A NEGOCIAÇÃO NO PROCESSO DE GESTÃO
EMPRESARIAL: DA NECESSIDADE À ARTE
Negociar é arte que se aprende
e se aprimora na prática
Historicamente, a negociação tem sido considerada um processo intimidante,
frustrante e opressivo, principalmente se utilizada como ferramenta para resolver
desentendimentos pessoais ou de negócios, pois acaba por mexer com as nossas
emoções e percepções – questões subjetivas, as quais nos causam muito desgaste.
Por conta desse enfoque, sustentado anos e anos, muitas pessoas deixam de negociar,
acreditando que essa condição seria prerrogativa de negociadores habilidosos, que
sabem preservar suas emoções, valendo-se de comportamentos frios e impessoais.
Kassem Mohamed El Sayed
O certo é que, sem nenhum conhecimento técnico, ou de forma atabalhoada,
negociamos o tempo todo. As únicas situações em que não podemos negociar são
as que envolvem o nosso nascimento físico e, posteriormente, o nosso nascimento
para o mundo espiritual.
Gestão
Negociação e relacionamentos
Hoje, negociação é encarada como uma arte, que,
neste caso, é entendida como aquilo que se aprende e
se aprimora na prática , sendo formada por três
elementos: a criatividade, a sensibilidade e a intuição.
Para desenvolvermos uma negociação bem-sucedida,
devemos:
• aprender sobre o processo de negociação;
• compreender a si mesmo; e
• buscar a construção de melhores relacionamentos.
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Desse modo, a negociação deve ser considerada como a
oportunidade tão almejada para nos desenvolver e fortalecer
os nossos relacionamentos em todos os aspectos da vida.
Um processo de negociação bem conduzido não
faz somente um vencedor, mas gera condições
de satisfazer todas as pessoas envolvidas, com
os resultados atingidos
Com base nesse desenvolvimento e fortalecimento das
relações é que os melhores negociadores atuam,
procurando fazer muitas perguntas, ouvir cuidadosamente,
concentrar-se no que desejam, manter-se sintonizados com
o que está ocorrendo e descobrir o que a outra parte
envolvida no processo pretende conseguir.
Esses mesmos negociadores encaram a negociação
com seriedade, jogam limpo e preservam uma perspectiva
profissional no relacionamento, buscando manter o seu
equilíbrio independentemente do modo como procede o
outro lado.
Precisamos compreender que o processo de
negociação não faz somente um vencedor, mas tem
condições de satisfazer todas as pessoas envolvidas, com
os resultados alcançados.
• avaliar todas as variáveis envolvidas;
• conduzir o processo de forma a perceber qual o
melhor momento para a tomada de decisão;
• reforçar, depois de tomada a decisão, o compromisso
acordado, de preferência registrando-o.
Saber ouvir é uma
habilidade que permite
obter muitas respostas e
identificar os interesses
envolvidos na negociação,
facilitando a decisão
Conceito de negociação
Certamente a maioria das pessoas tem conhecimento de
vários conceitos de negociação, que vão desde obter um sim,
passam pela prerrogativa de se saber usar a informação e o
poder que a mesma gera e chegam até a tomada de decisão
para se otimizar interesses. Negociação também é entendida
como um processo de comunicação que se desenvolve quando
queremos algo de uma outra pessoa. Note-se que, em todos
esses conceitos, o comportamento mais marcante é o de
conquista, o de persuasão da outra parte.
O conceito que, de nosso ponto de vista, caracteriza a
negociação como uma arte a ser treinada e desenvolvida
é: um processo que envolve uma ou mais partes com
interesses comuns e/ou antagônicos, que se sentam para
confrontar e discutir propostas explícitas com o objetivo
de alcançar um acordo.
Por ser concebida como um processo, precisamos ter a
definição do objeto da negociação e, principalmente, saber
de onde extrair as informações para o adequado planejamento
e condução da negociação. Para tanto, é necessário
considerarmos mais algumas questões importantes:
• identificar os aspectos em comum para ambas as
partes;
• perceber os interesses múltiplos que estão envolvidos;
• manter o foco voltado para as soluções, em vez de
desperdiçá-lo nos problemas;
• focalizar os benefícios para ambas as partes;
Etapas do processo
de negociação
Existem quatro etapas que são consideradas as mais
importantes no processo de negociação.
Planejamento
É a etapa mais importante e também a mais negligenciada
pelos negociadores. Mais de 60% do êxito de uma negociação
depende de um planejamento bem feito. Nesta etapa, iremos:
• examinar interesses e definir metas;
• definir a relação a ser estabelecida após a negociação;
• supor quais serão os interesses e objetivos do outro;
• coletar as informações necessárias;
• prever possíveis impasses e como evitá-los e
superá-los.
Abertura
Nesta etapa, as partes interessadas estão frente a
frente. Por isso, é extremamente importante criarmos um
clima favorável ao entendimento desde o início e também:
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• “quebrar o gelo” e reduzir eventuais tensões;
• buscar consenso entre a pauta e o tempo disponível
para a negociação;
• apresentar seus propósitos e estimular o interlocutor
a fazer o mesmo.
Desenvolvimento
Muitas vezes iniciamos a negociação nesta etapa,
esquecendo-nos das anteriores. No entanto, isso é um erro,
pois o desenvolvimento será muito mais fácil se precedido
da etapa de planejamento.
Nesta etapa devemos nos preparar para:
• explorar e compreender variáveis envolvidas;
• perguntar e ouvir atentamente, clarificando pontos
obscuros;
• pesquisar e criar alternativas de ganho mútuo;
• buscar concordância de posição vantajosa para ambos;
• evitar e/ou superar impasses.
Acordo
Este momento requer muita sensibilidade. Devem-se
evitar a impaciência e a precipitação. Ainda, precisamos
estar atentos aos sinais emitidos pelo outro e:
• resumir o que ficou combinado;
• recapitular os benefícios mútuos;
• verificar se não há mal-entendidos ou resistências;
• formalizar o compromisso;
• registrar o que foi acordado;
• combinar (se houver) os próximos passos e definir
o cronograma.
Gestão
Principais habilidades
na negociação
Entre as habilidades exigidas no processo de negociação,
destacamos o distanciamento emocional, uma vez que sem
esse distanciamento podemos prejudicar o andamento da
negociação, principalmente se a outra parte envolvida
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resolver utilizar a tática do apelo emocional. Outra habilidade
é o saber ouvir sabiamente, pois esta prática permite obter
muitas respostas e identificar os interesses envolvidos na
negociação, facilitando a decisão.
Um capítulo à parte no tocante às habilidades consiste
em utilizar a comunicação de forma clara e correta,
incluindo-se aí todo movimento corporal e gestual no
processo de persuasão, que caracteriza o ponto central
da negociação.
Frases como:
“ Mande para mim que eu negocio
qualquer coisa a qualquer momento”
soam infantis, pois levam a uma
negociação sem a preparação e
concentração necessárias para se
alcançar um acordo vantajoso para
ambas as partes
Personalidade dos
negociadores
Os filósofos gregos, em seus estudos de retórica,
definiram os seguintes traços essenciais na personalidade
dos negociadores e em ordem de importância:
• ethos ou ética - conjunto de valores construtivos e
presentes, como respeito, integridade, justiça,
responsabilidade, digno de confiança, senso de humor
e autodisciplina;
• pathos ou empatia - forte emoção que comove a alma,
o que inclui paciência, flexibilidade, energia pessoal e
ego suficientemente qualificado para uma disposição
de ficar em segundo plano e saber lidar com as
diferenças. Esta característica foi explorada por Daniel
Golleman em sua obra Inteligência Emocional; e
• logos ou inteligência racional - característica
resultante do processo de educação formal, da
preparação do negociador e da sua capacidade de
buscar o contínuo aperfeiçoamento.
Erros comuns no processo
de negociação
A grande maioria dos negociadores insiste em repetir
os mesmos erros. Entre os mais comuns, está aquele que
mais compromete o sucesso da negociação: a falta de
planejamento do que deverá ser realizado durante os
encontros negociais. Saibamos que frases como “Mande
para mim que eu negocio qualquer coisa a qualquer
momento” soam infantis ou sem sentido, pois levam a uma
negociação sem a devida preparação e concentração
necessárias para se alcançar um acordo vantajoso para
ambas as partes.
Alguns outros erros podem ser:
• negociar com a pessoa errada;
• insistir em uma posição;
• sentir-se impotente durante uma negociação;
• perder o controle da negociação;
• afastar-se das metas e limites estabelecidos;
• preocupar-se demais com o outro;
• pensar na “resposta certa” no dia seguinte;
• culpar-se pelos erros dos outros.
se dar ênfase ao outro lado que está negociando ou de
preocupar-se em garantir os próprios interesses.
Consideram-se também, entre os estilos de negociação, as
características de formalidade ou de informalidade.
A bem da verdade, o processo de negociação deve
contemplar a busca da mútua satisfação. Mais do que o
simples resultado da negociação, o que importa é o nível
de prazer em ter participado dela e o quão gratificante ela
foi em termos de realização pessoal e de melhoria das
relações, além da possibilidade de se estabelecerem laços
de respeito mútuo.
Independentemente de quem ou do que priorizar no
processo de negociação, o mais importante e praticá-lo e
não ter medo dos resultados que dele poderão advir. Só a
prática permitirá que alcancemos o estado de arte, pois as
técnicas de negociar e as táticas a serem utilizadas, todas
elas são fruto da experiência do dia-a-dia em qualquer
situação da nossa vida.n
Prioridades no processo
de negociação
Todos os grandes estudiosos do assunto, sejam eles
especialistas americanos (da Harvard, Wharton, Richmond,
Califórnia, etc.), ou especialistas brasileiros, destacam como
definidores dos estilos de negociação as características de
Kassem Mohamed El Sayed é psicólogo, especialista pela Universidade
do Texas e pelo Japan Productivity Center for Social and Economic
Development, mestre em Engenharia de Produção pela UFSC e professor
da FAE Business School.
E-mail: [email protected]
REFERÊNCIA
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1996.
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