ele não via aplicação
clara da Estatística na atuação em equipes multidisciplinares. Considera que é
importante representar graficamente os resultados obtidos por processos estatísticos
e não percebia a importância da comunicação oral e escrita, aspecto ainda
considerando mais importante na comunicação gráfica. Quando se tem grande
quantidade de números, sua apresentação pode ser de difícil entendimento e utilizar
um gráfico é uma forma mais fácil de compreender. Sua percepção agora é a de que
a Estatística pode ser uma linguagem universal e aprender novos conteúdos é
importante para desenvolver a comunicação oral. Isso deve-se ao maior domínio do
conhecimento de um assunto, porém o repasse de informações ocorre de maneira
clara apenas para uma pessoa que entenda sobre o que se fala. A comunicação
com quem desconhece a Estatística pode não ser efetiva. O aluno ligou a
comunicação escrita à preparação de um artigo científico e a necessidade de
explicar o referencial teórico. Considera apenas essa articulação entre a Estatística e
a comunicação escrita e, além disso, não conseguiria explicar os passos da
resolução de um problema na forma escrita. Na ligação entre Estatística e estudo de
impactos ambientais considerou o exemplo do desmatamento. Sem dados do
quanto se desmata, não é possível planejar uma ação. Continua pensando que
apenas a partir de dados pode-se analisar os fatores humano, socioeconômico,
social e ambiental. No seu entendimento, ao encaminhar para o lado das aplicações
estatísticas, essa análise é possível. Fora isso, não consegue perceber como.
Considerou normal a distância entre as disciplinas e que ensiná-las separadamente
é indiferente, apesar delas terem alguma ligação. Lembrou ter feito trabalhos
118
interdisciplinares que ligavam sem recordar se eram duas ou três disciplinas nem de
maiores detalhes. Quando elaborou um artigo ligou duas ou três disciplinas, mas,
outra vez, não lembrou quais foram. Também continua não vendo como a Estatística
ajudaria em relação à ética e que, por mais que alguém desenvolva o conhecimento
estatístico, não passará a ter comportamento ético. Qualquer pessoa pode agir
eticamente, conhecendo ou não Estatística. Ainda não percebe a Estatística
envolvida com temas de viés sociológico. Para ele, os resultados das pesquisas
podem ajudar a entender fatores humanos, como no caso da ética, mas não sabe
dizer como.
Nas primeiras entrevistas, o Aluno 4 concordou principalmente sobre a
importância da comunicação gráfica e que, para comunicar resultados, é importante
expressar os dados utilizando o conhecimento estatístico. A partir da utilização da
Probabilidade, também é possível encontrar erros e defeitos da produção. Não
soube se posicionar sobre atuação em equipes multidisciplinares utilizando o
conhecimento estatístico. Além disso, confundiu a noção de interdisciplinar na
qualidade de diálogo entre diferentes áreas profissionais com a utilização simultânea
de disciplinas no mesmo trabalho. Não relacionou o conhecimento estatístico e ética
(o que ainda persiste), mas concordou que se deve seguir os preceitos que estão no
manual sobre o tema. Percebe que existem impactos das atividades da engenharia
sobre contextos sociais e ambientais e que a coleta de dados usando instrumentos
aprendidos nas aulas de Estatística pode ajudar a diminuir impacto ambiental.
Acreditava inicialmente que as fórmulas de Estatística podem ser usadas em
pesquisas voltadas para a diminuição dos impactos ambientais e exemplificou com o
tema poluição e verificação do seu grau. As atividades de extração mineral e
industriais exercem pressão ambiental e a Estatística pode ser um instrumento para
procurar soluções. Atualmente, o aluno considera a comunicação oral essencial,
porque um Engenheiro de Produção convive muito com o ser humano e, ao lidar
mais com o fator humano, é necessário ser um bom líder. Daí a importância de
saber falar com as pessoas. Lembrou-se que a disciplina de GQ usa maciçamente a
comunicação gráfica para analisar anomalias e resolver problemas. Em quase todos
os estudos utilizou gráficos para chegar ao problema principal, obter a solução,
amenizar o problema e alcançar a meta estabelecida. É mais fácil entender um
resultado expresso graficamente, mas as pessoas nem sempre conseguem ler e
119
compreender o que nele está representado. Após uma pesquisa, é melhor fazer
gráficos para explicar a um leigo as demandas principais, pois considera mais fácil
as pessoas interessarem-se mais por uma representação gráfica do que por um
texto. Uma área pode se envolver com outras e um exemplo é a gestão de risco,
ligada à área contábil, que está entrelaçada com a EP, além de demandar trabalho
em equipe. Quando se trata de sustentabilidade, a Estatística pode ser usada da
mesma forma que na resolução de outros tipos de problemas, pois é possível
empregar esses métodos em todas as áreas. Ainda não sabia se posicionar sobre a
possibilidade da Estatística colaborar na compreensão de aspectos políticos.
O Aluno 5 incialmente considerou que as habilidades de comunicação
relacionadas ao estudo de Estatística servem para melhor demonstrar um
desempenho. Tanto na comunicação escrita quanto na oral, o engenheiro utiliza
palavras de um vocabulário específico da Matemática. A linguagem gráfica serve
para demonstrar resultados e, da mesa forma que o aluno 4 em sua última
entrevista, reconheceu que as pessoas têm dificuldade para ler e entender gráficos.
Percebe a Estatística como ferramenta útil para a indústria medir qualidade e
desempenho, entendendo esta última como uma medida que pode ser expressa
graficamente. Citou como exemplo o problema da quantidade de peças defeituosas
descartadas que necessitam do desenvolvimento de métodos para melhorar a
situação na qual são produzidas. Disse também que é necessário reconhecer onde
estão os erros, gargalos e afunilamentos para melhoria dos processos. Em relação à
atuação em equipes multidisciplinares, sua percepção foi que a Estatística utilizada
para medir desempenhos pode ser levada para os outros campos profissionais. Não
conseguiu relacionar conhecimento estatístico à ética e responsabilidade da
profissão. Seu entendimento era que assumir uma responsabilidade requer o
cumprimento de padrões de comportamento ético esperados do engenheiro, que
não estão exatamente ligados à sua formação estatística. Ao avaliar impactos da
Engenharia nos contextos social e ambiental, vinculou a Estatística à medição e
argumentou que o desenvolvimento de um projeto em uma empresa necessita da
medição de futuras influências da sua presença no cotidiano das pessoas ao seu
redor. Inicialmente não via outra função para a Estatística, a não ser medir e
mensurar quantidades e comentou que, por meio da Estatística, consegue-se
manipular dados e resultados. Afirmou que conhecendo um pouco dessa Ciência é
120
possível saber se um resultado reflete ou não a realidade, pois ele depende dos
procedimentos utilizados para organizar os dados, de acordo com o que se achar
mais interessante divulgar. Disse que essa manipulação é possível porque a
Estatística não é uma Ciência dotada dos mesmos padrões de exatidão da
Matemática, que tem capacidade de dizer com certeza o que é real. A Estatística
apenas indica o que é bem provável ocorrer, por isso fornece ferramentas para
manipular resultados. Outro exemplo citado foi o da indústria farmacêutica, que pode
apresentar um medicamento eficaz em até 99% dos casos tratados. Dependendo da
forma usada para fazer cálculos, 99 podem ser publicados como prova de eficácia,
mas quanto mais se expande a população estudada, existe a possibilidade do
medicamento fazer efeito ou não. Acredita que o conhecimento estatístico pode
colaborar para estudar a utilização de recursos escassos, destinação final de
resíduos e rejeitos, atentando para a sustentabilidade. Acha que essa preocupação
é um dos principais conceitos na EP: a necessidade de fazer sempre mais, utilizando
menos quantidades e da melhor forma possível é continuamente lembrada, pois não
se pode perder qualidade para fazer mais ou com objetivo de utilizar menos. Pensa
que se deve buscar a melhoria contínua e, nesse caso, a Estatística serve para
medições e as ferramentas que ela proporciona facilitam identificar a quantidade
exata de perdas e formas de melhorar os processos. A exatidão em Estatística não
ocorre na prática, mas quanto mais precisa for a identificação de um problema,
melhor será a solução alcançada. Afirmou que o conhecimento estatístico também
pode ajudar na melhoria contínua e que existem possibilidades de utilizar os
conteúdos aprendidos na identificação das influências ambientais dos sistemas de
produção. Comentou que, de forma geral, por meio de estudos e acompanhamento
dos processos, pode-se medir como a sociedade e o ambiente são afetados. Na
terceira entrevista, deixou claro que a Estatística serve para medida de desempenho
e ainda persiste nessa concepção de ferramenta de controle instrumento de
medição por excelência. Também tem a firme ideia de que, dependendo dos usos
do conhecimento estatístico, os resultados são manipulados, pois conseguem-se
respostas diferentes que podem ser melhores ou piores, dependendo de como se
usam os números. A medição de desempenho não se restringe à área de Produção
e a ideia pode ser levada para outras profissões, pois a Estatística pode ser usada
no dia a dia de qualquer profissão. Continua não entendendo como essa Ciência
pode se relacionar com a ética na atuação profissional, considera impossível
121
manipular permanentemente todos os dados e que uma pessoa ética vai apresentálos de forma correta. O aluno pensa que a Estatística pode colaborar para
desenvolver de forma eficiente a comunicação nas formas oral, escrita e gráfica.
Considera viável atuar em equipes multidisciplinares utilizando o conhecimento
estatístico como meio de comunicação. Para ele, a avaliação do impacto das
atividades da engenharia no contexto social e ambiental é uma oportunidade de
aplicar a Estatística, como no caso de um projeto para medir as interferências
ambientais e sociais da instalação de uma empresa. Isso ajudaria a saber até que
ponto uma indústria pode prejudicar e, se isso ocorrer, a coleta de dados e os
cálculos ajudariam na tomada de decisões sobre o que exatamente tentar para
reverter a situação.
4.5.1 Considerações e subcategorias
Considerando que, na pergunta 2, a palavra habilidades enquadra uma
categoria, temos 6 subcategorias, a saber: aplicabilidade, previsão, controle,
manipulação de dados, repasse e comunicação de dados e informações e
pensamento fragmentado.
A primeira subcategoria engloba percepções de que a Estatística pode
ajudar na melhoria contínua e identificação de influências que os sistemas de
produção exercem sobre o ambiente. Além disso, ela também pode ser utilizada
para levantar o perfil das pessoas, analisar o ambiente e os grupos dentro de cada
setor de uma organização, objetivando compreender a atuação de cada um. Para a
indústria, o conhecimento estatístico é ferramenta útil na aferição da qualidade e do
desempenho de qualquer setor. Um dos entrevistados não via outra função a não
ser a de mensurar quantidades, inclusive, na avaliação de equipes multidisciplinares.
Considerando
a
subcategoria
previsão,
pode-se
notá-la
fortemente
associada à anterior, com a informação estatística percebida como instrumento de
previsão de comportamentos. O mapeamento de características pessoais é visto
como direcionador do gerenciamento de pessoas.
A Estatística também foi percebida pelos alunos como instrumento de
controle, necessária ao reconhecimento de erros, gargalos e afunilamentos da
122
produção para melhoria de processos produtivos. Do ponto de vista do aluno, isso
pode ser estendido a estudos de impactos ambientais, utilização de recursos
escassos e destino final de resíduos e rejeitos, para a garantia da sustentabilidade.
Outro uso apontado para a Estatística são as aferições que ela proporciona,
constituindo-se em ferramenta que facilita medir, utilizar um produto e identificar
quantidades exatas de perdas, com objetivo de melhorar processos de produção.
Por fim, a mensuração é considerada tão importante que não existe melhor forma de
expressar, inclusive, as análises dos impactos e a verificação de que uma instituição
age de acordo com a legislação ambiental.
Na subcategoria manipulação de dados, foram agrupadas as percepções
sobre os resultados estatísticos. Considerou-se que o resultado de uma pesquisa
depende do método utilizado. Logo, por meio da Estatística, consegue-se manipular
dados e resultados. Portanto, dependendo de quem a use, essa Ciência tem a
capacidade de proporcionar análises distorcidas de uma realidade. Falta-lhe a
exatidão, atributo normalmente atribuído à Matemática, e isso permite manipulações.
A Estatística, por não apresentar a realidade dentro de padrões de certeza, mostra o
que é provável acontecer. Daí a sua possibilidade de apresentar dados falsificados.
Passando para a subcategoria repasse e comunicação de dados e
informações, três aspectos são mais citados. Primeiramente, a linguagem gráfica
serve para representar resultados e é considerada a melhor maneira de expressar e
dar compreensão às informações. Resultados na forma de gráficos e tabelas
facilitam a visualização, o entendimento e a identificação de dados e informações.
Visualizar facilita, por exemplo, entender melhor os dados do que ao ler um relatório
completo. O segundo aspecto é de que dados estatísticos servem para expressar
melhor um desempenho. O terceiro relaciona-se à ética social. A Estatística é
considerada útil em pesquisas para saber o que pensam os membros de uma
sociedade em relação ao que é ético.
Por último, temos a subcategoria pensamento fragmentado, que se
apresenta a seguir. Começando pela percepção de que a Estatística não está ligada
a qualquer dos tópicos citados na pergunta, em seguida temos alunos que não
relacionam o curso com a atuação em equipes multidisciplinares. Ocorreu a
percepção de que a Estatística pode ser articulada à comunicação, mas a
123
predominância é a parte gráfica (ou não se considerou qualquer elo entre Estatística
e as três modalidades). Não se percebeu possibilidade do uso de conhecimento
estatístico na compreensão e aplicação da ética e responsabilidade profissional, ou
elas foram associadas à responsabilidade de cada instituição (e suas relações
particulares com os códigos). As habilidades para avaliar o impacto das atividades
de engenharia no contexto social e ambiental, também foram consideradas ações
individuais de cada empresa. Não se considerou que padrões de comportamento do
engenheiro podem ser influenciados pela sua formação estatística.
4.6 Respostas à pergunta 3
Um documento elaborado após diversas reuniões do grupo de trabalho da ABEPRO
(Associação Brasileira de Engenharia de Produção) para a graduação recomenda
que o formando tenha um perfil que inclui a capacidade de considerar aspectos
humanos, econômicos, sociais e ambientais, dentro de uma visão ética e
humanística, atendendo às demandas da sociedade. Você vê possibilidades de
utilizar os conteúdos de Estatística como instrumento para identificar influências que
os sistemas de produção exercem sobre o ambiente? Se sim: Em relação à
utilização de recursos escassos e ao destino final de resíduos e rejeitos existe a
necessidade de atentar para a exigência de sustentabilidade. Como o seu
conhecimento estatístico pode colaborar no estudo dessas situações? Se não: Por
que você se vê impossibilitado de perceber possibilidades de utilizar o conhecimento
estatístico na análise de situações descritas na pergunta?
Nas duas primeiras entrevistas o Aluno 1 concordou que a Estatística pode
ser usada para prever acontecimentos futuros a partir do presente. No caso de
dejetos lançados na natureza, de acordo com a proporção de material residual
lançado, seria possível prever problemas por meio da Estatística. Atualmente
considera que a questão ambiental necessita mesmo da captação de dados e sua
transformação em informações e disse que a Estatística também ajuda a perceber
aspectos sociais e econômicos. Não via como demandas sociais podem ser
estudadas quantitativamente, mas poderia haver alguma relação, associada à
indústria e a necessidade de previsão. Pensa que o problema da demanda, do erro
124
e do Controle Estatístico da Qualidade (CEQ) são questões que influenciam a
sociedade de forma geral.
Inicialmente o posicionamento do Aluno 2 era o de que, com o decorrer do
tempo, a questão ambiental passou a ser mais discutida, principalmente em relação
ao destino de resíduos e avaliação de impactos. Dados devem possibilitar a
mensuração, mostrar o local exato para destino de resíduos e o que pode ser feito
para não prejudicar o meio. Percebe que a questão ambiental e a socioambiental
ocorrem em todas as áreas, causadas pelo aumento de exigências legais para a
certificação ambiental. Na verdade, as empresas não fazem tudo preocupadas
apenas com o ambiente, mas sim com elas próprias. Segundo o aluno, a divulgação
dos métodos de controle que existem na empresa é para preservar a sua imagem,
porque o mercado consumidor pode rejeitar seus produtos e até abandoná-los.
Sobre o fato de repetir diversas vezes o termo mensurar e dar importância à
mensuração, o aluno pensa que isso se deve às formas pelas quais se apresentam
as quantidades apuradas nas pesquisas. Utilizam-se muitos dados para mensurar
impactos, riscos, prejuízos, ou benefícios que os sistemas produtivos podem gerar
para o ambiente, para a sociedade e até mesmo para a cultura das pessoas. Como
exemplo, disse que um segmento da produção pode afetar a cultura ao instalar uma
fábrica em um lugar novo e é necessário conhecer a cultura do local.
Nas primeiras entrevistas, o Aluno 3 declarou que métodos estatísticos de
análise podem identificar impactos da EP na sociedade, no ambiente e temas afins.
Sobre os recursos escassos, a partir de análises estatísticas é possível agir em
relação ao grau de degradação e desgaste ambiental. Porém, na ausência de uma
análise estatística, o aluno pensa que não é possível saber o que está sendo
impactado, de que forma ou mesmo se impactos estão ocorrendo. Caso não tenha
dados claros sobre as fontes de recursos, também acha que não é possível ter ideia
de quando ou se haverá esgotamento do que é extraído. O aluno considera que a
Estatística pode ser utilizada para facilitar o entendimento da necessária atitude da
empresa em relação ao recurso utilizado. Na terceira entrevista considerou que a
análise estatística é fundamental para ter base do que dizer e quais atitudes a
empresa deve tomar. Sobre como agir ao constatar um impacto a partir do
conhecimento estatístico, o aluno reforçou a importância dos dados estatísticos.
Segundo o aluno, sem eles não se conseguem muitos avanços. Também manteve a
125
concepção de que o conhecimento estatístico serve à premeditação de ações e que
os dados podem dar ideias do que fazer.
O Aluno 4 lembrou da utilização da probabilidade para calcular a média de
vida das pessoas. Em se tratando da utilização de Estatística para identificar
influências exercidas pelos sistemas de produção sobre o ambiente, pensa que a
plotagem dos dados e a verificação das frequências de repetições são importantes.
No tratamento dos recursos escassos, destino final de resíduos e rejeitos, atentando
para a exigência de sustentabilidade, vê que pode utilizar o conhecimento estatístico
para proteger o ambiente. Os dados coletados hoje podem servir para projetar
resultados futuros e, a partir disso, cuidar de diferentes tipos de recursos para que
não se esgotem futuramente. Na terceira entrevista, considerou que para avaliar
impactos e o uso de recursos escassos, pode usar a Estatística para aprimorar
métodos de análise. O aluno partiu da ideia simples de que tratar da
sustentabilidade é pensar no cuidado com o ambiente agora, objetivando assegurar
a próxima geração. Pensa que, para tentar manter o que se tem agora, são
necessárias pesquisas, que verifiquem se a qualidade de determinada situação é
mantida, piora ou melhora. Para o aluno, a Estatística pode ser utilizada não apenas
no ambiente fabril, mas em diversos estudos da sociedade e de problemas
ambientais relativos à sustentabilidade e que a Engenharia de Métodos (EM), por
exemplo, envolve a relação do trabalhador com ambiente e a segurança do trabalho.
Se o ambiente não estiver adequado, afetará a saúde e o desempenho da função. O
aluno observou que, na prática, os estudos desses temas podem aplicar os mesmos
métodos de disciplinas da formação técnica.
Inicialmente o Aluno 5 pensava que olhar a área social implica na
capacidade de ver necessidades, exemplificando com o uso de dinheiro público.
Segundo ele, essas verbas são utilizadas em construções e reformas que
desperdiçam recursos públicos. Se as avaliações dos gastos fossem feitas mais
eticamente, pensa que não se desperdiçariam recursos, e seriam canalizadas
verbas para ações de melhoria do bem estar da sociedade. Atualmente, ele pensa
que a Estatística pode ser utilizada para verificar a influência ao redor de um
empreendimento. No caso de uma fábrica, quando ela é projetada, uma
preocupação deveria ser a existência de mão de obra local próxima. Já em relação
ao uso de recursos escassos, acha que isso tem simultaneamente as finalidades
126
social, econômica e ambiental, pois pode-se gastar menos ao reutilizar ou reciclar
insumos.
4.6.1 Considerações e subcategorias
Considerando que na pergunta 3 a palavra perfil representa uma categoria,
temos a repetição das subcategorias aplicabilidade, controle e previsão. Na
aplicabilidade, a Estatística foi percebida como instrumento para identificar e facilitar
o entendimento sobre impactos. Mensurar foi associado a uma forma de expressar
dados apurados em pesquisas e o resultado pode mostrar o local exato do destino
de resíduos.
Na subcategoria controle observa-se a necessidade de ter dados em mãos
que comprovem consequências de atitudes, necessidade essa voltada para a
tomada de providências que corrijam falhas. Emerge então outro aspecto: a análise
estatística pode fundamentar o que dizer aos funcionários de uma empresa e
justificar quais serão as atitudes assumidas. O conhecimento estatístico também foi
considerado útil para verificar o funcionamento de sistemas.
A previsão foi a terceira subcategoria de percepção encontrada para a
análise estatística. Os alunos consideraram que a Estatística serve para prever o
que acontecerá, considerando-se os dados do presente. São necessários dados
claros sobre fontes de recursos para saber quando ou se haverá esgotamento. A
Estatística também foi considerada importante para calcular a proporção de dejetos
e resíduos suportados pelo ambiente.
4.7 Respostas à Pergunta 4
O documento da ABEPRO citado na pergunta anterior vê a necessidade de: ter
capacidade de identificar, modelar e resolver problemas; ter a compreensão dos
problemas
administrativos,
socioeconômicos
e
do
meio
ambiente;
ter
responsabilidade social e ambiental; “Pensar globalmente, agir localmente”; Você
poderia dizer se a Estatística pode ser ligada a essas habilidades? Se sim: Como se
dariam essas ligações? Se não: Por que você pensa que essas habilidades não têm
ligações com o conhecimento estatístico? Por quê?
127
Nas duas primeiras entrevistas, o Aluno 1 lembrou que, em uma linha de
produção, a modelagem estatística é essencial para prever falhas e acertos a serem
feitos. Disse que o conhecimento estatístico deve ter ligações com a questão
econômica, mas não percebeu aplicabilidade nos estudos da sociedade,
considerando-o de fundo mais quantitativo. Afirmou que o que muda a sociedade
são questões práticas e que calculando por meio de conceitos estatísticos, pode-se
transformar objetos para a sociedade usar. A relação entre pensar globalmente e
agir localmente é a transformação do pensamento geral para tratar uma amostra e
uma ação pequena pode gerar impactos maiores. Pensa que a capacidade de
identificar, modelar e resolver problemas tem a ver com o fato de desejar
transformar, modelando para algo mais genérico. Sobre a questão da gestão
administrativa, lembrou do problema de produzir objetos defeituosos, refletindo que
primeiramente é necessário identificar os problemas, que podem ser ambientais,
como no lançamento de dejetos na natureza e que é possível buscar soluções para
diminuir as quantidades lançadas ou prever o valor máximo aceitável de
lançamentos. O aluno pensa que transformar dados em informação significa que
eles de forma geral não têm valor em si. Saber a altura média de uma população,
por exemplo, serve para verificar se alguém é alto ou baixo em relação à média. Isso
seria transformar dados em informação para poder avaliar algo. Na terceira
entrevista, ainda não via aplicações das ferramentas estatísticas que aprendeu no
estudo de questões sociais. Continua com a ideia de que é possível estudar
determinadas questões usando diferentes instrumentos estatísticos. Exemplificou
com a curva normal, que descreve tendências centrais como e dispersão de dados.
Em sua primeira entrevista, o aluno 2 considerou que a capacidade de
identificar, modelar e resolver problemas está ligada à possibilidade de identificá-los,
mas que não é fácil modelar a resolução. Para ele, é possível identificar as
informações fazendo mensurações e resolver o problema a partir de um estudo
serve para identificar viabilidades. Também refletiu sobre problemas administrativos,
socioeconômicos e do meio ambiente e pensa que podem ser associados às formas
de mensurar. Além disso, é possível estudar a população por meio de dados, pois as
formas de coleta e análise geram informações precisas para produzir relatórios de
previsão de desdobramentos futuros. Ao invés de textos extensos, segundo ele é
mais fácil apresentar os resultados das pesquisas na forma de dados, para ajudar a
128
compreensão de quem examina os relatórios. Também segundo o aluno, os dados
estatísticos são úteis para estudar a responsabilidade social e ambiental e são ponto
de partida para refletir sobre ambos. Considerou que “pensar globalmente, agir
localmente”, tem ligações com a estatística, pois o panorama global pode ajudar a
analisar as ações locais. O contexto global seria um guia para agir localmente, a
partir dos dados. Nas ligações da Estatística com as habilidades citadas, ressaltou
as formas de analisar a população e o ambiente, vendo a necessidade de mensurar
e apresentar feedbacks. Percebeu ligações entre diferentes formas de analisar
populações em determinados locais. Exemplificou com a introdução de um novo
produto no mercado. Todas as informações sobre o meio servem para obter
respostas às questões. Embora ressalte a importância dos dados estatísticos,
afirmou que nada é produzido com total acerto e podem acontecer erros, pois as
máquinas são factíveis de problemas. Disse que para relacionar essas partes é
importante controlar a variação e, na verdade, deve-se ter tudo mensurado,
identificando a margem de erro para contornar a dificuldade, caso algo saia do
padrão. Na terceira entrevista, relatou que no estágio conseguiu entender como
relacionar os problemas do setor e identificar soluções dentro do ambiente
administrativo. A estatística ajuda a relacionar e obter as informações mais precisas,
usadas para entender o que acontece no ambiente ou na sociedade. Considerou os
problemas ambientais, sociais e administrativos parecidos, porque em todos os
casos é necessário analisar tudo. Acha que a melhor forma de apresentar soluções
é usando dados mensuráveis para compreender mais claramente ou melhor resolver
um problema. Quando se procuram dados para obter relações fica mais fácil
visualizar a solução e isso ajuda na compreensão e na busca de melhorias, pois,
com informações e dados se consegue entender como o ambiente e a sociedade
são afetados. Atualmente pensa que a modelagem é um método analítico e que um
problema pode ter diversas causas e a Estatística ajuda a relacioná-las, obtendo
informações mais precisas.
O Aluno 3 tinha a ideia inicial de que, nesses pontos, são claros o uso da
Estatística, mas não são apenas os conteúdos aprendidos no curso que ajudarão a
identificar, modelar e resolver problemas. Segundo ele, pode-se conseguir modelar
com o uso da Estatística e, caso ela não resolva, podem ser utilizados modelos
matemáticos, incluindo equações diferencias e as derivadas parciais. Também que
129
se pode usar a Física e tudo isso estaria englobado nos recursos científicos. Porém,
na sua opinião, é mais fácil usar a Estatística. Acha que a análise de problemas
administrativos, socioeconômicos e do meio ambiente recai sobre a parte
administrativa e que por meio de pesquisas em cada área é possível encontrar
valores médios e números significativos que permitam compreender os fatos. Não
viu com muita clareza ligações da responsabilidade social e ambiental com a
Estatística. Não percebia como incluir a Estatística na análise de responsabilidade
social e ambiental e sua posição ainda era essa na segunda entrevista. Sua ideia
sobre pensar globalmente e agir localmente é a de que os dados globais servem
como referência que direcione a ação local a partir da identificação de marcos.
Continua com o pensamento de que não se pode lidar melhor com os problemas na
ausência de dados. Sem eles, não se consegue tratar de problemas humanos,
socioeconômicos, sociais, das Ciências Humanas e até mesmo a questão ambiental.
Diz que se estuda melhor os problemas sociais quando se leva para o lado das
análises estatísticas.
Para o Aluno 4, a Estatística realmente pode servir para ampliar horizontes,
facilitar a identificação e a resolução de problemas. Também considera necessário
ter um bom raciocínio lógico e para ele a capacidade de modelar está ligada ao
conhecimento
estatístico.
Ao
falar
sobre
a
compreensão
de
problemas
administrativos, socioeconômicos e do meio ambiente, considerou o raciocínio lógico
necessário aos trabalhos desenvolvidos com Estatística. A evolução do raciocínio
facilita a leitura de textos e a compreensão de situações problema. Associou a
responsabilidade social e ambiental à busca e coleta de dados que favoreçam
desenvolver métodos para resolver problemas ambientais e a desigualdade social.
Para o aluno, pensar globalmente e agir localmente com o envolvimento da
Estatística foi considerada uma ideia difícil de associar e uma questão que não é
fácil de responder. Perguntado como percebia o desenvolvimento do próprio
raciocínio lógico, disse que os exemplos levados pela professora para a sala de aula
colaboraram para tal. Lembrou dos exercícios que tratam de falhas na produção e da
diminuição do total de defeitos do processo produtivo. Segundo ele, na fábrica ou
em qualquer setor de trabalho, a Estatística é tem uma presença marcante. Não ter
conhecimento aprofundado prejudica perceber o que é a Estatística, pois não se
trata de uma Ciência que trabalha apenas com gráfico e representações correlatas,
130
ela envolve cálculos e utiliza muitas fórmulas, cada uma delas com aplicação
específica. Também considera a Estatística presente em aplicações diversificadas,
pois atualmente tudo demanda pesquisa e análise de dados para fazer previsões,
resolver e analisar situações. Classificou a Estatística II uma disciplina de análise e a
Estatística 1 ligada aos cálculos. Na terceira entrevista, o aluno lembrou que estudou
a função do trabalhador, a segurança individual e o ambiente. Se este não estiver
adequado, afetará diretamente a saúde do trabalhador, mas ainda existem indústrias
que não seguem esse preceito, porque o custo de produção aumentará. Diz que o
mesmo ocorre em relação aos problemas ambientais e que a Estatística pode se
envolver em estudos econômicos e sociais, com objetivo de manter a produtividade
do país e, ao mesmo tempo, cuidar do ambiente e das pessoas. Na disciplina de
GQ, lembrou ter utilizado a Estatística para identificar e resolver problemas. A parte
gráfica ajudou a analisar as situações.
Para o Aluno 5, as ligações existem quando, ao fazer medições, obtém-se
parâmetros e dados estatísticos. Portanto, a Estatística ajudaria a identificar o que
deve ser melhorado e mostrar pontos específicos de perda e de variação.
Inicialmente não via ligações entre a compreensão de problemas administrativos,
socioeconômicos e do meio ambiente com o conhecimento estatístico. O que se
consegue é pontuar os problemas para tentar resolvê-los. Em relação às situações
problema, disse que podem ocorrer dois casos: não conseguir identificar o problema
a ser resolvido, ou saber do que se trata, mas não identificar as quantidades
envolvidas na resolução. A Estatística ajuda a pessoa que a conhecem a conseguir
algum dado, por mais aproximado que seja, para encontrar as soluções. Tomou
como exemplo a quantidade de peças perdidas na produção e o que fazer para
diminuir as perdas. A partir do momento em que se começa a medir e controlar é
possível verificar se o sucesso realmente foi alcançado. Considera que os problemas
administrativos são resolvidos utilizando a Matemática, pois ela possibilita entender
melhor o ocorre e de que forma os fatos se desenrolam. A partir daí, pode-se
pontuar o que ocorre e quantificar de forma exata (ou bem próxima) para tomar
decisões. Na sua concepção, as questões matemáticas são ligadas diretamente aos
problemas administrativos, pois, para administrar de forma correta, são necessários
dados precisos e que é impossível administrar sem informação e dados relativos à
capacidade que pode ser usada. Apontou a necessidade das mensurações
131
permanentes e que a quantificação é importante e essencial para o sucesso de uma
empreitada. Na concepção do aluno, pensar globalmente e agir localmente é uma
questão ligada à percepção de tudo o que acontece ao redor e que determinadas
decisões não podem ser tomadas apenas considerando dados de um ambiente
específico ou de uma situação restrita. O aluno afirmou que a boa solução para um
caso, pode não servir para outro e que conhecer o global é buscar o conhecimento
do que acontece ao redor, identificar os pontos positivos, levando aquilo para o
cotidiano da empresa. Na terceira entrevista, o aluno considerou que na verdade, na
hora de buscar a melhoria, a definição do problema é muito importante, pois muitas
vezes basta resolver algo minúsculo e que afeta a cadeia de produção.
4.7.1 Considerações e subcategorias
Considerando que na pergunta 4 a palavra necessidade enquadra uma
categoria, temos a repetição de aplicabilidade, controle, pensamento fragmentado,
previsão e repasse e comunicação de dados e informações. Emergiram agora 2
novas subcategorias: desenvolvimento de habilidades e mensuração.
Desta vez a subcategoria aplicabilidade caracteriza-se pela compreensão de
que a Estatística é instrumento para modelar e resolver problemas, analisar
panoramas globais, buscar dados para desenvolver responsabilidade ambiental e
social, além de apoiar a administração. Por meio da Estatística consegue-se
mensurar, identificar informações, resolver problemas e identificar viabilidades.
Também pode identificar, modelar e resolver problemas quando se transforma e
modela algo particular de forma generalizada.
Com dados globais é possível estudar possibilidades de ação e a análise do
contexto global pode guiar ações locais. Existem decisões que não podem ser
tomadas apenas considerando dados restritos. A reponsabilidade social e ambiental
foi associada à coleta de dados para diminuir impactos ambientais e de
desigualdades sociais. Encontrar valores e números significativos melhora a
compreensão dos fatos. A administração correta necessita de dados precisos e é
impossível administrar sem informações e dados.
132
Na subcategoria controle estão o levantamento de falhas e erros, para
identificar pontos de perdas e diminuir a incidência desses eventos. Também foi
associada à melhoria da qualidade de processos e à essência de instrumento de
controle e medição. Tudo deve ser mensurado, identificando margens de erro para
controlar padrões. A Estatística ajuda a identificar problemas que, resolvidos,
diminuem erros dentro das empresas. Medições e controles possibilitam melhorar
processos e verificar se o sucesso foi alcançado. Dessa forma, a Estatística é
essencialmente um instrumento de controle e de medição, que permite identificar e
controlar a partir de dados globais. Estes servem de referência para a ação local,
identificação de marcos e direcionamento de ações.
A subcategoria desenvolvimento de habilidades contempla as seguintes
percepções: para identificar um problema é necessário ter raciocínio lógico
desenvolvido; a Estatística pode ampliar horizontes e facilitar a identificação do
problema real que se deve resolver; o conhecimento estatístico também desenvolve
a capacidade de modelar.
Inicialmente, a subcategoria mensuração está ligada à necessidade
permanente de mensurações, o que significa apresentar informações para traçar
cenários futuros. Isso se aplica tanto na análise da população e do meio quanto na
gerência de uma fábrica e à previsão de impacto ambiental gerado por uma
empresa. Aplicações da Estatística em estudos da sociedade foram associadas com
a indústria e a necessidade de previsão.
A previsão foi uma subcategoria caracterizada pela capacidade de descrever
situações futuras, ligadas a influências da atividade industrial sobre a sociedade.
Previsão foi associada a antecipação de demandas, de erros e ao controle de
qualidade. Além disso, existe a possibilidade da Estatística prever valores máximos
de elementos poluentes que podem ser liberados no ambiente.
O repasse de informações e dados é a subcategoria em que se incluiu as
seguintes concepções: instrumento de coleta e análise de dados para gerar
informações; dados como elementos facilitadores de compreensão; ponto de partida
para análises; necessidade de feedbacks; análise de populações; obtenção de
informações sobre determinado meio; obter parâmetros e dados informados
133
estatisticamente; tratar de amostras para que ações pequenas possam gerar
resultados maiores.
Finalmente, a subcategoria pensamento fragmentado reúne concepções
sobre a impossibilidade de articular a Estatística aos elementos da pergunta 4. São
exemplos: não relacionar a Estatística à compreensão de problemas administrativos,
socioeconômicos e do meio ambiente; não perceber claramente articulações entre
conhecimento estatístico e análise de responsabilidade social e ambiental; aceitar
ligações da Estatística com a Economia, mas não ver aplicabilidade em relação ao
estudo da sociedade; associar a resolução de problemas administrativos à
Matemática e não à Estatística; não ver como demandas sociais podem ser
estudadas quantitativamente.
4.8 Respostas à Pergunta 5
Você vê ligações entre o conteúdo de Estatística estudado, demandas sociais e
posicionamento
político
nos
elementos
citados
nas
perguntas
anteriores
(posicionamento político, mas não partidário)?
O Aluno 1 viu as ligações entre Estatística e os estudos citados na pergunta.
Também considerou possível extrair informações do contexto social por meio de
pesquisas estatísticas. Acha que a influência política ocorre ao querer influenciar
mudanças e que isso se relaciona à liderança e não a questões partidárias. Diz que
nesse quadro está o aperfeiçoamento da produção para tornar algo melhor para as
pessoas. Ao pedir que explicasse melhor o que considera comportamento médio e
sua importância, disse que a média, de forma geral, não dá relevância aos extremos
e que desconsiderando-os, o raciocínio volta-se para valores médios e, portanto,
esse o comportamento não diz respeito a extemos. O conceito de demanda na
terceira entrevista foi associada à previsão de vendas futuras e comportamentos
sazonais, cálculo de erro e CEQ. Voltou a tocar no mundo dos físicos, ainda
considerando que seus problemas fogem à realidade social.
O Aluno 2 inicialmente percebia que os acontecimentos no meio político
refletem sobre o meio social e a apuração de dados serve para mostrar como isso
acontece. Segundo o aluno, estudos estatísticos podem apresentar a evolução do
134
meio político e orientar ações a partir dos dados obtidos. Acha que ao analisar o
meio ambiente é possível aplicar muito mais os dados do que na política. Mesmo
que se obtenham dados que geram informações, o meio político não os utiliza como
poderia. A ligação com a Estatística seria mostrar como o meio político evolui e
também identificar como as pessoas veem o que mudou de um período a outro. Na
terceira entrevista, o aluno manteve a percepção que o posicionamento político
relaciona-se ao conhecimento das informações para constatar e entender
tendências em época de eleição. Além disso, acha que as pesquisas podem ser
empregadas para verificar se a sociedade enxerga os fatos de uma forma ou se
deixa influenciar pelas informações passadas. Diz que sobre as demandas mais
exigidas socialmente, por meio de estudos é possível supri-las e satisfazer as
maiores necessidades.
Inicialmente o Aluno 3 considerou que é possível retirar informações do
contexto social. Apesar de não ver ligação clara da Estatística com demandas
sociais e o posicionamento político, sua ideia era a de que se pode transformar
dados em informações e concluir a respeito desses temas. Comentando sobre o fato
de não perceber ligações entre eles os elementos da pergunta, disse que não pegou
nada no ar. Não negou que não possam existir tais relações e considerou a falta de
percepção um problema pessoal. Na terceira entrevista não expôs seu ponto de
vista sobre as ligações com o posicionamento político nem se posicionou em relação
às demandas sociais.
Para o Aluno 4, o caráter político corresponde às promessas dos candidatos.
Apresentou como exemplo voltado para o atendimento de demandas sociais
colocação em prática projetos para erradicar a pobreza, pois eles podem iniciar com
a obtenção de dados sobre quantidade de pessoas pobres. Então, a partir do
levantamento, ações devem ser planejadas para diminuir a pobreza e acha que
depois de iniciado o projeto é necessário realizar outra pesquisa utilizando diferentes
abordagens estatísticas, para ver se o problema foi resolvido. Sua concepção ainda
é a de um universo político repleto de erros e corrupção. Não soube opinar a
respeito de articulações entre Estatística, demandas sociais e posicionamento
político, mas pensa que as decisões não são tomadas a partir dos dados existentes.
Sobre a compreensão de demandas sociais por meio da Estatística, disse que a
leitura dos gráficos ajuda a compreender os dados de uma pesquisa.
135
O Aluno 5 percebia ligações entre o conteúdo de Estatística com as
demandas sociais e o posicionamento político. Sua justificativa foi que, quando se
conhece uma área, por mais superficial que seja o conhecimento, os horizontes
podem ser expandidos. Saber Estatística permite identificar diferentes elementos do
meio e, a partir do seu uso, é possível manipular dados a favor de uma opinião.
Quando se sabe que informações podem ser obtidas a partir de dados manipulados,
conhecer Estatística permite buscar as intenções e a verdade por trás de atos e
fatos. Acha que a Matemática permite levantar dados, informações e é instrumento
de medição. No caso da Estatística o conhecimento pode ajudar a entender de fatos
cotidianos. Considera que a maioria da população não entende determinados
procedimentos estatísticos e não percebe manipulações e que dados econômicos e
sociais podem ser manipulados para passar a ideia de crescimento, mas apenas do
ponto de vista de quem os prepara para apresentar ao público. Pensa que usando
conhecimento estatístico é possível, de acordo com a real intenção, manipular dados
de diferentes formas e mostrar se eles devem ser considerados positivos, ou
negativos (ou apresentar da melhor forma para que a mesma informação aparente
ter forma negativa ou positiva). Na terceira entrevista, novamente associou o estudo
de demandas sociais e posicionamento político com manipulação de dados para
chegar a resultados favoráveis. Citou um erro na Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD), divulgada pelo IBGE em setembro. Isso o deixou desconfiado
em relação à honestidade dos dados, embora o Instituto goze de credibilidade.
4.8.1 Considerações e subcategorias
Considerando que na pergunta 5 a palavra ligações enquadre uma
categoria, temos a repetição da aplicabilidade, da manipulação de dados, da
mensuração, do pensamento fragmentado e do desenvolvimento de habilidades.
Emergiu uma nova subcategoria: exatidão.
A subcategoria aplicabilidade apresenta as percepções da Estatística
aplicada na análise de dados para realizar mudanças, direcionar decisões práticas e
apresentar a evolução do meio político. Informações resultantes de estudos sobre o
ambiente podem guiar decisões. Também servem para iniciar a implantação de
projetos e, posteriormente, avaliá-los.
136
O desenvolvimento de habilidades é uma subcategoria que inclui a
percepção de que o conhecimento estatístico amplia horizontes intelectuais. A
Estatística também foi associada à identificação de diferentes elementos do meio e
ajuda a entender fatos cotidianos.
A subcategoria mensuração apresenta a Estatística na qualidade de
instrumento que possibilita medir para, a partir dos resultados, atender às
necessidades.
Na subcategoria exatidão, temos o conhecimento estatístico percebido como
elemento de medições possíveis que fornece resultados precisos.
Manipulação de dados é uma subcategoria que agrega as seguintes
concepções: a Estatística possibilita manipular dados a favor de uma opinião; os
dados podem influenciar positiva ou negativamente a opinião da sociedade;
conhecer estatística permite saber se os dados foram manipulados; maioria da
população a população desconhece a Estatística e não percebe manipulações;
existe intencionalidade na manipulação dos dados e os governantes interpretam os
resultados de acordo com conveniências.
A subcategoria pensamento fragmentado aglutinou as percepções de que o
conhecimento estatístico não se articula a diferentes análises, entre elas a do
posicionamento político e de fenômenos associados a esse universo. Ao contrário
do que ocorre com a política, o meio ambiente é passível de estudos estatísticos.
Apesar de não perceber ligações claras da Estatística com estudos de demanda
social e posicionamento político, os dados podem informar sobre os temas da
pergunta. Não ver ligações entre os elementos da pergunta pode ser uma falha do
próprio raciocínio individual.
4.9 Respostas à Pergunta 6
Até o presente momento, em relação à sua formação em Engenharia de Produção,
que temas da Estatística foram mais significativos para você? Você pode explicar
por que?
137
Na primeira e segunda entrevistas, o Aluno 1 citou a média, pois, para ele, o
comportamento médio diz muita coisa. Esse destaque deve-se à falta de praticidade
da EP trabalhar com dados extremos porque oscilações bruscas não dizem muito
sobre eventos pontuais. Segundo o aluno, a influência deles, ou a sua probabilidade,
é pequena e saber onde há maior concentração facilita o trabalho. A curva normal,
que descreve o comportamento de uma variável mostra onde os dados estão mais
centrados (com maior possibilidade) de ocorrer e por isso é importante, ao contrário
da moda. Uma expressão muito utilizada pelo aluno durante as entrevistas foi
“transformar dados incertos em algo provável, transformar nada em talvez”. Ele
inicialmente percebia na Estatística um instrumento capaz de lidar com o aleatório,
mas sem muito significado e não muito representativo. A Estatística transformaria
valores pequenos (ou várias oscilações incertas) em algo que talvez acontecesse.
Essa foi a explicação de tomar um dado não muito representativo e transformá-lo em
informação, o talvez. Falando da sua mudança de visão inicial sobre a Estatística,
relatou que ao entrar no Nível Superior ela era muito restrita ao conteúdo do Ensino
Médio. Ao entrar no Ensino Superior, saiu de um ambiente teórico, no qual era
suficiente conhecer superficialmente os conceitos para aplicá-los. No início da
graduação, continuou um pouco da visão anterior, quando estudou moda, média e
variância e o desvio padrão, conceitos que não foram tratados em diferentes
aplicações (sempre em situações simples). Para ele, é difícil encontrar problemas
simples em contextos globais, pois surgem situações complexas. Também considera
a Estatística muito mais real, pois no mundo nada é exato. Via cálculos exatos por
trás das teorias estatísticas, apesar das aplicações não fornecerem resultados
exatos. Pensa que na verdade existem possibilidades ou probabilidades de
resultados e que a Estatística é mais concreta por tratar de algo que pode acontecer.
O Cálculo, por exemplo, é uma Ciência que trata de objetos reais e, por meio dos
cálculos, seria possível descobrir resultados que têm existência real. A expressão
“nada é tão certo quanto o Cálculo18 no mundo”, significa que, de forma geral, ele
considera que em toda disciplina de existe um resultado considerado verdadeiro. Na
Estatística diz-se que é possível que seja. Nesse sentido, compara as probabilidades
com a exatidão atribuída ao Cálculo. Não percebe muita aplicabilidade do Cálculo de
derivadas e de integrais no mundo ao seu redor, referindo-se a este como um
18
Entenda-se por Cálculo, com “C” maiúsculo, o Cálculo Diferencial e Integral.
138
mundo aplicável e coloca o trabalho dos físicos fora do mundo prático, que é
ocupado por diferentes grupos sociais. Na terceira entrevista ainda considerava a
média importante para a EP, juntamente com a curva normal. Diz o mais importante
no desvio padrão é a possibilidade de ver como os dados se dispersam em relação
ao comportamento normal. No período que se encerrava, estudou uma disciplina
relacionada ao conhecimento estatístico: Controle de Qualidade (CQ), que utiliza a
curva normal e temas correlatos. Também cursou EM, que trabalha com o conceito
de tempo padrão, utiliza os conceitos de média, desvio padrão e o escore z. Em GQ,
utilizou com os conceitos de dispersão e comportamento normal de defeitos, por
intermédio de ferramentas estatísticas. Também estudou o investimento e risco de
aplicações na bolsa de valores com a partir de modelos estatísticos. Considerou que
falta abordar mais aplicações da Estatística, o que influenciou sua concepção de
Engenharia como um curso no qual as disciplinas não estão ligadas, qualificando-as
como “disciplinas solitárias”. Em meio à solidão, alguns alunos percebem que os
temas podem ser articulados, mas os professores não sabem como fazer isso. Citou
a Previsão de Demanda que utiliza o Cálculo de Regressão e o Cálculo Numérico,
mas que a professora desta disciplina não relacionou os conteúdos com a Previsão
de Demanda. Também percebeu, a partir da forma que os conteúdos foram
ensinados, que não há comunicação entre os professores. Disso resultou uma
abordagem superficial dos tópicos em relação às necessidades da EP. Em PCP
usou várias fórmulas e não compreendeu bem a associação dos resultados com
desenho do gráfico e a dispersão dos dados. Declarou ter chegado a pensar que o
ideal seria os professores especialistas da Engenharia lecionarem as disciplinas de
Matemática e Estatística, mas reconsiderou a ideia, pois seria difícil. Diz que os
matemáticos têm melhor conhecimento desses temas e que seria necessário reunir
todos os professores para decidir novos rumos para o curso. Os que lecionam
disciplinas técnicas deveriam apresentar seus objetivos e os conteúdos que
abordam. Além da solidão, o aluno diz que ocorreram casos em que os conteúdos
foram repetidos por professores de disciplinas diferentes. A falta de aplicabilidade
das disciplinas básicas foi o problema considerado mais grave pelo aluno, resolvido
em parte pelo professor de Mecânica dos Fluidos (MF), pois ele relacionou a
aplicação dos conteúdos à EP. Solicitou que os alunos pesquisassem artigos
relacionados às aplicações práticas ou procurassem problemas usualmente
enfrentados nas empresas onde estagiavam. A experiência foi considerada bem
139
sucedida. Os grupos de trabalho encontraram diversas situações e relacionaram a
Física da MF com fatos da EP.
Entre os temas da Estatística que foram mais significativos, o Aluno 2
destacou a Probabilidade e a Estatística II e disse que a importância dos temas
decorre do fato de ajudar a entender a demanda a partir das informações
disponíveis. A parte conceitual e as informações básicas da Estatística 1 passaram a
ter mais aplicações e importância, contribuindo para compreender as análises
amostral e populacional. O aluno não poderia afirmar se os resultados estatísticos
constituem-se em verdades absolutas, pois as respostas dependem do ambiente
estudado. As análises de Probabilidade, Demanda, População e do Ambiente foram
partes que mais interessaram e consideradas mais úteis para o aluno . Na terceira
entrevista, os cálculos de desvios, histogramas e curvas de demanda foram citados
como significativos e tópicos com mais aplicações na EP. Os cálculos de desvios, os
histogramas e as curvas de demanda foram utilizados na Inspeção da Qualidade
(IQ). Diz que nessa disciplina é importante relacionar a qualidade de um produto aos
seus limites e padrões. Sua percepção sobre o papel da Estatística na EP mudou
desde a primeira entrevista. Para ele, com a articulação de saberes frente a outras
disciplinas e a integração de estudos, a aplicação do conhecimento estatístico foi
melhor compreendida. Constatou a necessidade desse conhecimento para a EP e
que isso facilita a compreensão de conceitos.
Quando entrevistado pela primeira vez, imediatamente o Aluno 3 lembrou-se
de média, variância e desvio padrão, classificando-os como conceitos bastante úteis.
Os conteúdos de Estatística II e as análises gráficas e de Probabilidades também
foram considerados. Todos os gráficos têm utilidade e, dependendo da situação, não
é possível afirmar qual deles é melhor que o outro. De forma geral, todos os
conteúdos de Estatística são úteis para a EP. Utilizando a Análise Estatística e a
Probabilidade, por exemplo, é possível estudar mercados futuros. O valor médio é
importante porque norteia a produção e a variância foi lembrada como instrumento
para calcular variações da produção. Na terceira entrevista, o aluno cursava CEQ e
muitas aplicações da Estatística foram despercebidas. Usualmente o professor de
uma disciplina técnica não avisa que trabalha com Análise Estatística e ela foi
importante para estudar previsão de demanda. Além das disciplinas citadas,
considera a Estatística aplicável em outros campos, tais como a pesquisa de
140
mercado e a análise da quantidade de defeitos. Discutindo sobre a pouca carga
horária de Estatística nas engenharias, confirmou a opinião do Aluno 1: seria uma
boa opção aumentar o número de aulas, porque se trata de disciplina muito
importante em todos os momentos das vidas acadêmica e profissional. Para ele, a
Estatística usualmente ensinada nos cursos de Engenharia não é deficiente, mas a
modalidade Multivariada, por exemplo, é pouco discutida. O aluno não percebeu
diferenças entre as aplicações internas da Estatística e as realizadas por outras
disciplinas. Para ele, trata-se exatamente do mesmo conteúdo, com a diferença da
abordagem do professor. Considera normal ensinar Estatística separada de outras
disciplinas, pois cada um observa o conhecimento de uma forma. O professor de
PCP, por exemplo, foi mais técnico, ao passo que a professora de Estatística tinha
uma visão mais teórica sobre os mesmos temas. Ao estudar a curva normal na
Estatística o aluno aprendeu a lidar com a Probabilidade e conceitos afins. Essa
curva foi tratada em PCP de forma idêntica à da Estatística, apenas levando para o
lado mais aplicado. Também citou o exemplo da fábrica de parafusos e a previsão
de demanda, que também pode ser aplicada ao estudo de algum tipo de câncer. A
alteração profunda sentida foi ver aplicações da Estatística e perceber a utilidade de
cada resultado.
O aluno 4 considerou que se desenvolveu melhor em relação à leitura de
textos e aplicação dos conteúdos. Destacou a importância da leitura do texto, a
identificação do problema a partir dos dados fornecidos e a aplicação das fórmulas.
Relatou que inicialmente conhecia apenas a parte considerada básica. Quando
cursou Estatística II passou a fazer análises e, com isso, entende melhor as
diferentes situações propostas pela professora. Também retornou ao exemplo da
produção de parafusos e o cálculo da probabilidade de encontrar um elemento
defeituoso. O objetivo dessa aplicação é diminuir a margem de erro da produção e
estipular um plano para melhorá-la. Sobre as articulações da Estatística com a
Economia, afirmou que o Brasil tem muitas chances de melhorar e voltou ao tema
corrupção. Seria necessário usar a Estatística para alterar o cenário de
investimentos e melhor aplicar o dinheiro. Mencionou o cálculo do Produto Interno
Bruto (PIB), comentando que os gráficos divulgados mostram o quanto ele cresce e
a Estatística é muito importante para estudar o tema. Na época das primeiras
entrevistas, disse que seu conhecimento de Economia, disciplina cursada no
141
momento, era precário. Aplicou o teste da hipótese nula em Econometria e percebeu
elos entre a disciplina e a Estatística. Na terceira entrevista, comentou que em GQ
utilizou a tabela de frequência e os gráficos em geral, além dos conceitos de
mediana, variância e desvio padrão. Não lembrou de outros temas, alegando falta de
uso. Desde de o início do curso, a cada dia seu conhecimento aumenta e vê novos
significados quando as disciplinas técnicas aplicam os conceitos de Estatística.
Percebe grande articulação desta disciplina com as demais e ressaltou que ela é
necessária nos estudos de Logística. Se for necessário escrever uma comunicação
científica, ou mesmo ao trabalhar na linha de produção, considera que a Estatística
estará presente. Nos próprios artigos que escreveu, apresentou os dados por meio
dos gráficos, tanto para desenvolver o trabalho, quanto para explicar os
procedimentos usados.
Quando entrevistado pela primeira vez, o Aluno 5 lembrou que foi reprovado
em Estatística 1 e estudou somente os conceitos básicos. O que ficou da disciplina
relaciona-se a métodos para medir, obter conclusões e calcular aproximações.
Percebia a Matemática exata; a Estatística, nem tanto. O conhecimento estatístico
ajuda a desenvolver noções de como medir e calcular aproximações e clareia a
visão a respeito de determinada situação. Não pode pontuar questões da Estatística
II, pelo fato de não frequentar as aulas e estar desinformado sobre o assunto.
Porém, continuava com a ideia de que essencialmente a Estatística não é uma
Ciência exata como a Matemática, porque apenas fornece proximidades com grande
chance de ocorrer. Mesmo não voltando a cursar Estatística, o que ficou de mais
significativo na memória é que seus métodos e medições podem ser utilizados para
tirar conclusões e, dependendo da situação, estarão sempre atreladas a uma
medida. Considera mais simples os conceitos média, moda e mediana,
permanecendo a concepção de que Matemática é exata e, a Estatística, não. Disse
que se aprende a ter essa ideia, pois a Matemática sempre vai trabalhar com o todo
e a Estatística usa mais a margem de erro, o que não ocorre na outra Ciência. A
Estatística e seus processos estão sujeitos a oscilações, mas isso não significa que
os dados estejam errados e sempre há margem de erro.
142
4.9.1 Considerações e subcategorias
Considerando que na pergunta 6 a palavra significativo enquadre uma
categoria, temos o a repetição das subcategorias aplicabilidade, mensuração,
previsão e desenvolvimento de habilidades. Emergiram 4 novas subcategorias:
complexidade, modificação de comportamento, relatividade e relevância.
Começando pela subcategoria aplicabilidade, na pergunta 5 ela foi
caracterizada por diferentes concepções do termo. Primeiramente, ao entrar no
Ensino Superior o aluno deixa um ambiente em que é suficiente conhecer os
conceitos básicos e imediatamente aplicá-los, não percebendo aplicabilidades da
Estatística. Porém, conforme o andamento do curso, passa a notar que os conceitos
são muito mais aplicados e todos os conteúdos passam a ser considerados úteis
para a EP, incluindo as análises gráficas e as probabilidades. Com isso, o Cálculo
perde a imagem de instrumento fundamental da Engenharia, apesar de suas
aplicações aos objetos reais.
As aplicações da Estatística também podem ser vistas a partir de uma
hierarquia que o aluno elabora ao longo dos semestres letivos. Média, variância e
desvio padrão são considerados extremamente úteis, pois valores médios norteiam
a produção. A variância é instrumento para registrar e tentar modificar um
comportamento mal visto na produção: as variações do que é produzido, pois não é
viável a indústria trabalhar extremos. Análise de probabilidade, demanda, população
e ambientes passam a ter maior interesse pela utilidade, que é basicamente
controlar, planejar e melhorar a produção. O cálculo de probabilidades torna-se um
instrumento de prospecção de falhas.
Mensuração é uma subcategoria na qual encontramos percepções para a
Estatística como instrumento associado a aplicações e controle. Métodos foram
compreendidos como úteis para medir, tirar conclusões e encontrar aproximações e
a variância passa a objeto que qualifica o grau de uniformidade desejado. Ficou a
ideia da importância de aprender as análises amostral e populacional para mensurar
e obter dados para controlar situações.
Passando à subcategoria previsão, incluímos aí a percepção que o aluno
tem da Estatística e da Probabilidade como instrumentos de análise que lhes
143
assegurem a respeito do que está por ocorrer. É importante conhecer probabilidades
ou resultados possíveis para enxergar demandas e analisar mercados futuros.
Uma característica da subcategoria complexidade é a percepção da extrema
dificuldade de encontrar as situações simplificadas de aula em aplicações reais.
Estas têm caráter de análise global de contextos e não admitem soluções
fragmentadas. A ideia expressa por solidão das disciplinas é um indício de que o
indivíduo percebe a sua formação realizada com o estudo de diversas disciplinas
isoladas, mas que na realidade deveriam ser apresentadas articuladamente.
Na subcategoria desenvolvimento de habilidades agrupam-se a necessidade
da leitura para compreender contextos, desenvolver o pensamento estatístico e
melhor aplicar conceitos. Assim, a Estatística ajuda a desenvolver noções sobre a
importância das medidas e cálculos que permitem compreender diferentes
situações.
A partir do momento em que a Estatística passa a ser percebida de forma
diferente daquela do início do curso, temos a mudança de comportamento. Essa
subcategoria caracteriza-se pela compreensão de que a própria postura do aluno
modifica ao longo do tempo. Se no início ele via a Estatística como aleatória ou sem
representatividade, postura ligada ao Ensino Médio, a entrada em outro ambiente de
estudos de Estatística possibilita que ele perceba a necessidade de ir além de saber
conceitos básicos e manejar uma calculadora.
A relevância é a próxima subcategoria e trata da percepção que o aluno tem
da importância de diferentes tópicos da Estatística. Primeiramente ela pode ser
considerada mais concreta, porque trata de fatos que podem acontecer e sua
importância reside em ajudar concluir sobre demandas, por exemplo. A partir daí,
não basta saber calcular se as aplicações não resultarem em padrões considerados
verdadeiros. A média tem maior significado porque representa comportamentos
gerais, mais necessários à indústria. Nesse caso, a curva normal ganha relevância,
pois por seu intermédio pode-se verificar concentrações de resultados mais
prováveis e o comportamento central.
Relatividade é a subcategoria na qual foram classificadas as percepções
relacionadas
ao
alcance
do
conhecimento
estatístico.
Por
exemplo,
a
144
impossibilidade de afirmar se o que é obtido pela Estatística é verdade absoluta. O
conhecimento estatístico não é tratado como algo essencialmente exato, atribuindose à Matemática a segurança que a outra Ciência não traduz. Por outro lado, isso
pode aproximar a Estatística de um estudo da realidade, pois o mundo concreto não
é nem apresenta apenas resultados exatos.
4.10 Respostas à Pergunta 7
Você gostaria de acrescentar alguma coisa? Ou fazer comentários/considerações?
Na parte final da primeira entrevista, quando perguntado se gostaria de
acrescentar algum comentário ou considerações, o Aluno 1 disse que, ao entrar para
a graduação, questionou-se qual seria a utilidade da Estatística. Depois de estudar
Probabilidades, percebeu que determinar a região de probabilidade é importante
para delimitar esforços. Saber se algo é mais provável e útil para agir e delimitar
regiões de Probabilidade mostra a importância da Estatística na elaboração de
planos de ação. Na segunda entrevista disse que sua percepção sobre o
conhecimento estatístico modificou ao cursar Estatística 1. Isso foi consolidado em
Estatística II, quando estudou Probabilidade e Curva Normal. Se antes não percebia
utilidade para a Estatística, agora considera importante aumentar a carga horária da
disciplina, porque ela é mais real que o Cálculo. Também considerou que, pela
pequena carga horária, principalmente em Estatística II, foi necessário passar
superficialmente pelos tópicos e sem aproveitar plenamente o que a disciplina pode
fornecer. Na terceira entrevista, tocou na necessidade das disciplinas serem úteis
para o engenheiro, pois ao cursar disciplinas da área técnica verificou a importância
da Estatística. Teorias relacionadas ao planejamento e ao controle de qualidade
baseiam-se em algumas ferramentas estatísticas. Sobre as aplicações da
Matemática, relatou que há disciplinas humanísticas teóricas, relacionadas à leitura
de textos mais específicos, que podem ser ensinadas por si só. Lembrando de
diversos temas aplicados, voltou à curva normal. Também citou a Análise de Pareto,
que usa um gráfico de barras que representa os problemas significativos da linha de
produção. Todas as ferramentas da Estatística auxiliam e são fundamentais. Sem
elas, por exemplo, a GQ não seria o que é hoje. Também voltou ao Cálculo
Numérico, cujas relações com a EP foi perceber depois de cursar outra disciplina. Ao
145
fim da terceira entrevista voltou a afirmar que, para o seu curso, a Estatística é mais
importante que o Cálculo.
Nas primeiras entrevistas, o Aluno 2 disse que não enxergava muitas aplicações da
Estatística, apesar de considerar toda informação válida. Faltava entender mais a
utilidade daquilo que aprendia. Depois de pesquisar a respeito, percebeu mais usos
da Estatística do que inicialmente imaginou. A mudança de ponto de vista sobre a
Estatística ocorreu com o andamento das disciplinas. Entre as Estatísticas 1 e 2
conheceu mais aplicações e exemplos de como mensurar dados quantitativos. No
decorrer do curso eles serviram para identificar a utilidade do conhecimento
estatístico. Passou a ver contribuições e a presença da Estatística em todos os
pontos que estuda, entende que agora é necessário ter dados para tudo e tudo tem
que ser analisado. Afirmou que ter informações também serve para direcionar a
parte humanística. Apresentou o exemplo de uma fábrica: analisar o produto final, se
está de acordo com os padrões e qual a margem de erro. Nos ambientes em que se
deve desenvolver análises, é possível obter informações numéricas e dados que
serão tratados estatisticamente. Não necessariamente tudo tem dados, mas deve-se
tentar obtê-los na maior quantidade possível. Na segunda entrevista retornou à sua
explicação sobre a parte humanística e disse que se expressou de maneira errada
no primeiro encontro. A relação ocorre da seguinte forma: verificar como um produto
é aceito no mercado e qual o reflexo da sua presença. A veracidade de uma
pesquisa depende do tamanho da amostra em relação ao ambiente. Quanto maior,
mais veracidade. Não se pode analisar um ambiente muito grande a partir de uma
amostra insignificante, devendo existir uma proporção significativa. Na terceira
entrevista, disse que a Estatística faz mais sentido agora. No início o conteúdo era
simples e não foi aplicado de maneira que o aluno considerou efetiva.
Fazendo mais estudos práticos é possível encontrar mais utilidade e as
informações fazem sentido para quem as utiliza. Hoje sabe mais porque aplica o que
aprendeu em Estatística. No início, deveria ser mais informado como as disciplinas
são articuladas. Pensa que a turma aprendeu Estatística e viu exemplos teóricos,
mas não as aplicações práticas que realmente a relacionasse com outras disciplinas.
O Aluno 3 não acrescentou qualquer coisa além do que foi perguntado nas
duas primeiras entrevistas, mas comentou sobre aplicações de instrumentos
146
eletrônicos na terceira. Disse que seria bom incluir o uso de softwares no ensino de
Estatística. Admitiu que não os conhece, mas crê que eles existam, pois hoje em dia
as rotinas empregam muitas tecnologias e, dessa forma, é necessário aprender a
lidar com instrumentos que facilitarão o trabalho. Pensa que dificilmente depois de
formado alguém fará cálculos manualmente. Citou o Microsoft Excel que é
conhecido e que ajuda executar tarefas de Estatística. Acha também que se existem
ferramentas facilitadoras é importante aprender a usar, principalmente nos cálculos e
na análise dos dados. Na coleta deles, não soube dizer se há utilidade. Acha que
com uma planilha é possível manipular os dados com maior facilidade e eles estão
disponíveis, o procedimento é diferente de usar uma calculadora. Pensa que essas
aplicações podem facilitar a pesquisa para saber se o tamanho de amostra é
suficiente ou não. Porém, nada disso é utilizado na graduação. Existem softwares
que o aluno desconhece, apesar de saber que eles são mais potentes que o MS
Excel. Acha que tudo poderia ser usado, inclusive, para facilitar a ação da
professora, pois gráficos desenhados manualmente não ficam exatamente como
deveriam ser. Lembrou de um professor de Cálculo, que usava um programa para
plotar gráficos e mostrar como eles poderiam ser. Sua percepção da Estatística
continua a mesma desde que começou a estudá-la.
O Aluno 4 acrescentou ao fim da primeira entrevista que está feliz com sua
situação estudantil. Disse que certamente necessitará da Estatística no futuro, tanto
ao elaborar o trabalho de conclusão de curso quanto na atuação profissional.
Reafirmou que sem a Estatística é difícil resolver situações das Engenharias. Se for
trabalhar na área conhecida como o chão de fábrica, (diretamente ligada à
produção), é necessário conhecer Estatística para identificar desperdícios e coletar
dados com objetivo de organizar a produção. Na segunda entrevista lembrou que,
da Estatística, usava média, somatório, tabela e aplicava esses dados no cálculo do
erro na produção. Desde a primeira entrevista, disse que aprendeu mais tópicos de
Estatística, como no caso do teste de hipótese, aplicado em um trabalho de
Economia. Constatou ainda que não sabia com profundidade para que serve, mas
conseguiu explicar razoavelmente o contexto dos cálculos. Agora adquiriu mais
firmeza para tratar do tema e, desde aquela época até agora, aprendeu mais
conteúdos aplicados às Engenharias. Na terceira entrevista, disse que não saberia
lidar com as disciplinas que aprende agora, nem escrever um artigo, sem utilizar
147
Estatística. Sem ela, não se chega ao fim do ciclo PDCA19, nem se encontra as
causas de um problema. Também não teria como explicar detalhes de seu trabalho
em uma reunião sem usar a Estatística e teria muita dificuldade de expressar as
análises. No começo do curso, pensou que iria aplicar o conhecimento estatístico
apenas para escrever artigos, pois não tinha ideia de como utilizaria depois. Não
tinha ideia do seu alcance e considerava a Estatística apenas uma disciplina da
grade. No início da graduação, percebia o conhecimento estatístico como algo
menor, que usaria na produção ou em situações como na análise de uma a linha de
montagem (ou na fábrica de parafusos). Agora as aplicações são mais amplas e,
naquela época, não tinha ideia de como poderia associar Estatística a outros
estudos.
Nas primeiras entrevistas, o Aluno 5 comentou que a Estatística é muito
importante não apenas para as engenharias, mas para a formação geral. Ela amplia
o conhecimento e facilita a tomada de decisões. Reforçou o que disse sobre a ideia
de que, quando se tem conhecimento, a quantidade de oportunidades aumenta na
vida. Nas Engenharias o que se estuda de Estatística não é o suficiente para formar
um estatístico profissional, mas é muito importante (da mesma forma que é no curso
de Administração). Considera a habilidade de tomar decisões essencial ao
engenheiro contemporâneo. Se ele não souber analisar dados, a decisão tomada
pode não ser a mais correta e a Estatística facilita essa escolha porque, dispondo de
informações, o detentor de conhecimento poderá decidir com mais tranquilidade.
Acha que a diferença de capacidade de decisão aparece quando é possível pontuar
e saber exatamente o que se tem, em que quantidade, o quanto se pode perder ou
está sendo perdido, facilitando a tomada de decisão. Acrescentou considerações na
terceira entrevista, confirmando sua percepção de que o conhecimento estatístico,
por mais simples que seja, ajuda a interpretar melhor os dados e as informações
recebidas. Lembrou os dados por meio dos quais soube que a população tende a
chegar a um patamar de igualdade econômica. Surgiu a dúvida: a desigualdade
19
Em Inglês, Plan, Do, Check, Act. O Ciclo PDCA é considerado uma ferramenta de controle de
qualidade que facilita a tomada de decisões com objetivo de garantir o alcance das metas
necessárias à sobrevivência do estabelecimento. É uma elaboração simples e sem limites para a
concepção de um planejamento eficaz. A sigla é formada pelas iniciais P (de Plan, Planejar estabelecer objetivos e processos necessários para obter os resultados de acordo com os requisitos e
políticas pré-determinados), D (de Do, Fazer - implementar ações necessárias, C (de Check, Checar monitorar e medir os processos e produtos frente a políticas, objetivos e requisitos estabelecidos e
relatar os resultados) e A (de Act, Agir - executar ações para promover a continuamente a melhoria
dos processos produtivos).
148
diminuiu pelos pobres ficarem mais ricos ou por causa dos ricos ficarem mais
pobres? Tendo as ferramentas e o conhecimento da Estatística, consegue avaliar
melhor os dados que possui, verificar a melhor forma de medir e tirar conclusões.
4.10.1 Considerações e subcategorias
Considerando que na pergunta 7 a palavra conclusão enquadre uma
categoria, temos o a repetição das subcategorias aplicabilidade, controle
mensuração, previsão, relevância e modificação de comportamento.
Na conclusão, a subcategoria aplicabilidade foi caracterizada por três
capacidades associadas: direcionar, verificar e analisar. O direcionamento consiste
em analisar para direcionar a atuação em um ambiente, organizar a produção e
informar como algo deve ser desenvolvido. Outra inter-relação ocorre ao verificar a
aceitação de um produto ou identificar desperdícios. A análise serve para obter
informações numéricas.
A subcategoria controle corresponde a margem de erro, controle do
conhecimento para decidir e verificar tanto a aceitação quanto o retorno financeiro
de um produto.
Os termos incluídos na subcategoria mensuração referem-se à percepção
da necessidade de entender tudo, como no caso do entorno de uma indústria, ter
informações sobre um ambiente e determinar quantidades de perdas.
Na subcategoria previsão confirma-se a necessidade de informação para
determinar como uma tarefa será cumprida.
A modificação de comportamento é uma subcategoria que corresponde às
percepções de que a Estatística influenciou algum ponto de vista. O fato de passar a
compreender que a disciplina tem aplicações e não é mais considerada superficial é
uma delas. Sentir-se mais seguro e ter mais firmeza para tratar um tema é outra. A
percepção do período da mudança é mais um indicativo de mudança.
A
relevância,
última
subcategoria
relacionada,
reúne
percepções
relacionadas às ideias de validação, necessidade, ampliação, formação e
149
importância. A primeira é identificada quando o aluno considera que toda informação
é válida ou verifica que se pode realizar diferentes tarefas na presença da
Estatística. A necessidade é identificada ao verificar que: a Engenharia necessita de
dados; dados identificam a utilidade do conhecimento estatístico; necessitará da
Estatística no futuro; sem o conhecimento estatístico é difícil resolver situações das
engenharias; A falta de análise de dados leva à tomada de decisões incorretas. A
ampliação corresponde a mais conhecimento e ao aumento de oportunidades de
trabalho. A Estatística é importante não apenas para a Engenharia, mas para a
formação geral e sua importância também está presente ao delimitar regiões de
Probabilidade de ação; viabilizar planejamentos; considerar mais importante
aumentar a carga horária de Estatística do que a de Cálculo.
4.11 Considerações sobre o capítulo
Este capítulo apresentou resultados da coleta e categorização dos dados, a
partir dos quais buscamos contribuições da disciplina de Estatística para a formação
do Engenheiro de Produção.
A aplicação do questionário de levantamento do perfil da turma permitiu
verificar alguns pontos de vista sobre as concepções iniciais dos alunos a respeito
da Estatística. Seus dados apresentam uma turma com diferentes concepções em
relação à Estatística, caracterizada como disciplina curricular, disciplina de caráter
matemático, conhecimento aplicável ou como instrumento para tratamento de dados
e informações. O grupo inicialmente também apresentava dificuldades para
reconhecer diferentes tipos de variáveis e suas respectivas representações gráficas.
A entrevista permitiu aprofundar o conhecimento sobre percepções e
concepções dos alunos em relação à Estatística. As respostas às perguntas da
entrevista apresentaram diversas subcategorias, sendo várias delas repetidas. Uma
delas é a aplicabilidade, também presente nas respostas do questionário. Elas serão
confrontadas com as que emergiram da entrevista da professora e discutidas diante
do quadro teórico no próximo capítulo.
151
CAPÍTULO 5 - A ANÁLISE DOS DADOS
O provável, senhores, é que, na realidade,
o sábio seja o deus e que queira dizer,
no seu oráculo, que pouco ou nenhum valor
tem a sabedoria humana
(Platão).
5.1 Introdução
Neste capítulo analisaremos os dados provenientes das subcategorias
obtidas durante a construção dos dados. Trataremos as ideias, concepções e
percepções dos alunos e da professora. Confrontaremos as concepções da
professora e dos alunos com aquelas contidas nos documentos oficiais: a proposta
da ABEPRO (2001), as diretrizes curriculares nacionais para os cursos de
Engenharia (CNE/CES, 2002), os planos de ensino de Estatística, as listas de
exercícios e as provas aplicadas pela professora.
5.2 Os documentos oficiais
A proposta da ABEPRO (2001) apresenta um conjunto de competências
necessárias ao desempenho da profissão de Engenheiro de Produção. Nesta
análise, destacaremos os usos sugeridos para o conhecimento estatístico.
Primeiramente, a Matemática e a Estatística são citadas em suas capacidades de
modelar sistemas de produção e orientar tomadas de decisão. Outra habilidade
destacada traz a Matemática de maneira implícita: diz respeito ao acompanhamento
dos avanços tecnológicos, que devem ser colocados a serviço de demandas da
empresa e da sociedade. Mesmo não aplicada explicitamente, ela é utilizada para
desenvolver tecnologias que podem, inclusive, otimizar o emprego da Estatística,
como é o caso dos computadores.
O Engenheiro de Produção também deve ser capaz de utilizar indicadores
de desempenho e custeio e também avaliar a viabilidade econômica e financeira de
projetos. A citação no documento atribui ao conhecimento científico função de
instrumento de previsão e de controle.
152
A proposta também apresenta o Engenheiro de Produção como alguém
capaz de relacionar os sistemas produtivos com o meio ambiente, atentando para o
uso de recursos escassos, destinação de resíduos e rejeitos. Essa é uma exigência
contemporânea, associada ao conceito de sustentabilidade. Neste caso, o
profissional deve utilizar dados para elaboração de projetos com caráter preventivo
em relação às possibilidades de impactos ambientais.
A ABEPRO (2001) também apresenta uma lista de habilidades relacionadas
a diferentes aspectos da vida do profissional de EP, que podem ser associadas à
aprendizagem de Estatística. Entre elas, destacam-se duas: a necessidade de bom
desempenho na comunicação oral e escrita; a desenvoltura na leitura, interpretação
e expressão por meios gráficos. Outras habilidades tais como a capacidade de
trabalhar em equipes multidisciplinares, a capacidade de identificar, compreender,
modelar e resolver problemas (administrativos, sócio econômicos e do meio
ambiente) também podem ser associadas à formação estatística do Engenheiro.
As competências e habilidades constantes nas diretrizes curriculares do
CNE/CES (2002) para os cursos de Engenharias têm basicamente o mesmo teor da
proposta da ABEPRO (2001). O acréscimo que as diretrizes trazem é que o
Engenheiro deve ser capaz de avaliar impactos causados pelas atividades da
engenharia sobre os contextos social e ambiental. Tais avaliações necessitam de
análises quantitativas e qualitativas que podem ser desenvolvidas em articulação
com a aprendizagem de Estatística. Percebe-se então que tanto a proposta da
entidade de classe quanto a resolução ministerial impõem grande responsabilidade
sobre a formação estatística dos Engenheiros.
Os planos de ensino das disciplinas de Estatística (I e II) são documentos
que descrevem a ementa, os objetivos (gerais e específicos), a metodologia e
recursos (de ensino, avaliação e recuperação), os conteúdos programáticos e
referências bibliográficas (básica e complementar). Em Estatística I, os objetivos
gerais são compreender as informações e as projeções que uma análise de dados
estatísticos transmite por meio de cálculos matemáticos e de probabilidade. O
conteúdo dessa parte aborda a organização e a apresentação de dados estatísticos,
medidas (posição, dispersão ou variabilidade), correlação e regressão. Em
Estatística II, os objetivos gerais são apresentar conceitos fundamentais de
153
Probabilidade, Estatística e aplicações na Engenharia. O conteúdo da segunda parte
consta de
variáveis aleatórias,
distribuição de probabilidade,
técnicas de
amostragem e testes (de hipótese e significância). Nas referências bibliográficas
constam autores nacionais e estrangeiros, com obras editadas em língua
portuguesa, abrangendo o período de 1977 a 2006. Um fato importante deve ser
considerado: a professora não participou da criação do curso, nem estava presente
quando os livros das bibliografias básica e complementar foram escolhidos.
Pessoalmente, na qualidade de especialista na disciplina, não recomendaria as
obras adotadas.
Sobre a metodologia de ensino das duas partes dedicadas à Estatística,
resumidamente pode-se dizer que constam de aulas expositivas interativas (em
laboratório com uso de softwares), aplicação de listas de exercícios e atendimento
individualizado. Os recursos metodológicos de ensino são traduzidos por apostilas,
livros, anotações em sala de aula, quadro branco e marcadores, computador,
projetor de multimídia, dvd e softwares.
A princípio, as listas de exercícios apresentam situações de possível
ocorrência no cotidiano dos engenheiros, tal como exercícios nos quais avalia-se a
probabilidade de encontrar peças defeituosas em uma linha de produção.
Entretanto, as questões apresentam contextos seguidos de perguntas que
direcionam o aluno para a aplicação dos métodos de cálculo e não suscitam a
discussão dos significados das informações obtidas. Dessa forma, não há discussão
do que os números representam frente ao contexto de cada questão.
Na primeira lista, elaborada com objetivo de orientar o estudo para primeira
prova, não há proposição de construção ou análise de gráficos. Nas entrevistas com
os alunos e a professora não foram registradas a utilização de meios eletrônicos
(computador, projetor de multimídia, dvd e softwares) nas aulas e avaliações.
Apenas a calculadora científica era utilizada. As provas e o trabalho em dupla para
avaliação da aprendizagem de correlação seguiram o mesmo padrão das listas.
154
5.3 Análise das respostas do questionário
Uma primeira análise das respostas sugere que alguns alunos percebiam na
Estatística uma ciência a serviço da análise de dados, com aplicações diversificadas.
Mas houve quem a considerasse apenas outra disciplina em sua formação
profissional ou ainda apenas uma disciplina de caráter matemático.
A submissão do aluno a rotinas de aplicação de exercícios é uma possível
origem para a percepção de parte do grupo. O documento da ABEPRO (2001)
destaca a importância da Estatística para a atuação profissional na EP, mas o
conhecimento estatístico não será instrumento para compreender problemas
socioeconômicos, políticos e ambientais se as suas aplicações forem limitadas ao
estudo de situações que reportem exclusivamente às rotinas de fábrica. A melhor
forma de desenvolver o senso estatístico é inserir o aluno nas diferentes fases do
processo estatístico por meio de investigações que contextualizem aplicações da
disciplina, conforme sugestão de AlrØ e Skovsmose (2010). Outra explicação para a
percepção da Estatística como aplicação da Matemática pode estar no desequilíbrio
entre as visões de aleatório e o determinístico.
Podemos refletir a respeito desse quadro a partir também da proposta de
Gal e Garfield (1997) sobre a possibilidade da Estatística contribuir com que o aluno
tome parte na produção, interpretação e comunicação de dados relativos aos
problemas que resolverá ao longo de sua vida profissional. É necessário superar a
visão fragmentada do conhecimento estatístico como elaboração essencialmente
técnica, centrada no uso de fórmulas e algoritmos. A continuidade dessa visão
fragmentada pode levar o estudante a tratar a Estatística como um ramo da
Matemática, o que prejudica perceber o potencial que o conhecimento estatístico
tem para esclarecer contextos em diferentes áreas.
Quando se pediu que o aluno fizesse considerações sobre a possibilidade
de usar a Estatística para tentar exercer influências sobre o comportamento de
setores da sociedade, as referências focalizaram fatos da rotina industrial. Além
disso, não houve citação de aspectos políticos da futura profissão. Essas respostas
representam um desafio para o ensino de Estatística, pois os currículos das áreas
técnicas são voltados predominantemente ao desenvolvimento de habilidades e
155
procedimentos rotineiros (SKOVSMOSE, 2007), não explicitando preocupações com
as consequências sociais dos usos do conhecimento.
Alro e Skovsmose (2010) postulam, por exemplo, que o entendimento de
problemas socioeconômicos, políticos e ambientais de uma sociedade não são
viabilizados apenas a partir do estudo de aspectos internos de uma disciplina.
Conteúdos
específicos
de
uma
disciplina
por
si
só
não
colaboram
no
desenvolvimento de atitudes de crítica e reflexão sobre a realidade que cerca o
estudante. Voltando a Gal e Garfield (1997), percebe-se a necessidade de ensinar o
aluno a distinguir e refletir sobre a realidade a partir dos conceitos mobilizados.
Existe a necessidade de colocar o aluno diante de diferentes contextos, com o
objetivo dele aprender a avaliar cada situação apresentada, aprendendo a lidar com
situações abertas cujos padrões de resolução ainda foram estabelecidos.
Variáveis são características do objeto de estudo observadas ao aplicar o
conhecimento estatístico na resolução de um problema. A professora considera
variável um conceito simples, mas percebe que os alunos apresentam dificuldades
de compreensão. Alguns não souberam conceituar o tipo de variável (qualitativa ou
quantitativa, discreta ou contínua) nem indicar a melhor representação. As respostas
evidenciaram problemas de compreensão do conceito e um desafio inicial para a
professora, que não sabe o motivo da dificuldade e também desconhece alguma
sistematização para proceder com a conceituação.
Além do problema em relação à classificação e representação de variáveis,
a professora considera que os alunos apresentam um tipo de analfabetismo, pois
parte deles chega à graduação não conseguindo ler qualquer modelo de gráfico (o
que se repete em relação à tabela de frequências). A suspeita da docente recaiu
sobre a falta de abordagem dos temas, em algum momento anterior à graduação. Ao
mesmo tempo, considera que os gráficos constituem uma simbologia mais concisa
do que outras formas de comunicação e que proporcionam uma forma diferente de
raciocinar. Para ela, o gráfico é uma forma do leigo entender a mensagem que os
dados podem passar e o Engenheiro deve aprender a extrair informações desse tipo
de representação.
156
As deficiências no estabelecimento de significações necessárias à análise e
compreensão de dados por meio de gráficos remetem ao trabalho de Curcio, Friel e
Bright (2001), referências importantes por explicarem que existem fatores críticos
que influenciam a compreensão dos gráficos. Os problemas de compreensão podem
estar relacionados à decodificação visual, ao tipo de dado, variação, tamanho do
conjunto de dados ou às formas utilizadas para representá-los. Os autores também
consideram que a capacidade de atribuir sentido é desenvolvida gradualmente e
requer, de início, a análise de gráficos prontos, associados a diferentes problemas e
contextos.
É importante lembrar que essa dificuldade realmente pode estar associada à
compreensão equivocada de conceitos que o aluno já traz da sua escolaridade
anterior à graduação. Também pode-se debitar o fato à ausência, pouco (ou
nenhum) contato com a análise de dados e construção de gráficos. Uma
possibilidade para resolver a situação pode estar na utilização de TICs para
dinamizar a análise e a exploração dos gráficos, além de permitir experimentos com
diferentes representações de dados. Trocas de experiências de interpretações entre
os alunos podem ajudar a compreender conceitos e partilhá-los dentro de novas
redes, o que traz de volta a ideia de Lévy (2006) sobre o conhecimento elaborado
em grupos sociais mediante utilização de diferentes tecnologias.
5.3.1 Considerações
Em cada fase da vida escolar não basta cumprir apenas o papel de dotar o
indivíduo de conhecimentos e habilidades para manipular conceitos, mas é preciso
associar os conteúdos técnicos à realidade do estudante. Para tanto, as aulas
dedicadas ao conceito de variável e representações gráficas não devem se limitar
apenas à utilização de situações padronizadas, usualmente apresentadas em listas
de exercícios para aplicação mecânica de algoritmos, onde os números
apresentados são desprovidos de contextos. Outro recurso, que é o uso de
semirrealidades também não deve limitar-se a apresentar um contexto só com
objetivo de orientar os passos para o cálculo estatístico.
A Estatística certamente pode ser um instrumento para o aluno tornar-se um
profissional amplamente competente, capaz de lidar com situações indeterminadas e
157
adequar seu raciocínio a diferentes contextos. A simples manipulação de conceitos
abstratos e fórmulas não permite desenvolver a percepção diante de situações
complexas.
5.4 Análise das repostas das entrevistas
Após realizar as entrevistas com cada os alunos e a professora, as
subcategorias identificadas nas respostas foram reagrupadas para análise. Agora
trataremos de forma análoga ao questionário as subcategorias que emergiram dos
depoimentos nas entrevistas.
5.4.1 Aplicabilidade
A subcategoria que emergiu já havia surgido na categorização das respostas
do questionário. Nenhuma subcategoria abordada nesta análise emerge dos planos
de curso das disciplinas de Estatística I e II.
A professora considera que vivemos uma era em que tudo é medido e os
dados são usados para gerar informações sobre comportamentos, doenças,
educação ou qualquer fato que se queira conhecer. A tendência atual é medir para
tirar conclusões. Sua declaração coincide com o exposto em Lopes (2013) sobre a
importância do conhecimento estatístico no século XXI, o que faz da análise de
dados um componente essencial do currículo em diferentes níveis.
De acordo com a professora, para desenvolver a capacidade de identificar,
modelar e resolver problemas deve-se conhecer exatamente o que acontece em
determinada situação. Retificou que saber exatamente é, na verdade, uma
expressão, pois existe uma margem de erro e incerteza, que pode ser calculada
estatisticamente de acordo com a segurança desejada. O Engenheiro de Produção
deve saber claramente onde utilizar a Estatística para mensurar e analisar dados.
Como exemplo, citou o caso de uma indústria que emite poluente atmosférico. De
posse de dados e conhecimento de Estatística, o Engenheiro pode analisar se o
estabelecimento atende aos parâmetros legais ou se necessita de algum
equipamento.
158
Sobre a ação política, a professora percebe possibilidades de articulações,
mas não vê os alunos enxergarem dessa forma. Existe entre os alunos uma
percepção vaga para aplicação da Estatística na análise da evolução do meio
político. Um dos motivos poderia ser o tempo destinado à disciplina de Estatística
durante o curso, considerado exíguo pelos entrevistados. Para a professora, com um
conhecimento maior dessa disciplina, não apenas o Engenheiro poderia usar o que
conhece para pensar nas questões políticas e entender melhor como a sociedade
funciona, quais são as suas demandas ou necessidades.
Realmente, não apenas o Engenheiro tem a possibilidade de utilizar o
conhecimento estatístico para pensar em questões políticas. A capacidade de
aproximar elementos sociais, dos personagens que tomam decisões importantes
para a sociedade é um aspecto tecnológico da Estatística, conforme Camargo
(2009). O trabalho desenvolvido com base nessa Ciência fornece elementos para
tomadas de decisões políticas práticas, como, por exemplo, prioridades de
investimentos em infraestrutura. Isso se constitui-se em uma tecnologia de governo
na ação à distância. Os alunos não percebem esse viés do conhecimento estatístico
utilizado com fins políticos.
Durante as entrevistas com os alunos, outra percepção que emergiu foi a de
Estatística como instrumento de melhoria contínua. Ela pode ser utilizada para
descrever influências dos sistemas produtivos sobre o ambiente. Isso é previsto no
documento da ABEPRO (2001). Um entrevistado foi bem claro ao explicar a ideia de
que a Estatística pode descrever o perfil de pessoas e características dos grupos em
diferentes setores de uma empresa. Em relação a isso, a professora exemplificou,
citando o questionário de percepção do ambiente da empresa. Ele serve para colher
dados remetidos ao setor de Recursos Humanos (RH), com o objetivo de conhecer e
solucionar problemas do ambiente de trabalho.
Voltando a Camargo (2009), é importante recordar que a Estatística pode
servir à moldagem de visões de mundo ou da imagem que cada um tem de seu
semelhante. Neste caso, os dados estatísticos servem para criar a visão em relação
ao pessoal de cada setor da empresa, na qual temos um grupo social formado pelos
que frequentam o mesmo espaço. Porém, a noção de ambiente entre os alunos não
159
é associada imediatamente a questões ecológicas, assunto contemplado pela
ABEPRO (2001) e a resolução do CNE/CES (2002).
Os alunos também atribuíram muita importância ao papel da Estatística
como instrumento de aferição da qualidade da produção e do desempenho
industrial. Neste caso, é importante comentar a preocupação de Skovsmose (2007)
em relação às reconfigurações ocorridas com a Matemática na graduação superior.
Tal preocupação pode ser estendida ao ensino de Estatística e também às
reconfigurações que ocorrem com o saber e formulação de novos conhecimentos.
Nos estudos ambientais, o conhecimento estatístico é reconhecido como
instrumento capaz de orientar decisões, o que acentua tanto a responsabilidade dos
professores quanto a dos futuros profissionais de EP. Entre os entrevistados, foi
percebida a utilidade do conhecimento estatístico para identificar e compreender
elementos causadores de impactos ambientais devido à presença de uma fábrica.
Porém, a articulação entre a Estatística e a Ecologia não está clara, pois houve
quem pensasse que o conhecimento aplicado aos processos industriais poderia ser
transferido imediatamente para o estudo de questões ecológicas.
Outra aplicação encontrada para a Estatística foi identificada na entrevista
de um dos alunos: a mensuração associada à exatidão e resultados precisos, que
capacitam o indivíduo a determinar locais exatos para o destino de resíduos. Esse é
um problema ecológico grave, pois determinados resíduos (químicos e radioativos)
são altamente perigosos e o contato com eles pode levar a óbito. Uma pista para a
elaboração dessa ideia pode estar no desequilíbrio entre as visões de aleatório e o
determinístico, observada na discussão das respostas do questionário. Existe a
presença muito forte entre os entrevistados de que os resultados de diferentes
cálculos apresentam uma resposta correta. Além disso, a própria Educação em sua
forma tradicional tende a ser fragmentadora (FEYERABEND, 2007), moldando o
pensamento para buscar padrões, o que também pode gerar esse desequilíbrio. É
necessário que a Estatística além de preparar o profissional de EP para a ação
dentro do ambiente da fábrica também o prepare para assumir responsabilidades
diante da sociedade (SKOVSMOSE, 2007).
Uma percepção da Estatística que pode ser discutida a partir das ideias dos
teóricos presentes no parágrafo anterior diz respeito à análise das demandas
160
populacional e do ambiente. Elas foram observadas sob o ponto de vista do
planejamento e previsão de melhorias da produção. Porém, no estudo de situações
ligadas às rotinas de fábrica, o cálculo de probabilidades torna-se instrumento de
prospecção de falhas e das variações que inviabilizam alcançar maiores níveis de
produção. Essa atitude reflete uma situação na qual a linguagem de uma Ciência é
utilizada de forma restrita. A presença da incerteza e da aleatoriedade é um fato
indesejado quando se trata da produção industrial. Um problema nesse caso é o
aluno fixar a ideia de que o objetivo das análises amostral e populacional é apenas
obter dados para controlar diferentes situações.
A mensuração também foi percebida como aplicável à análise de
populações, em estudos do meio, à gerência de uma fábrica e à previsão de impacto
ambiental gerado por uma empresa. Entretanto, aplicações da Estatística em
estudos da sociedade foram associadas com a indústria e a necessidade de
previsão. Essa restrição de raciocínio aponta outra necessidade. Durante a formação
especializada, os estudantes devem ser convidados a refletir sobre significados e
consequências de suas atividades profissionais.
A Estatística, da mesma forma que a Matemática, pode desenvolver
raciocínios hipotéticos e criar alternativas para elaborar novas tecnologias. O
estímulo da imaginação tecnológica (SKOVSMOSE, 2007) abre espaços para a
Estatística identificar tecnologias aplicáveis à prevenção de impactos ambientais e
não apenas à sua quantificação com objetivo de conter um problema que poderia
ser evitado. A ideia de articular o conhecimento estatístico à necessidade de
entender tudo do entorno e do interior de uma indústria pode ser ampliada e não
deve atrelar-se apenas à elaboração de informações sobre um ambiente fabril
restrito, no qual se busca determinar quantidades de perdas. Embora isso seja
necessário ao empreendimento industrial, não contribui para compreender questões
ambientais de maior alcance, preocupação expressa pela ABEPRO (2001).
5.4.2 Repasse e comunicação de dados e informações
A professora conceituou o conhecimento como uma informação que é
transformada segundo uma hierarquia. Primeiro define-se a variável, que depois é
medida, ao longo de um tempo (ou em locais específicos). A partir dessa sequência,
161
os dados podem ser tratados estatisticamente para gerar informação. De posse
desta informação, tem-se as conclusões que o ferramental estatístico permitiu obter.
Porém, isso necessariamente não é conhecimento, porque ele é determinado
quando as informações geram mudança de uma realidade (ou um contexto). Esta é
apenas uma forma de utilizar a Estatística para repassar informações e dados. A
subcategoria
repasse
e
comunicação
de
dados
e
informações apareceu
primeiramente nas respostas do questionário, sob a forma de expressões como
“método para análise mais eficiente dos dados” e “coleta e análise de dados para
obter informações”, todas elas associadas à coleta e análise de dados, com o
objetivo de gerar informações.
Essa
utilização
também
foi
caracterizada
simultaneamente
como
instrumento para direcionar, verificar e analisar. Direcionar seria usar a Estatística
em análises que dirijam a atuação do Engenheiro em um ambiente para que ele
organize a produção e informe o modo como algo deve ser desenvolvido. Dessa
forma, temos outra utilidade para um modelo, que é justificar uma decisão
previamente tomada. Nesse caso, o conhecimento serve à legitimação de um
discurso, mesmo que as soluções sejam excessivamente restritas, favorecendo a
imposição de apenas uma alternativa (SKOVSMOSE, 2007).
Ao longo das entrevistas, a associação da Estatística ao repasse e
comunicação de dados e informações incluiu percepções relacionadas à linguagem
gráfica, com a citação das tabelas e diagramas como representação adequada e
melhor forma de compreender as informações. Em sociedades com forte presença
do uso de TICs, as análises quantitativas divulgadas por diferentes meios têm
ocorrido cada vez mais por intermédio de representações gráficas. Para o domínio
da comunicação gráfica, a habilidade da leitura e interpretação de gráficos está
ligada ao desenvolvimento da literacia estatística, pois associa a capacidade de
compreender as ideias fundamentais da Estatística e uma forma de linguagem
utilizada em sua comunicação.
Entre os depoentes existe a ideia generalizada de que os resultados
expressos na forma gráfica facilitam o entendimento quando comparada com a
apresentação dos mesmos dados em relatórios escritos. Esse ponto de vista
necessita de algumas considerações, pois atualmente considera-se a capacidade de
162
ler e compreender dados expressos por meio de gráficos necessária à alfabetização.
O desenvolvimento da habilidade para a leitura de gráficos requer do indivíduo a
capacidade de localizar, integrar elementos e gerar informações, ou seja,
compreender as informações e inferir com base no que o gráfico contém (CURCIO;
FRIEL; BRIGHT, 2001). Porém, dominar a decodificação visual do conteúdo de um
gráfico não é suficiente, tendo em vista que a Estatística pode se articular a outras
disciplinas que utilizam seus conceitos e ferramentas. A compreensão de gráficos
dependerá então da capacidade de adaptar o pensamento à interpretação de
situações que não são, na maioria das vezes, internas à própria Ciência Estatística.
Entre os entrevistados também foi percebida a necessidade de buscar
incessantemente a aferição a partir de levantamentos de dados voltada para a
melhoria de desempenho. Outra a concepção encontrada foi que a linguagem
gráfica é importante instrumento utilizado após a coleta e análise dos dados para
que as informações geradas tenham sua compreensão facilitada e sirvam à análise
de diferentes aspectos. Devemos observar com mais cuidado a linguagem gráfica,
importante na comunicação, conforme recomendam Curcio, Friel e Bright (2001).
Eles identificaram fatores críticos, de influência crucial sobre a compreensão de
gráficos. A compreensão de uma representação gráfica necessita de reorganizações
e classificações, que ocorrem de acordo com hierarquias. Uma interpretação não
ocorre apenas ao observar a imagem representada, mas necessita de extrapolações
e interpolações para identificar as consequências dos dados expostos. A
compreensão de um gráfico, assim como ocorre com uma mensagem escrita,
necessita de níveis diferentes de interpretação.
Embora
os entrevistados apresentem
ideias
de
como
associar a
comunicação Estatística com a linguagem gráfica, não se pode esquecer que essa
forma de representação de dados resulta de um desenvolvimento coletivo. Para
serem compreendidos, os dados necessitam passar por trocas de significados
dentro de um grupo e, portanto, é importante não esquecer que a compreensão da
linguagem gráfica apoia-se em um idioma e também ocorre nas formas oral e a
escrita, imprescindíveis na comunicação. Deve-se associar a comunicação gráfica
ao uso de uma linguagem acessível, para não afastar pessoas não especializadas
da discussão sobre os avanços científicos, devido ao fato de desconhecerem uma
163
linguagem. Feyerabend (2007) lembra que cada Ciência deve ser uma forma de
concepção do conhecimento e não o caminho exclusivo para entender o mundo.
5.4.3 Controle
Retornando à professora, que considera frequentemente a possibilidade de
medir e extrair dados para gerar informações, temos outro viés de compreensão dos
usos da Estatística. Todo controle estatístico de qualidade é um mecanismo de
cobrança de desempenho da produção que não recai apenas sobre o Engenheiro de
Produção. Ao mesmo tempo, esse profissional não pode esquecer do controle
ambiental, que é uma responsabilidade social. Esta última é prevista no documento
da ABEPRO (1998) e do CNE/CES (2002). O controle exercido sobre os
profissionais da indústria por intermédio da Estatística é um aspecto do
conhecimento discutido por Feyerabend (2007). Nesse caso existe um paradoxo: o
conhecimento que deveria ser prova da evolução e instrumento de liberação
humana é utilizado para o controle. A Ciência está protegida de ideologias, mas os
indivíduos que compõem estão à sua mercê.
A percepção de Estatística para controle também se apresenta na
necessidade de construir instrumentos para reconhecer as falhas sistêmicas que
travam a produção. Aqui não se explicita a preocupação com as consequências
sociais das transformações e aplicações do conhecimento. O objetivo de melhorar
os processos produtivos é ligado à identificação dos motivos das perdas, mas há um
risco ao pautar excessivamente o ensino nessas aplicações. Skovsmose (2007)
considera que a formação centrada na eficiência operatória do saber adquirido pode
não preparar tomadas de decisões em que o conhecimento técnico não será único
fator a considerar. Decidir baseado apenas em resultados estatísticos pode levar a
opção apenas para lado econômico e relegar aspectos sociais a um plano inferior.
Portanto, existe um desafio: os currículos das áreas científica e tecnológica devem
ultrapassar o objetivo de desenvolver habilidades para o controle rotineiro de
processos. É necessário incluir discussões das consequências sociais ligadas às
aplicações do conhecimento científico em geral e, em particular, a Estatística.
Em relação à quantificação de impactos ambientais, a utilização de recursos
escassos e o destino final de resíduos e rejeitos, um exemplo apresentado foi a
164
verificação do cumprimento da legislação ambiental, cujo objetivo é garantir a
sustentabilidade. Essa verificação em estudos ambientais seria possível mediante a
transferência dos modelos de identificação dos níveis de desperdícios aceitáveis em
uma linha de produção. O controle também foi associado à necessidade de obter
dados para verificar o funcionamento de um sistema, comprovar consequências das
ações humanas e orientar a correção de falhas. Temos aqui uma situação típica de
confiança plena do conhecimento científico na qualidade de instrumento para
inspeção da observância de critérios legais. O fato também é discutido por
Skovsmose (2007), referindo-se à suposição de progresso científico associado à
garantia de progresso social.
Verificar o sucesso de um método é outra concepção, desta vez associada à
produção de dados globais, que servem de referência à ação local, além de
identificar marcos direcionadores de novas ações. Demo (2000) e Feyerabend
(2007) partilham a ideia de que o conhecimento que parece racionalmente
determinado é afetado por escolhas subjetivas. A percepção de sucesso é uma
delas. Em relação aos dados globais uma linha de montagem é um caso exemplar
de estudo de produtividade. Porém, é necessário verificar os impactos sociais e
ambientais ligados a esse desempenho produtivo. Essa perspectiva deixa evidente
que não existem instrumentos puramente racionais, neutros e isentos de
subjetividades.
A percepção da Estatística como instrumento de controle e medição
corresponde à ideia de que tudo deve ser o mensurado para identificar margens de
erro e manter padrões. O conceito de margem de erro faz do conhecimento
estatístico um instrumento de verificação, decisão e aceitação de qualidade do
produto e um modo de prever a sua lucratividade. Com isso, as aplicações da
Estatística ficam na fronteira entre o controle e a previsão, tratando a variabilidade
como um inconveniente à produção em série.
5.4.4 Previsão
Uma consideração da Estatística presente nas entrevistas com os alunos foi
como vê-la como instrumento de planejamento e/ou mudanças ao direcionar
decisões práticas. A professora comentou que o Engenheiro convive com processos
165
aleatórios e o seu raciocínio estocástico deve ser mais apurado, devendo também se
acostumar às imprevisibilidades.
A
Probabilidade
também foi
considerada
instrumento de previsão, que capacita seu conhecedor a antever possíveis
acontecimentos ainda não testados. A previsão também foi percebida pela
caracterização da Estatística como instrumento de análise que permite saber o como
serão a demanda e o comportamento de mercados futuros. Dessa forma, possibilita
descrever tais quadros além de ser capaz de prever e detalhar influências da
atividade industrial sobre ambiente e a sociedade.
A possibilidade de previsão inspira a segurança, quando associa o
conhecimento à constatação de comportamentos, com objetivo de planejar o
gerenciamento de pessoal. Sob esse ponto de vista a Estatística, por meio de
categorizações da realidade, dispõe de meios para identificar o indivíduo em relação
ao grupo e suas particularidades. Embora seja fruto da década de 1830, percebe-se
viva a ideia de Adolphe Quételet e sua definição de homem médio (CAMARGO,
2009). Os alunos provavelmente desconheçam esse fato e também outro de grande
importância: há menos de duzentos anos a média é elemento de comparação e
homogeneização de dados. Ajustar as ações em busca de uma produção média é
uma necessidade industrial. Porém, sem as necessárias críticas, levar o uso de um
conceito estatístico para o campo da Sociologia pode gerar perigosos abusos na
aplicação e gerar distorções de análise.
A associação da análise estatística, à previsão e à antecipação de
acontecimentos pode ser exemplificada pela declaração de um aluno, que comentou
a necessidade de prever o esgotamento de fonte de recurso para o seu manejo e/ou
fim de exploração. Outro exemplo é o do cálculo da proporção de dejetos e resíduos
que o ambiente suporta. Neste caso, a previsão estatística determinaria valores
máximos de elementos poluentes que podem ser liberados na natureza.
A atividade industrial é impactante, poluidora e o planeta está cada vez mais
a mercê de agressões ambientais. Em alguns depoimentos existe uma clara
percepção de que a Estatística serve a estudos sobre o ambiente, com o potencial
de, inclusive, prever riscos ambientais e esgotamento de recursos. Em meio apenas
à tarefa de assimilar habilidades para o desempenho profissional, a Estatística não
se constitui um instrumento pleno de crítica das próprias condições sociais e de
166
trabalho. AlrØ e Skovsmose (2010) e Gal e Garfield (1997) analisaram o ensino
orientado para treinamento, que não favorece o desenvolvimento de sínteses e
críticas de problemas reis.
O profissional de produção é considerado alguém que sabe lidar com a
incerteza, contornar a variabilidade na linha de produção e usar a informação
estatística no ambiente industrial. Os próprios depoentes associaram a possibilidade
da Estatística antecipar demandas e erros. Neste caso, assumem e compreendem a
necessidade de produção e compreensão dos dados (GAISE COLLEGE REPORT
FRANKLIN et al., 2005, p. 5). Eles também conhecem métodos para testar a
consistência dos dados, mas a presença da variabilidade, quando percebida, é
quantificada e explicada com o objetivo de eliminação, pois para a indústria não é
estratégico ultrapassar determinados limites de diferenças. Por um lado isso é
importante, pois garante que os produtos destinados aos consumidores não devem
apresentar grandes diferenças entre si que cheguem a ser classificadas como
defeitos de fabricação. Por outro, é necessário que essa busca de uniformidade não
se torne traço de personalidade e faça do Engenheiro um indivíduo deslocado dentro
em uma sociedade repleta de diferenças.
5.4.5 Manipulação
A professora acredita que há interseções da aprendizagem da Estatística
com a possibilidade dela ser utilizada para estudar o contexto social da atuação do
Engenheiro, mas não especificou de que forma faria. Além disso, considerou as
formas oral e a escrita como possibilidades de comunicar resultados estatísticos,
embora veja mais utilidade para os gráficos. Na sua opinião, aprender a aplicar a
ética e a responsabilidade da profissão relacionam-se ao poder, pois quem detém o
conhecimento controla o poder. As informações podem ser usadas para o bem ou
não e o seu detentor tem a possibilidade, inclusive, de transmitir a verdade de forma
enviesada (viciada).
A professora tocou em pontos da Educação Crítica (EC) discutidos por
Skovsmose (2007). Primeiramente o conhecimento científico deve colaborar para
elucidar consequências sociais de sua própria existência. Para ela, a Estatística
167
pode se valer de seus instrumentos para examinar, por exemplo, as relações de
poder dentro da sociedade e os interesses que movem seus atores.
Entre os alunos, a manipulação foi associada à ideia de manipulação dos
dados e distorção do entendimento de uma realidade. Aqui, pode-se associar a
declaração do aluno ao que Skovsmose (2007) chamou de fabricação de fatos. Para
o depoente, o conhecimento estatístico pode tratar as informações divulgadas em
diferentes
mídias,
descrevendo
ou
ocultando
elementos
que
favoreçam
determinados indivíduos. Camargo (2009) também discutiu outro aspecto do
conhecimento estatístico: depois que os resultados são divulgados, o pesquisador já
não tem mais controle sobre aquilo que produziu. A partir de então, quem tomou
posse dos dados pode divulgá-los de acordo com conveniências pessoais.
A manipulação de resultados estatísticos foi percebida como a possibilidade
de favorecer um portador de opinião e influenciar a percepção de outros indivíduos.
Conhecer estatística, portanto, permitiria confirmar se há manipulação de dados.
Além disso, um aluno considera um risco a maioria da população desconhecer a
Estatística, pois não percebe as distorções e torna-se suscetível de ser ludibriada. O
depoente reforça uma discussão de Gal e Garfield (1997): o aluno deve
compreender que processos de pesquisa estatística ajudam a obter conclusões
melhores que as baseadas em intuições e deve aprender a elaborar estatísticas, ao
invés de apenas consumi-las.
Também verificou-se a Matemática associada à exatidão e certeza,
características não atribuídas à Estatística. Aqui há um confronto pessoal entre a
objetividade e a subjetividade de alguém que se confronta com duas linguagens
científicas, das quais uma delas é considerada a que apresenta resultados precisos.
Portanto, temos o que Demo (2000) e Feyerabend (2007) consideram contaminação
por elementos desconhecidos pelo próprio profissional. Eles discutem a tradição das
Ciências Naturais, que consideram confiáveis os dados fornecidos pelos sentidos em
condições de normais. A Matemática, provedora da precisão, utiliza aproximações
para números irracionais (como no caso do π) e, entretanto, a Estatística não é
considerada precisa pela margem de erro e pelos intervalos de confiança.
168
5.4.6 Pensamento fragmentado
A professora comentou que repetia o termo quantificar devido à sua
personalidade, pois desde criança tem o hábito de contar tudo. Declarou que lhe é
difícil descrever qualitativamente um fenômeno e, para ela, não é natural articular os
pensamentos qualitativo e quantitativo. Disse que deseja ter a experiência de fazer
uma pesquisa qualitativa, mas não entende minimamente o que é estudar com
profundidade uma questão específica sem buscar padrões que a descrevam. Temos
alguém que expressa uma concepção fragmentada sobre o próprio exercício
profissional, o que pode ser reflexo do seu treinamento para uso do conhecimento
científico. A restrição da imaginação provavelmente ocorre em decorrência de
aprender a utilizar uma linguagem de maneira restrita (FEYERABEND, 2007) sem a
construção de elos com outras metodologias, levando ao alinhamento com apenas
um método de conhecer a realidade (DEMO, 2000).
Segundo a professora, o Engenheiro de Produção tem formação
diversificada, o que possibilita atuar em equipes multidisciplinares e, dessa forma,
ajudar na compreensão e tratamento de diferentes aspectos das variáveis. A
habilidade de atuar em equipes multidisciplinares é prevista na proposta a ABEPRO
(2001) e pode ser melhor desenvolvida com a partilha do conhecimento com os seus
semelhantes discutida por Lévy (2006). O autor considera a inteligência e a cognição
elaborações sociais que podem ser desenvolvidas utilizando tecnologias que
colaboram para socialização de experiências e saberes. Esse ponto de vista também
foi expresso pelos autores do GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005). Eles
argumentam que acumular dados não significa formular uma informação, pois é
necessário tomar os dados e processá-los para lhes dar sentido. Os sentidos
atribuídos coletivamente, o contexto e a compreensão de mensagens são elementos
da comunicação que possuem valor educacional em relação à Estatística. A
formulação de sentidos e a aprendizagem necessitam de contextos que situam o
aluno frente ao objeto que deve compreender.
Entre os alunos entrevistados ocorreu pensamento fragmentado, por
exemplo, ao não se perceber como demandas sociais podem ser estudadas
quantitativamente, apesar de conceber essa metodologia aplicável ao mesmo
estudo quando o tema é o mercado consumidor. Entretanto, o conhecimento
169
estatístico foi associado ao tratamento de amostras para ensaios de ações sobre
objetos pequenos para eles gerarem resultados em contextos maiores. Neste caso,
as ideias de Lévy (2006) e do GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005)
expostas no parágrafo acima podem ajudar a discutir as concepções de uso do
conhecimento estatístico de forma compartimentada.
As demandas sociais representam um tema que, para a professora, pode
ser estudado com o uso da sua disciplina, porém considera tema de difícil
tratamento. Sem uma amostragem justa e mantendo apenas juízo sobre o que
conhece nas proximidades, a informação obtida ao fim do processo não é útil e a
sociedade não será descrita como um todo.
Segundo o GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) é necessário
utilizar contextos para relacionar os conceitos estatísticos com o exame de situações
reais. Essa atitude favorece a criação de redes nas quais os significados são
articulados. O uso de dados reais é uma alternativa para envolver o estudante no
processo de aprendizagem e aproximá-lo do objeto estudado. Pelo tempo de
convivência com exercícios clássicos da formação de Engenheiros de Produção,
certamente a professora está desacostumada a trabalhar com outros tipos de
contextos.
A docente comentou na segunda entrevista que muitos alunos se prendem
aos métodos de cálculo e não se interessam em entender os conceitos. Percebeu
em mais de uma turma que muitos deles executam os cálculos, mas não sabem
explicar o que fazem. Considera necessário acompanhar esse tipo de aprendizagem
e pensa em mudar seu modelo de avaliação da compreensão dos conceitos. Isso
mostra duas preocupações com a aprendizagem: a primeira refere-se à
compreensão de conceitos, um dos pontos da proposta do (GAISE COLLEGE
REPORT, FRANKLIN et al., 2005); a segunda é tirar o foco dos cálculos, pois
acredita que os graduandos se prendem aos algoritmos, decoram roteiros e repetem
tudo até a hora da prova. Ela percebe que não deve avaliar somente as habilidades
de uso dos algoritmos e a sua experiência levou à observação de que é necessário
desenvolver o pensamento e a literacia estatística.
170
Associar a resolução de problemas administrativos à Matemática e não à
Estatística foi outro aspecto da fragmentação apresentado nas entrevistas. Essa
concepção foi explicada pela imprecisão atribuída ao conhecimento estatístico em
comparação com a certeza e exatidão associada ao campo matemático.
Entre os alunos existe a concepção de que medir desempenho não se
restringe à área de Produção e que pode ser aplicado em outras situações. Por trás
desta declaração encontra-se um ponto de interseção entre dois teóricos. Tanto
Demo (2000) quanto Feyerabend (2007) discutem o alinhamento à lógica de um
setor, que leva o indivíduo a considerar a atividade de medição de desempenho da
produção transferível, podendo ser aplicada indistintamente em outros contextos.
Mais uma vez apresenta-se o problema relacionado a um ensino científico sem a
crítica de métodos e conteúdo.
O indivíduo que pensa de forma fragmentada não percebe possibilidade de
articular o conhecimento estatístico à compreensão de diferentes aspectos, tanto do
cotidiano de trabalho, quanto da própria vida fora do ambiente laboral. A
fragmentação ficou evidente com a falta de associação dos tópicos da pergunta 2
com a Estatística, além de não percebê-la como uma linguagem que pode favorecer
a comunicação entre profissionais de diferentes atividades. Para alguém que passa
por uma formação acadêmica fragmentada é fácil aceitar a ideia da extrema
especialização profissional, assim como a formação dos Engenheiros de Produção
parece preservar aspectos da hierarquização positivista.
O pensamento fragmentado também se manifestou na falta de elos entre as
três modalidades de comunicação: oral, escrita e gráfica, sendo quase atribuído a
esta última a exclusividade de repassar dados e informações estatísticas. Lévy
(2006) nos lembra que, além de meios materiais, necessitamos de relações sociais
para desenvolver a inteligência e a cognição individual a partir do encontro com uma
língua, com as tecnologias socialmente disponíveis e com os demais indivíduos.
Pode-se considerar normal o desconhecimento dos alunos em relação à
fragmentação, mas a discussão sobre necessidades de articulações não deve
passar despercebida pelo professor.
171
Outro aspecto da fragmentação foi considerar a ética assunto privado e de
cada instituição, ocorrendo o mesmo em relação à avaliação de impactos das
atividades de engenharia no contexto social e ambiental, que também foram
consideradas encargo de cada empresa. O excesso de simplificações que ocorrem
no ensino de Ciências apontado por Feyerabend (2007) reflete-se nas limitações
apresentadas já no ciclo básico das Engenharias. Como exemplo, pode-se pensar
na dificuldade que o aluno de Engenharia tem para entender como adaptar os
instrumentos estatísticos ao estudo de situações da própria sociedade em que vive.
Outra ocorrência do pensamento fragmentado deu-se com a não articulação
da compreensão de problemas socioeconômicos e ambientais à Estatística. Mais um
viés dessa dissociação seria aceitar possíveis elos dos estudos de Economia com o
conhecimento estatístico, pois não percebê-la aplicada à compreensão de fatos na
sociedade seria negar que se vive dentro de determinadas condições econômicas.
Não ver elos da realidade social com o conhecimento é um elemento dos jogos de
poder envolvendo a utilização da produção científica com o objetivo de manter
intactas as relações sociais vigentes (SKOVSMOSE, 2007). Sendo assim, temos
como resultado a minoria de elementos de uma sociedade decidindo as pautas de
desenvolvimento científico, tecnológico e econômico.
5.4.7 Desenvolvimento de habilidades
A professora considera importante usar TICs para desenvolver o conteúdo de
Estatística e fez uma crítica ao curso de graduação em EP, que na Instituição
pesquisada não tem as disciplinas de Lógica e Algoritmos. Algumas turmas sequer
desenvolvem a capacidade de programar e não passam da elaboração dos
algoritmos em papel. Para a professora, Engenheiro deve conhecer alguma
linguagem de programação para processar os dados na quantidade e com a rapidez
necessária, pois o MS Excel não tem potência suficiente para a tarefa. A percepção
da professora pode ser traduzida por dois itens da proposta do (GAISE COLLEGE
REPORT, FRANKLIN et al., 2005). A primeira é a necessidade de promover a
aprendizagem ativa na sala de aula, o que seria facilitado com a utilização de TICs,
que permitem buscar bancos depositários de dados reais. A outra é que a utilização
172
dessas tecnologias proporcionaria mais tempo para desenvolver a compreensão dos
conceitos e a análise de dados.
O acesso a dados reais e a utilização de TICs para automatizar cálculos,
trabalhar com gráficos e realizar simulações é uma necessidade apontada pelo
GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005), pois possibilita interpretar
resultados e não apenas assimilar rotinas de cálculos estatísticos. A aprendizagem
de uma linguagem de programação articularia o tratamento de grandes quantidades
de dados de forma rápida. Com isso, o tempo gasto em longas sequências de
cálculos pode reverter no desenvolvimento da literacia e do pensamento estatístico.
A percepção dos alunos sobre o desenvolvimento de habilidades também
passou pelo reconhecimento de que a Estatística pode ajudar a desenvolver o
raciocínio lógico. Isso foi associado à melhoria da capacidade de modelar a
resolução dos exercícios apresentados pela professora. Nesse caso, mesmo com a
professora utilizando semirealidades e por vezes trabalhando alinhada ao paradigma
do exercício, um aluno considerou que as aulas de Estatística serviram para ampliar
sua capacidade de compreender enunciados. Também considerou que isso
facilitaria a abordagem de problemas reais. Porém, o trabalho realizado na disciplina
está longe daquele preconizado pelos educadores estatísticos presentes no
referencial. O GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005) propõe atividades de
ensino e de avaliação ativas. Paralelo a isso, Gal e Garfield (1997) apontam a meta
de fazer dos alunos cidadãos informados e capazes de compreender e lidar com a
incerteza, a variabilidade e a informação estatística (além de serem produtores,
intérpretes e comunicadores de dados).
O uso de dados e situações reais, aliado à utilização de TICs, viabilizaria o
contato do aluno com todo o percurso iniciado com a coleta de dados, passando
pela análise e culminando na divulgação dos resultados. Inserindo o processo
estatístico em um contexto, evita-se o afastamento entre sujeito e objeto, outro
aspecto da fragmentação discutido por Demo (2000), Lévy (2006) e Feyerabend
(2007). Tem-se uma oportunidade de colocar o aluno como sujeito histórico em um
processo de elaboração de conhecimento, munido de tecnologia e comunicando-se
por meio de diferentes linguagens. Assim, os contextos favorecem a criação de
redes nas quais diversos significados são articulados.
173
5.4.8 Mudança de comportamento
A subcategoria mudança de comportamento constitui-se nas alterações de
percepção do aluno em relação aos usos do conhecimento estatístico. Com a
aplicação do questionário, constatou-se que, no início do curso, a Estatística era
considerada apenas mais uma disciplina curricular ou mesmo uma parte da
Matemática.
Inicialmente um dos alunos não via muita utilidade na Estatística e ainda
guardava a postura do Ensino Médio, época em que foi submetido a um ensino
simplificado, no qual o conhecimento estatístico não possuía vínculos com a
realidade. Ao entrar na graduação ainda lidava com conceitos esparsos e pouco
aplicados, mas ao longo do curso passou a perceber aplicações da Estatística e a
necessidade de superar o estágio de conhecimento em que se encontrava. As
aplicações tonaram-se mais relevantes e a média, por exemplo, aumentou de
importância por representar comportamentos gerais, mais necessários à indústria.
Mesmo trabalhando com semirrealidades e tratando com dados que não são reais,
viu aplicações e pode esclarecer os temas que estudava. Variância e desvio padrão
passaram a apresentar utilidade, pois juntamente com a curva normal norteiam o
planejamento da produção. Nas articulações com outras disciplinas o próprio uso da
curva normal ajudou a compreender como verificar concentrações de resultados
mais prováveis e comportamentos centrais.
Novamente nos deparamos com algo já apontado por Demo (2000),
Feyerabend (2007) e Skovsmose (2007): o currículo condicionando o aprendiz à
lógica de um setor, cumprindo o papel de selecionar e demarcar competências
necessárias à transformação de conhecimento em força produtiva. As aplicações
lembradas pelos alunos e a professora relacionam-se à linha de produção. Citações
sobre outros estudos fora do mundo industrial ocorreram apenas quando
perguntadas especificamente. Mesmo assim, quando isso foi feito, as articulações
sugeriam a simples transferência de instrumentos e processos de pesquisa da
indústria para os estudos socioeconômicos. Esse é um aspecto do currículo
impregnado por um padrão tecnológico que não favorece desenvolver competência
democrática em meio a uma graduação cujo egresso deverá trabalhar com pessoas.
174
A mudança de comportamento também pode ser observada em relação ao
Cálculo, que antes era instrumento fundamental da Engenharia. Agora a Estatística
passa a ser reconhecida como instrumento importante para a EP e isso coloca a
percepção na fronteira entre a mudança de comportamento e o reconhecimento da
relevância.
5.4.9 Relevância
A professora relatou um choque sofrido ao cursar o mestrado em Engenharia
Ambiental, pois percebeu que não havia estudado Estatística o suficiente, devido ao
fato de que, na graduação, teve apenas um semestre da disciplina. Comentou que
atualmente já existem sugestões de diminuir o total de aulas de Cálculo e aumentar
o de Estatística em cursos de Engenharia. Pelo menos na EP existe a necessidade
de tornar o currículo mais dinâmico e, na segunda entrevista, a professora
apresentou a preocupação com o desempenho dos alunos. Essa declaração
apresenta um momento de reflexão sobre a relevância de conteúdos para a EP.
Entre os diferentes temas e conceitos da Estatística para o Engenheiro de
Produção, a professora destacou os seguintes: entender o conceito de variável, o
que ela representa e o fato das variáveis explicarem-se mutuamente. A regressão
não ocorre somente na forma linear e deve ser conhecida pelo aprendiz, mesmo que
não necessite usar imediatamente todas as formas. A professora também acha
importante saber testar hipóteses e determinar intervalos de confiança e é
necessário conhecer a estimação pontual e a estimação por intervalo de confiança.
Essa noção tem relevância, porque o profissional testará amostras, já que não é
possível testar a população total. Daí a importância da amostragem e da
possibilidade de comparar amostras.
É necessário entender o que é uma medida de tendência central e o conceito
de dispersão, pois são conceitos necessários para perceber o quanto uma linha de
produção está desajustada. No caso, erro significa dizer que não se está produzindo
de acordo com o planejado.
A experiência de ensinar Estatística e a conivência com os alunos em fase de
aprendizagem indicam para a professora que é preciso tratar mais apuradamente
175
determinados tópicos e procedimentos, tendo em vista o progresso dos aprendizes.
Mesmo trabalhando a partir de semirrealidades ao invés de dados reais, a sua
preocupação é desenvolver o pensamento e a literacia estatística, além de enfatizar
o entendimento conceitual.
Os alunos também consideraram a Estatística relevante por vários motivos,
entre eles a possibilidade de delimitar regiões de Probabilidade. Isso faz com que a
Estatística
lhes
pareça
concreta,
pois
quantificam
possibilidades
de
um
acontecimento. Entretanto, não percebem que trabalharam apenas com situações
hipotéticas, sem estudar acontecimentos reais.
A necessidade do tratamento de dados foi identificada ao verificar que a
Engenharia necessita deles para as suas realizações. A partir dessa ideia, os alunos
constataram que as aplicações do conhecimento estatístico são amplas. Uma das
características do desenvolvimento do pensamento estatístico é o fato do aprendiz
compreender a necessidade dos dados e reconhecer a importância de sua
produção, destaque do GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005). Além disso,
os alunos também consideraram que não basta conhecer os processos de cálculos
estatísticos, mas os resultados devem estar dentro de padrões considerados
verdadeiros. Portanto, os alunos perceberam a necessidade de verificar a
consistência dos dados, apontando outra face do desenvolvimento do pensamento
estatístico.
A utilidade da disciplina foi acentuada pela ideia de que a Estatística será
necessária no futuro. Na ausência desse conhecimento é difícil resolver situações
práticas nas Engenharias e, sem saber analisar dados, pode-se tomar decisões
incorretas. Nesse ponto, retornamos a Gal e Garfield (1997) que defendem a ideia
de que o aluno deve compreender que processos de pesquisa estatística ajudam a
concluir sobre uma situação de maneira mais apropriada do que fosse baseada em
intuições ou experiências subjetivas. Também é necessário retornar ao que foi
escrito por Skovsmose, (2007), ao dizer que existe o desafio dos currículos em áreas
técnicas, nas quais predomina o desenvolvimento de habilidades operatórias
desligadas da preocupação com as consequências sociais das aplicações do
conhecimento.
176
A Estatística viabiliza planejamentos e mais de um entrevistado considerou
fundamental aumentar a carga horária de Estatística. A disciplina é importante não
apenas para a Engenharia, mas para a formação geral das pessoas. Essa ideia
pode ser reforçada por Lopes (2013), que lembra um fato importante: em pleno
século XXI, a análise de dados é essencial para desenvolver diversas habilidades
em diferentes níveis de ensino. Porém é importante não deturpar a ideia de
aumentar a carga horária de Estatística, pois diante das necessidades de formação
do Engenheiro de Produção o conhecimento estatístico tem importância relativa.
Não se pode torná-lo um novo elemento a reinar no ensino, seja em qualquer nível
de conhecimento, conforme nos afirma Demo (2000) e Feyerabend (2007).
5.4.10 Complexidade
A professora considera bom ter as disciplinas de Estatística I e II separadas
e que elas não estão de forma alguma desarticuladas em relação às demais.
Lembrou que os alunos têm a disciplinas que aplicam o conhecimento estatístico
como, por exemplo, o CEQ e lembrou que a sua disciplina atravessa outros campos.
Porém, é necessário que tanto a professora de Estatística quanto o professor da
cada disciplina que utiliza procedimentos estatísticos tenham o cuidado de não
dissipar excessivamente o aspecto complexo dos fenômenos que estudam.
Muitas ações no cotidiano do Engenheiro são respaldadas por aplicações da
Estatística que ocorrem dentro de contextos complexos (Como no caso do CEQ), e,
dessa forma, não possibilitam decisões baseadas em análises fragmentadas. O
conhecimento para a prática da EP, mesmo sob uma formação que lança mão de
disciplinas solitárias (assim declarado pelo Aluno 1) é aplicado em meio a uma
ecologia cognitiva (LÉVY, 2006). Perceber a solidão entre as disciplinas foi um
indício da compreensão que a sua formação não deve ocorrer em meio a saberes
desconexos.
As atividades da EP são exercidas por coletivos de atores sociais munidos
de diferentes linguagens em meio a diversas tecnologias, o que remete à
necessidade de tratar articulada e simultaneamente diversos aspectos do mesmo
objeto. É importante compreender que a resolução de problemas reais não se
adequa aos modelos simplificados das aulas iniciais e uma a opção é incentivar a
177
aprendizagem ativa, proposta do GAISE College Report (FRANKLIN et al., 2005). A
aprendizagem ativa favorece elaborar e compreender conceitos da Estatística, além
de estimular o aluno a desenvolver o pensamento estatístico. As atividades de
campo constituem-se em uma possibilidade didática que permite confrontar
situações reais que levam à necessidade de mobilizar diversas habilidades. Além
disso, existem as atividades em laboratórios e os trabalhos em grupo que podem
promover a discussão de dados constituindo-se em possíveis instrumentos para
ensinar a disciplina.
5.4.11 Relatividade
A professora comentou que a convivência com a aleatoriedade deveria ser
trabalhada desde o Ensino Fundamental. Normalmente ela convive com alunos que
têm o primeiro contato apenas na graduação, o que acarreta dificuldades de
compreender diversos conceitos ligados ao acaso e à Probabilidade. Um problema
para ela é o aluno pensar que toda situação apresenta apenas um resultado
esperado, o que não é verdade, pois a Estatística, ao trabalhar junto com a
Probabilidade, trata de conjuntos de resultados possíveis, característicos de uma
situação amostral.
Após estudar Estatística e aplicá-la em diferentes disciplinas da formação
profissional, os alunos começam a perceber o alcance do conhecimento estatístico.
Voltamos a Feyerabend (2007) e a sua ideia de que a Educação Científica é
excessivamente simplificadora, e que existe a necessidade de relativizar o potencial
do conhecimento científico em ralação às explicações da realidade.
Apesar da tendência de alguns entrevistados tratarem a Estatística como
Ciência produtora de respostas exatas, houve a percepção de que é impossível
afirmar que todos os resultados obtidos por meio da Estatística constituem-se
verdade e certeza absoluta. Houve quem considerasse que o conhecimento
estatístico não deve ser tratado como exato em sua essência e à Matemática foi
atribuída a segurança que a Estatística não traduz.
Essa falta de percepção de elos da Estatística com o mundo real é um
indício de que o seu ensino muitas vezes é desconectado da realidade da profissão.
178
Os fenômenos naturais e sociais que se desenrolam no mundo concreto não
apresentam apenas resultados exatos. Diante desse quadro existe a necessidade e
a possibilidade de conceber um novo papel social para a Estatística como Ciência
capaz de articular outros saberes em torno de si e ajudar a refletir sobre o
conhecimento de uma forma geral.
5.5 Considerações sobre o capítulo
Neste capítulo analisamos os dados emergentes do questionário e dos
depoimentos frente aos teóricos e documentos oficiais. A proposta da ABEPRO
(2001) e a resolução do CNE/CES (2002) apresentam habilidades, competências e
conteúdos curriculares necessárias ao desempenho da profissão. Os planos de
curso documentam de que maneira as recomendações devem ser seguidas.
Todos os documentos destacam que a Estatística tem aplicações à
modelagem de sistemas e é necessária para subsidiar tomadas de decisão.
Também se considera relevante preparar o profissional para acompanhar os
avanços tecnológicos e demandas de origem empresarial e social, o que leva à
necessidade da formação estatística permitir ao Engenheiro compreender as formas
pelas quais o conhecimento é utilizado no desenvolvimento tecnológico. Os
documentos também incluem a necessidade de formar Engenheiros que
reconheçam a importância dos cuidados ambientais na preservação de diferentes
recursos. A formação para as capacidades de comunicação nas diferentes
modalidades e de associação de conhecimentos também são contempladas.
Apesar dos programas das disciplinas reportarem-se a situações ideais de
ensino e aplicação do conhecimento estatístico, na prática o ensino e a avaliação da
disciplina ocorreram de acordo com padrões convencionais, tais como a recorrência
ao paradigma do exercício e às semirrealidades. A análise das respostas do
questionário e das entrevistas sugere reflexos dessas práticas de ensino na
formação estatística do grupo. Por sua vez, o referencial teórico aponta que os
currículos escolares e as práticas pedagógicas são instrumentos de estratificação,
servindo para ocultar e afastar aspectos sociais, políticos e culturais do ensino
científico.
179
Entretanto, a fragmentação descrita não deve ser considerada definitiva nem
irreversível. O reconhecimento de que a formação do Engenheiro é fragmentada
pode ser o ponto de partida para a proposição de um ensino que atenda às
necessidades de formar um profissional que simultaneamente seja consciente das
responsabilidades técnicas do ofício e do seu lugar de cidadão atuante da
sociedade. Nas considerações finais trataremos com mais detalhes os aspectos
relacionados ao tipo de formação dos alunos envolvidos na pesquisa.
180
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A utilização dos progressos da ciência
e da tecnologia para tornar a vida do homem menos
angustiante parece-nos ser uma tarefa que escapa ao
poder dos cientistas
e, de fato, a impressão que se tem é que
à medida que o progresso científico avança, menos e
menos as realizações
são voltadas
para minorar o sofrimento do homem.
(Ubiratan D’Ambrosio).
Introdução
Em geral, os profissionais da área de Engenharia consideram que a
Estatística tem grande importância para a sua atuação profissional. Os alunos
ingressantes na graduação em Engenharia com os quais temos contato quase diário
consideram a disciplina um obstáculo a ser transposto na sua formação. Ao mesmo
tempo em que se preocupam com a formação estatística de quem dependerá desse
conhecimento para atuar profissionalmente, os professores da disciplina percebem a
angústia dos alunos diante dos conteúdos. A partir desse quadro, surgiu uma
curiosidade que depois tornou-se objetivo de estudo: saber qual lugar a Estatística
ocupa no universo no estudante de Engenharia.
Nesta pesquisa investigamos a formação estatística inicial do Engenheiro de
Produção, buscando evidenciar quais demandas de formação seriam explicitadas
pelos estudantes em relação à Estatística, as suas fragilidades e concepções
equivocadas. Além disso, procuramos saber de que forma o Plano de Curso e os
instrumentos de ensino e de avaliação da Estatística dialogam com as necessidades
dos futuros engenheiros de Produção, expressas em documentos da associação de
classe e as determinações do Ministério da Educação.
Relembremos que a investigação contou com os depoimentos de cinco
alunos escolhidos e/ou sorteados dentre os respondentes do questionário, além da
professora de Estatística de uma turma do curso de Engenharia de Produção da
181
mesma Instituição Federal de Ensino da Grande Vitória. Os cinco alunos estudaram
Estatística no Ensino Médio. A partir da questão “Como ocorre a formação estatística
de futuros engenheiros de Produção?” Estudamos como o conhecimento estatístico
contribui na formação dos alunos, quais são as perspectivas do uso desse
conhecimento no prosseguimento da carreira, que percepções eles têm a respeito
da disciplina, e quais articulações ela tem com outros componentes da matriz
curricular do curso.
Resultados e reflexões
No início do trabalho, após a aplicação de um questionário de levantamento
de perfil dos estudantes e primeiras análises interpretativas dos dados, as
evidências coletadas mostravam diferentes percepções a respeito da Estatística.
Parte considerava a disciplina como Ciência de análise de dados com aplicações
que não se restringem ao ambiente industrial e outra a considerava apenas uma
disciplina da formação do Engenheiro. Porém, havia uma terceira percepção, a de
considerar a Estatística uma disciplina de caráter matemático. Portanto, devido a
diferentes motivos, tínhamos um grupo que tinha pouca experiência com o conteúdo
da disciplina e apresentava ideais difusas a seu respeito.
A turma como um todo apresentava uma série de indícios do primeiro
contato com a Estatística ter ocorrido igual aquele que se dá com a Matemática
dentro de padrões tradicionais. Os depoimentos realizados após a aplicação do
questionário indicam um ensino básico de Estatística que, quando ocorreu foi sob a
tônica de trabalho, rotineiro com aplicação de fórmulas em exercícios de fixação e
pouca atenção aos conceitos estatísticos.
Outro reflexo de um deficitário ensino básico de Estatística surgido na
aplicação
do
questionário
foi
em
relação
à
conceituação
de
variável
(qualitativa/quantitativa, discreta/contínua) e a indicação de uma representação
gráfica. Há evidências de falta de compreensão dos conceitos. A deficiência na
compreensão de representações gráficas das variáveis foi outra situação encontrada
no primeiro levantamento. Considerando que a análise de dados necessita da
compreensão de mensagens expressas graficamente, tínhamos um grupo com
sérias deficiências em relação ao raciocínio e ao domínio da literacia estatística.
182
O ensino deficitário que transpareceu nas respostas do questionário
apresentou outra situação: falta de elos do conteúdo ensinado com situações
concretas. Uma pessoa que desconheça o que é variável (e sua importância no
desenvolvimento da análise de dados) e não domine a compreensão e leitura de
representações gráficas (instrumento que representa o comportamento da variável),
certamente apresentará dificuldades de elaborar informações a partir dos dados
disponíveis. Esse indivíduo também apresentará dificuldades de se situar frente ao
conhecimento estatístico, deficiência em lidar com dados quantitativos para
interpretar diferentes situações cotidianas (mesmo as mais simples). Essas
deficiências, caso não sejam resolvidas, podem inclusive comprometer a
continuidade dos estudos da Estatística.
Com o decorrer das diversas etapas de entrevistas foi possível perceber
mudanças de percepção em relação ao alcance da Estatística. Porém, ao mesmo
tempo em que horizontes se ampliavam, algumas visões permaneceram inalteradas.
Inicialmente, devido a ideias trazidas do Ensino Médio, a Estatística ainda não era
considerada instrumento capaz de ajudar a entender determinadas realidades.
Persistia a visão de algo que lidava com conceitos esparsos e pouco aplicados.
Em geral, os alunos consideraram que as aplicações começaram a ganhar
alguma visibilidade ao longo da Estatística I, mesmo que as situações estudadas
ainda não fossem associadas a situações reais. Conceitos fundamentais como
média, moda, variância e desvio padrão começaram a ter suas aplicações melhor
compreendidas. Na Estatística II o cálculo de probabilidades passou a fazer parte
das análises de dados e novas aplicações foram vistas. As aplicações do
conhecimento estatístico foram percebidas com maior intensidade quando da sua
utilização como linguagem e instrumento de resolução de problemas em outras
disciplinas. Então, a versatilidade da Estatística se fez presente, habilidades foram
desenvolvidas, a disciplina tornou-se relevante, sua inserção em situações
complexas foi reconhecida. Sua utilidade como instrumento de comunicação e a
relatividade de seu alcance e sua necessidade foram compreendidos. Porém, não
foram esses apenas os aspectos da formação estatística constatados na formação
do Engenheiro de Produção.
183
Ao mesmo tempo, o profissional que deve ter a habilidade de trabalhar em
equipes multidisciplinares apresenta aspectos de fragmentação na sua formação
estatística. Consideramos fragmentação a falta e/ou dificuldade em articular a
Estatística à análise de algum objeto que pode ser estudado mobilizando o
conhecimento desse campo. Primeiramente, apesar da percepção da variada
aplicabilidade da Estatística, os entrevistados não identificaram como tratar de
demandas sociais ou então as associaram com aquela que é gerada pelo mercado
consumidor. Outro aspecto do conhecimento fragmentado foi a falta de associação
entre as modalidades de comunicação oral, escrita e gráfica e à última foi atribuída a
primazia da expressão de dados. Até o momento da última entrevista ainda havia
quem não percebesse a importância de se comunicar oralmente. Tendo em vista
que a futura profissão está ligada à convivência entre pessoas em um ambiente de
trabalho, existe a necessidade de desenvolver a habilidade de explicar oralmente
como dados devem ser aplicados e os procedimentos operacionais cumpridos.
Um dos aspectos evidentes da fragmentação do pensamento, tanto do
questionário quanto das entrevistas, foi a consideração de que a ética e a avaliação
de impactos de atividades da engenharia (na sociedade e no ambiente) são
assuntos que podem ser tratados de forma privada em cada instituição. O
pensamento fragmentado também existiu quando não foi articulada a compreensão
de problemas socioeconômicos e ambientais à Estatística, mesmo sabendo que ela
pode ser utilizada para traduzir o pensamento dos economistas. Essa concepção
materializa a negação de que a sociedade na qual o Engenheiro vive está submetida
às suas condições econômicas. Outra dificuldade de associação pode ser percebida
quando o aluno de Engenharia não entende que é necessário adaptar os
instrumentos estatísticos aplicados ao planejamento e supervisão da produção para
estudar situações de caráter social.
Continuando a tratar das percepções obtidas dos entrevistados, a
manipulação, a previsão e o controle foram três concepções da presença da
Estatística encontradas nos depoimentos. A possibilidade de manipular a
apresentação de resultados segundo conveniências e diferentes interesses foi uma
preocupação apontada durante os depoimentos, pois a desvirtuação do trabalho
estatístico pode levar a distorções da percepção da realidade. Em geral, os
comentários referiram-se exatamente aos usos enviesados do produto de uma
184
pesquisa estatística. Quando o resultado do tratamento de dados não está mais sob
o controle de quem os obteve, aquele que os detiver pode divulgá-los de forma
honesta ou não. Isso implica em considerações éticas, pois dados distorcidos podem
influenciar a opinião pessoal de diferentes indivíduos, de forma a favorecer o
portador de determinado ponto de vista.
Para os alunos, outra importante aplicação da Estatística seria a
possibilidade de servir como instrumento de planejamento e/ou previsão de ações
ou quadros futuros. Ela é importante em diferentes tipos de planejamentos, sejam
eles da esfera pública ou privada e auxilia a decidir frente a diversas possibilidades.
Ao mesmo tempo, possibilita descrever e detalhar influências da atividade industrial
sobre ambiente e a sociedade. A análise estatística pode também ser utilizada para
prever o esgotamento de fontes de recursos ou a proporção de dejetos e resíduos
que o ambiente suporta, ou mesmo determinar valores máximos de poluentes que
se permite liberar no ambiente.
A Estatística é válida como instrumento de trabalho pelo fato de antecipar
possibilidades, mas da mesma forma que os dados manipulados podem favorecer
determinados interesses e influenciar a opinião pública, o mau uso de instrumentos
estatísticos no planejamento e previsão também acarretam graves consequências
para a sociedade. É problemático quando alguém, de posse de dados sobre riscos
de um empreendimento toma uma decisão sem preocupação com a ética, mesmo
ciente da possibilidade de graves danos ambientais e sociais. Esses riscos devem
ser considerados pelos profissionais em formação, tendo em vista que resultados
futuros não espelham necessariamente o planejamento. As atividades industriais são
altamente impactantes para o ambiente e as considerações sobre o fato não podem
ficar apenas a cargo das disciplinas ligadas ao controle de produção ou de gestão
ambiental.
Passando da previsão ao controle, outro uso da Estatística consiste em
elaborar planos para controle de falhas na produção, pois a perda de insumos para
os quais não se conhecem processos de reutilização constitui-se em problema
ambiental. Portanto, existe a necessidade de cada vez mais refinar determinados
processos de controle, como no caso das redes de distribuição de eletricidade. O
problemático é pautar as aplicações da Estatística tanto no planejamento quanto no
185
controle e deixar de lado outros problemas. Existem outras necessidades como, por
exemplo verificar quais são os impactos ligados à produção industrial. A perspectiva
de que tudo pode ser mensurado para identificar padrões dentro de margens de erro
não pode fazer do conhecimento estatístico um instrumento apenas de verificação
voltado para a lucratividade de um empreendimento.
Perspectivas, implicações e/ou recomendações
As contribuições desta pesquisa não terão reflexos diretos ou mesmo a curto
prazo sobre os alunos entrevistados mas, contribuiu para o próprio desenvolvimento
pessoal e profissional do autor, tanto do ponto de vista do professor quanto do
pesquisador.
Do ponto de vista do professor, os resultados servem de alerta e, ao mesmo
tempo, de estímulo. O alerta refere-se aos procedimentos de aula e a necessidade
de cada vez mais buscar meios de articular os saberes de uma disciplina a
diferentes contextos. Não basta focalizar apenas o desenvolvimento econômico ou
tecnológico, pois seria continuar atrelando a formação profissional ao panorama de
descuido com a vida e o planeta. A necessidade de formar Engenheiros cada vez
mais competentes para o desempenho de suas funções não pode ser dissociada de
sua preparação para o exercício da cidadania. Não se trata de uma cidadania que
visa apenas o direito ao consumo em decorrência do acúmulo de riqueza. Na
sociedade em que vivemos, cabe a quem domina os diferentes saberes científicos
preocupar-se não apenas em proteger o patrimônio material, mas também avaliar as
consequências da aplicação conhecimento elaborado no ambiente escolar.
As Ciências e seus desdobramentos tecnológicos não podem ficar à mercê
de aspectos utilitários, tais como o binômio lucro/prejuízo. Continuar com o modelo
de ensino científico atual significa manter o aprisionamento a um padrão de
aprendizagem que tem rendido catástrofes sociais e ambientais ao ser humano nos
últimos três séculos. Portanto, é necessário um ensino de Estatística que contribua
para desenvolver a percepção de que a disciplina é um instrumento capaz de
contribuir para melhorar as condições de vida das pessoas nas sociedades
contemporâneas e não apenas inserir o indivíduo no mercado de trabalho.
186
O estímulo ao professor é perceber que existe a possibilidade de modificar
alguns cenários, a começar pelo próprio exercício da profissão. Lévy (2006) nos
lembra que onde há seres humanos reunidos, munidos das tecnologias ao seu
alcance, há troca de perspectivas e partilha de conhecimento.
O objetivo de investigar a formação estatística de estudantes de um Curso
Superior de Engenharia de Produção foi cumprido. Como ocorre essa formação? A
princípio, no grupo pesquisado, da forma tradicional, apartada de maiores usos de
TICs, apoiado na resolução repetitiva de exercícios e semirrealidades. O principal
reflexo no caso é um conhecimento fragmentado, a serviço da medição e do
controle. Esse aspecto ajuda a evidenciar outra função do ensino de Estatística: ele
deve, desde o início, articular a compreensão dos conceitos com aplicações em
situações reais, objetivando romper o isolamento entre a Academia, o mercado de
trabalho e o mundo fora do ambiente da indústria. Por outro lado, deve também
servir de instrumento de ruptura do isolamento disciplinar.
Quais fragilidades e concepções equivocadas referentes ao conhecimento
estatístico foram reveladas e percebidas nesses alunos da Engenharia de
Produção? Entre as fragilidades encontradas, a ideia de que o conhecimento
científico não tem valor por si próprio ou apenas pelas aplicações que se imaginem
para ele. Além disso, existem indícios de uma orientação da Estatística para
controle, previsão e medição incessantes, ou seja, de alinhamento (mesmo que
involuntário) a uma formação concebida no século XIX.
Como o Plano de Curso e os instrumentos de ensino e de avaliação da
Estatística dialogam com as necessidades dos futuros engenheiros de Produção?
Dialogam em parte com as necessidades de aprendizagem técnica para o
desempenho da futura profissão. Falta a perspectiva de articular saberes das outras
disciplinas em relação à Estatística mostrando, desde o início, que este
conhecimento tem vasta aplicabilidade. Existe a necessidade de estabelecer um real
diálogo entre as áreas e as disciplinas não devem apenas servir de pré requisito
para os demais elementos presentes na matriz curricular. A formação do grupo
pesquisado mostrou que a continuidade da obtenção de significados e aplicações
dos conceitos ficou ao encargo de outras disciplinas, que podem ou não lançar mão
de um conteúdo considerado já sabido na sua plenitude. Logo, é importante a
187
aproximação dos professores que trabalham nesse curso, para chegar a um
consenso sobre possibilidades de articular diferentes saberes durante a graduação,
ao mesmo tempo em que se respeitem as peculiaridades de cada área.
Ao mesmo tempo, percebeu-se a falta orientação para articular o
conhecimento estatístico ao mundo fora das atividades do Engenheiro. O ensino não
deve ter somente a perspectiva de atender a demandas industriais, deixando outras
perspectivas fora do campo de domínio da disciplina. Em pleno século XXI, quando
a própria entidade de classe aponta a necessidade de formar um cidadão que é
engenheiro, o panorama na graduação ainda é o do início do século XX: forma-se o
engenheiro que é conhecedor especializado. Existe uma necessária especialização
de aprendizagem que é imposta pela formação técnica, mas não se pode deixar de
abordar os diferentes sentidos para os termos precisão, subjetividade e objetividade,
quando se trata de assuntos científicos.
Que demandas foram explicitadas? Primeiramente, entre os próprios
entrevistados existe a percepção das disciplinas não articuladas entre si,
prevalecendo a concepção de curso fragmentado. Outro ponto explicitado foi a
necessidade de perceber a Estatística básica aplicada em diferentes situações e não
à espera de sentidos para seus conceitos. Uma terceira demanda, agora implícita, é
a necessidade de tratar mais da compreensão dos conceitos estatísticos do que das
fórmulas, pois estas são um elemento a mobilizar depois que outras compreensões
foram obtidas. Outra demanda também implícita é levar o ensino de Estatística para
o domínio da literacia e desenvolvimento do pensamento estatístico. Um passo a dar
para ultrapassar a fragmentação de saberes, seria tratar assuntos relevantes e
perceber que as aplicações do conhecimento estatístico não podem servir apenas
para medir, prever e controlar. Fora da Academia e da indústria existe uma
sociedade que necessita ser estudada, compreendida e atendida em suas
demandas, o que abre possibilidades para a identificação do caráter social da
elaboração do conhecimento.
A professora da turma nos lembrou que estamos em uma era na qual tudo é
medido com objetivo de obter dados, usados na geração de informações sobre
comportamentos, doenças, educação ou qualquer fato que se queira conhecer.
Assume, portanto, a importância da Estatística como instrumento de investigação do
188
mundo. O argumento ético também está presente nas suas declarações e, na sua
opinião, a ética e a responsabilidade da profissão relacionam-se ao poder e,
atualmente, quem detém conhecimento controla o poder. Ela também considera que
os instrumentos estatísticos podem ser utilizados para examinar as relações de
poder na sociedade e os interesses que movem diferentes atores.
Outro aspecto importante colhido no depoimento da professora foi a sua
dificuldade de descrever qualitativamente um fenômeno, pois não lhe é natural
articular os pensamentos qualitativo e quantitativo. Disse também que deseja ter a
experiência de fazer uma pesquisa qualitativa, mas não entende como estudar com
profundidade uma questão sem buscar padrões numéricos. Ao mesmo tempo em
que assume as suas fragilidades, encontra-se receptiva a novas possibilidades de
trabalho. Isso pode ser percebido em outra fala, quando considera variável um
conceito simples, percebe que os alunos apresentam dificuldades de compreensão,
não sabe o motivo dessa dificuldade e desconhece alguma sistematização que
permita proceder com sucesso a conceituação. Essas preocupações podem ser as
mesmas de outros profissionais que ensinam Estatística.
Existe, portanto, a necessidade de buscar novas perspectivas para o
professor trabalhar o conhecimento estatístico. Materiais didáticos, novos usos para
as tecnologias existentes, renovação curricular e outras formas de tratar esses
conteúdos nos livros são algumas necessidades imediatas. Na concepção desta
pesquisa não se pensou, por exemplo, no acompanhamento das aulas dos cursos
de Estatística I e II. Isso certamente será necessário, por exemplo, para acompanhar
as fases de preparação e teste de novos materiais didáticos.
Existem instrumentos para materializar todas essas ações necessárias,
desde a utilização de tecnologias com objetivos bem definidos às propostas
pedagógicas e de avaliação (que estão no referencial teórico deste trabalho e
provavelmente em outras obras às quais ainda não tivemos acesso). Porém, o
domínio do pensamento, das técnicas e da literacia estatística devem ter como
finalidade uma tríplice libertação, que se daria da seguinte forma: 1) sobre os
ombros do professor deixa de pesar as responsabilidades de juiz e fonte do saber;
2) o aluno fica livre das rotinas que não fazem mais sentido em uma época na qual
os instrumentos eletrônicos têm capacidade de processamento maior do que
189
equipes de calculistas profissionais possuíam há cerca de 50 anos atrás; 3) sobra
tempo para professor e aluno cumprirem o objetivo principal da sua presença na
escola, que é desenvolver conhecimento. Atividades investigativas e apelo à
realidade dos dados divulgados diariamente servem para aproximar ambos de
diferentes realidades.
O Engenheiro que sair desse ensino, a princípio, comunicar-se-ia melhor
com seus semelhantes utilizando diferentes meios, seria mais hábil na leitura,
escrita, comunicação oral e decodificação de mensagens visuais, livre de amarras
burocráticas e poderia ver o seu lugar na profissão e na sociedade. Essa abertura
intelectual também serviria para situar o outro não apenas como um dado, mas
como um semelhante a si mesmo. Para que a formação do Engenheiro ocorra da
forma aqui defendida, é necessário colocar o aluno diante de contextos diversos e
complexos para que ele aprenda a avaliar diferentes situações mediante a utilização
dos conteúdos estudados durante a graduação. De grande importância é aprender a
lidar com situações abertas, cujos padrões de resolução não foram previamente
estabelecidos.
O professor que atuou como pesquisador não terminou a pesquisa apenas
sabendo um pouco mais sobre uma Ciência, mas saiu consciente da necessidade de
mudar determinados panoramas de formação técnica. Sai na companhia de
pensadores com os quais entrou: pessoas do porte intelectual de Demo (2000 e
2006), Feyerabend (1991, 1996, 2001, 2007, 2010 e 2011) e Skovsmose (2001,
2007 e 208), que fizeram com que ele enxergasse as armadilhas e prisões que
podem estar ocultas em um discurso de progresso e liberdade.
O pesquisador ficou satisfeito, pois saiu de seu referencial teórico e
encontrou novos objetivos e perspectivas para o conhecimento. A orientação
recebida teve grande peso no processo. Não contou apenas a obra anterior da
orientadora, mas o elemento principal foi a sua capacidade de, no diálogo franco e
aberto, apresentar aspectos para os quais jamais pesquisador e professor havia
atentado. Se o fruto da pesquisa terá impacto sobre a aprendizagem de outra
pessoa, só o curso do tempo para sabê-lo.
190
Em todos os níveis de escolaridade é importante associar o conteúdo
técnico à realidade do estudante e os cursos de Engenharia costumeiramente não
cuidam da realidade fora do ambiente industrial, resultando profissionais que sabem
especialmente lidar muito com equipamentos e instalações. Porém, é o ser humano
que põe toda a estrutura em funcionamento e ele também deve ser foco de atenção.
O ideal seria a Educação não cumprir apenas a tarefa de tornar o indivíduo hábil
para manipular seus conceitos, desafiando-o sempre a romper o estágio de
conhecimento em que se encontra. O estudante de Engenharia necessita ser
constantemente estimulado a observar possíveis consequências de sua atuação e
isso seria um grande passo para que o Engenheiro de Produção, além de um
técnico qualificado, torne-se um cidadão atuante na sociedade.
191
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199
ANEXOS
ANEXO A - Plano de curso de Estatística I
200
201
202
ANEXO B - Plano de curso de Estatística II
Curso: ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
Unidade Curricular: ESTATÍSTICA II
Professor(es):
Período Letivo: 2013/2
Carga Horária: 45H
OBJETIVOS
Gerais:

Apresentar os conceitos fundamentais de Probabilidade e Estatística e suas aplicações em Engenharia.
Específicos:

Fazer cálculos que envolva a probabilidade de eventos.

Compreender o que é um processo aleatório e as informações que os cálculos de probabilidade transmitem.

Compreender os conceitos básicos de probabilidade e de distribuição de probabilidade.

Compreender os princípios básicos da amostragem e as técnicas para estimar o tamanho de uma amostra.

Conhecer as técnicas de formulação de hipótese e a verificação da significância dos testes.

Compreendera as técnicas e os testes de comparação de duas ou mais médias.
EMENTA
VARIÁVEIS ALEATÓRIAS, DISTRIBUIÇÃO BINOMIAL, DISTRIBUIÇÃO DE
POISSON, DISTRIBUIÇÃO NORMAL E DISTRIBUIÇÃO EXPONENCIAL.
AMOSTRAGEM, ESTIMAÇÃO DE PARÂMETROS, INTERVALO DE
CONFIANÇA, ESTIMATIVA DO TAMANHO DE UMA AMOSTRA, MARGEM DE
ERRO, TESTE DE HIPÓTESE E SIGNIFICÂNCIA, DISTRIBUIÇÃO T DE
STUDENT. COMPARAÇÃO DE DUAS MÉDIAS E TESTE DE HIPÓTESE PARA
DIFERENÇA DE DUAS MÉDIAS. ANÁLISE DE VARIÂNCIA.
PRÉ-REQUISITO
Estatística I
CONTEÚDOS
CARGA HORÁRIA
UNIDADE I: Variáveis aleatórias e distribuição de probabilidade
1.1. Definição de variável aleatória
1.2.Distribuição de probabilidade;
1.3.Valor esperado e variância de uma variável aleatória;
1.4.Distribuição binomial e distribuição de Poisson;
1.5.Variável aleatória continua;
1.6.Distribuição de probabilidade continuas;
1.7.Distribuição Normal;
1.8. Distribuição Exponencial;
1.9. p-value.
15
203
UNIDADE II: Técnicas de amostragem
2.1. População e amostra;
2.2. Tipos de amostragem;
2.3. Distribuição amostral dos estimadores;
10
2.4. Estimação por ponto e por intervalo;
2.5. Intervalo de confiança;
2.6. Estimativa do tamanho de uma amostra; Margem de erro.
UNIDADE III: Teste de hipótese e significância
3.1. Procedimentos básicos para realizar teste de hipótese;
3.2.Distribuição t de Student e teste de hipótese;
20
3.3.Teste de hipótese para diferença de duas médias;
3.4. Análise de variância;
ESTRATÉGIA DE APRENDIZAGEM

Aulas Expositivas Interativas.

Aplicação de listas de exercícios.

Uso de software.

Atendimento individualizado.
RECURSOS METODOLÓGICOS
São os recursos materiais utilizados como suporte ou complemento para o desenvolvimento do programa da
disciplina: quadro e marcadores; computador; projetor de multimídia; dvds; software.
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Critérios:
Será priorizada a produção discente, sobretudo a articulação entre o saber
estudado e a solução de problemas que a realidade apresenta. A avaliação
processual se dará durante as aulas em atividades propostas aos alunos de forma
individual ou em grupo.
Instrumentos:

Avaliação individual;

Trabalho em grupo.
Bibliografia Básica (títulos; periódicos etc.)
Título/Periódico
Autor
Ed.
Probabilidade: Aplicações à Estatística
Paul L. Meyer
2ª
Probabilidade e estatística para
engenharia e ciência
Estatística aplicada e Probabilidade
para engenheiros
Introdução à Estatística
Local
São Paulo
DEVORE, Jay L.
Editora
Ano
LTC
2000
Thomson
2006
MONTGOMERY, D.C.;
RUNGER G.C.
5ª.
Rio de Janeiro
LTC
2003
TRIOLA, Mario F.
11ª.
Rio de Janeiro
LTC
1999
Local
Editora
Ano
São Paulo
Makron
Books
1999
Bibliografia Complementar (títulos; periódicos etc.)
Título/Periódico
Estatística básica
Estatística para os cursos de:
economia, administração e ciência
contábeis. V. 2
Autor
Ed.
MORETIN, L.G.
SILVA; E.M et al.
1ª.
São Paulo
1977
204
ANEXO C - Lista de exercícios
205
206
207
ANEXO D - Prova
209
APÊNDICES
APÊNDICE A - Termo de consentimento livre e esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Declaro, por meio deste termo, que concordei em responder ao questionário, ser entrevistado (a) e
participar na pesquisa de campo referente ao projeto de pesquisa intitulado “A EDUCAÇÃO
ESTATÍSTICA DE FUTUROS ENGENHEIROS”, desenvolvido por Geraldo Bull da Silva Júnior.
Fui informado(a), ainda, de que a pesquisa é orientada pela Profa. Dra. Celi Aparecida Espasandin
Lopes, a quem poderei contatar/consultar a qualquer momento que julgar necessário através do
telefone nº 19 3869-5217 ou e-mail: [email protected].
Afirmo que aceitei participar por minha própria vontade, sem receber qualquer incentivo financeiro ou
ter qualquer ônus e com a finalidade exclusiva de colaborar para o sucesso da pesquisa. Fui
informado(a) dos objetivos estritamente acadêmicos do estudo, que, em linhas gerais é analisar o
processo de aprendizagem estatística de futuros engenheiros por meio do desenvolvimento de um
projeto investigativo utilizando Modelagem Matemática e os meios materiais disponíveis na
instituição, não implicando em qualquer transtorno ao andamento da disciplina em questão.
Minha colaboração se fará de forma anônima, por meio das informações expressas no questionário,
na entrevista semi-estruturada, autorização das imagens realizadas durante os encontros de
desenvolvimento do projeto e na apresentação pública do mesmo.
A colaboração de cada um se fará de forma anônima, por meio das informações expressas em
questionário, em entrevista semi-estruturada, em gravações, fotografias e/ou filmagem autorizada
pelos envolvidos. As imagens e gravações realizadas durante os encontros de desenvolvimento do
projeto preservarão a identidade de estudantes e da professora e o acesso e a análise dos dados
coletados se farão apenas pelo pesquisador e sua orientadora.
Autorizo a divulgação dos dados produzidos por meio de textos acadêmicos.
Cariacica, ES, ____ de _________________ de _______.
Assinatura do pesquisador: ______________________________________________________
Assinatura da testemunha: ______________________________________________________
210
Apêndice B - Questionário de perfil estudantil
Projeto de Pesquisa: “A EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA DE FUTUROS ENGENHEIROS”
Doutorando: Prof. Ms. Geraldo Bull da Silva Júnior
Orientadora: Profa. Dra. Celi Espasandin Lopes
QUESTIONÁRIO - PERFIL ESTUDANTIL
1) Nome:__________________________________________________________________
2) E-mail:___________________________
3) Data de Nascimento:____________
4) Semestre em que estuda:_______________
5) Você já fez outro curso superior? Qual? _________________________________
6) Você fez curso técnico? Qual?______________________________________
7) Você fez Ensino Médio regular ou EJA?________________________________
8) Você estudou Estatística durante o Ensino Médio? ________________
9) O que significa Estatística para você?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
10) RESPONDA OS ITENS A SEGUIR APENAS SE VOCÊ JÁ CURSOU A DISCIPLINA DE
ESTATÍSTICA EM ALGUM SEMESTRE NO PASSADO.
a) Como você avalia a disciplina de Estatística cursada anteriormente?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
b) Cite conhecimentos que ela lhe trouxe.
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
11) Você é capaz de diferenciar variável qualitativa de variável quantitativa? Se a resposta
foi sim, cite um exemplo de cada tipo de variável.
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
211
12) Você é capaz de diferenciar variável discreta de variável contínua? Se a resposta foi
sim, cite um exemplo de cada tipo de variável.
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
13) Dentre os modelos de gráficos que já foram trabalhados, quais você julga que melhor se
adaptam à descrição de variáveis qualitativas e melhor se adaptam à descrição de variáveis
quantitativas?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
14) Dentre os modelos de gráficos que já foram trabalhados, quais você julga que melhor se
adaptam à descrição de variáveis contínuas e melhor se adaptam à descrição de variáveis
discretas?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
15) Você saberia atribuir significados para a palavra variabilidade?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
16) Você considera que alguns usos da Estatística e da Matemática podem influenciar o
comportamento de setores da sociedade e de profissionais de diferentes áreas? Caso tenha
respondido sim, cite alguns aspectos sociais e profissionais que você percebe sofrer
influências?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
17) Você considera que alguns usos da Estatística e da Matemática podem contribuir para
reconhecer aspectos sociais e políticos da sua futura profissão? Caso tenha respondido sim,
que aspectos você gostaria de mencionar?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
18) Quais sugestões você teria para as aulas de Estatística?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
212
Apêndice C - Entrevista semiestruturada
ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA
Data:
Horário:
Local:
Tempo de duração:
Nome do entrevistado:
1) O que o(a) motivou a escolher o curso de Engenharia de Produção?
2) Nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia de
Produção constam diversas habilidades que devem desenvolvidas durante a formação do
engenheiro de produção:
- comunicar-se eficientemente nas formas escrita, oral e gráfica;
- atuar em equipes multidisciplinares;
- compreender e aplicar a ética e a responsabilidade da profissão;
- avaliar o impacto das atividades da engenharia no contexto social e ambiental.
Você vê possibilidades de ligações/conexões/relações entre a Estatística aprendida nas
aulas e as habilidades citadas?
Se sim: Quais são as ligações/conexões/relações que você vê?
Se não: Você pensa que o que aprendeu em Estatística (ou a forma como ela foi
desenvolvida) não permite a você estabelecer essas ligações/conexões/relações?
3) Um documento elaborado após diversas reuniões do grupo de trabalho da ABEPRO
(Associação Brasileira de Engenharia de Produção) para a graduação recomenda que o
formando tenha um perfil que inclui a capacidade de considerar aspectos humanos,
econômicos, sociais e ambientais, dentro de uma visão ética e humanística, atendendo às
demandas da sociedade.
Você vê possibilidades de utilizar os conteúdos de Estatística como instrumento para
identificar influências que os sistemas de produção exercem sobre o ambiente?
Se sim: Em relação à utilização de recursos escassos e ao destino final de resíduos e
rejeitos existe a necessidade de atentar para a exigência de sustentabilidade. Como o
seu conhecimento estatístico pode colaborar no estudo dessas situações?
Se não: Por que você se vê impossibilitado de perceber possibilidades de utilizar o
conhecimento estatístico na análise de situações descritas na pergunta?
4) O documento da ABEPRO citado na pergunta anterior vê a necessidade de:
- ter capacidade de identificar, modelar e resolver problemas;
213
- ter a compreensão dos problemas administrativos, socioeconômicos e do meio
ambiente;
- ter responsabilidade social e ambiental;
- “Pensar globalmente, agir localmente”;
Você poderia dizer se a Estatística pode ser ligada a essas habilidades?
Se sim: Como se dariam essas ligações?
Se não: Por que você pensa que essas habilidades não têm ligações com o conhecimento
estatístico? Por quê?
5) Você vê ligações entre o conteúdo de Estatística estudado, demandas sociais e
posicionamento político nos elementos citados nas perguntas anteriores (posicionamento
político, mas não partidário)?
6) Até o presente momento, em relação à sua formação em Engenharia de Produção, que
temas da Estatística foram mais significativos para você? Você pode explicar por que?
7) Você gostaria de acrescentar alguma coisa? Ou fazer comentários/considerações?
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