OS EFEITOS ATRIBUÍDOS AOS EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL A
PARTIR DA EDIÇÃO DA LEI Nº 11.382/06
Cristiano Xavier Bayne
Procurador do Estado do Rio Grande do Sul
1. Introdução.
O Código de Processo Civil sofreu uma profunda reformulação em seu Livro II
– Processo de Execução – especialmente após a edição da Lei nº 11.382/06, cujas
alterações foram proporcionadas com a intenção de conferir maior agilidade ao
processo, a partir da modernização dos meios para a obtenção do crédito.
Consoante aponta Jaqueline Mielke Silva, a Lei n° 11.382/06 tenta implantar o
princípio da duração do processo dentro de um prazo razoável, previsto no art. 5°,
LXXVIII da Constituição Federal, estabelecendo mecanismos que vão ao encontro
com esse ideal.1
Entre as mudanças, destacam-se a possibilidade de averbação da execução no
álbum imobiliário; a penhora eletrônica de ativos financeiros; a adjudicação direta do
bem penhorado pelo exeqüente; a alienação por iniciativa particular; a atribuição de
efeito suspensivo aos embargos de devedor apenas em casos excepcionais, entre
outras.
O presente ensaio terá por objeto avaliar se a norma contida no art. 739-A do
Código de Processo Civil, inserida pela Lei nº 11.382/06, que retirou o efeito
suspensivo ipso facto dos embargos de devedor, trouxe reflexos nos embargos à
execução fiscal.
1
SILVA, Jaqueline Mielke. A nova execução de títulos executivos extrajudiciais: As alterações a Lei 11.382/06. Porto
Alegre: Verbo Jurídico, 2008, p. 32.
1
2. O tratamento dispensado pela Lei nº 6.830/80 aos embargos de devedor.
Inicialmente, deve ser destacado que a Lei nº 6.830/80 aborda de maneira
muito superficial o procedimento dos embargos de devedor, limitando-se a destinar
três artigos para tratar especificamente sobre o tema, a saber, arts. 16, 17 e 20, que
assim rezam:
“Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias,
contados:
I - do depósito;
II - da juntada da prova da fiança bancária;
III - da intimação da penhora.
§ 1º - Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a
execução.
§ 2º - No prazo dos embargos, o executado deverá alegar toda matéria útil à
defesa, requerer provas e juntar aos autos os documentos e rol de
testemunhas, até três, ou, a critério do juiz, até o dobro desse limite.
§ 3º - Não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo
as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria
preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos.”
“Art. 17 - Recebidos os embargos, o Juiz mandará intimar a Fazenda, para
impugná-los no prazo de 30 (trinta) dias, designando, em seguida, audiência
de instrução e julgamento.
Parágrafo Único - Não se realizará audiência, se os embargos versarem sobre
matéria de direito, ou, sendo de direito e de fato, a prova for exclusivamente
documental, caso em que o Juiz proferirá a sentença no prazo de 30 (trinta)
dias.”
2
“Art. 20 - Na execução por carta, os embargos do executado serão oferecidos
no Juízo deprecado, que os remeterá ao Juízo deprecante, para instrução e
julgamento.”
Como se observa, o caput do art. 16 trata do prazo para oposição de embargos,
enquanto seus incisos dispõem sobre os três termos iniciais de contagem. Por sua vez,
o § 1º estabelece o pressuposto de admissibilidade dos embargos, qual seja, a garantia
do juízo. Ainda, os §§ 2º e 3º tratam da produção de provas e da limitação da matéria
a ser discutida nos embargos à execução fiscal.
Ao seu tempo, o art. 17 trata do prazo para impugnação dos embargos de
devedor pela Fazenda Pública, enquanto o art. 20 versa sobre os embargos a serem
opostos nas execuções fiscais processadas por carta precatória.
Então, qualquer outra matéria afeta ao procedimento dos embargos é regulada
subsidiariamente pelo Código de Processo Civil, ex vi do disposto no art. 1º da Lei nº
6.830/80, que assim dispõe:
“Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será
regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.”
Portanto, de acordo com o art. 1º acima transcrito, o Código de Processo Civil
terá aplicação na parte que não for tratada pela norma especial, razão pela qual se
pode afirmar que, nesses casos, qualquer alteração provocada no diploma processual
acarretará reflexos na Lei de Execuções Fiscais.
No caso em análise, pois, as alterações provocadas no procedimento dos
embargos de devedor, em decorrência da Lei nº 11.382/06, deverão ser aplicadas
também nos embargos à execução fiscal, exceto na parte devidamente regulada na
Lei de Execuções Fiscais, especialmente nos seus arts. 16, 17 e 20.
3
3. Breve exame das principais alterações promovidas no procedimento dos
embargos de devedor, na redação dada pela Lei nº 11.382/06.
No Título III do Livro II do Código de Processo Civil, importantes alterações
foram levadas a cabo pela Lei nº 11.382/06, passando-se a destacar, neste momento,
as principais.
Agora, para a oposição dos embargos de devedor regulado pelo Código de
Processo Civil, não se mostra mais necessária a garantia do juízo, uma vez que seu
art. 736 aduz que os embargos serão opostos independentemente de penhora, depósito
ou caução.
De outro lado, a partir da edição da Lei nº 11.382/06, restou alterado o prazo
para oposição de embargos do devedor, de 10 (dez) para 15 (quinze) dias, cujo termo
inicial passou a ser a data da juntada aos autos do mandado de citação, nos termos do
caput do art. 738.
Aliás, com as últimas alterações, a petição inicial dos embargos de devedor
deverá vir acompanhada das cópias das peças relevantes do processo de execução,
conforme previsto no parágrafo único do art. 736.
Uma das principais inovações do Código de Processo Civil foi a retirada do
efeito suspensivo ipso facto dos embargos como regra geral, a partir da inclusão do
art. 739-A, com a seguinte redação:
“Art. 739-A. Os embargos do executado não terão efeito suspensivo.
§ 1° O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo
aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento
da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil
ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por
penhora, depósito ou caução suficientes.
4
§ 2° A decisão relativa aos efeitos dos embargos poderá, a requerimento da
parte, ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão
fundamentada, cessando as circunstâncias que a motivaram.
§ 3° Quando o efeito suspensivo atribuído aos embargos disser respeito
apenas a parte do objeto da execução, essa prosseguirá quanto à parte
restante.
§ 4° A concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos
executados não suspenderá a execução contra os que não embargaram,
quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente ao
embargante.
§ 5° Quando o excesso de execução for fundamento dos embargos, o
embargante deverá declarar na petição inicial o valor que entende correto,
apresentando memória do cálculo, sob pena de rejeição liminar dos
embargos ou de não conhecimento desse fundamento.
§ 6° A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de
penhora e de avaliação dos bens. “
Com efeito, consoante previsto no art. 739-A, os embargos à execução não
terão mais efeito suspensivo, exceto se presentes os seguintes elementos: (a)
requerimento prévio do embargante, (b) execução garantida por penhora, depósito ou
caução suficientes, (c) presunção do bom direito e (d) perigo de dano irreparável.
Outra inovação foi a exigência de apontamento do valor incontroverso quando
o fundamento dos embargos for o excesso de execução, sob pena de rejeição liminar
dos embargos ou de não conhecimento desse fundamento, de acordo com o § 5º do
art. 739-A do CPC.
Restou majorado, também, o prazo para impugnação dos embargos, passando
de 10 (dez) para 15 (quinze) dias.
5
Finalmente, o art. 745-A autorizou o parcelamento do crédito em execução, na
hipótese do devedor, no prazo para oposição dos embargos, reconhecer o crédito
exeqüendo e comprovar o depósito de 30% de seu valor, cujo saldo remanescente
poderá ser quitado em até seis parcelas mensais.
4. Algumas alterações inaplicáveis aos embargos à execução fiscal.
Conforme restou salientado no capítulo 2, o Código de Processo Civil somente
pode ser aplicado nos executivos fiscais na parte em que restar silente a Lei nº
6.830/80.
Assim, fica fácil identificar quais os novos dispositivos do Código de Processo
Civil que não terão aplicabilidade nos executivos fiscais, pois sempre que a Lei n°
6.830/80 tratar expressamente da matéria, não será possível a utilização subsidiária
do diploma processual.
De plano pode-se anotar que, como a LEF exige a prévia garantia do juízo para
fins de oposição de embargos à execução fiscal, inviável se mostra a aplicação do art.
736 do CPC.
Da mesma forma, o termo inicial para oposição dos embargos na execução
fiscal continua sendo o depósito, a juntada da prova da fiança bancária ou a intimação
da penhora, ex vi dos incisos do art. 16 da Lei de Execuções Fiscais, não tendo
aplicabilidade, portanto, o disposto no art. 738 do Código de Processo Civil.
Aqui, deve ser destacado que o art. 738, I, do CPC não estava sendo aplicado
aos executivos fiscais desde a redação conferida pela Lei nº 8.953/94, uma vez que o
diploma processual empregava como termo inicial a juntada aos autos da prova da
intimação da penhora, enquanto a norma especial iniciava a contagem do prazo com a
intimação do executado da realização da penhora.
6
Nesse sentido firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, consoante
se infere do seguinte julgado:
“PROCESSUAL
CIVIL.
EXECUÇÃO
FISCAL.
EMBARGOS
DO
DEVEDOR. PRAZO. TERMO INICIAL. INTIMAÇÃO DA PENHORA.
PRECEDENTES. DISSÍDIO PRETORIANO. COTEJO ANALÍTICO.
AUSÊNCIA.
1. O prazo de 30 (trinta) dias para oposição de embargos do devedor, na
execução fiscal, inicia-se da intimação pessoal da penhora, e não da juntada
aos autos do respectivo mandado, devendo constar expressamente deste a
advertência do prazo para o oferecimento dos aludidos embargos à execução.
2. Não se conhece da alegada divergência jurisprudencial nas hipóteses em
que o recorrente, desatendendo ao disposto nos arts. 541, parágrafo único, do
CPC e 255, § 2º, do RISTJ, não realiza o necessário cotejo analítico, que
demonstraria a existência ou não de similitude fática entre os acórdãos
confrontados, pressuposto para a configuração do dissídio pretoriano
viabilizador do recurso especial.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido.”2
O mesmo ocorre em relação ao prazo para oposição dos embargos à execução
fiscal, que se mantém em 30 (trinta) dias, restando inviabilizada a aplicação do prazo
constante do art. 738, caput, do CPC, haja vista o expresso tratamento dispensado à
matéria por meio do art. 16, caput, da Lei de Execuções Fiscais.
Igualmente, o prazo para impugnação dos embargos opostos nas execuções
fiscais continua sendo aquele previsto no art. 17 da Lei nº 6.830/80 – trinta dias – não
tendo repercussão a alteração contida no art. 740 do Código de Processo Civil.
2
STJ, 2ª Turma, Resp 445550/DF, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Julgamento 18/05/2006, DJ
01.08.2006.
7
5. A aplicação subsidiária do art. 739-A do Código de Processo Civil,
incluído pela Lei nº 11.382/06.
Examinando a Lei de Execuções Fiscais, infere-se que em nenhum momento
ela trata do efeito atribuível aos embargos de devedor, razão pela qual era aplicado
subsidiariamente o disposto no art. 739, § 1º, do Código de Processo Civil, que
concedia a atribuição de efeito suspensivo no momento do recebimento dos
embargos.
Importante anotar que o processualista Luiz Rodrigues Wambier, ao examinar
o efeito atribuível aos embargos de devedor opostos nas execuções fiscais, quando
ainda em vigor o art. 739, § 1º, do CPC, teceu o seguinte comentário:
“A oposição de embargos suspende a execução, embora isso não esteja
expresso na lei especial, mas decorra do texto do art. 739, § 1.º, do CPC, que
se aplica subsidiariamente.”3
Então, partindo do pressuposto que somente era agregado efeito suspensivo aos
embargos opostos à execução fiscal em decorrência da aplicação subsidiária do
Código de Processo Civil, resta evidente que a alteração do diploma processual, no
que diz respeito à retirada do efeito suspensivo automático, deverá repercutir também
nas execuções fiscais.
Sustentar o contrário equivale a defender a aplicação subsidiária do Código de
Processo Civil somente para beneficiar o executado, não valendo a mesma regra na
hipótese do emprego subsidiário proporcionar prejuízo ao contribuinte, o que se
mostra sem fundamento jurídico.
Por outro norte, faz-se mister anotar que não prospera a tese defendida por
aqueles que sustentam a previsão implícita da atribuição de efeito suspensivo aos
3
WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil, vol. 2, Processo de Execução, 7.ª ed., São Paulo,
Saraiva, 2005, p. 387
8
embargos à execução fiscal, diante das normas inseridas nos arts. 18 e 19 da LEF,
que assim dispõem4:
“Art. 18 - Caso não sejam oferecidos os embargos, a Fazenda Pública
manifestar-se-á sobre a garantia da execução.”
“Art. 19 - Não sendo embargada a execução ou sendo rejeitados os embargos,
no caso de garantia prestada por terceiro, será este intimado, sob pena de
contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para, no prazo de 15
(quinze) dias:
I - remir o bem, se a garantia for real; ou
II - pagar o valor da dívida, juros e multa de mora e demais encargos,
indicados na Certidão de Divida Ativa pelos quais se obrigou se a garantia
for fidejussória.”
Nota-se que as normas acima transcritas, em nenhum momento, atribuem efeito
suspensivo aos embargos de devedor, mas apenas prevêem os atos subseqüentes que
devem ser observados na fase posterior à interposição dos embargos.
O fato do art. 18 aduzir que a Fazenda Pública se manifestará sobre a garantia
da execução caso não sejam oferecidos embargos, não induz à conclusão de que a
execução deverá permanecer suspensa na fase do contencioso judicial.
Isso ocorre porque, caso sejam opostos embargos, existem outras providências
prévias a serem observadas pela Fazenda Pública, como a própria impugnação dos
embargos, entre outras.
Aliás, deve ser destacado que a redação do art. 18 é falha, pois sua
interpretação meramente literal levaria à conclusão de que, havendo embargos, ainda
que rejeitados liminarmente, a Fazenda Pública restaria impossibilitada de se
4
Nesse sentido, por exemplo, o entendimento de Jamol Anderson Ferreira de Mello no artigo publicado na internet, sob
o título “Embargos à execução fiscal devem continuar a ter efeito suspensivo”, Disponível em
<http://www.hernandezferreira.com.br/boletimEletronico.aspx?idBoletim=40> Acesso em 10/08/2008.
9
manifestar sobre a garantia da execução, pois tal previsão somente é destinada para a
hipótese de não serem opostos embargos, o que se mostra inadmissível.
De outro lado, a referência do art. 19 da Lei nº 6.830/80, relativamente às
garantias prestadas por terceiro, de que sua intimação para remir ou pagar a dívida
será efetuada na hipótese de não haver embargos, ou de sua rejeição, não consagra a
regra da suspensividade dos embargos de devedor.
Primeiro, porque não se pode estabelecer a regra a partir da exceção, uma vez
que tal dispositivo – excepcional, diga-se – tem por objeto apenas preservar o terceiro
prestador da garantia, que não tem ligação direta com a dívida em execução.
Aliás, a palavra “prosseguir”, contida no art. 19, caput, da Lei de Execuções
Fiscais, não leva à afirmação de que a execução estava suspensa no momento
anterior, pelo simples fato de que o mesmo dispositivo legal dirige-se tanto para as
execuções não embargadas como para aquelas em que os embargos foram rejeitados
e, como é cediço, a execução fiscal jamais fica suspensa nos casos de execução não
embargada, fator outro que revela a fragilidade da corrente que defende a manutenção
do efeito suspensivo direto na execução fiscal embargada.
A propósito, interessante a lição de José da Silva Pacheco acerca da finalidade
da intimação do terceiro, que nada tem a ver com a suspensividade dos embargos.
Eis a lição do renomado doutrinador:
“A finalidade da intimação é levar ao conhecimento de terceiros que não foi
embargada a execução ou, se o foi, que os embargos foram rejeitados, tendo
eles, desse modo, o prazo de quinze dias para remir o bem, objeto de garantia
real, ou pagar a dívida ativa.”5
Por outro turno, impende destacar que a Lei n° 11.382/06 alterou, também, o
art. 587 do Código de Processo Civil, passando a ter a seguinte redação:
5
PACHECO, José da Silva. Comentários à Lei de Execução Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2002, p.209.
10
“Art. 587. É definitiva a execução fundada em título extrajudicial; é
provisória enquanto pendente apelação da sentença de improcedência dos
embargos do executado, quando recebidos com efeito suspensivo (art. 739).”
Como é cediço, antes da reforma processual, toda e qualquer execução fundada
em título executivo extrajudicial era sempre definitiva, ao passo que agora,
especificamente para a hipótese de ser concedido efeito suspensivo aos embargos de
devedor, o prosseguimento da execução, na pendência de apreciação de recurso de
apelação da sentença de improcedência, será de forma provisória, devendo ser
observadas as regras estatuídas no art. 475-O do CPC.
A partir dessa alteração, portanto, a Súmula 317 do Superior Tribunal de
Justiça, a qual dispõe ser “definitiva a execução de título executivo extrajudicial,
ainda que pendente apelação contra sentença que julgue improcedente os
embargos”, não poderá ser aplicada quando os embargos de devedor contarem com
efeito suspensivo, concedido nos termos do art. 739-A, § 1°, do diploma processual.
Sobre o tema, importante o comentário de Misael Montenegro Filho:
“Antes da reforma procedida pela Lei n° 11.382/2006, a provisoriedade da
execução era característica exclusiva da pretensão fundada em títulos
judiciais. A execução instaurada com apoio em título extrajudicial era
sempre definitiva. Com a modificação legislativa, exclusivamente na hipótese
de os embargos do devedor serem recebidos no efeito suspensivo (o que
representa exceção, conforme a redação do art. 739-A e do seu § 1°), sendo
interposta apelação contra a sentença que os rejeitar ou que julgá-los pela
improcedência dos pedidos, a execução é provisória, atraindo a aplicação das
regras dispostas no art. 475-O. Se os embargos do devedor não foram
recebidos no efeito suspensivo (como é a regra), sendo julgados e (mesmo
quando) combatidos por sentença, a execução é definitiva”.6
6
FILHO, Misael Montenegro. Código de Processo Civil Comentado e Interpretado, São Paulo: Atlas, 2008, p. 652.
11
Por conseguinte, entender pela atribuição de efeito suspensivo necessário às
execuções fiscais equivale a defender a revogação da Súmula nº 317 do STJ nos
executivos fiscais, restando impossibilitada a Fazenda Pública de dar prosseguimento
à execução até seus ulteriores termos, enquanto pendente apelação da sentença de
improcedência dos embargos do executado.
De fato, conforme ficou assentado na introdução, as mudanças provocadas no
Código de Processo Civil tiveram por escopo acelerar a satisfação da dívida em
cobrança judicial, a fim de proporcionar uma duração razoável do processo de
execução, conforme exige o art. 5°, LXXVIII, da Constituição Federal.
Não se mostra razoável, assim, sustentar que as execuções fiscais, cujo produto
da arrecadação é destinado à própria coletividade, devam sofrer um retrocesso, a
partir da não-aplicação da Súmula 317 do STJ, já que, se for conferido efeito
suspensivo em toda e qualquer execução embargada, o título executivo passará a ser
regulado pelas regras da execução provisória, ex vi do disposto no art. 587 do CPC.
Ademais, deve ser anotado que a certidão de dívida ativa regularmente inscrita
goza da presunção de liquidez e certeza, a qual somente pode ser ilidida por prova
inequívoca, em decorrência da presunção de legitimidade e veracidade dos atos do
Poder Público, razão pela qual o tratamento dispensado aos executivos fiscais não
pode ser relegado a um segundo plano, quando comparado com as execuções de
título extrajudicial promovidas por particulares, fator relevante para a aplicabilidade
subsidiária do art. 739-A, caput, do Código Processo Civil, nos executivos fiscais.
Ainda, ao contrário das execuções promovidas pelos entes privados, grande
parte das execuções fiscais dizem respeito a tributos informados pelo próprio
devedor, os quais não foram honrados no prazo estabelecido em lei.
Dessa forma, tendo presente que a Lei de Execuções Fiscais silencia sobre os
efeitos dos embargos de devedor, bem como a qualidade da certidão de dívida ativa
regularmente inscrita, a qual, como dito, na maioria das vezes é confeccionada com
12
base nos valores informados pelo próprio devedor, resta patente a aplicabilidade do
art. 739-A nos executivos fiscais.
Nessa esteira o comentário de Theotônio Negrão:
“Art. 16:3b. Sem efeito suspensivo (CPC 739-A – caput). Não obstante a
execução fiscal obedeça a regras especiais, elas nada dispõem acerca da
eficácia suspensiva dos respectivos embargos. Logo, para esse assunto, valem
as normas gerais do CPC (art. 1°), com a redação dada pela Lei 11.382/06.
Assim, embargos à execução fiscal somente serão aptos a suspender a
execução se preenchidos os requisitos previstos no CPC 739-A, § 1°”.7
Igual teor a doutrina de Leonardo José Carneiro da Cunha:
“A Lei n.º 6.830/1980 não trata dos efeitos decorrentes da propositura
dos embargos do executado. Incidem, diante disso, as novas regras
contidas no Código de Processo Civil. Significa, então, que, ajuizados os
embargos, a execução fiscal não estará, automaticamente, suspensa.”8
Corroborando o alegado, ainda, o entendimento consagrado na obra de Leandro
Paulsen, René Bergman Ávila e Ingrid Scrhroder Sliwka:
“A teor das modificações instituídas pela Lei n.º 11.382/2006, os embargos do
executado deixaram de ter efeito suspensivo, à exceção de atribuição expressa
nesse sentido, desde que a execução já esteja garantida, que sejam relevantes
os fundamentos alegados e o prosseguimento da execução possa causar ao
executado grave dano de difícil ou incerta reparação.”9
7
NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. São Paulo: Saraiva, 2008, p.1464.
CUNHA, Leonardo José Carneiroi da. A Fazenda Pública em Juízo. São Paulo: Dialética, 2008, p. 346.
9
PAULSEN, Leandro. Direito Processual Tributário: Processo Administrativo Fiscal e Execução Fiscal à Luz da
Doutrina e Jurisprudência. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2007, p. 314
8
13
Por derradeiro, deve ser sinalizado que a 2ª Turma do Superior Tribunal de
Justiça, a partir do julgamento do Recurso Especial nº 1024128, espancou qualquer
dúvida sobre a matéria em análise, ao decidir, por unanimidade, pela aplicação do
artigo 739-A do Código de Processo Civil aos embargos à execução fiscal.
Nesse sentido o teor da notícia elaborada pela Coordenadoria de Editoria e
Imprensa do Superior Tribunal de Justiça, divulgada no dia 15/05/2008.
“Embargos não suspendem execução fiscal sem que haja argumentação
idônea e garantia integral da dívida
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que
embargos à execução fiscal não podem ser recebidos com efeito
suspensivo sem que os argumentos do executado sejam robustos, e que
o valor da execução esteja integralmente garantido por penhora,
depósito ou fiança bancária. Isso porque, de acordo com a Turma, o
artigo 739-A, parágrafo primeiro, do Código de Processo Civil (CPC) se
aplica à Lei n. 6.830/80, que trata da cobrança judicial da dívida ativa
da Fazenda pública. (...)
O relator, ministro Herman Benjamim, ressaltou que o artigo 1º da Lei
n. 6.830/80 prevê a utilização subsidiária do CPC. Ele disse estar
convencido de que a teoria geral do processo de execução teve sua
concepção revista e atualizada e que as lacunas existentes nos processos
regidos por leis específicas são preenchidas com as normas do CPC.
Acompanhando as considerações do ministro Herman Benjamim, a
Segunda Turma decidiu, por unanimidade, aplicar o artigo 739-A,
parágrafo primeiro, do CPC aos embargos à execução fiscal.”10
10
Disponível em <www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=87515&tmp.area_
anterior> Acesso em 09/08/2008.
14
Ficou sedimentado, portanto, a partir desse julgado, que os embargos de
devedor não mais suspendem ipso facto a execução fiscal, salvo se houver pedido do
embargante, argumentação idônea, risco de dano e garantia integral da dívida, ou
seja, se atendidos os pressupostos do art. 739-A, § 1°, do CPC.
6. Conclusão.
Diante das considerações tecidas ao longo do presente ensaio, conclui-se:
1) as mudanças proporcionadas no Código de Processo Civil, pela Lei n° 11.382/06,
podem ser aplicadas nas execuções fiscais, quando a Lei n° 6.830/80 silenciar sobre a
respectiva matéria;
2) por conseguinte, permanecem plenamente em vigor as disposições contidas nos
artigos 16, 17 e 20 da Lei de Execuções Fiscais, razão pela qual, nos executivos
fiscais, o termo inicial para oposição dos embargos continua sendo a data do
depósito, juntada da prova da fiança bancária, ou intimação da penhora, ao contrário
do que restou disciplinado no art. 738, caput, do Código de Processo Civil. Da
mesma forma, no rito da Lei n° 6.830/80, tanto o prazo para oposição de embargos,
como para sua impugnação, continuam sendo de 30 (trinta) dias, ex vi de seus arts. 16
e 17, independentemente do que consta nos arts. 738 e 740 do CPC. Igualmente, no
rito especial, a admissibilidade dos embargos está condicionada à prévia garantia do
juízo, nos termos do § 1° do art. 16 da LEF, enquanto que tal exigência não se mostra
necessária no rito comum, conforme consta do art. 736 do diploma processual;
3) a partir da edição da Lei n° 11.382/06, os embargos opostos nos executivos fiscais
não mais suspendem ipso facto a execução, sendo necessária, para tanto, a
conjugação dos seguintes elementos: (a) requerimento prévio do embargante, (b)
execução garantida por penhora, depósito ou caução suficientes, (c) presunção do
bom direito e (d) perigo de dano irreparável, conforme previsto no art. 739-A do
CPC, aplicado subsidiariamente, por força do art. 1º da Lei nº 6.830/80;
15
4) a inaplicabilidade do art. 739-A do Código de Processo Civil no rito da Lei n°
6.830/80 provocaria um retrocesso na cobrança da dívida ativa, o que afronta a
própria garantia consagrada no art. 5°, LXXVIII, da Constituição Federal, referente à
duração razoável do processo, pois, se agregado efeito suspensivo aos embargos do
devedor, o prosseguimento da execução, quando pendente apreciação do recurso de
apelação interposto da sentença de improcedência, dar-se-á de forma provisória, ex vi
da nova redação conferida ao art. 587 do CPC, que afasta, nesse caso específico, o
disposto na Súmula 317 do STJ.
Bibliografia
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Embargos não suspendem execução fiscal sem que