PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Instituto de Psicologia
DE AMÉLIA A CACHORRA:
A EXPRESSÃO DA IDENTIDADE FEMININA NO FUNK E O REFLEXO
DESTAS NA CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DE GÊNERO EM
ADOLESCENTES
Miriam Nogueira da Silva
Belo Horizonte
2009
Miriam Nogueira da Silva
DE AMÉLIA A CACHORRA:
A EXPRESSÃO DA IDENTIDADE FEMININA NAS LETRAS DE FUNK
E O REFLEXO DESTAS NA CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DE
GÊNERO EM ADOLESCENTES
Monografia apresentada ao Curso de
Psicologia da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais - Unidade São
Gabriel, como requisito à conclusão da
disciplina Orientação de Monografia II.
Orientadora: Luciana Kind
Belo Horizonte
2009
Ao meu marido e filhos, que
que aceitaram esse quinto
elemento chamado “monografia” em nossas vidas e me
amaram mesmo assim...
AGRADECIMENTOS
A Deus por ter me dado suporte para chegar até aqui, sendo minha família o
principal deles.
Aos jovens que participaram do grupo focal e da entrevista, contribuindo
enormemente com este trabalho.
Aos meus amigos que caminharam comigo esta longa jornada e que em
momento algum me deixaram desanimar. Agradeço especialmente á Lili, Lidi,
Paulinha, Ge, Ju(s), Léa, Carlos, Joel, Ana, Márcia, Lêle e Diogo e todos os meus
queridos amigos “doidos da psicologia”
Á orientadora, professora Luciana Kind, que com seu pulso forte me ajudou a
superar meus limites.
Aos amigos que fiz em todos os lugares que realizei estágios, curriculares ou
extra-curricilares:Cras Paulo VI, Mediação de Conflitos de Vespasiano, SOSF Centro
Sul, Muriqui Noroeste, Asspron.
A todos os profissionais que de alguma maneira contribuíram com a minha
formação e com a realização deste trabalho,
“O cenário não é agradável, mas mais desagradável
ainda é estar "alienado" da situação.”
Luana Carola
RESUMO
Esta monografia é fruto de um estudo que teve como principal objetivo compreender
como se dá a construção da identidade na adolescência, com foco em seus
desdobramentos na concepção que estes sujeitos têm de masculino e feminino,
homem e mulher, fatores relevantes que foram abordados neste trabalho, tendo
como ponto de partida a depreciação da mulher em letras de funk. Utilizou-se o
método qualitativo de pesquisa, buscando interpretar fenômenos em termos das
significações que as pessoas trazem para eles. Foi realizada uma pesquisa
bibliográfica de modo a permitir um conhecimento básico sobre a construção de
gênero e identidade na adolescência. Foi feita também uma revisão de literatura
sobre a história do funk no Brasil, bem como a história do movimento feminista e as
implicações de ambos na construção da identidade feminina. Foram coletados
dados empíricos sendo que, como técnica de coleta de dados utilizou-se o grupo
focal e para problematizar a questão da depreciação da mulher em letras de funk
selecionou-se três músicas do referido gênero musical, músicas estas que estão nas
paradas de sucesso atualmente.Utilizou-se também uma entrevista com uma
adolescente de 16 anos, que se declara apreciadora deste gênero musical, para
complementar algumas informações.
O grupo foi composto por adolescentes 12 de ambos os sexos, sendo 7 do sexo
masculino e 5 do sexo feminino,com idades entre 14 e 17 anos que já se reúnem
periodicamente por fazerem parte de um programa da Prefeitura de Belo Horizonte.
A forma de registro dos dados foi através de gravações durante a conversa no grupo
e posteriormente transcrição das fitas de áudio. A análise dos dados foi feita através
do método hermenêutica dialética.
Palavras-chave: adolescência, letras de funk e identidade feminina.
LISTA DEIGLAS
PEA - População Economicamente Ativa
CEBs -Comunidades Eclesiásticas de Base
CNDM - Conselhos Nacionais dos Direitos da Mulher
CRAS – Centro de Referencia da Assistência Social
LISTA DE FIGURAS
Quadro 1: Letras selecionadas ................................................................................. 31
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9
2 BREVE CONTEXTO DA HISTÓRIA DO FUNK NO BRASIL ................................ 13
3 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE GÊNERO EM ADOLESCENTES .......... 17
4 A IDENTIDADE DA MULHER AO LONGO DA HISTÓRIA ................................... 22
4.1 Contexto histórico do papel da mulher ....................................................... 23
4.2 Os movimentos feministas .......................................................................... 25
5 ANÁLISE DE DADOS ............................................................................................ 30
5.1 Análise das letras de funk............................................................................. 30
5.2 Análise do grupo focal e entrevista ............................................................. 34
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 40
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 42
APÊNDICE ................................................................................................................ 44
APÊNDICE A: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .......................... 44
APÊNDICE B: Direção para o grupo focal ......................................................... 46
APÊNDICE C: Entrevista individual ................................................................... 47
9
1 INTRODUÇÃO
No final do ano de 2007, uma reportagem chamou a atenção dos
espectadores: uma gravadora fora multada por divulgar uma música do gênero
musical funk, intitulada “Um tapinha não dói”, pois a mesma incitava a violência
contra a mulher. Pode-se interpretar que, de fato, uma música em que uma mulher
afirma que “um tapinha não dói” reforça o discurso machista presente em nossa
sociedade de que a mulher gosta de apanhar. Entretanto, essa não é a única música
desse gênero musical que traz mensagens depreciativas à imagem da mulher,
colocando-a, também, na posição de objeto sexual, sem levar em conta outras
vertentes da subjetividade feminina.
A ação foi ajuizada em 2003, por considerar que a música banaliza a violência
contra a mulher, transmite uma visão preconceituosa contra a imagem da mesma,
além de dividir as mulheres em boas ou más conforme sua conduta sexual. No
momento inicial da ação, o então procurador Regional dos Direitos do Cidadão
Paulo Gilberto Cogo Leivas afirmou que:
[...] esse tipo de música ofende não só a dignidade das mulheres que
comportam-se de acordo com o descrito em suas letras, mas toda e
qualquer mulher, por incentivar à violência, tornarem-na justificável e
reproduzirem o estigma de inferioridade ou subordinação em relação ao
1
homem. (Informação verbal)
Assim, esta pesquisa investigou expressões da identidade feminina presentes
nas letras de funk e o reflexo destas na constituição da identidade de gênero em
adolescentes. Teve como objetivos específicos: contextualizar o gênero musical funk
no Brasil; relacionar as conquistas do movimento feminista e a expressão que as
músicas de funk trazem sobre a identidade feminina, investigar a construção de
identidade de gênero em adolescentes e analisar as expressões da identidade
femininas contidas em letras de funk.
Para maior clareza, o funk, é um gênero musical bastante apreciado por
adolescentes e jovens e, segundo Dayrell (2002, p.1), “[...] os jovens vêm lançando
mão da dimensão simbólica como a principal e mais visível forma de comunicação...”
1
Notícia obtida em reportagem do Jornal Nacional da Rede Globo, exibido em 28/02/2007.
10
Para o Dayrell, o mundo da cultura é um espaço privilegiado de práticas
representações, símbolos e rituais, no qual os jovens buscam demarcar sua
identidade. Neste sentido, a música é uma atividade que muito os envolve e
mobiliza. Deste modo, o autor dialoga com Afonso (2001), que parte da concepção
que a adolescência é uma fase de negação e reafirmação, no qual retrabalha-se
constantemente sua identidade perante seu contexto sócio-cultural.
Com isso, buscou-se compreender como se dá a construção da identidade na
adolescência, bem como seus desdobramentos, na concepção que este tem de
masculino e feminino, homem e mulher. Acredita-se que este trabalho soma uma
discussão relevante aos estudos já desenvolvidos acerca desse tema.
Entender a relação dessa identificação musical com o modo do adolescente
pensar identidade de gênero é importante, uma vez que, a partir do imbricamento
realizado entre a música, adolescência e gênero, este trabalho pode contribuir para
uma construção teórica, envolvendo as três vertentes acerca da problemática
escolhida.
Esta pesquisa trará contribuições significativas para as práticas psicológicas,
com base na investigação de campo e poderá fornecer novos elemento para o
debate sobre preconceitos e identidade de gênero junto aos adolescentes,
ampliando canais de intervenções com esse público.
A importância deste trabalho para a pesquisadora deveu-se à sua condição
de educadora social que trabalha com adolescentes, como mãe de adolescente,
como psicóloga e principalmente como mulher, que a lança a certas inquietações
que
movem
esta
investigação.
Pretendeu-se,
através
da
construção
de
conhecimentos na referida pesquisa, construir novas formas de dialogar com jovens
e adolescentes acerca de identidade de gênero, preconceitos contra a mulher e o
papel das mulheres na contemporaneidade.
A metodologia utilizada foi a pesquisa qualitativa na qual, segundo Turato
(2003), os pesquisadores estudam as coisas em seu setting natural, buscando
interpretar fenômenos em termos das significações que as pessoas trazem para
eles.
Realizou-se, também, uma pesquisa bibliográfica de modo a permitir o
conhecimento básico sobre gênero e a construção da identidade na adolescência.
Foi feita, então, uma revisão de literatura sobre a história do funk no Brasil
11
relacionando-a com a história do movimento feminista e as implicações de ambos na
construção da identidade feminina.
Para fazer parte do corpus desta pesquisa, foram coletados dados empíricos
sendo que, como técnica de coleta de dados, foi utilizada o grupo focal assim
denominada. Para aprimorar a discussão acerca do papel das mulheres em letras de
funk, selecionou-se três letras afim de analisá-las à luz da técnica hermenêutica
dialética. Com o intuito de complementar alguns dados, realizou-se também uma
entrevista individual com uma adolescente de 16 anos.
Segundo Kind (2004), o grupo focal permite ao pesquisador dedicar-se a
interação grupal para produzir dados e insights e levar em conta os sentimentos e
pontos de vista individuais. Assim, o grupo focal conserva o caráter de técnica de
coleta de dados sendo adequado à investigação qualitativa.
Carlini-Cotrim (1996) fornece uma definição pertinente sobre grupo focal,
entendendo-o como um método que dá conta de captar diferentes percepções frente
a fatos, atitudes e práticas, contudo, não o considera adequado a estudar a
assiduidade com que tais comportamentos ou opiniões se dão.
Foram selecionados para fazer parte desta, 12 informantes sendo 7 do sexo
masculino e 5 do sexo feminino, com faixa etária entre 14 e 17 anos. Esses
informantes se reúnem periodicamente, num Centro de Referência da Assistência
Social (CRAS), situado no município de Belo Horizonte. A forma de registro dos
dados coletados se deu por meio de gravações durante a conversa com o grupo.
Daí foi apresentado aos mesmos algumas letras de funk, a fim de problematizar a
questão do papel da mulher nelas descritas.
A análise dos dados foi feita através da técnica de análise de dados se deu
através do método hermenêutico dialético, porque segundo Minayo (2000), enquanto
a hermenêutica busca embasamento no consenso, a dialética inseri o conflito e a
contradição como algo constante e que se explica na transformação.
Por tratar-se de uma pesquisa que envolveu seres humanos, foram seguidas
as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres
Humanos do Conselho Nacional de Saúde, Resolução 196/96, observando-se todas
as exigências descritas no referido documento (CNS, 1996). Os aspectos éticos se
pautaram também nas normas do Marco Legal (BRASIL, 2005). O documento
presume a preservação da autonomia do adolescente, garantido o respeito à
12
privacidade, a confidencialidade, ao direito de opinião e expressão consentimento
informado para a realização de qualquer intervenção.
A presente monografia está dividida em quatro capítulos. No primeiro,
apresentado na segunda seção, contextualiza-se brevemente a história do início do
gênero musical funk e sua trajetória no Brasil. No segundo, faz-se a relação entre as
conquistas do movimento feminista e a expressão que as músicas de funk trazem
sobre a identidade feminina. As análises das expressões da identidade femininas
contidas em letras de funk são apresentadas e discutidas nessa seção. O terceiro
capítulo discute a construção da identidade de gênero em adolescentes e suas
implicações na vida dos mesmos. O quarto capítulo, quinta seção do texto, recorre à
análise dos dados colhidos na entrevista e grupo focal.
13
2 BREVE CONTEXTO DA HISTÓRIA DO FUNK NO BRASIL
Este capítulo pretende sintetizar algumas informações sobre o surgimento do
gênero musical funk e sua trajetória no Brasil. É importante entender que este
gênero musical teve em sua origem a intenção de dar voz a uma minoria étnica e
não em reproduzir preconceitos como ocorre em algumas letras hoje.
A história do funk começa na África, nas décadas de 1930 e 1940, quando
grande parte da população negra migrava para os centros urbanos dos Estados
Unidos. Com a união dos ritmos soul, que vem a ser a união da música profana com
a música gospel (protestante negra) e o blues que é uma música de estilo mais rural,
nasceu o soul, cantadas por ícones como Elvis Presley, Ray Charles e James Brow.
Na década de 60, segundo Vianna (1997), este ritmo passou a ser um elemento
importante cuja intenção era constituir um ritmo que entoasse a luta pelos direitos
civis dos negros americanos.
Segundo Herschmann (2000), o termo funk, aparece nas décadas de 1960 e
1970, sendo considerado o símbolo de alegria, de orgulho negro, inclusive encarado
como uma vertente da cultura negra capaz de produzir uma música revolucionária,
dirigida para essa minoria étnica.
Mas apesar de serem produzidos por e para essa minoria étnica, o funk como
todos os estilos musicais, foram conquistando o sucesso de massa e os
articuladores dos bailes optaram por uma música mais dançante, alegre e não
necessariamente politizada. Ainda Vianna (1997) acrescenta que os militantes do
movimento negro não mais consideravam os bailes como espaço propício para a
“conscientização”, entendendo que as pessoas preferiam dançar a ouvir discursos
politizantes.
No Brasil, o funk tem seu início nos anos 1970, com os chamados “Bailes da
Pesada”, promovidos por Ademir Lemos e Big Boy, dois ícones do movimento funk
nesta época. Eles deram início às chamadas “equipes de som”, com o que havia de
mais moderno em parafernália eletrônica da época. Equipes de nomes sugestivos
como Revolução da Mente, Soul Grand Prix e Black Power, sempre pensando na
questão da militância negra. Segundo Vianna (1997), enquanto o público dançava,
slides contavam histórias de festivais de música negra norte-americana, além de
exibirem fotos de músicos e esportistas negros nacionais e internacionais. Além
14
disto, a cultura negra também era difundida através dos cabelos afros e frases
vinculadas à expressão “Black is beautiful”.
O funk causou um boom por todo o país, mas em algumas regiões o lado
político foi mais difundido, já em outras o lado “diversão” ganhou maior espaço. No
Rio de Janeiro, por exemplo, a mídia publicou inúmeras matérias com o foco nos
chamados “Black Rio”, os debates giravam sempre em torno do tema alienação e
colonialismo cultural, o movimento recebeu homenagens de nomes como Gilberto
Gil e o apoio de entidades ligadas ao movimento negro da época, como afirma
Vianna (1997).
Em Salvador, os bailes funk foram considerados como a concretização dos
sonhos de todos os ideólogos do movimento negro brasileiro, tamanho seu
engajamento com a propagação da cultura negra e em São Paulo, a mídia os
considerou como o “movimento da maior importância no processo da formação da
identidade negra no Brasil” (VIANNA,1997, p 29).
Na década de 80, o funk sofre a influência direta de um grupo americano
chamado Miami Bass, com batidas graves, mais rápidas e mais erotizadas. Vianna
(1997) afirma que a principal diferença entre esse novo estilo e os da época “Black
Rio”, é o desaparecimento da temática do orgulho negro, ao contrário, o funk passou
a ser relacionado com uma das praticas que marcaram a década, os temidos
arrastões. Nesta época a violência nos bailes chamava a atenção de todo Brasil,
sendo o funk diretamente ligado pela mídia aos arrastões ocorridos nas praias, nos
quais grupos de jovens brigavam entre si, enquanto simultaneamente roubavam os
pertences dos banhistas e aterrorizaram as principais cidades brasileiras como Rio
de Janeiro e São Paulo.
Com a forte repressão à violência dos bailes funk, esse gênero musical sofre
uma grande modificação e as músicas passam a ser cada vez mais erotizadas e
com coreografias sensuais aumentando o abuso da pornografia e do sexo.
A partir da década de 90, o baile funk tornou-se uma das poucas
oportunidades de lazer dos jovens de classe baixa e as letras de funk surgem como
uma forma de protestar contra as injustiças sociais sofridas por esta parcela da
população, por isso a violência, armas, drogas e criminalidade são temas facilmente
encontrados nas músicas deste gênero musical.
Vianna (1997) comenta que este movimento busca um reconhecimento social
que nunca foi dado aos negros e pobres, tanto do Brasil quanto nos Estados Unidos,
15
onde o movimento iniciou. Mas é necessário ter uma visão crítica da comercialização
sexista que este gênero musical assumiu. Ele passou de uma forma de militância
negra para um disseminador de idéias preconceituosas e discriminatórias com
relação à identidade feminina, principalmente junto a seu público fiel: os
adolescentes.
O funk nos dias atuais retrata uma mulher sempre muito liberada
sexualmente, sempre disponível para o desejo do homem, com palavras bastante
pejorativas, reproduzindo assim atitudes que mostram um preconceito social e
histórico. É preciso sim valorizar todas as formas de manifestação cultural, mas é
necessário também problematizar junto aos jovens as idéias que estão atravessadas
de representações de gênero, tornando-se um meio de perpetuar a manutenção dos
estereótipos e assimetrias de gênero.
A leitura de Vianna (1997) e Herschmann (2000) foi relevante para este
trabalho, no sentido de apontar que para além de uma importante manifestação
cultural bastante estigmatizada, o funk se apresenta muitas vezes como “espelho do
seu tempo”, ou seja, ele retrata as contradições sociais, os preconceitos velados ou
explícitos que permeiam essa sociedade.
Uma vez que os jovens estão lançando mão desta dimensão simbólica como
a mais visível forma de comunicação, os autores provocam os leitores a pensarem
se o que realmente incomoda nessa manifestação cultural são os “ecos” produzidos
dentro da própria sociedade.
Ao contrário do que acontece em outros países, no Brasil o preconceito é
extremamente velado. A frase “eu não tenho preconceito”, é um jargão bastante
difundido, até por ser politicamente correto, mas basta alguém deparar-se com um
negro que já o acha suspeito, com uma mulher ao volante que as piadas
automaticamente surgem, com uma pessoa mais obesa que os apelidos maldosos e
as risadinhas saltam aos lábios.
Como bem pontuou Azeredo (2007), em seu livro O preconceito contra “a
mulher”, parece absurdo falar de preconceito contra a mulher, uma vez que elas
estão por toda parte, inclusive é dentro do corpo de uma mulher que todos são
gerados.
Mas o preconceito contra a mulher existe e é preciso identificá-lo nas suas
variadas formas. De alguma maneira, a arte e a música podem se tornar um meio
disseminador de preconceitos, e como Smigay (1989), bem pontuou, é preciso “[...]
16
buscar uma ampla visão das relações de gênero para encontrar as teias de
opressão e discriminação da sociedade.” (SMIGAY, 1989, p. 12)
Na seção a seguir, discute-se as noções de identidade e construção de
identidade de gênero em adolescentes, para verificar as possíveis influências das
letras de música no comportamento e no pensar dos mesmos na identidade da
mulher.
17
3 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE GÊNERO EM ADOLESCENTES
Neste capítulo, trabalhou-se as noções de identidade e construção de
identidade de gênero em adolescentes, questão fundamental para a realização
desta pesquisa.
A adolescência se mostrou como um tema controverso, com múltiplas visões
e interpretações. Os autores pesquisados divergem quanto a sua discrição, mas
todos eles concordam que a adolescência é uma fase importante na construção do
sujeito e que ela se dá a partir do contexto histórico ao qual o jovem esta inserido.
A Organização Mundial de Saúde define adolescência como:
[...] uma fase de transição em que se dá (1) o desenvolvimento biológico da
infância até o amadurecimento sexual e reprodutivo, (2) o desenvolvimento
dos padrões cognitivos e emocionais da infância á idade adulta, respeitando
as particularidades culturais, e (3) o desenvolvimento sócio- econômico da
pessoa em direção á sua relativa independência material, no interior da
organização econômica de seu grupo. (OMS,1986, p.18).
O período comumente atribuído a adolescência situa-se entre 12 e 21 anos,
com variações devidas a fatores biológicos e culturais. Segundo Afonso (2001), aos
fatores biológicos, denomina-se puberdade ou pré-adolescência e estão ligadas às
mudanças
corporais
tais
como:
maturação
sexual,
mudanças
hormonais,
menstruação, ejaculação, dentre outras manifestações.
Fatores biológicos são fundamentais para se caracterizar a adolescência, mas
não se pode definir a duração e a dinâmica interna da adolescência sem levar em
conta o contexto sócio-cultural. Ainda Afonso (2001) acrescenta que é preciso
compreender que a identidade psicossocial na adolescência é o meio organizador a
partir do qual todos os outros estão associados.
Segundo Stengel (2003), é na adolescência que o indivíduo vivencia suas
primeiras experiências afetivas e caminha para a vida adulta, mas ela nem sempre
foi concebida como a conhecemos hoje, visto que a infância era reduzida ao período
em que a criança não podia bastar-se. A partir do momento que a mesma conseguia
algum desembaraço físico, já era posta junto aos adultos, transformando-se em
homem jovem, sem viver as etapas da juventude.
Até o final do século XVIII, a adolescência era confundida com a infância e até
mesmo o vocabulário empregado as duas fases não eram distintos. Seu surgimento
18
como idade autônoma ocorrerá após a Primeira Guerra Mundial e torna-se o foco
principal de ações educativas, políticas sociais e principalmente o mercado de bens
de consumo, como afirma Stengel (2003). Diferentemente do final do século XVIII,
hoje o que se observa é uma extensão da adolescência, empurrando a infância para
trás e a maturidade para frente e que esta descontinuidade grande entre a criança e
o adulto – tão característico da sociedade ocidental – causa grandes conflitos ao
adolescente.
Para melhor compreender a adolescência numa perspectiva psicossocial é
preciso entender também o processo de construção de identidade. Ciampa (2001,
p.56) discorre sobre a identidade “como um processo e não um produto, que não é
dada, mas vai sendo um contínuo processo de identificação”. Este processo de
construção de identidade é bastante complexo, configurando-a como contraditória,
múltipla e mutável, porém única, buscando um movimento de permanente
integração entre os vários papéis e dimensões vividos pelo sujeito na sociedade.
Stengel (2003) concorda com este autor ao defender que a identidade só
pode ser construída em referencia a um mundo em que o indivíduo esteja situado e
em suas interações sociais que se expressam em dois tipos de socialização, a
primária e a secundária.
Por meio da socialização primária, vivenciada na infância, o indivíduo torna-se
membro da sociedade. Os pais têm papel fundamental, pois são eles que
introduzem a criança na cultura. Esta socialização primária é a primeira de uma série
que virão e tem forte base afetiva, base esta que acompanhará a criança por toda
sua vida e atravessará os outros processos de identificação. A socialização primária
forma o que Stengel (2003) chamou de “base” para que a secundária seja
desenvolvida. A secundária introduzirá o individuo já socializado em outras
instâncias de socialização, como a escola, grupo religioso, amigos, trabalho, e assim
por diante.
Durante o processo de socialização, Stengel (2003) afirma que o individuo
incorpora valores e atitudes que podem estar em continuidade ou descontinuidade.
Em uma sociedade paradoxal e complexa como a vigente, o individuo recebe vários
conjuntos de valores e regras que podem diferir entre si, causando conflitos e
produzindo contradições. É por isso que um dos problemas fundamentais do
adolescente é a procura de sua identidade.
19
Calligaris (2000) corrobora esta percepção ao denominar a adolescência
como moratória, a partir da formulação de Erik Erikson. Segundo o autor, existe uma
fase em que há uns sujeitos capazes, instruídos e treinados pela escola, mídia e
comunidade para assumir papéis já “ensaiados” ao longo da vida, mas esta fase é
postergada, pois há uma parada entre o amadurecimento dos corpos e a
autorização para realizar esses valores. Este tempo de suspensão é a adolescência
Uma importante contribuição para pensar a adolescência neste trabalho, foi o
texto de Mayorga (2006). Em seu texto, a autora aponta que não é possível referirse á adolescência no seu aspecto geral e universal, visto que a diversidade de
vivências marca esse período de desenvolvimento.
Concordando com a posição da autora de se priorizar a compreensão do fato
da adolescência ser um fenômeno cultural produzido no encontro de duas linhas de
força: de um lado os adultos, com esta sociedade cada vez mais confusa de si e de
seus papéis sociais, do outro lado os adolescentes, criando estratégias para serem
reconhecidos, mesmo diante de todo seu repertório de esquisitices e desafios.
Mayorga (2006) apresenta as várias abordagens acerca do tema identidade e
observa que estas concepções pretenderam explicar de forma distinta, o fenômeno
da identidade. As orientações que mais se destacam são as biologicistas,
internalistas, fenomenológicas e narrativas. Nesta pesquisa optou-se em destacar a
perspectiva narrativa, pois nela enfatiza-se a importância da linguagem na
constituição de identidade. Através dessa orientação, pode-se interpretar quem
somos, assim gerar imagens de nós mesmos e dos outros e comunicá-las ao
contexto social. É importante compreender que a linguagem é um mecanismo que
possibilita a adaptação mútua de um ato social, exigindo de cada indivíduo na
relação que adote para si próprio, as atitudes do outro. É a partir da perspectiva
narrativa que este trabalho seguiu, por concordar que os processos de constituição
das identidades comportam conotações e valores sociais, contendo as marcas dos
processos sociais que as geram.
Pautada por uma perspectiva que também considera identidade como
construção social, Afonso (2001) contribuiu com este trabalho ao afirmar que na
adolescência a identidade é constantemente retrabalhada diante de seu contexto
sócio-cultural, levando os adolescentes a perceberem-se como parte desse
processo. A identidade de gênero combina “identidade” e “gênero”, e diz respeito ao
20
reconhecimento que uma pessoa tem de si mesma e de relações de gênero
instituídas. Em dialogo com a autora, entende-se gênero como:
[...] o conjunto de dispositivos, através dos quais uma sociedade transforma
a sexualidade biológica em produtos da atividade humana, como praticas,
símbolos, representações, normas e valores sociais, que as sociedades
elaboram a partir do relacionamento entre as pessoas (BARBIERI apud
AFONSO, 2001, p. 12).
A autora aponta que na adolescência há uma revisão das representações de
corpo, sexualidade, reprodução, masculino e feminino e que neste processo se
revisa não só as relações com as figuras parentais, mas também seu lugar no
sistema de gênero. A partir da percepção dos papéis desempenhados por homens e
mulheres, os jovens identificarão ou não com tais papéis. Meninas e meninos
poderão construir narrativas de si em continuidade e descontinuidade com o que o
valor social prescreve sobre o que é o masculino e o feminino.
Segundo a autora, a participação dos jovens no contexto sócio-cultural e sua
relação com as mudanças que aí ocorrem são de suma importância para entender o
processo de reconstrução da identidade de gênero na adolescência, principalmente
em uma sociedade que sofre constantes transformações nas relações de gênero e
sistema familiar.
Ela aponta também que os jovens precisam interiorizar valores sócio-culturais
a fim de questioná-los, aceitá-los ou rejeitá-los, para mostrarem-se capazes de
questionamentos e julgamentos, provando-se como adultos na sociedade. Esta
participação desses jovens tem se dado muitas vezes através das manifestações
culturais, como teatro, dança, mídia e música.
Dayrell (2002) relata que os jovens lançam mão da dimensão simbólica como
a principal forma de comunicação e expressam, através de comportamentos e
atitudes, suas posições diante de si mesmo e da sociedade. A música é uma das
atividades que mais os envolve e os mobiliza, por ser um produto cultural bastante
consumido. O autor alerta que se deve estar atento ás expressões juvenis, pois elas
podem ser a ponta do iceberg que torna visíveis as tensões e contradições da
sociedade em que vivemos.
O texto de Dayrell (2002) permite um diálogo com este trabalho, quando
considera pertinentes as críticas sobre a qualidade de certas letras de funk, o
machismo, a erotização publica exagerada, mas salienta que se deve levar em conta
21
que os jovens expõem na cena pública as contradições do tecido social e que as
musicas expressam o caldo de cultura em que estão inseridos e denunciam o
acesso que possuem aos bens simbólicos.
Assim, partindo desta compreensão que na próxima seção, trabalhou-se a
expressão que as músicas de funk trazem sobre a identidade feminina e o papel da
mulher ao longo da história, para perceber os avanços e retrocessos na constituição
da identidade feminina. Trabalhou-se, também, as conquistas dos movimentos
feministas, visto que, a partir deles é possível visualizar melhor muitas das
conquistas para as mulheres.
22
4 A IDENTIDADE DA MULHER AO LONGO DA HISTÓRIA
Neste capítulo, fez-se uma relação entre as conquistas do movimento
feminista e a expressão que as músicas de funk trazem sobre a identidade feminina.
Pretendeu-se também analisar as expressões da identidade feminina contidas em
letras de funk.
A crescente entrada das mulheres na vida pública e a aquisição dos direitos
civis e políticos teve, com certeza, grandes impactos na representação do feminino,
mas não a ponto de eliminar o preconceito contra a mulher. Ao observarmos os
outdoors, folhearmos as revistas, assistirmos televisão ou prestarmos atenção às
letras das músicas, a forma de retratar a mulher nos meios de comunicação em
massa, nas artes, continua reproduzindo os modelos arquetípicos da mãe e da
prostituta, daquela que “é para casar” e das “cachorras”.
Com bem pontuou Azeredo (2007), a dicotomia mulher santa/puta, define as
mulheres sempre em função do homem, fazendo com que as mulheres ainda sejam
percebidas fundamentalmente como “corpo”, em um mundo em que o discurso é
masculino, em uma sociedade falocêntrica.
Com isso, é possível perceber que houve muitos progressos na aquisição de
cidadania e na autopercepção da mulher, mas existem também fortes visões
tradicionais no que se refere a gênero, que demonstram ainda uma grande
dominação patriarcal. Dentre os progressos podemos destacar uma maior
participação política e cultural – ainda que não esteja no patamar do ideal – mas
muito já se conquistou, com nomes como Roseana Sarney, Benedita da Silva, Marta
Suplicy na política e Zezé Mota, Camila Pitanga e Taís Araújo na cultura.
Para entender melhor esses progressos, discutiu-se um pouco como tem sido
construído o papel do feminino ao longo da história, seu “adestramento”, suas
conquistas, principalmente com os movimentos feministas, processo bastante
relevante de ressignificação do lugar da mulher na sociedade.
23
4.1 Contexto histórico do papel da mulher
“Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é...”
Miguel de Cervantes
Desde os tempos do Brasil colônia, as relações de poder estão instauradas
em variadas instâncias de poder: poder financeiro, poder nas relações de gênero,
dentre outros tantos. Já nesta época, a mulher tem seu lugar definido por vários
fatores que conferem a ela uma situação específica na sociedade que se formava
como bem ilustra Del Priore (1995).
Segundo a autora, à mulher do período colonial cabia apenas resignar-se ao
papel que lhe era imposto pelo Estado e principalmente pela religião. Adestrar a
mulher fazia parte do processo civilizatório no Brasil, domesticando-a no sentido de
torná-la responsável pela casa, a família, o casamento e a procriação, na figura da
“santa – mãezinha”.
Este adestramento, segundo Del Prior (1995) se dava através de um discurso
moralizador agindo nos padrões de comportamento das mulheres, através de
sermões dominicais, assim sendo, a mentalidade colonial foi sendo lentamente
penetrada por este tipo de discurso.
O caráter “domador” era tamanho nesta época, que serviu para a fabricação
de estereótipos, por exemplo, o da santa e da puta, da que é pra “casar” e da que é
pra “aproveitar”, da inteligente e da burra e outros bastante utilizados naquela época
e que refletiam nas relações entre os sexos e até mesmo entre as próprias
mulheres.
Neste período, não havia solidariedade nem mesmo entre as mulheres,
corroborando o que Azeredo (2007) aponta como um dos aspectos mais cruéis do
preconceito, que é a naturalização e a identificação com as idéias que o produzem e
perpetuam, por parte tanto dos opressores como dos oprimidos por tal forma de
preconceito. Azeredo (2007) afirma ainda que a partir do momento em que a mulher
não consegue criticar essas idéias preconceituosas, antes pelo contrário, a
entendem como natural é que se dá esse aspecto cruel do preconceito.
Retornando a Del Priore, (1995), ainda no período colonial, a Igreja era a
instituição que possuía grande monopólio ideológico e ditava regras a respeito do
cotidiano das pessoas dentro dos preceitos religiosos, exercendo severa vigilância
24
doutrinal e de costumes através da confissão, sermão e pelas devassas da
Inquisição e por uma mentalidade androcêntrica.
Desta forma, a Igreja acabou por estimular as relações de dominação entre
homens e mulheres, incentivando as mesmas a comportar-se de forma obediente e
submissa a seus maridos.
Da mesma forma, a medicina aliou-se a igreja no que se refere a constituição
de famílias sacramentadas e com o aval da religião.Ocupou-se em disciplinar as
mulheres para o ato da procriação, atestando que a para a mulher estar dentro da
“normalidade”, o corpo feminino deveria estar esvaziado de prazeres físicos.
Naquele período, a realização feminina se dava apenas no papel de mãe atendendo
assim ao projeto fisiológico-moral dos médicos e á perspectiva sacramental da
Igreja, conforme Del Priore (1995).
A historiadora atesta perceber que na veneração á mulher, ao mesmo tempo
o medo masculino contrabalanceavam-se ao longo das transformações sociais. Em
alguns momentos a mulher era vista como atraente e sedutora, já em outros, era
vista como impuro devido ás suas secreções, cheiros e sucos.
A insaciabilidade sexual também era um dos piores “adjetivos” que um ser
humano poderia possuir, e a mulher era estigmatizada como sendo a juíza da
sexualidade masculina, “[...] seu sexo assemelhava-se a uma voragem, a um
redemoinho a sugar desejos e fraquezas humanas..” (DEL PRIORE, 1995 p. 35)
Causa de horror e fascínio, a mulher precisava a todo custo ser adestrada,
pois, seria impossível para o homem conviver com tal perigo. E esse adestramento
ocorreu ao longo de muitos anos, através de governos, religiões, normas sociais.
No decorrer da história, muitas mulheres tiveram suas vidas e trajetórias
marcadas por uma sociedade conservadora e castradora. Muitas mudanças culturais
e sociais ocorreram e o modo essencial de ver a mulher foi alterado. Como bem
pontuou Azeredo (2007), a mudança do sentido da palavra “mulher” se dá de forma
lenta, pois, ocorre sempre por meio das relações de poder.
Uma das armas na luta por direitos e a igualdade feminina foram os
movimentos feministas, cujo objetivo era livrar as mulheres de toda e qualquer forma
de opressão.
Na discussão que se segue, trabalhou-se um pouco a trajetória desses
movimentos tão importantes na luta pelos direitos da mulher.
25
4.2 Os movimentos feministas
Carolina Marra (2005), em sua dissertação de mestrado defendida na
PUC/SP, afirma que a principal tendência do movimento feminista é por “fim á
opressão das mulheres e nos pressupostos de inferioridade e submissão das
mesmas” (MARRA, 2005, p 40), além de lutar pela ampliação dos papéis femininos
na sociedade.
“O movimento feminista nasceu no século XIX, como um movimento social
tradicional e hierárquico de maneira piramidal” (MARRA, 2005, p. 40). A autora
aponta que, no século XVIII, a participação das mulheres foi fundamental na
conquista de direitos, porém pouco reconhecido formalmente, visto que as mulheres
não eram consideradas cidadãs.
Na Revolução Francesa, as mulheres tiveram participação fundamental, mas
foram esquecidas logo após a entrada dos revolucionários no poder, inclusive sendo
consideradas inferiores aos homens no que diz respeito á razão, devendo portanto
ser subordinadas aos mesmos.
Segundo Marra (2005), no decorrer da revolução Americana, novamente as
mulheres mostraram sua força e capacidade, mas como naquela época seu principal
papel social era o de mãe, educadora e formadora de filhos e apenas estes eram
considerados cidadãos, mais uma vez lhes foram negados direitos fundamentais.
No início do século XIX a polaridade entre homens e mulheres é tão
marcante, “que a incapacidade feminina era vista como natural, bem como a
autoridade masculina, o que justificava toda e qualquer discriminação” (MARRA,
2005, p 41). Tanto que a mulher não era sequer mencionada nas constituições da
época e mais uma vez, desconsideradas enquanto cidadãs. Já no final do século, as
mulheres passaram a lutar pelo direito de votar e serem votadas, em um movimento
que ficou conhecido como sufragista, movimento ao qual, segundo Marra (2005), o
Brasil também aderiu. A autora relata também que em 1932, um novo código
legitima o direito á mulher votar e também ser votada e que esta luta política foi
considerada a porta de entrada para a luta de direitos mais amplos.
Outra corrente do feminismo, representada por operárias e intelectuais de
esquerda, buscava um caminho diferente na luta pelos direitos da mulher. Para
estas, as conquistas pelos direitos femininos se dariam a partir das diferenças,
26
mesmo entre aqueles que conviviam em estado de opressão. A discussão iniciada
com esta corrente do feminismo vem sendo debatida até os dias de hoje.
Os textos de Marra (2005), Azeredo (2007) e Scott (2005) convergem no
sentido de apontar que é na afirmação das diferenças que se abrirão caminho para a
igualdade. Para as autoras, não estamos falando de uma entidade homogênea
chamada mulher, mas de uma multiplicidade de relações. Scott (2005) afirma que há
posições que “tomam a igualdade para significar simplesmente a presumida
igualdade perante lei”. (SCOTT, 2005, p.13)
Smigay (1989), em seu artigo “Mulheres (re)partidas e excluídas”, cita Maria
Célia Paoli, afirmando que ao se colocar "a questão do direito à diferença como
recusa a se dissolver em um tipo único e genérico de oprimido" evidenciou-se a
"extrema heterogeneidade da sociedade brasileira e, por conseqüência, a
diversidade das formas concretas de dominação que se criam a recriam no interior
das formas de exploração vigentes” (PAOLI, apud Smigay 1989, p.11).
Retornando a trajetória do movimento feminista com o trabalho de Marra
(2005), em meados de 1949, é fundada a “Federação das Mulheres do Brasil”, com
o foco nas lutas nos bairros e problemas locais, o que colocava as mulheres como
colaboradoras das grandes causas sociais da época.
A partir dos anos 60, o movimento feminista, segundo Marra (2005) passou a
organizar-se de forma distinta, como um movimento múltiplo que abrangia várias
frentes, articulando-se e formando redes com grande poder de mobilização.
Já em 1970, no Brasil, um "novo movimento feminista" surgiu. Souza, Baldwin
& Rosa (2000) afirmam que foi em meados dos anos 70 que as mulheres de classe
média e de nível universitário juntamente com as pobres e sem educação,
organizaram movimentos para que suas exigências políticas feministas fossem
introduzidas no sistema político brasileiro.
Souza, Baldwin & Rosa (2000) acrescentam, ainda, que naquela época, três
fatores influenciam na conjuntura histórica: política, economia e religião. No contexto
político, com a ditadura militar em declínio, em 1975, durante a presidência de
Ernesto Geisel, houve maior abertura e liberdade ao movimento político, com as
feministas dando seu apoio a oposição. Também as forças políticas estrangeiras
tiveram grande impacto sobre o movimento das mulheres, enquanto que as Nações
Unidas, lutando contra a desigualdade entre os sexos, apoiou o Dia Internacional da
27
Mulher e o ano 1975, é considerado como o ano do nascimento do movimento
moderno das mulheres no Brasil.
No
contexto
econômico,
a
participação
feminina
na
População
Economicamente Ativa (PEA) incluir na lista de siglas brasileira aumentou de 18,5%
para 26,9%. O número de mulheres em profissões de alto prestígio como
engenheiras, economistas, médicas, professoras universitárias e advogadas
cresceram aproximadamente 400% nessa década, de 19.000 em 1970 para 95.800
em 1980. Em 1980, já havia praticamente o mesmo número de homens e mulheres
brasileiros nas universidades (689.000 homens e 663.000 mulheres), conforme
Souza, Baldwin & Rosa (2000).
Com relação à religião, os autores afirmam que a Igreja Católica, até então,
sempre esteve ao lado das elites, mas tomou uma nova posição no Brasil por volta
de 1970, com a Teologia da Libertação dando apoio social aos oprimidos. Eles
formaram grupos comunitários, chamados Comunidades Eclesiásticas de Base, ou
CEBs incluir na lista de siglas que freqüentemente dedicavam-se à ação social ou
política. Estes grupos freqüentemente eram liderados por mulheres, além das
religiões afro-brasileiras que forneceram força libertadora para as mulheres,
especialmente entre as pobres, oferecendo-lhes modelos de papéis positivos (por
exemplo, mãe-de-santo), compensando a falta de poder que elas vivenciavam na
sociedade
A partir da década de 1980, o movimento tomou outros rumos, sendo dividido
em grupos temáticos, tendo a saúde e violência como principais temas de
discussão. Muitos grupos aliaram-se á partidos políticos, causando divisão e
dissolução de muitos deles. Marra (2005) acrescenta que no inicio doa anos 80, em
vários estados do Brasil, foram criados os Conselhos Nacionais dos Direitos da
Mulher (CNDM).
A criação destes conselhos foi controversa e polêmica dentro do movimento.
Uma parte das feministas acreditava ser importante o reconhecimento do Estado a
reivindicação das mulheres, outras, porém, achavam importante a autonomia do
grupo frente aos governos.
Marra citando Esmeraldo & Said (2002), afirma que apesar das dificuldades
enfrentadas pelos conselhos, um importante avanço alcançado foi a articulação
entre parlamentares constituintes, movimento de mulheres e a sociedade em geral
na campanha da constituinte no final de 1987 e inicio de 1988.(MARRA,2005,p.45)
28
Esta articulação foi fundamental para criação da chamada “bancada feminina” na
eleição da constituinte e apesar das eleitas não estarem todas diretamente ligadas
ao movimento feminista, mesmo assim conquistaram a apresentação de 30
emendas com o foco em conquistas do movimento feminista.
A partir dos anos 90, o movimento feminista sofreu uma fragmentação, e
desmobilização. Houve criticas ferrenhas que o classificaram como “paralisado e
morto”. Apesar disto, na década de 1990 aconteceram importantes conquistas, como
a conhecida “Convenção de Belém do Pará”, encontro em que se discutiu o
enfrentamento á violência contra a mulher dentre outras ações.
Marra (2005) nos relata que nesta época ocorreu em Beijing, na China, a “IV
Conferencia Mundial da Mulher”, onde se começou a articular as formas de reerguer
o movimento das mulheres, mas principalmente porque foi neste evento, onde se
reuniram mais de 40 mil pessoas em torno do tema direitos humanos e igualdade
nas relações de gênero.
Ainda segundo a autora, o século XX ficou conhecido como o “Século das
mulheres”, pois, várias foram as conquistas em setores diversos e grandes
modificações no sentido da emancipação feminina.
Hoje várias políticas públicas estão em funcionamento em diversos âmbitos
da sociedade. Muitas foram as conquistas das mulheres dentre o direito a existir
enquanto cidadãs e isto implica em mudanças nas relações de gênero, abrindo
possibilidades de se pensar em um mundo diferente onde homens e mulheres são
percebidos como iguais, como afirma Marra (1995).
Apesar de todas as inegáveis conquistas alcançadas, o preconceito e a
discriminação contra a mulher têm variadas faces e muitas vezes não mais se
apresentam de forma direta, mas de forma sutil, com um quê de “irreverência”,
porém tão destrutivo e tendencioso quanto nos séculos passados.
A linguagem como já discutido anteriormente neste trabalho, é uma forma de
se interpretar quem somos e de gerar imagens de si e dos outros, segundo Mayorga
(2006), mas é também um mecanismo de ação de preconceitos. Azeredo (2007)
aborda essa questão de forma brilhante, ao referir-se ao insulto. Segundo a autora,
em determinados momentos a linguagem pode agir contra os sujeitos, afirmando-se
na teoria que alega que a linguagem reproduz sujeitos. A autora cita Butler para
marcar a seguinte afirmação: “[...] essa constituição do sujeito através da linguagem
numa estrutura social que dicotomiza a mulher e que dá força à interpretação e ao
29
discurso e produz a dor” (BULTER apud AZEVEDO, 2007.p. 33)
Azeredo (2007) discute ainda o fato de que tanto a linguagem como a
questão do corpo serem percebidas como sendo “naturais”, construídas de forma
independente, portanto, sem escapatória quanto a materialidade do corpo, nem a
realidade da língua.
A autora argumenta, porém, que ao contrário disto, a materialidade é
construída e tem o sujeito como seu agente. O não reconhecimento desta agência é
o que produz o preconceito, colocando a linguagem como algo que já é dado,
independente do sujeito, cabendo a este apenas aceitá-lo.
Ao pesquisar algumas letras de funk, percebeu-se que em algumas delas
aparece claramente a depreciação e a inferioridade da figura da mulher. Nessas
músicas e essas práticas, se tornam naturalizadas e acabam sendo reproduzidas no
senso comum entre seus ouvintes.
Neste sentido, no capitulo a seguir, foi realizada a análise de dados,
buscando perceber expressões da identidade feminina apresentadas nestas letras e
se elas influenciam de algum modo a forma do adolescente–público fiel deste
gênero musical–ver, pensar e ser mulher.
30
5 ANÁLISE DE DADOS
Nesta seção, realizou-se a análise de dados, com a técnica hermenêutica
dialética, dividindo esse procedimento em duas etapas: uma para analisar as letras
de funk, bem como as possíveis formas de apresentação da identidade feminina
nelas contidas, e uma segunda para analisar a os dados colhidos no grupo focal e
na entrevista individual realizado com adolescentes.
Esta divisão se fez necessária devido à complexidade dos dados, apesar de
ambas servirem para o mesmo propósito, que é pesquisar as expressões da
identidade feminina nas letras de funk e averiguar se há um reflexo destas na
constituição da identidade de gênero em adolescentes.
5.1 Análise das letras de funk
Foram selecionadas três letras do gênero musical funk, que falam da mulher
em tom jocoso ou de forma preconceituosa. A escolha das mesmas se deu pelo fato
de estarem nas paradas de sucesso, ou seja, são músicas conhecidas e que
agradam ao público que gosta deste tipo de música.
Quadro 1: Letras selecionadas
Músicas
Fiel x Amante
Agora Eu Sou
Piranha
Piriguete
Cantor(a)
A Gaiola das Popozudas
A Gaiola das Popozudas
Mc Papo
Estereótipo identificado
Dicotomia entre a “santa-puta”
Declaradamente semvergonha
Interesseira
Fonte: Dados da pesquisa
A música intitulada Fiel x Amante, de autoria não divulgada, é cantada por um
grupo de mulheres que se denominam “funkeiras”. O grupo em questão é chamado
de “A gaiola das popozudas” e é composto por 3 mulheres que cantam suas
canções embaladas por coreografias sensuais.
É uma letra bastante conhecida e apreciada no meio funk.Trata-se de uma
espécie de “repente” entre duas mulheres, uma denominada ”a fiel” e a outra de “a
31
amante”. No decorrer da música, uma ofende a outra e ao mesmo tempo apresenta
seus atributos que a fazem merecer o amor de um homem disputado por ambas.
O diálogo que se segue na referida letra, é permite um diálogo claro com que
pontuou Azeredo (2007), onde a autora fala sobre a dicotomia mulher santa / puta,
que além de estimular a competição entre as mulheres, representa o tripé do padrão
no qual se assenta o preconceito contra a mulher, conforme discussão apresentada
no segundo capítulo. A autora cita Chauí, para corroborar sua opinião sobre o tema
em questão:
[...] a presença - ausência do elemento masculino determina o jogo dos
conflitos fundamentais que tendem à violência – desde a competição mãe e
filha, sogra- nora, esposa- a ”outra”, pelo mesmo amor...o curioso, porém, é
que o homem pareça ser o objeto dos conflitos e das violências quando é
efetivamente o sujeito delas[...] (CHAUÍ apud AZEVEDO,2007,p 24)
Na disputa de ambas pelo mesmo homem há um reforço no discurso de uma
sociedade falocêntrica, na qual a referência é o homem, pai, provedor, viril, que não
se contenta apenas com sua esposa e não contém o próprio desejo sexual. Se este
é o tipo de homem que é valorizado, a mulher para merecê-lo deve se adequar ao
seu padrão, ou seja, mais uma vez o parâmetro para o comportamento da mulher é
o homem.
No caso da letra em questão, observa-se também um diferencial interessante,
visto que, como já foi dito, o que se é valorizado é o papel da “puta” e não da
“santa”, como observado na seguinte seqüência da letra:
“Sou safada, sou cachorra e também sou sem vergonha, mas ele te deixa em
casa e me leva pro Verona.”(GAIOLA DAS POPOZUDAS, 2008)
Esse dado pode se apresentar como um avanço no sentido de valorizar a
mulher que vive sua sexualidade independente das convenções sociais. Contudo, é
preciso perceber a serviço de quem este tipo de mentalidade beneficia.
Será que ao valorizar extremamente o papel de “puta”, a mulher não está
apenas reafirmando o discurso machista que percebe a mulher apenas como corpo,
tentando fixá-la à sua sexualidade? Neste caso, não seria mais oportuno, como
sugeriu Azeredo (2007), buscar sair do lugar em que procuram prender a mulher
para assegurar sua diferença?
Outro fator que se apresenta é a negação do papel da mulher enquanto
“rainha do lar”. Neste caso, segundo Del Priore (1995), a amante deixa claro sua
32
superioridade ao se apresentar para o homem como uma mulher sensual, desejável
e não como dona de casa, fugindo do estereótipo imposto para as mulheres desde o
período colonial, quando as mesmas eram adestradas para tornarem-se apenas
responsáveis pela casa e a família.
O trecho da letra da música, abaixo, retrata bem a visão da mulher que não
quer ser mais “Amélia”.
“Ô fiel, recalcada, o melhor é ser amante enquanto eu como seu marido tu se
acaba lá no tanque, lava, passa e cozinha, faz tudo direitinho, e só pra te deixar
bolada eu to comendo seu marido...” (GAIOLA DAS POPOZUDAS, 2008)
Como discutido anteriormente, a luta para a mulher sair da condição de
“Amélia” foi bastante ferrenha. Suas conquistas alcançadas com muita luta e
posicionamento político de mulheres que não se conformaram com o papel a elas
relegado pela sociedade machista.
Mas a questão que novamente se apresenta é que quando a mulher se
submete ao papel de objeto sexual, como é o caso da amante neste contexto, ela
não está novamente se deixando “adestrar”, uma vez que novamente ela está
respondendo ao lugar imposto a ela pela sociedade?
A música “Agora eu sou piranha”, também cantada pelo grupo de mulheres “A
Gaiola das Popozudas”, traz novamente uma contradição no conteúdo da letra, pois
neste caso, ao invés da mulher sofrer o insulto e ser chamada de “piranha”, ela o
produz, toma para si própria esse rótulo.
É fato que a sexualidade da mulher era antes negligenciada e mesmo
negada, mas, uma questão importante neste trabalho foi pensar se é um avanço
para a representação do papel feminino, a mulher ser vista com um apetite sexual
exacerbado, insaciável, sempre disponível para saciar o desejo do homem.
É preciso perceber se este excesso que se observa nestas letras não é tão
pernicioso quanto a negação, por mais uma vez colocar a mulher como objeto, visto
que em nenhum momento nesta letra vê-se a mulher dizendo de si enquanto sujeito.
Essa percepção dialoga com Smigay (1989) quando afirma que em alguns
casos,o projeto ideal não parte da própria pessoa ou de sua própria vivência, mas da
necessidade de se constituir como objeto ideal do desejo dos outros
“Eu queria andar na linha tu não me deu valor, agora eu sento, soco, soco,
faço até filme pornô” (GAIOLA DAS POPOZUDAS, 2008)
33
Outro atravessador presente nas letras de funk é a relação de poder.
Concordando com Azeredo (2007), quando se discutiu acerca da relação de poder.
Neste trecho da letra, o poder que o homem exerce sobre a mulher é tamanho, que
é ele quem determina se a mesma vai “andar na linha” ou fazer “filme pornô”, ou
seja, mesmo na falsa liberdade de escolha que esta mulher tem, ela está capturada
pelo desejo do homem.
“Quando ela me vê, ela mexe, piri, piri, piri, piriguete....De mini-saia rodada,
blusa rosinha, decote enfeitado, com um monte de purpurina, ela não paga cortesia,
foge se sua carteira tiver vazia” (MC PAPO, 2008)
Este refrão é cantado em todas as rádios populares, bares, festas, reuniões
de amigos, etc. A letra intitulada Piriguete, cantada por um jovem que se intitula Mc
Papo, é uma das mais populares entre os jovens e virou um conhecido jargão entre
eles, quando se pretende denominar o comportamento da mulher que é interesseira,
que não é a prostituta que vende seu corpo por dinheiro, mas que se vende por
favores e privilégios.
Nesta letra não há palavras de baixo calão como em algumas letras de funk,
mas ela reproduz outra forma preconceituosa de ver a mulher. Ela conta a história
do tipo de mulher que faz do seu corpo seu “material” de trabalho, mas deixa claro
que não se trata da prostituta profissional.
“... desfila pela nigth de short curtinho, 1572 de marido ela gosta é de cara
comprometido..ela não é amante, não é prostituta, ela é fiel, ela é substituta” (MC
PAPO, 2008)
A palavra “piriguete” não se encontra nos dicionários de língua portuguesa,
mas está disseminada no discurso de vários jovens de várias classes de várias
regiões do país.
Como dito anteriormente, a “piriguete”, é vista como a mulher que usa seu
corpo para conseguir privilégios. Nesta letra percebe-se mais uma vez que a mulher
é vista apenas como corpo.
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a
pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: (BRASIL,
2005, p.)
2
34
A mulher deste contexto vê em seus atributos físicos uma forma de tirar
vantagem, novamente a mulher se resume a seu sexo, como pontuou Azeredo
(2007), citando Foucault.
5.2 Análise do grupo focal e entrevista
Os sujeitos que participaram do grupo focal, são adolescentes na faixa dos 14
a 17 anos, que vivem na periferia de Belo Horizonte. Eles fazem parte de um
programa
da
Prefeitura
Municipal
de
Belo
Horizonte,
onde
se
reúnem
periodicamente e lhes são oferecidas oficinas de esporte, lazer e cultura. Ao
contrário da imagem geralmente associada aos jovens pobres de periferia,
geralmente associados à violência e à criminalidade, estes jovens têm buscado
outras possibilidades para si, participando ativamente de tudo que lhes é oferecido
através do referido programa.
No decorrer da entrevista, os jovens se mostraram bastante abertos ao
diálogo, respondendo às questões apresentadas e contribuindo de forma
espontânea aos questionamentos, característica bastante peculiar deste público
específico.
Foi-lhes apresentada a proposta da pesquisa, bem como seus objetivos. Após
o momento inicial do grupo focal, foram expostas as 3 letras de músicas já
analisadas neste trabalho para fomentar a discussão.
Os dados coletados não constituem de forma alguma como verdade absoluta,
até porque, há um limite na amostragem observada, mas considera-se que traduz
ainda que de forma restrita, um pouco do que se pretende responder às questões
deste trabalho.
Em complemento ao grupo focal, entrevistou-se uma adolescente de 16 anos
do sexo feminino. Também moradora de um bairro de periferia, ela se declara uma
apreciadora do gênero musical funk.
Uma das primeiras questões levantadas em ambas as técnicas de coleta foi
se os adolescentes gostavam deste gênero musical. A esta questão, a maioria
respondeu que sim, principalmente da batida, ou seja, do ritmo, da adrenalina e
energia que a música traz. Isto ocorre provavelmente por tratar-se de um gênero
35
musical dançante, que tem em suas batidas musicais um ritmo quente e sensual,
que faz com que as pessoas se envolvem no ritmo e não levem em conta o
conteúdo das letras.
Além do mais, observou-se que a dança também é importante neste gênero
musical. Conforme as colocações de Vianna (1997), hoje além das letras, as
coreografias sensuais são a marca registrada do funk, levando milhares de jovens a
dançar freneticamente em passos ritmados e geralmente bem ensaiados.
“Eu adooorooo (risos), tudo... eu gosto de tudo, mas eu gosto
mesmo é do som, da batida, das coreografias... tem umas que são meia
indecentes (sic), mas eu gosto (risos)” (J.C.S 16 anos sexo femininoentrevista individual)
3
Poucos foram os sujeitos que responderam não gostar deste gênero musical,
demonstrando que pelo menos neste grupo, este gênero musical é praticamente
uma unanimidade no gosto dos adolescentes. Isso é um dado bastante relevante,
uma vez que comprova que de fato há uma aceitação marcante por parte dos jovens
com relação a essas músicas.
Como ponto negativo, observou-se pouca crítica por parte dos jovens com
relação ao conteúdo das músicas. A maioria não se mostrou incomodada ou
constrangida com o conteúdo das letras. Isso pode ser entendido como uma
naturalização da depreciação e a inferioridade da figura da mulher, tão comumente
disseminada no discurso de uma sociedade patriarcal e que perpassa por várias
gerações.
Esta foi uma característica deste grupo em especial, pois, na revisão
bibliográfica, conforme discussão com Afonso (2001) sobre esta questão, o
adolescente também questiona, aceita ou rejeita os valores sócio-culturais.
Dados da entrevista. Pesquisa realizada juntos aos jovens que participam do programa da prefeitura
de Belo Horizonte. Para garantir o sigilo das identidades dos informantes optamos pelas siglas em
caixa-alta.
3
36
No grupo pesquisado, os poucos que se manifestaram contra, foram
adolescentes do sexo feminino, que alegaram “sentir vergonha”, e criticaram o fato
das mulheres estarem sendo “xingadas e não se incomodarem com isso”,
demonstrando que de alguma forma, estas músicas trazem um sentimento de insulto
as essas adolescentes e como pontuou Azeredo (2007), muitas vezes, o insulto dói
mais que um tapa.
“ Essas letras tão detonando as mulheres, só fala em comer..comer..comer,
mulher não é só vagabunda não...” (B.C.M. 17 anos sexo feminino grupo
focal)
“...e as mulher (sic) acham que ta abafando..os caras chingando elas todas
e elas lá, dançando..” ( A.L.S. 15 anos sexo feminino grupo focal)
Dois adolescentes do sexo masculino se mostraram contrários à forma como
a mulher é representada nas letras de funk, por motivos um tanto diferente.
Um por defender o funk mais “politizado”, aquele funk apresentado por Vianna
(2007) como sendo a voz da minoria étnica, que busca através da música, da arte,
expressar seu desejo de reconhecimento social. Segundo este adolescente, ele não
concorda com a disseminação do tipo de funk “erotizado”.
Mas igual eu falo, o funk não é só essas porcarias não. O funk é revolução
também daí isso é bom pros jovens. É porque essas músicas “paias”,
marcam o funk como tudo ruim, mas não é.Tem funk consciente também.
4
(M.J.S. 17 anos, sexo masculino grupo focal)
Segundo outro integrante do grupo focal o que o incomoda é o fato de
perceber que nas letras há uma generalização da mulher, ou seja, é como se todos
fossem postas no mesmo “balaio”. Ele pontua que tanto sua mãe e irmãs são
mulheres, e que não lhe agradaria vê-las sendo chamadas de nomes depreciativos.
“... só sei que mulher tem que ser respeitada.porque minha mãe é mulher,
minha irmã..se falar desse jeito com elas eu não vou gostar..” (C.E.S. 16
anos, sexo masculino grupo focal)
Dados da entrevista. Pesquisa realizada juntos aos jovens que participam do programa da prefeitura
de Belo Horizonte. Para garantir o sigilo das identidades dos informantes optamos pelas siglas em
caixa-alta.
4
37
Um questionamento feito aos jovens entrevistados, perguntou-se se eles
acham que as letras das músicas apresentadas influenciam a forma deles
verem/pensarem a mulher. Sobre esta questão houve divergências, visto que uns
discordaram outros concordaram que exista influência das músicas na forma de
pensar a mulher. Os argumentos para ambas as opiniões foram bem elaborados:
“Só pra quem tem cabeça fraca, tipo Maria vai com as outras, tá
ligado? Porque a gente convive com mulher, a gente sabe que nem todas
são assim...” (D.B.S.17 anos, sexo masculino grupo focal)
[...] influencia sim, sabe porquê? Porque ó, igual novela, todo mundo copia
as roupas, os cabelos, então a música também.....depois que saiu a música,
toda mão a gente chama os outros do que fala na música (J.C.S 16 anos
sexo feminino- entrevista individual)
Conforme a discussão apresentada, os adolescentes não apenas reproduzem
o que se vê na sociedade, há uma reavaliação de certos valores, mas é preciso
haver parâmetros sólidos para que essa reavaliação ocorra, visto que, não são
apenas eles com suas inquietações e dúvidas peculiares da sua fase de vida que se
deixam influenciar por mitos, modismos, ditos populares. Fato é que a própria
sociedade usa desses mecanismos para disseminar seus pensamentos, sejam eles
discriminatórios ou não e a música pode ser apenas uma forma delas.
Mas outro ponto interessante levantado a partir da análise de dados, foi a fala
de uma adolescente que diz concordar que realmente há mulheres do tipo
representado pelas letras de funk. Em seu depoimento, a jovem afirma que se está
nas letras é por que tem mulheres realmente assim. Interessante dizer que foi
também desta jovem que se obteve uma dura crítica a forma como o tema “sexo” é
diferentemente abordado por homens e mulheres.
A fala a seguir se deu a partir do comentário de um jovem que criticava
certas músicas em que mulheres depreciavam a si próprias:
mas eu acho que mulheres também pode falar besteira, falar de sexo, não é
só homem não... mulher também transa uai, ela tem direito de cantar
falando disso também. Tem muitas músicas de homem falando que “comeu”
um tanto de mulher, que fez e aconteceu e todo mundo gosta. Daí vem uma
mulher e fala que “deu” pra um e pra outro e não pode?” (J.C.S. 16 anos,
sexo feminino grupo focal)
38
Esta fala é a síntese da liberdade de expressão sexual tanto almejada pelas
mulheres ao longo da história. Mostra indícios de mudança na discursividade sobre
a mulher e também uma quebra na expectativa de que essas músicas fossem
repudiadas, tornando–se inclusive um questionamento direto á pesquisadora.
Os jovens também foram questionados, se faz diferença quando quem canta
músicas depreciativas com relação à mulher é homem ou é mulher. Alguns disseram
que muitas vezes o homem é menos depreciativo que a mulher. Segundo a opinião
de alguns adolescentes: “mulher quando pega pra falar mal de outra mulher é pra
detonar mesmo”5.
Este dado corrobora a discussão levantada por Azeredo (2007), ao constatar
que o preconceito é reproduzido por opressores, mas muitas vezes também pelos
oprimidos. A autora pretende com esta afirmação lembrar que opressores e
oprimidos vivem juntos, na mesma sociedade, por isto não estão “imunes” às
contradições, pensamentos que são constantemente disseminados na sociedade. É
preciso, porém, ter senso crítico com relação á que tipo de influência está se
submetendo.
Reitero que estes dados representam uma pequena amostragem de
adolescentes, não sendo, portanto suficientes para concluir de forma definitiva
acerca da questão levantada por este trabalho. Porém, com relação ao que foi
possível pesquisar, a conclusão a que se pôde chegar é que não só os
adolescentes, mas a sociedade é também influenciada pela música, mídia e arte.
O som eletrizante, as batidas bem marcadas, as coreografias sensuais são o que
mais os atraem neste gênero musical, tornando alguns adolescentes um tanto
alienados com o conteúdo das letras e com as mensagens que elas transmitem.
Este é um dado alarmante, pois, isso pode significar que através deste estilo de
música tão apreciado pelos jovens, o preconceito tenha encontrado uma forma sutil
de se disseminar.
Sendo a construção da identidade um relevante aspecto psicossocial da
adolescência, é fundamental que dessa construção surja sujeitos mais críticos,
menos preconceituosos, não só com relação à situação da mulher, mas com todas
as minorias.
5
Dados da entrevista.
39
Um dado que não foi pesquisado neste trabalho, mas que também se
manifesta em várias letras deste gênero musical é a questão racial. Em muitas letras
em que um perfil de mulher é retratado como o ideal, esse perfil é sempre da mulher
branca. Nestas letras a mulher negra é retratada de forma extremamente pejorativa,
sendo tratada de “canhão, fogão, macaca” e tantos outros adjetivos que hoje, fora
deste contexto são considerados crime de racismo, mas que são totalmente
tolerados dentro do contexto cultural/musical. E um dado interessante é que a
maioria dos adeptos deste gênero musical são negros, evidenciando mais uma vez
que a base da produção do preconceito é exatamente seu aspecto alienante de
assujeitamento.
A principal conclusão deste trabalho é que a luta contra qualquer forma de
preconceito precisa ser diária e quanto mais cedo o sujeito se deparar com essas
questões, espera-se que menos chance ele tenha de se contaminar por elas.
O adolescente precisa de alguma forma ser despertado para questões
fundamentais como preconceito, cidadania, relações de gênero, relações raciais,
relações de classe, para que as mudanças sociais aconteçam de forma mais rápida
e abrangente.
40
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O principal objetivo a que se propôs esse trabalho foi pesquisar a identidade
feminina nas letras de funk e o reflexo destas na constituição da identidade de
gênero em adolescentes. Este objetivo foi alcançado, uma vez que com a coleta de
dados pôde-se concluir que existe uma certa uma influência na forma como o
adolescente vê a mulher a partir das letras de funk, mas não só o adolescente e sim
a sociedade é influenciada pela mídia, seja através de música, novela, arte e etc.,
não só com relação à questão da mulher, mas com várias outras questões sociais.
As hipóteses levantadas eram que existe alguma influência devido ao fato dos
adolescentes estarem em fase de construção da sua própria identidade, sendo
assim, a identidade de gênero estaria de alguma forma também sendo construída e
essa construção se dá a partir do que se vê, se ouve, se percebe em seu contexto
histórico. Essa hipótese se confirmou, a partir dos depoimentos de alguns
adolescentes.
Algumas limitações foram encontradas nesta pesquisa. A tríade música,
adolescência e mulher á princípio pareceu ser de fácil entrelaçamento, mas ao longo
do trabalho a peculiaridade de cada categoria trouxe certa dificuldade de articulação,
mas que ao final trouxe um resultado satisfatório, apesar de que algumas
discussões poderiam ter sido melhor aprofundadas.
Contudo as inquietações provocadas pelo desafio de construir este trabalho
acadêmico auxiliaram na formação da pesquisadora e a despeito das possíveis
lacunas teórico-conceituais que possam existir, as discussões contribuíram para
rever conhecimentos construídos ao longo da formação.
Buscar uma certa imparcialidade com relação ás músicas estudadas e vê-las
como um canal de diálogo com o adolescente, foi um desafio nesta pesquisa.Porém,
percebeu-se que a partir da discussão das letras de funk entre os adolescentes, esta
pode ser uma boa estratégia de ação entre eles, uma vez que a linguagem é muito
próxima e acessível a este público e os mesmos se sentiram á vontade para dar
opiniões e fazer comentários.
Uma das limitações vividas no processo de pesquisa foi de cunho pessoal.
Falar de identidade e principalmente de gênero se tornou um grande desafio para
mim, que sem me dar conta, ao estudar e falar de mulher deparei-me com questões
41
da minha própria identidade, questões estas que se tornaram ao mesmo tempo
dificultadores e facilitadores do processo de construção deste trabalho.
Como contribuição para o campo da psicologia social, bem como para outras
áreas do saber, entende-se que esta pesquisa tem méritos no sentido de apontar
mais uma possibilidade de trabalhar temas tão importantes e fundamentais, falando
a linguagem do adolescente que é a música. Não só o tema mulher, tão explorado
nas letras de funk, mas outras questões como drogas, violência, sexo, são temas
sempre presentes neste gênero musical e usar este ponto positivo a serviço da
discussão, do diálogo pode ser bastante proveitoso.
Durante a pesquisa, alguns temas foram apontados, mas devido ao recorte
necessário para a pesquisa não puderam ser trabalhados, mas que merecem ser
explorados em outro momento.
Dentre estes temas, apontou-se há alguma relação entre as coreografias,
cada vez mais sensuais, que muitas vezes simulam e incentivam o ato sexual,
contribuem de alguma forma para o fato de jovens iniciarem sua vida sexual de
forma precocemente. É claro que este não é o único fator, há toda uma questão
social atravessada nesta discussão, mas isso apareceu e de alguma forma pode ser
melhor estudado.
Apontou-se também a questão da mudança na forma de pensar do jovem que
participa de grupos de convivência, que estimulam o pensamento crítico e
contribuem com atividades culturais. Segundo alguns jovens pesquisados, há
mudança de comportamento de jovens que participam desses referidos grupos.
Necessário se faz trabalhar melhor esse tema em outras propostas de pesquisa.
42
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VIANNA, Hermano – O mundo funk carioca - Rio de Janeiro, J.Zahar,1997
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APÊNDICE
APÊNDICE A: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título do Projeto: A expressão da identidade feminina no funk e o reflexo destas na
constituição da identidade de gênero de adolescentes
Pesquisador: Miriam Nogueira da Silva
Orientadora: Luciana Kind
1) Introdução
Você está sendo convidado(a) a participar da pesquisa “A expressão da identidade
feminina no funk e o reflexo destas na constituição da identidade de gênero de
adolescentes”, sob responsabilidade de Miriam Nogueira da Silva, pesquisadora
principal do trabalho sob orientação da Profª Luciana Kind. Esta pesquisa está sendo
desenvolvida como Projeto de pesquisa apresentado ao Curso de Psicologia da
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Unidade São Gabriel, como
requisito à conclusão da disciplina Orientação de Monografia II. Sua colaboração é
fundamental para o desenvolvimento da pesquisa, entretanto, não é obrigatória. A
participação neste estudo é voluntária e a qualquer momento você pode desistir de
participar e retirar seu consentimento.
Objetivo
O objetivo deste estudo é conhecer o reflexo da expressão da identidade feminina
no funk na constituição da identidade de gênero de adolescentes.
Procedimentos do Estudo
Você será solicitado a participar de um grupo focal, no qual serão analisadas,
algumas letras de funk e abertas umas discussões sobre o conteúdo das mesmas.A
condução do grupo será gravada e transcrita posteriormente. As informações
registradas servirão para que eu, enquanto pesquisadora possa verificar o reflexo da
expressão da identidade feminina no funk na constituição da identidade de gênero
de adolescentes.
Caráter Confidencial dos Registros
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As informações obtidas a partir de sua participação neste estudo serão mantidas
estritamente confidenciais. Somente a pesquisadora principal e a orientadora da
pesquisa terão acesso aos registros da condução do grupo focal. Entretanto, você
não será identificado quando o material de seu registro for utilizado, seja para
propósitos de publicação científica ou educativa. Os registros escritos ficarão sob a
responsabilidade do pesquisador e serão utilizados apenas para as finalidades da
pesquisa - serão destruídos posteriormente.
Participação
Sua participação nesta pesquisa consistirá em discutir a respeito de algumas letras
de funk.
Para obter informações adicionais
Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone do pesquisador
principal, e da orientadora da pesquisa, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e
sua participação, agora ou a qualquer momento.
Declaração de Consentimento:
Li as informações contidas neste documento antes de assinar este termo de
consentimento. Declaro que tive tempo suficiente para ler e entender as informações
acima. Declaro também que toda linguagem técnica utilizada na descrição desta
pesquisa foi satisfatoriamente explicada e que recebi respostas para todas as
minhas dúvidas.
Tendo garantido, como adolescente, meus direitos ao consentimento informado, de
acordo com o Marco Legal (Brasil, 2005), dou meu consentimento de livre e
espontânea vontade e sem reservas para participar como entrevistado desse
estudo.
Belo Horizonte, ___ de ___________ de 2008.
_____________________________________
(Nome completo do Adolescente e telefone de contato)
____________________
Assinatura
46
APÊNDICE B: Direção para o grupo focal
DIREÇÃO PARA O GRUPO FOCAL
Eu quero saber primeiro quem gosta de funk? Quem gosta, do que que gosta
e quem não gosta, do que que não gosta
E a mulher desse funk mais “pesado”? Essa mulher é real ou é só um
personagem? Quando vocês ouvem essas músicas vocês identificam alguém
assim?
Eu quero pedir um favor para vocês. Vamos dividir o grupo em dois, eu
selecionei algumas músicas. Como o meu tema é sobre o papel da mulher, então eu
gostaria que vocês que vocês fizessem um retrato dessa mulher das letras. Não se
preocupem com julgamento de valor, não tem certo nem errado, eu quero saber da
opinião de vocês: A mulher das letras de funk é real? Vocês concordam com a forma
que ela é apresentada?
47
APÊNDICE C: Entrevista individual
ENTREVISTA INDIVIDUAL
O que é o funk para você?
O que você conhece sobre o funk?
Na sua opinião, como a mulher é retratada nas músicas de funk?
Você conhece mulheres que se parecem com as que são mostradas nas letras de
funk?
Você acha que há diferença quando são homens falando de mulher ou quando é
mulher mesmo falando de mulher nas letras de funk?
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