Apelação Cível n° 2008.043108-9, de Rio Negrinho
Relator: Des. Luiz Fernando Boller
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO
MORAL JULGADA IMPROCEDENTE - AUTORES QUE, À
ÉPOCA DOS FATOS, ERAM VEREADORES DO MUNICÍPIO DE
RIO NEGRINHO-SC, E TERIAM RECEBIDO VERBA
DENOMINADA `DIÁRIA´ POR CONTA DE PARTICIPAÇÃO EM
SEMINÁRIO REALIZADO NO MUNICÍPIO E COMARCA DE
ITAPEMA-SC - TRANSMISSÃO, PELA ESTAÇÃO DE RÁDIO
APELADA, DA ÍNTEGRA DA NOTÍCIA VEICULADA EM
PERIÓDICO DE CIRCULAÇÃO REGIONAL, NO SENTIDO DE
QUE OS DEMANDANTES NÃO TERIAM PARTICIPADO DO
EVENTO, USUFRUINDO, INDEVIDAMENTE, OS VALORES
REPASSADOS PELA CÂMARA MUNICIPAL - FATO QUE TERIA
REFLETIDO NEGATIVAMENTE NA CARREIRA POLÍTICA DOS
APELANTES - ALEGAÇÃO DE QUE, EM VERDADE, A MÍDIA
TERIA APENAS INFORMADO QUE REPRESENTANTES DE
ALGUNS MUNICÍPIOS NÃO ESTAVAM PRESENTES NO
SEMINÁRIO, SEM, CONTUDO, FAZER REFERÊNCIA AOS
NOMES DOS AUTORES - DIVULGAÇÃO EQUIVOCADA QUE
TERIA DENEGRIDO A IMAGEM DOS EDIS PERANTE A
SOCIEDADE LOCAL - DANO MORAL NÃO EVIDENCIADO MERA TRANSMISSÃO DE NOTÍCIA JÁ VEICULADA EM
PERIÓDICO - CONTEÚDO DE NOTÓRIO E PRETÉRITO
CONHECIMENTO DA POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DE RIO
NEGRINHO-SC.
"Mera referência, via rádio, acerca de reportagem publicada
anteriormente em periódico de circulação local, inclusive com
citação da fonte, sem o ânimo nem o efeito de atingir a honra de
outrem, não configura dano moral passível de indenização"
(Apelação Cível n° 2006.024632-9, de Concórdia. Relator: Des.
Marcus Tulio Sartorato, j. 08/10/2007).
DIREITO DE RESPOSTA EXERCIDO POR APENAS UM
DOS
VEREADORES
NOMINADOS
NA
MATÉRIA
JORNALÍSTICA - LIBERDADE DE EXPRESSÃO ASSEGURADA
PELA CF/88 - INFORMAÇÃO REPASSADA DE MODO ÉTICO E
DE ACORDO COM A FUNÇÃO SOCIAL DO JORNALISTA ABUSO NO EXERCÍCIO DO RESPECTIVO DIREITO NÃO
EVIDENCIADO - INSURGENTES QUE, EM RAZÃO DA
FUNÇÃO PÚBLICA, ESTÃO EXPOSTOS ÀS CRÍTICAS DA
MÍDIA E DA POPULAÇÃO - IMPRENSA QUE TEM A FUNÇÃO
DE AUXILIAR NA FISCALIZAÇÃO DA ATUAÇÃO DOS
AGENTES POLÍTICOS ELEITOS PARA REPRESENTAREM OS
INTERESSES DO POVO - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO POR
CONTA DA VEICULAÇÃO DA MALSINADA NOTÍCIA CONSTATAÇÃO DE QUE 2 (DOIS) DOS 4 (QUATRO)
RECORRENTES FORAM NOVAMENTE CONDUZIDOS A
CARGO POLÍTICO - DEMAIS AUTORES QUE, AO QUE TUDO
INDICA, NÃO SE CANDIDATARAM POR RAZÕES QUE NÃO
APRESENTAM LIGAÇÃO COM A SITUAÇÃO SUB JUDICE SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E
DESPROVIDO.
"As pessoas que se tornam notórias, conhecidas pelo público
em geral, normalmente atraem sobre si manifestações e juízos de
valoração nem sempre favoráveis, por melhores que sejam tais
pessoas.
No caso dos políticos, estão sujeitos de forma especial às
críticas públicas, e é fundamental que se garanta não só ao povo
em geral larga margem de fiscalização e censura de suas
atividades, mas sobretudo à imprensa, ante a relevante utilidade
pública da mesma.
Os políticos, quando detêm cargos eletivos, mandatários que
são do povo, devem estar submetidos à permanente observação
de seus atos como tais, motivo pelo qual, ressalvada a vida
privada de cada um, cumpre-lhes conformarem-se, como natural
a própria atividade que exercem, como a veemência dos
inconformismos daqueles que não sigam as mesmas orientações
em tal campo. [...] A notícia que envolve funcionários ou agentes
públicos interessa não apenas para dar conhecimento do que se
sabe, como também, igualmente, para criticar, pois a crítica,
nesses casos, constitui em eficaz instrumento para controle dos
atos de governo e para que a comunidade possa valorar e
apreciar os assuntos de interesse geral provenientes daqueles
que atuam na esfera do poder, é que a proteção à honra dos
funcionários públicos esbarra nos elevados interesses da
comunidade. A proteção a essas pessoas não deve ser
observada com o mesmo rigor das pessoas simples, que não
detêm nenhuma fração do poder" (SANTOS, Antônio Jeová.
Dano moral indenizável. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003. p. 333).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n°
2008.043108-9, da comarca de Rio Negrinho (1ª Vara), em que é apelante Abel
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
Schroeder e outros, e apelado Rádio Rio Negrinho Ltda.:
A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime,
conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo
Senhor Desembargador Eládio Torret Rocha, com voto, e dele participou o
Excelentíssimo Senhor Desembargador Substituto Ronaldo Moritz Martins da Silva.
Funcionou como Representante do Ministério Público, o Excelentíssimo Senhor
Doutor Mário Gemin.
Florianópolis, 2 de fevereiro de 2012.
Luiz Fernando Boller
RELATOR
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação cível interposta por Abel Schroeder, Alcides
Grohskopf, Célio Paulo Tureck e Luiz Carlos Ribeiro, contra decisão prolatada pelo
juízo da 1ª Vara da comarca de Rio Negrinho, que julgou improcedente o pedido
deduzido nos autos da ação de Reparação de Danos n° 055.04.000756-6 (disponível
em
<http://esaj.tjsc.jus.br/cpo/pg/search.do?paginaConsulta=1&localPesquisa.cdLocal=-1&cbPesquisa=NUMPROC&tipoNuProces
acesso nesta data), ajuizada contra Rádio Rio Negrinho Ltda., condenando os
autores/apelantes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios,
estes fixados em R$ 4.000,00 (quatro mil reais - fls. 411/416).
Malcontentes, os insurgentes alegam que a apelada transmitiu uma
matéria jornalística publicada em periódico de circulação local, sem, contudo, verificar
a autenticidade e a veracidade das informações divulgadas, circunstância que lhes
teria ocasionado excepcional sofrimento, visto que lhes foram atribuídas condutas
incompatíveis com o exercício do cargo de vereador, denegrindo a sua imagem
perante os eleitores.
Asseveraram, preliminarmente, a violação do princípio da identidade
física do juíz, pois a sentença vergastada não teria sido prolatada pelo magistrado
que presidiu a audiência de instrução e julgamento, sobressaindo, no mérito, que
estaria evidenciado nos autos que a divulgação de fatos cuja autoria lhes foi
falsamente imputada, extrapolou o direito à liberdade de imprensa, já que o locutor da
Rádio Rio Negrinho Ltda. teria agido com a finalidade específica de atingir a sua
honra subjetiva, sem oportunizar-lhes o direito de resposta, motivo pelo qual objetivando a interposição de eventual recurso extraordinário e/ou especial -,
lançaram prequestionamento acerca do disposto no art. 186 do Código Civil e art. 49
e seguintes da Lei n° 5.250/1967, pugnando pelo conhecimento e provimento do
reclamo, dando-se guarida à pretendida indenização pelo alegado dano moral (fls.
421/442).
O recurso foi recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo (fl. 466).
Em sede de contrarrazões, a Rádio Rio Negrinho Ltda. argumentou que
não teve a intenção de denegrir a imagem dos apelantes, tendo apenas transmitido as
notícias que já teriam sido amplamente divulgadas acerca da ausência de Abel
Schroeder, Alcides Grohskopf, Célio Paulo Tureck e Luiz Carlos Ribeiro no seminário
sobre "Ações legislativas e executivas no período eleitoral", realizado no município e
comarca de Itapema-SC, isto apesar de terem recebido as diárias correspondentes ao
período do evento, o que denotaria mero relato dos acontecimentos, razão porque
bradou pela manutenção do julgado (fls. 476/483).
Ascendendo a esta Corte, os autos foram originalmente remetidos ao
Desembargador Monteiro Rocha (fls. 488/489), vindo-me às mãos em razão de
superveniente assento nesta Quarta Câmara de Direito Civil.
Este é o relatório.
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
VOTO
Conheço da presente insurgência, pois demonstrados os respectivos
pressupostos de admissibilidade.
Num primeiro momento, convém destacar que, de fato, segundo o
disposto no art. 132 do Código de Processo Civil, o juiz, titular ou substituto, que
concluir a audiência, julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado ou afastado
por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao
seu sucessor.
Todavia, este Sodalício tem pacificado o entendimento de que a violação
ao princípio da identidade física do juiz não enseja nulidade, se o togado que presidiu
a audiência de instrução estiver afastado, e a decisão for prolatada por outro julgador,
que poderá decidir, ou não, acerca da imperiosa repetição do ato:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÕES DECLARATÓRIAS DE ANULAÇÃO DE
TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS C/C REPARAÇÃO DE DANO E AÇÕES CAUTELARES
DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA.
VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. INOCORRÊNCIA.
EXEGESE DO ART. 132 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DUPLICATAS SEM
ACEITE. COMPROVAÇÃO DA ENTREGA DAS MERCADORIAS. ACEITE POR
PRESUNÇÃO. VALOR DA CONDENAÇÃO PLEITEADO EM RECONVENÇÃO.
EQUÍVOCO CONFIGURADO. CORREÇÃO DEVIDA. RECURSOS PARCIALMENTE
PROVIDOS.
"Inocorre nulidade por violação ao princípio da identidade física do juiz se o
magistrado titular que presidiu a instrução do feito, independentemente do motivo,
está afastado e a sentença é proferida por juiz substituto, que poderá decidir acerca
da necessidade ou não da repetição do ato [...] (Apelação Cível n° 2007.063795-6 e
Apelação Cível n° 2007.063796-3, de São José. Relator: Des. Monteiro Rocha, j.
26/03/2009) (Apelação Cível n° 2005.038436-5 e Apelação Cível n° 2005.036363-9,
de Criciúma. Relator: Des. João Henrique Blasi, j. 13/01/2010).
E, mais,
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. REVISIONAL DE ALIMENTOS.
SENTENÇA REDUTORA DA VERBA. RECURSO DE APELAÇÃO DOS
ALIMENTANTES. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA NÃO EXAMINADO EM
PRIMEIRO GRAU. HIPOSSUFICIÊNCIA COMPROVADA. DEFERIMENTO.
INFRAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. IRRELEVÂNCIA.
AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. NULIDADE NÃO CARACTERIZADA. MÉRITO.
REDUÇÃO DOS RENDIMENTOS DO ALIMENTANTE INCOMPROVADA. BINÔMIO
NECESSIDADE-POSSIBILIDADE (CC, ARTS. 1.694, § 1º, E 1.699). RECURSO
PROVIDO (Apelação Cível n° 2011.062842-4, de Joinville. Relator: Des. Luiz Carlos
Freyesleben, j. 21/11/2011).
Portanto, conclui-se que, com o afastamento do magistrado que presidiu
a audiência, admite-se a análise dos autos por seu sucessor, sem que tal fato enseje
violação ao princípio da identidade física do juiz, que não se revela absoluto,
especialmente quando sequer há menção acerca de qualquer prejuízo para as partes.
Passo, pois, ao exame de mérito, sobressaindo que o art. 5° da
Constituição Federal de 1988, em seu inc. X, preconiza que são invioláveis a
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Entretanto, ao tratar da comunicação social, a Carta Magna estabelece
em seu art. 220 que 'a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer
restrição', dispondo, inclusive, que 'nenhuma lei conterá dispositivo que possa
constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo
de comunicação social, observado o disposto no art. 5°, incs. IV, V, X, XIII e XIV'.
De outra banda, o art. 186 do Código Civil estabelece que 'aquele que,
por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito', atraindo para si consoante se infere do disposto no art. 927 do aludido codex -, a obrigação de
indenizar, observando-se, para tanto, os princípios da razoabilidade e
proporcionalidade.
Sobre os elementos da responsabilidade civil extracontratual, citando
Moreira Alves, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam que
Pressupostos da responsabilidade civil extracontratual. Funda-se no ato ilícito
absoluto, composto por elementos objetivos e subjetivos. São elementos objetivos do
ato ilícito absoluto: a) a existência de ato ou omissão (ao comissivo por omissão),
antijurídico (violadores de direito subjetivo absoluto ou de interesse legítimo); b) a
ocorrência de um dano material ou moral; c) nexo de causalidade entre o ato ou a
omissão e o dano. São elementos subjetivos do ato ilícito absoluto: a) a
imputabilidade (capacidade para praticar a antijuridicidade); b) a culpa em sentido
lato (abrangente do dolo e da culpa em sentido estrito) (Código Civil Comentado, 6.
ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 733).
Do excerto epigrafado, infere-se que a responsabilização civil pressupõe
a demonstração de uma conduta contrária ao direito (ato ilícito), na qual se verifique a
culpa ou dolo do agente, o nexo de causalidade entre esta conduta e o dano
provocado a outrem, e a existência do próprio dano, conceituado por Fernando
Noronha como o prejuízo "que viole qualquer valor inerente à pessoa humana ou
atinja coisa do mundo externo que seja juridicamente tutelada" (Direito das
Obrigações. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 474).
Ao versar sobre o tema, Adauto de Almeida Tomaszewski salienta que
"imputar a responsabilidade a alguém, é considerar-lhe responsável por alguma coisa,
fazendo-o responder pelas conseqüências de uma conduta contrária ao dever, sendo
responsável aquele indivíduo que podia e devia ter agido de outro modo" (Separação,
violência e danos morais - a tutela da personalidade dos filhos. São Paulo: Editora
Paulistana Jur, 2004. p. 245).
Já Rui Stoco, destaca que "toda vez que alguém sofrer um detrimento
qualquer, que for ofendido física ou moralmente, que for desrespeitado em seus
direitos, que não obtiver tanto quanto foi avençado, certamente lançará mão da
responsabilidade civil para ver-se ressarcido" (Tratado de responsabilidade civil:
doutrina e jurisprudência. 7. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2007. p. 112).
Por sua vez, Aguiar Dias avulta que
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
A responsabilidade pode resultar da violação, a um tempo, das normas, tanto
morais, como jurídicas, isto é, o fato em que se concretiza a infração participa de
caráter múltiplo, podendo ser, por exemplo, proibido pela lei moral, religiosa, de
costumes ou pelo direito. Isto põe de manifesto que não há reparação estanque entre
as duas disciplinas. Seria infundado sustentar uma teoria do direito estranha à moral.
Entretanto, é evidente que o domínio da moral é muito mais amplo que o do direito, a
este escapando muitos problemas subordinados àquele, porque a finalidade da regra
jurídica se esgota com manter a paz social, e esta só é atingida quando a violação se
traduz em prejuízo (Da responsabilidade civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979.
p. 5)
Por fim, Darcy Arruda Miranda, citado por Rolf Madaleno, salienta que
"todo homem tem um valor moral próprio dentro do seu círculo social e esse conceito
passa a integrar a sua personalidade, e sua aceitação social depende da preservação
desses valores éticos, desse seu prestígio moral inalienável, violável e invulnerável",
porquanto "o dano moral respeita uma lesão aos sentimentos afeições legítimas de
uma pessoa, ou quando lhe ocasionam prejuízos que se traduzem em padecimentos
físicos, ou que de uma maneira ou outra perturbam a tranquilidade e o ritmo de vida
normal da pessoa ofendida" (Curso de direito de família. Rio de Janeiro: Forense,
2011. pp. 337/338).
Partindo dessa premissa, conclui-se que, para a instituição da objetivada
reparação, é imprescindível a demonstração de que a conduta dita reprovável tenha
efetivamente lesionado bem juridicamente tutelado.
Na espécie, os apelantes, que à época dos fatos eram vereadores no
município de Rio Negrinho-SC, afirmaram que a Rádio Rio Negrinho teria divulgado
informação inverídica acerca de suas participações em seminário realizado município
e comarca de Itapema-SC, dando a entender que eles teriam se apropriado
indevidamente de verba pública, circunstância que lhes teria causado excepcional
sofrimento, ensejador da pretendida reparação.
Entretanto, após detidamente analisar o conjunto probatório carreado
aos autos, não constato a alegada ofensa à honra subjetiva dos recorrentes, e,
tampouco, a violação de outros atributos que lhe são inerentes à personalidade, tais
como o direito à privacidade, à intimidade e à imagem.
Isso porque, em razão de terem sido eleitos para representarem os
interesses dos cidadãos do município de Rio Negrinho-SC, Abel Schroeder, Alcides
Grohskopf, Célio Paulo Tureck e Luiz Carlos Ribeiro estavam sujeitos à exposição
pública e eventuais críticas recebidas por conta da sua atuação política, competindo à
imprensa relatar e noticiar os fatos de interesse de toda a coletividade.
Ademais, é incontroverso que o locutor da Rádio Rio Negrinho apenas
procedeu a leitura de matéria jornalística publicada no periódico A Gazeta de São
Bento do Sul (fls. 110/111), inclusive especificando a respectiva fonte (fl. 114), em
razão do que - de acordo com a transcrição de excerto do programa apresentado por
Ricardo Otto Cziczek Redlich (fl. 118) - foi garantido aos insurgentes o direito de
resposta, que foi exercido exclusivamente por Abel Schroeder, que, em nome dos
demais edis, verberou as acusações lançadas pela mídia, registrando sua indignação
para com a alegada irresponsável divulgação de fatos que, segundo referiu,
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
destoariam da realidade.
Tampouco o comentário realizado pelo radialista após a manifestação
de Abel Schroeder denota conteúdo injurioso, tendo sido ressaltado, apenas, que a
malsinada notícia teria sido amplamente divulgada pelos meios de comunicação, que
relataram os acontecimentos que são de interesse da sociedade local (fl. 119).
Portanto, em que pese os apelantes sustentem que o exercício do direito
de informação, in casu, teria ultrapassado os limites delineados pelo art. 220 da
Constituição Federal de 1988, não se evidencia o alegado abalo anímico, pois, como
já referido, a notícia transmitida pela Rádio Rio Negrinho foi apenas extraída de
periódico que já havia divulgado a chamada `farra das diárias´.
Gize-se, a propósito, que a liberdade de imprensa não pode ser
censurada, sobretudo na divulgação de fatos que são relevantes e merecem ser
levados ao conhecimento do povo, quanto a seus representantes, eleitos para
atuarem em defesa do interesse público, sendo defeso à mídia fiscalizar a atuação
dos agentes políticos.
Neste sentido, Antônio Jeová Santos preleciona que
As pessoas que se tornam notórias, conhecidas pelo público em geral,
normalmente atraem sobre si manifestações e juízos de valoração nem sempre
favoráveis, por melhores que sejam tais pessoas.
No caso dos políticos, estão sujeitos de forma especial às críticas públicas, e é
fundamental que se garanta não só ao povo em geral larga margem de fiscalização e
censura de suas atividades, mas sobretudo à imprensa, ante a relevante utilidade
pública da mesma.
Os políticos, quando detêm cargos eletivos, mandatários que são do povo,
devem estar submetidos à permanente observação de seus atos como tais, motivo
pelo qual, ressalvada a vida privada de cada um, cumpre-lhes conformarem-se como
natural a própria atividade que exercem, como a veemência dos inconformismos
daqueles que não sigam as mesmas orientações em tal campo.
[...] A notícia que envolve funcionários ou agentes públicos interessa não
apenas para dar conhecimento do que se sabe, como também, igualmente, para
criticar, pois a crítica, nesses casos, constitui em eficaz instrumento para controle
dos atos de governo e para que a comunidade possa valorar e apreciar os assuntos
de interesse geral provenientes daqueles que atuam na esfera do poder, é que a
proteção à honra dos funcionários públicos esbarra nos elevados interesses da
comunidade. A proteção a essas pessoas não deve ser observada com o mesmo
rigor das pessoas simples, que não detêm nenhuma fração do poder (Dano moral
indenizável. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 333).
A respeito do assunto, Oduvaldo Donnini e Rogério Ferraz Donnini
salientam que
A liberdade de expressão e de informação é um direito fundamental, sendo
facultada a qualquer pessoa a livre manifestação do pensamento, opiniões e idéias,
por intermédio de escritos, imagem, palavra ou qualquer outro meio, assim como o
direito de informar ou receber informações. Nas sociedades democráticas essa
garantia tem sido constante, visto que inexiste democracia sem a liberdade de
expressão e informação (Imprensa livre, dano moral, dano à imagem e sua
quantificação a luz do novo código civil. São Paulo: Editora Método, 2002. p. 35).
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
O Código de Ética Jornalista dispõe, em seu art. 2°, que 'a divulgação da
informação precisa e correta é dever dos meios de comunicação e deve ser cumprida
independentemente da linha política de seus proprietários e/ou diretores ou da
natureza econômica de suas empresas', de modo que 'a produção e a divulgação da
informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse
público'.
O referido normativo disciplina, ainda, que o compromisso fundamental
do jornalista é com a verdade no relato dos fatos, devendo pautar seu trabalho na
precisa apuração dos acontecimentos e na sua correta divulgação, além de 'respeitar
o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão' (art. 4°), o que
foi observado na espécie.
Consoante o art. 12 do aludido Código de Ética, compete ainda ao
jornalista:
I - ressalvadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir sempre,
antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas
em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações
não suficientemente demonstradas ou verificadas;
II - buscar provas que fundamentem as informações de interesse público;
III - tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que
divulgar;
IV - informar claramente à sociedade quando suas matérias tiverem caráter
publicitário ou decorrerem de patrocínios ou promoções;
V - rejeitar alterações nas imagens captadas que deturpem a realidade, sempre
informando ao público o eventual uso de recursos de fotomontagem, edição de
imagem, reconstituição de áudio ou quaisquer outras manipulações;
VI - promover a retificação das informações que se revelem falsas ou inexatas
e defender o direito de resposta às pessoas ou organizações envolvidas ou
mencionadas em matérias de sua autoria ou por cuja publicação foi o responsável;
VII - defender a soberania nacional em seus aspectos político, econômico,
social e cultural;
VIII - preservar a língua e a cultura do Brasil, respeitando a diversidade e as
identidades culturais;
IX - manter relações de respeito e solidariedade no ambiente de trabalho;
X - prestar solidariedade aos colegas que sofrem perseguição ou agressão em
conseqüência de sua atividade profissional.
Segundo o depoimento prestado pelo locutor Ricardo Otto Cziczek
Redlich, foi efetuada uma tentativa no sentido de contatar os apelantes para que
previamente se manifestassem acerca da matéria veiculada na edição n° 2.251 do
periódico A Gazeta de São Bento do Sul (fl. 110), o que não se efetivou por conta de
os respectivos edis terem dito que se encontravam em reunião.
Então, o informante asseverou que:
[...] leu a notícia da Gazeta na rádio; que os autores tiveram direito de defesa
na rádio; que antes de veicular a matéria tentou contato com os vereadores, mas não
conseguiu porque estavam em reunião; que a matéria foi veiculada sem o contato
prévio; que após a divulgação da notícia, procurou os vereadores, mas estes não
quiseram tecer comentários naquele dia, tendo procurado a rádio 3 (três) dias após;
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
[...] que falou com a telefonista da Câmara de Vereadores antes de ler a notícia; que
não informou o assunto à telefonista; que a Rádio Rio Negrinho gera notícia com
base em jornais e Internet; que a matéria da Gazeta baseava-se no Jornal Santa
Catarina, edição de domingo; que ouviu comentários que a notícia também saiu no
Diário Catarinense; que a reprodução feita pela rádio é idêntica à veiculada nos
jornais; que a resposta ocupou mais tempo do que a notícia; que os autores sempre
foram procurados mensalmente para conceder entrevistas; que depois dos fatos os
autores não foram mais procurados pela rádio; que comentou que o clima estava
tenso no final da entrevista porque o Sr. Abel estava exaltado; que nunca foi
influenciado pela direção da rádio para fazer determinados comentários ideológicos
ou políticos; [...] que procurou os vereadores antes de ler a notícia para saber sobre
a veracidade desta, mas não os encontrou; que não esperou para divulgar a notícia
após o contato porque a notícia perderia a validade (fls. 343/344).
O ouvinte Salvador Onorino Roell, por sua vez, declarou que teve
conhecimento acerca dos fatos noticiados pela rádio também através de periódicos
locais, não tendo percebido que a intenção do locutor seria exclusivamente de
denegrir a imagem dos apelantes, visto que a atuação política dos mesmos era
rotineiramente comentada, sem se revelar o posicionamento político ou ideológico do
programa.
Do respectivo depoimento, colhe-se que:
[...] ouviu a notícia na Rádio Rio Negrinho; que parece que a rádio concedeu
direito de defesa aos autores; que, como ouvinte, nunca percebeu posicionamento
ideológico ou político da rádio; que os autores, em outras oportunidades, eram
citados pela ré; que nas outras oportunidades a ré não criticou os autores; que a
rádio costuma reproduzir notícias de outros jornais; que conhece o jornal A Gazeta;
que leu no jornal A Gazeta a notícia sobre os fatos em litígio; que leu as notas
seguintes publicadas sobre o fato pela Gazeta; que leu a notícia em outros jornais;
que a ré não deu espaço maior para os fatos do que os outros jornais; que não ouviu
mais comentários na rádio sobre o assunto; que nos outros jornais foi utilizada a
expressão `gazear´; que leu a expressão `gazear´ apenas na Gazeta (fl. 345).
Idem, do depoimento do ouvinte Hilário Antônio Detroz infere-se que
[...] ouviu a notícia na rádio; que antes de ouvir na rádio, leu a notícia no jornal
A Gazeta; que acredita que a rádio divulgou a mesma notícia que estava no jornal;
que ouviu a manifestação dos autores sobre os fatos na rádio; que a rádio costuma
reproduzir os noticiários de outros jornais; que ouviu comentários de que a notícia foi
divulgada no Diário Catarinense e em outro jornal; que ouve com freqüência a rádio e
nunca ouviu outras críticas ou agressões da rádio para com os autores; que a rádio
não tem posicionamento ideológico ou político partidário (fl. 346).
Destarte - ao contrário do que foi sustentado pelos apelantes -, entendo
que o locutor da Rádio Rio Negrinho não agiu com o intuito de macular a honra
subjetiva de Abel Schroeder, Alcides Grohskopf, Célio Paulo Tureck e Luiz Carlos
Ribeiro, merecendo destaque que, em razão de os mesmos serem agentes políticos,
inevitavelmente estão sujeitos às críticas e têm a sua atuação pública fiscalizada tanto
pela mídia, quanto pelos eleitores, o que se revela imprescindível para a manutenção
da ordem do Estado Democrático de Direito.
Portanto, não demonstrado que a malsinada informação foi divulgada de
modo descomprometido com a ética e em desconformidade com a função social do
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
jornalista - já que a recorrida apenas transmitiu a íntegra de notícia já veiculada em
periódico de circulação regional -, entendo mais consentânea à situação jurídica
subjacente a manutenção do comando vergastado, que se revela em consonância
com o direito aplicável e de acordo o entendimento jurisprudencial consolidado por
este Sodalício:
RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LEI DE
IMPRENSA. ALEGAÇÃO DE OFENSA À HONRA E FALSA IMPUTAÇÃO DE CRIME
ATRAVÉS DE PROGRAMA DE RÁDIO. REPRODUÇÃO IDÊNTICA DE MATÉRIA
PUBLICADA ANTERIORMENTE EM PERIÓDICO LOCAL. CITAÇÃO DA FONTE E
DO JORNALISTA RESPONSÁVEL PELA REPORTAGEM. ANIMUS CALUNIANDI
OU DIFAMANDI NÃO VERIFICADOS. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE.
MERO ANIMUS NARRANDI DE FATOS QUE JÁ ERAM DE CONHECIMENTO
PÚBLICO. SENTENÇA REFORMADA. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS.
RECURSO DA RÉ PROVIDO. RECURSO ADESIVO PREJUDICADO
Mera referência, via rádio, acerca de reportagem publicada anteriormente em
periódico de circulação local, inclusive com citação da fonte, sem o ânimo nem o
efeito de atingir a honra de outrem, não configura dano moral passível de
indenização (Apelação Cível n° 2006.024632-9, de Concórdia. Relator: Des. Marcus
Tulio Sartorato, j. 08/10/2007).
E, mais,
Os vereadores, enquanto agentes públicos que são, devem estar
acostumados, aceitando e convivendo com as críticas destinadas a sua atuação
profissional, principalmente por representarem a população e seus interesses.
"O apontamento de fatos supostamente ocorridos durante a vereança do autor,
bem como a censura da opinião pública, não devem ser suficientes à configuração
do dano moral indenizável, eis que o indivíduo inserido no mundo político, ao assumir
determinado cargo, deve ter ciência da possibilidade de enfrentar oposição dos
administrados e legislados, os quais depositaram total confiança ao o elegerem como
seu representante". (Apelação Cível n° 2005.008338-4, de Laguna. J. 09/09/2005)
[...] (Apelação Cível n° 2009.045193-6, de São Bento do Sul. Relator: Des. Henry
Petry Junior, j. 27/10/2009).
Bem como,
APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA QUE CONDENA COLUNISTA E PERIÓDICO
SOLIDARIAMENTE POR DANO MORAL DECORRENTE DE MATÉRIA
JORNALÍSTICA. ARTIGO INICIAL QUE CONTÉM CRÍTICA CONTUNDENTE À
ATUAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA DO AUTOR, NO EXERCÍCIO DAS
FUNÇÕES DE DIRETOR REGIONAL DA FATMA. AUSÊNCIA DE OFENSAS
PESSOAIS. DIREITO DE RESPOSTA ASSEGURADO. LESADO QUE SUGERE
INVEJA DO JORNALISTA E O COMPARA A UMA COBRA, UTILIZANDO-SE DE
UMA PARÁBOLA. PERIODISTA QUE, NA TRÉPLICA, DE FORMA SATÍRICA,
REBATE A VERSÃO DO OFENDIDO, REITERANDO AS CRÍTICAS ANTERIORES.
EXERCÍCIO REGULAR DO MISTER DE JORNALISTA, QUE EM UMA SOCIEDADE
DEMOCRÁTICA E PLURAL, NÃO APENAS DESCREVE OS FATOS, SENÃO OS
INTERPRETA E SOBRE ELES EMITE SUA OPINIÃO. CONDUTA ANTIJURÍDICA
NÃO CONFIGURADA. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR.
RECURSOS CONHECIDOS, SENDO O PRINCIPAL PROVIDO, PREJUDICADO O
RECURSO ADESIVO (Apelação Cível n° 2008.007635-7, de Joaçaba. Relator: Des.
Ronei Danielli, j. 20/09/2011).
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
E especialmente:
Os políticos de uma forma geral e, inclusive, quaisquer agentes públicos, pela
posição que ocupam e em razão de suas funções estão expostos às mais diversas
críticas sobre a sua atuação na administração da máquina pública, devendo conviver
e aceitar as insurgências do povo e das pessoas que o representam de alguma
forma, só podendo caracterizar abalo a sua moral quando comprovada a má-fé
daqueles que o criticaram ou ainda o abuso desse direito por parte desses (Apelação
Cível n° 2008.057056-3, de Brusque. Relator: Des. Saul Steil, j. 27/05/2011).
Ademais, os alegados reflexos negativos na carreira política dos autores
por conta da malsinada notícia transmitida pela Rádio Rio Negrinho não restaram
evidenciados nos autos, visto que, segundo o relatório apresentado pelos próprios
vereadores, conquanto tenha havido redução do número de votos, os eleitores
novamente conduziram os candidatos Alcides Grohskopf e Luiz Carlos Ribeiro aos
cargos públicos a que concorreram na eleição realizada em 2004, pleito do qual os
demais autores não participaram por razões que, ao que tudo indica, não apresentam
relação direta com os fatos imputados à Rádio Rio Negrinho (fls. 367/376)
Por derradeiro, indefiro o requerimento dos insurgentes de manifestação
expressa acerca do disposto na Lei n° 5.250/1967 para fins de prequestionamento,
posto que, como é cediço, o relator não está obrigado a se pronunciar
minuciosamente a respeito de todos os pontos levantados pelas partes, quando as
suas razões de decidir restarem devidamente fundamentadas, solucionando o objeto
da lide.
Ante todo o exposto, por não estarem demonstrados os pressupostos da
responsabilização civil elencados no art. 186 do Código Civil, evidenciado-se o mero
exercício do direito de informação jornalística, voto no sentido de se conhecer e negar
provimento ao recurso.
Este é o voto.
Gabinete Des. Luiz Fernando Boller
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Apelação Cível n° 2008.043108-9, de Rio Negrinho Relator: Des