PROCESSOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM
A ideia de que eu, adulto, determino a idade com
que alguém vai aprender a escrever é parte da
onipotência do sistema escolar que decide em
que dia e a que horas algo vai começar. Isso não
existe. As crianças têm o mau costume de não
pedir permissão para começar a aprender.
Emília Ferreiro1
Os processos de ensino-aprendizagem são contínuos, permanentes e não podem ser
entendidos descolados da concepção de Educação, ou da abordagem educacional na
qual estejam inseridos. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais2, as diferentes
abordagens educacionais que perpassaram o cenário educacional brasileiro – nunca
de maneira cristalizada e fechada, mas de forma geralmente superposta uma às
outras – são conhecidas como Pedagogia Tradicional; Tecnicismo Educacional;
Pedagogia Libertadora; Pedagogia Crítico-social dos Conteúdos; e a Pedagogia
Construtivista. A questão aqui não é discorrer sobre ou analisar criticamente cada uma
delas, mas entender a importância de que sejam costuradas de maneira coerente com
a concepção de professor, de conhecimento e de estudante que as alicerçam.
A corrente epistemológica que acredita que o conhecimento vem de fora para dentro,
e que a relação de ensino-aprendizagem se constitui num professor-que-sabe e ensina
ao aluno-que-nada-sabe, enlaça-se a uma perspectiva pedagógica centrada na figura
do docente, sendo ele o único responsável no processo de ensinar, de transmitir os
conhecimentos aos estudantes, independente dos contextos de vida que estes
estejam inseridos, priorizando a repetição e memorização dos conteúdos como
método de aprendizagem. Ainda nesta visão de conhecimento como algo exterior aos
sujeito-educandos, há uma abordagem educacional que proclama o professor como
1 FERREIRO,
E. Cultura Escrita e Educação: conversas de Emília Ferreiro com José Antônio Castorina,
Daniela Goldin e Rosa Maria Torres. Porto Alegre: Ed. Artmed, 2001.
2 Disponível: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acessado: 08.02.2013.
um cumpridor-de-manuais, que exerce o papel de controle da prática pedagógica por
meio da supervalorização tecnológica como método em si – ao estudante, nestes
casos, cabe somente reagir aos estímulos propostos pelo docente.
Diferentemente, a corrente epistemológica que concebe o conhecimento como algo
interno, já inerente aos sujeitos, desvela um processo focado apenas na figura do
estudante, dando ênfase ao processo de desabrochar de suas competências e
habilidades inatas – e o professor passa, neste caso, a ser visto como mero
coadjuvante no processo, pois não lhe é facultada nenhuma intervenção, cabendo
exclusivamente aos estudantes percorrer, por meios próprios, todo o caminho do
conhecimento na humanidade.
Em ambas correntes epistemológicas, a concepção de conhecimento é de algo
estanque e desconectado; e assim, as abordagens educacionais que neles se apoiam,
se valem de estratégias pedagógicas descontextualizadas e descoladas das dimensões
sociais e culturais dos diversos atores sociais envolvidos no processo de ensinoaprendizagem.
Coadunamos com a corrente epistemológica que defende o conhecimento como
provisório e dinâmico, sempre em transformação, pois sofre ação de diferentes
vetores. Continuamente em movimento, conhecimentos nunca são neutros, ahistóricos ou acabados; e são sempre produzidos pelo coletivo de homens e mulheres
ao longo da história – o que nos remete a uma compreensão de escola como lócus
privilegiado de discussão e problematização de saberes e fazeres, que atua na e a
favor da multiplicidade de realidades sociais, culturais e políticas. Nesta direção,
entendemos que as crianças e jovens se apropriam e produzem conhecimento,
permanentemente, na troca com o meio e com os variados sujeitos que os cercam –
sejam estes crianças, jovens ou adultos; bem como assumimos como certo que todos
são diferentes entre si e congregam, não apenas potenciais próprios de
aprendizagem, como bagagem anterior de conhecimentos variados. Também neste
sentido entendemos ser fundamental respeitar o ritmo de cada criança e jovem – isto
é, não a(o)s entendendo como um bloco homogêneo, levando em conta o seu tempo
próprio de descobertas, de associação de ideias, de despertar o interesse.
Por fim, cabe enfatizar que, para nós, da Xmile, é importante que se busque uma
produção e uma apropriação significativas de conhecimentos. Este processo de
apropriação e produção de conhecimentos se torna significativo no momento em que
o(a)s estudantes começam a estabelecer ligações entre i) os conteúdos que
oferecemos (historicamente construídos); ii) aqueles que já fazem parte de seu
repertório de experiências, saberes e fazeres anteriores; iii) e o mundo – seja aquele
de sua realidade cotidiana e imediata, seja o universo maior.
Em suma, defendemos que os conhecimentos, sejam eles de caráter científico, social,
cultural, ético ou estético, tenham sentido, alcem a esfera afetiva, e que possam afetar
e melhorar a qualidade de vida dos sujeitos, e de seu entorno – compactuando com
as ideias de Vygotsky3 de que conhecimento e afetividade caminham juntos.
3 Para saber mais: VIGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
1998; _______. Psicologia pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2003; _______. La imaginación y el arte
em la infancia. Madrid: Ediciones Akal SA, 2006.
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