life&style bem-estar
Adriano Miranda
MITOS QUE COMEMOS
Hidratos de carbono à noite: Bicho papão… ou talvez não!
17.06.2013 Por Pedro Carvalho, nutricionista
Se está a tentar perder peso e a cumprir um plano alimentar hipocalórico, não existe razão para cortar os hidratos de carbono ao jantar. Pode até
ser a melhor altura para os ingerir.
“Toda a gente sabe” que evitar os hidratos de carbono a partir das 16h, 18h ou 19h (consoante a “corrente” da mitologia alimentar) é uma das
regras de ouro para quem está a tentar perder peso. O nosso metabolismo “desacelera”, ao dormir gastamos menos calorias, e, por isso, todos
os hidratos de carbono que ingerimos na fase final do dia são, segundo esta teoria, automaticamente transformados em gordura (quiçá pelo
mesmo aparelho interno que multiplica os hidratos de carbono do arroz e da batata quando ingeridos em conjunto).
Bom, dentro de certos limites metodológicos, a ciência não só não tem corroborado esta “teoria” como a tem de facto refutado. Em boa verdade,
os escassos estudos que compararam estes diferentes momentos de ingestão de hidratos de carbono ao longo do dia indicam que, a existir um
momento do dia preferencial para a ingestão de hidratos de carbono, será mesmo durante a noite (jantar) e não durante o dia (almoço)!
Surpreendente, não?
Um estudo (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21475137) feito com polícias israelitas mostrou uma maior diminuição de peso, do perímetro
abdominal e da massa gorda, bem como uma melhoria nos níveis de colesterol, de resistência à insulina e de mediadores inflamatórios no grupo
que ingeria hidratos de carbono ao jantar em vez de fraccionados durante o dia. Também os níveis de adiponectina
(http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22901843) e leptina (duas hormonas com papel essencial na regulação do nosso comportamento
alimentar) se modificaram favoravelmente, sendo menores os níveis de fome quando se ingeriram os hidratos de carbono à noite. Apesar de
interessante, este estudo não permite dizer com propriedade se estes efeitos se verificaram pelo facto da ingestão de hidratos de carbono ter
sido especificamente à noite ou por ter sido “concentrada” apenas num momento do dia.
Nesta perspectiva, pode mesmo questionar-se a pertinência em ingerir pequenas quantidades de hidratos de carbono ao longo do dia que, ao
estimular continuamente a produção de insulina, poderão sabotar a nossa capacidade de produzir internamente glicose a partir das nossas
reservas, uma vez que estamos sempre a fornecê-la de forma exógena. Esta hipótese, meramente académica, poderia então questionar a
utilidade dos snacks ricos em hidratos de carbono, como pão, bolachas e bolos, a meio da manhã e da tarde, podendo estes ser substituídos por
outros como lacticínios magros sem açúcar e frutos gordos de modo a concentrar a ingestão de hidratos de carbono apenas numa refeição. E a
este nível, parece que o jantar é mesmo o melhor momento.
De facto, um outro estudo (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23389113) também verificou que a ingestão de hidratos de carbono
preferencialmente durante o almoço foi responsável por níveis mais elevados de glicemia em jejum, insulina e resistência à insulina em
comparação à ingestão primordialmente ao jantar. Ainda assim, há que ter em conta que nestes estudos a quantidade de hidratos de carbono
ingerida foi bastante baixa para aquilo que é a “nossa realidade” pois foram investigados indivíduos com excesso de peso e obesidade em
regime hipocalórico, ou seja, estavam em “dieta”.
O comportamento tradicional de “picar” alimentos extremamente ricos em hidratos de carbono depois de jantar e pouco tempo antes de deitar,
sem nenhum tipo de restrição no resto do dia, para além de acrescentar mais algumas calorias desnecessárias, parece igualmente capaz de
aumentar os níveis de “mau” colesterol (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23174861) e aumentar os níveis médios de glicemia durante o dia
(http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1871403X1100007X). De resto está bem estudado que os
(http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20087536)trabalhadores por turnos (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20087536) têm uma maior
prevalência de doenças cardiovasculares e diabetes tipo II, precisamente por uma grande ingestão de hidratos de carbono durante a madrugada,
altura em que existe uma maior resistência à insulina.
Trocando o cenário da investigação científica pelo do quotidiano comum, todos nós conhecemos pessoas que “cortaram” os hidratos de
carbono durante a noite e tiveram resultados positivos. A este nível há logicamente que reconhecer que o ser humano não se limita a responder
indiscriminadamente aos seus estímulos fisiológicos - as condições altamente controladas dos ensaios clínicos acima citados, são dificilmente
encontradas na “vida real”. Como tal, em “pessoas reais” esta recomendação da limitação de hidratos de carbono à noite até pode ser
extremamente útil como uma forte condicionante do comportamento alimentar.
Se olharmos à nossa volta e pensarmos na maioria dos alimentos mais apetecíveis a comer no conforto do lar após o jantar, todos eles têm
hidratos de carbono (iogurtes, leite, bolachas, bolos, chocolate, gelados, etc…). Ou seja, a interiorização de que os hidratos de carbono devem ser
evitados após o jantar faz com que, no limite, a pessoa não coma nada até se deitar. Mesmo nas grandes refeições, a exclusão à partida dos
hidratos de carbono como acompanhamento faz desde logo eliminar uma série de pratos mais desequilibrados, optando por uma tipologia de
prato “carne/peixe/ovo + salada ou legumes”. Ou seja, esta recomendação pode facilitar o processo de perda de peso não por limitar a ingestão
de hidratos de carbono em específico mas porque, no limite, conduz a um menor número de calorias ingeridas que, independentemente do
caminho para lá chegar, é o objectivo final!
Em resumo:
- Se está a tentar perder peso e a cumprir um plano alimentar hipocalórico, não existe razão para cortar os hidratos de carbono ao jantar. Pode
até ser a melhor altura para os ingerir, desde que os limite no resto do dia;
- Se acreditar que comer hidratos de carbono à noite o faz “engordar mais” e se essa crença se traduzir em menos calorias ingeridas nesta altura
do dia e estiver a dar resultado, continue! Mas também funciona para as proteínas e as gorduras;
- Independentemente de estar ou não a tentar perder peso, controle a disponibilidade dos alimentos que compra para casa. Vai ver que se não
existirem chocolates, bolachas e bolos na despensa a vontade de os consumir depois do jantar (essa sim a pior altura de todas) será muito
menor!
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