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JORNAL DA ORDEM
PUBLICAÇÃO
DA
ORDEM
Entrevista
DOS
A DVO G A D O S
DO
BRASIL
-
PA R A N Á
|
NÚMERO
160
|
MAIO
DE
2012
OAB define nomes da
advocacia para vaga do
quinto constitucional no TJ
José Miguel Garcia Medina comenta
mudanças do Código de Processo Civil
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Cascavel
Nova sede da OAB para os advogados
de Cascavel
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Lei da Ficha Limpa
Os desafios das novas regras eleitorais
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Numa sessão que durou aproximadamente 14 horas, o Conselho Seccional da OAB
escolheu, no dia 25 de maio, seis advogados para compor a lista que concorre a
uma vaga de desembargador do quinto constitucional no Tribunal de Justiça do
Paraná. Integram a lista os advogados Dely Dias das Neves, Marcione Pereira
dos Santos, Marcia Carla Pereira Ribeiro, José Hipólito Xavier da Silva, Márcio
Antonio Sasso e Munir Abagge (por ordem, na foto, com José Lucio Glomb). Três
deles serão selecionados pelo Tribunal de Justiça para formar a lista tríplice que
será encaminhada ao governador Beto Richa, a quem cabe a escolha final.
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entrevista
José Miguel Garcia Medina
Não podemos desperdiçar a chance de
conceber um CPC mais democrático
O advogado paranaense José Miguel Garcia Medina tem sua
história intimamente ligada ao Processo Civil, e desde muito antes
de ele seguir a carreira jurídica e se tornar doutor e mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, onde leciona no curso de pós-graduação – também é professor na Universidade Estadual de Maringá, onde vive e advoga.
Medina e o atual Código de Processo Civil (CPC) nasceram quase
ao mesmo tempo. Natural de Loanda, Noroeste do Paraná, Medina nasceu no dia 21 de julho de 1972. Dez dias depois, o então
ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, encaminhava ao Presidente
do Brasil, o militar Emílio Garrastazu Médici, sua Exposição de
Motivos do CPC. Era concebido o atual Código de Processo Civil,
que veio à luz em janeiro de 1973.
Na epígrafe daquela Exposição de Motivos, Buzaid citava o
lendário processualista italiano Giuseppe Chiovenda, cujos ensinamentos haviam inspirado a reforma do Processo Civil na Itália:
“Convien decidersi a una reforma fondamentale o rinunciare alla
speranza di un serio progresso”. Cerca de 40 anos depois, hoje é
Medina um dos principais responsáveis pelo novo Código de Processo Civil Brasileiro, em gestação no Congresso Nacional – ele fez
parte da comissão de juristas, nomeada pelo Senado Federal, que
elaborou o anteprojeto do novo CPC. E, como Chiovenda dizia em
relação à processualística italiana, Medina defende uma reforma
fundamental no processo civil brasileiro, para que não se renuncie
à esperança de um progresso sério: “Evidentemente, a alteração
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legislativa não resolve todos os problemas, mas ajuda muito. Só o
fato de termos a chance de conceber um CPC mais democrático,
ajustado aos princípios constitucionais, é uma oportunidade ímpar, que não pode ser desperdiçada”.
Medina concedeu esta entrevista ao Jornal da Ordem pouco
depois da divulgação dos primeiros relatórios da comissão especial da Câmara que analisa o projeto do novo CPC. Além de fazer
considerações sobre a aguardada codificação, ele também tratou
de outros temas: sua atuação como conselheiro federal da Ordem
dos Advogados do Brasil (suplente, no triênio 2010-2012), as atividades da Comissão Nacional de Acesso à Justiça da OAB, a qual
preside, e até mudanças na forma de escolha dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
O Sr. integrou a comissão de juristas que elaborou o anteprojeto
do novo Código de Processo Civil, e, na XXI Conferência Nacional dos Advogados, realizada em Curitiba no ano passado, falaria
sobre os honorários advocatícios no projeto do novo CPC. No entanto, com a ausência ao evento do presidente daquela comissão,
ministro Luiz Fux, foi escalado para falar sobre o tema reservado
a ele: as principais alterações no projeto do CPC. Em linhas gerais,
quais são essas principais alterações? E como ficam os honorários
advocatícios no projeto do novo Código?
Há muitas e importantes propostas inseridas no projeto do novo
CPC, que aprovamos, e que, a nosso ver, torna o processo mais
democrático. Há mudanças relativas a prazos: que passarão a ser
contados apenas em dias úteis, e não serão contados entre 20 de
dezembro e 20 de janeiro. Quanto aos honorários advocatícios, há
o expresso reconhecimento de que têm natureza alimentar e de que
constituem direito autônomo do advogado, vedada a compensação
em caso de sucumbência recíproca. Há, também, previsão expressa de porcentuais mínimos a serem observados, o que impede a
fixação de valores irrisórios – às vezes humilhantes – a título de
honorários advocatícios.
A comissão de que o Sr. fez parte entregou o anteprojeto do
novo CPC ao Congresso em junho de 2010. Em dezembro do mesmo ano, o Senado aprovou o projeto. Desde então, ele tramita na
Câmara. O Sr. tem alguma expectativa de quando o novo Código
será aprovado?
Sinceramente, eu acreditava que a tramitação do projeto seria
mais célere. Houve demora na designação de comissão para analisar o projeto, na Câmara. No entanto, desde que criada a comissão, os trabalhos têm sido intensos. Mais uma rodada de audiências públicas foi realizada, e mais opiniões foram recebidas
e estão sendo consideradas pela comissão. É difícil afirmar que
o projeto poderá ser aprovado ainda neste ano, já que em breve
teremos eleições, e muitos deputados acabam dando mais atenção
a esse processo eleitoral do que aos trabalhos na Câmara. Tenho
entrevista
a impressão de que a aprovação do projeto, na Câmara, deverá ficar para o próximo ano, e, depois, o projeto retornará
ao Senado, já que haverá emendas. Mas
a Comissão, presidida pelo deputado Fábio Trad (PMDB/MS), tem trabalhado
bastante, e não me admiraria que eles nos
surpreendessem e aprovassem o projeto
até o final deste ano, na Câmara.
Então, ao que tudo indica, o “velho”
CPC vai chegar aos 40 anos no ano que
vem. Muita gente defende a tese de que
um novo Código seria desnecessário,
uma vez que o CPC de 1973 vem passando por muitas alterações ao longo dos
anos, atualizando-se. Um novo Código é
mesmo necessário?
Respondo a essa pergunta repetindo
a afirmação que tenho ouvido de muitas
pessoas que eram céticas em relação ao
projeto do novo CPC, antes de conhecê-lo: o projeto é avançado, moderno, e
pode, e muito, contribuir para o aprimoramento do acesso à Justiça. Evidentemente, a alteração legislativa não resolve
todos os problemas, mas ajuda muito. Só
o fato de termos a chance de conceber
um CPC mais democrático, ajustado aos
princípios constitucionais, é uma oportunidade ímpar, que não pode ser desperdiçada.
Quais são as principais alterações previstas pelo projeto que evidenciam essa
concepção mais democrática do CPC, a
que o Sr. se refere?
Ao longo de todo o projeto, há projeções dos princípios constitucionais do
processo, oriundos do devido processo
legal. Há desde uma preocupação muito
grande com a integridade da jurisprudência e a fundamentação das decisões
judiciais. Hoje, a meu ver, esse é um dos
maiores problemas a serem enfrentados.
Há vários assuntos a respeito dos quais
a jurisprudência não se entende, o que,
evidentemente, aumenta o grau de litigiosidade. Há, também, um alto grau de
subjetivismo nas decisões judiciais fundadas em princípios jurídicos. O projeto
do novo CPC deu muita atenção a todos
esses problemas.
O relatório parcial do novo CPC,
apresentado recentemente pela comissão
especial que analisa o tema na Câmara,
alterou vários pontos do anteprojeto. O
que o Sr. achou das mudanças? O projeto
foi desfigurado?
Sem dúvida, há muitos pontos polêmicos. Mesmo os trabalhos que realizamos na Comissão designada pelo
Senado para a apresentação do anteprojeto foram cercados de controvérsias. Eu
mesmo não concordo com tudo o que
está no projeto, e acho que a Câmara
dos Deputados está conseguindo corrigir o que deveria ser corrigido e aprofundar ainda mais os avanços do projeto
de novo CPC. O projeto não está sendo
desfigurado, mas, ao contrário, está sendo aprimorado, a meu ver. Mas só poderemos fazer uma avaliação quando a
Câmara concluir seus trabalhos.
O Sr. afirmou que não concorda com
tudo o que está no projeto. Pode exemplificar?
A sistemática da tramitação da apelação, creio, poderia ser mais simples.
Entendo que os procedimentos especiais
de “jurisdição voluntária” também poderiam ser mais simplificados. Deveria
ser inserido algo a respeito da coisa julgada em ações de paternidade, e poderíamos avançar um pouco mais em re-
lação às medidas executivas. Creio, de
todo modo, que alguns desses pontos
foram alterados, na tramitação do projeto, na Câmara. Devemos aguardar os
resultados dos trabalhos realizados no
Congresso Nacional.
Na Câmara, foram incluídas linhas
gerais sobre o processo eletrônico no
novo CPC. O que o Sr. pensa disso?
Concordo com as mudanças propostas. É inevitável ajustar as regras processuais à prática dos atos por meios
eletrônicos. O mais importante, creio,
é prever a uniformização da prática de
atos processuais por meios eletrônicos,
em todos os âmbitos do Poder Judiciário. É absurda a necessidade de nos
ajustarmos a um procedimento eletrônico para cada Justiça, para cada Estado… O projeto prevê soluções para esse
problema.
Há poucos anos, o seu livro “Execução” (Editora RT) foi um dos vencedores, na categoria Direito, do Prêmio
Jabuti – principal premiação literária
do Brasil. Em entrevista publicada em
edição recente do Jornal da Ordem, o
advogado-geral da União, Luis Inácio
Adams, levantou o problema da exe-
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entrevista
cução no processo brasileiro: segundo ele,
passa-se “a vida” discutindo a execução.
O Sr. concorda que a execução é o grande
gargalo da Justiça brasileira? O CPC pode
resolver isso?
Concordo, sim. Infelizmente, é na execução que todos os problemas do processo transparecem com mais clareza, pois,
quando se chega nesse momento, ao menos em princípio não há mais dúvida a
respeito da existência da dívida que deve
ser paga. Mas a lei processual muito pouco
pode fazer, contra a cultura de inadimplência que prepondera entre nós. É, de fato,
uma cultura, contra a qual temos que lutar. Mas é difícil mudar essa cultura, quando o próprio Estado cria embaraços, como
a denominada “PEC do calote”, para dificultar o pagamento de precatórios.
Uma das linhas mestras do anteprojeto
do novo CPC foi dar celeridade à Justiça
com a simplificação do processo, inclusive com limitações recursais. Diante disso,
qual é a sua opinião sobre a “PEC dos
Recursos”, que, como o projeto do novo
Código, também supostamente tem a intenção de tornar a Justiça mais célere?
O único recurso que, verdadeiramente,
se extinguiria, de acordo com a proposta
prevista no anteprojeto, seria o de embargos infringentes. Mas se criou, também no
anteprojeto, o dever de o voto vencido ser
declarado e fazer parte do acórdão, solução esta que repercutia também em relação ao prequestionamento, para cabimento de recursos extraordinário e especial.
Na Câmara, de todo modo, há a tendência
de os embargos infringentes retornarem
ao projeto. O recurso de agravo retido só é
extinto no projeto porque se criou a regra
que permite à parte, na apelação, suscitar
as questões que foram objeto de decisão
interlocutória, ao longo do processo, antes
da sentença (adotando-se, quanto ao ponto, solução parecida com a prevista no processo trabalhista). O projeto do novo CPC
torna o sistema recursal menos burocrático, por exemplo, impedindo que recurso protocolado antes de iniciado o prazo
não seja conhecido, admitindo a complementação de documentos que de acordo
com o Tribunal seriam importantes para
a compreensão da controvérsia etc. Mas
a “PEC dos Recursos”, ao contrário, ver-
dadeiramente impede o acesso à Justiça,
e devemos nos manifestar contra ela. O
mesmo se deve dizer da proposta de PEC
que cria o requisito da repercussão geral
para o recurso especial. Acesso à Justiça
é acesso à ordem jurídica justa. As partes, o cidadão tem direito a uma resposta
adequada à Constituição, ao sistema jurídico, e isso envolve também o direito de
acesso aos tribunais superiores.
Por falar em acesso à Justiça, o Sr.
é presidente da Comissão Nacional de
Acesso à Justiça (CNAJ) da OAB. Que
análise faz da atual situação do país em
relação ao tema?
A CNAJ analisa questões e pedidos
endereçados ao Conselho Federal da
OAB que dizem respeito a obstáculos
variados, existentes em um plano mais
geral, ao acesso à Justiça. Temos feito,
preponderantemente, análise de propostas de reformas legislativas referentes
ao tema, e encaminhado sugestões ao
Conselho Federal da OAB. No Brasil, os
problemas referentes ao acesso à Justiça
não se relacionam apenas a óbices legislativos – embora esses, sem dúvida, também atrapalhem, e muito, tendo em vista
que o procedimento é excessivamente
burocrático, formalista, cheio de armadilhas para as partes. Há problemas graves,
decorrentes da falta de investimento em
servidores e na própria estrutura do Poder Judiciário. Boa parte dos problemas
referentes ao acesso à Justiça se resolveria com maior investimento e melhoria
na gestão. Mas há também problemas
locais, que são verdadeiros obstáculos ao
acesso à Justiça, que não são enviados à
Comissão, como, por exemplo, o de magistrados que se negam a atender partes e
advogados, em qualquer hipótese – tema
a respeito do qual o próprio Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) já se manifestou.
Neste ano, o Sr. encerra um triênio
como Conselheiro Federal da OAB, representando a Seção do Paraná. Qual é o
balanço que faz da atuação do Conselho
nesse período?
A OAB tem se manifestado de modo
decisivo em relação aos maiores problemas enfrentados pela Justiça e pela
sociedade brasileira. Vários temas im-
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portantes foram enfrentados, ainda que
cercados de polêmica. Um deles, recente, diz respeito ao reconhecimento da
constitucionalidade da Lei da “Ficha
Limpa”, em relação à qual a OAB moveu ação declaratória de constitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal, em cuja ação eu tive a honra e a
responsabilidade de atuar.
O que o Sr. pensa dessa atuação da
OAB, como no caso da “Ficha Limpa”,
colocando-se à frente de temas de interesse geral, extrapolando as questões estritamente de classe?
Considero fundamental a atuação da
OAB não apenas em relação a temas relativos à classe dos advogados. A OAB
deve ir além, pois desempenha importantíssimo papel na fiscalização da atuação
do Poder Judiciário e de outras instituições do Estado.
Dois ministros do Supremo Tribunal Federal se aposentam compulsoriamente neste ano: Cezar Peluso e Carlos
Ayres Britto. Em artigo recente, o Sr.
defendeu alterações na forma de composição e escolha dos integrantes dos
tribunais superiores. Quais são essas alterações?
Hoje, a escolha é realizada apenas
pelo Presidente da República, e o Senado a aprova. Penso que o processo de
escolha deve ser mais amplo e democrático, e deve haver maior participação de
outros órgãos, como a OAB e o Poder
Judiciário, com indicações de nomes
etc. Há propostas nesse sentido em trâmite, no Congresso Nacional. Também
entendo que o número de ministros do
Superior Tribunal de Justiça deve ser
aumentado, como, aliás, já admite a
Constituição Federal. Mas há um forte
movimento em sentido contrário, que
restringe ainda mais o acesso aos Tribunais superiores, criando requisitos
como, por exemplo, a repercussão geral para o recurso especial. Penso que
as reformas constitucionais não devem
ser pensadas apenas com o intuito de
se reduzir a quantidade de trabalho nos
tribunais. Devemos levar a sério nossa
Constituição, e devemos pensar em reformas constitucionais que aprimorem,
qualitativamente, a Justiça brasileira.
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jornal da ordEM - Prof. José Miguel Garcia Medina