Equipe
Ernesto Moreira Guedes Filho
Carla Rossi
Carolina Guerra
Andrea Curi
AUMENTO NA TRIBUTAÇÃO E OUTRAS DISTORÇÕES
PROVOCADAS PELAS MODIFICAÇÕES NO SEGURO
ACIDENTE DE TRABALHO (SAT)
JANEIRO/2010
Rua Estados Unidos, 498 Jardim Paulista 01427-000 – São Paulo – SP
Tel: 5511 3052 3311 Fax: 5511 3884 9022 www.tendencias.com.br
1
AUMENTO NA TRIBUTAÇÃO E OUTRAS DISTORÇÕES PROVOCADAS
PELAS MODIFICAÇÕES NO SEGURO ACIDENTE DE TRABALHO (SAT)
ÍNDICE
SUMÁRIO EXECUTIVO ............................................................................................................................3
1. INTRODUÇÃO...................................................................................................................................12
2. DESCRIÇÃO ......................................................................................................................................15
2.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA .........................................................................................................................15
2.2 O ENQUADRAMENTO DA EMPRESA – ATIVIDADE PREPONDERANTE ..................................................................16
2.3 ALTERAÇÕES RECENTES: O NOVO SAT, O NTEP E O FAP ..............................................................................18
3. RISCO ACIDENTE DE TRABALHO (RAT)/SAT ......................................................................................25
3.1 O AUMENTO DA ALÍQUOTA DE RAT PARA A MAIORIA DAS ATIVIDADES .............................................................25
3.2 O PROBLEMA DA UTILIZAÇÃO DOS PERCENTIS..............................................................................................27
3.3 POSSÍVEIS INCONSISTÊNCIAS DO ENQUADRAMENTO NO RAT .........................................................................28
3.4 ATIVIDADE SIMILARES COM RAT/SAT MUITO DISTINTOS ..............................................................................30
3.5 DISCRIMINAÇÃO DE EMPRESAS COM ATUAÇÃO EM VÁRIAS ATIVIDADES ............................................................30
3.6 DISCRIMINAÇÃO DE SETORES COM DIVERSIDADE TECNOLÓGICA ......................................................................32
3.7 DIFERENÇAS REGIONAIS..........................................................................................................................35
4. FATOR ACIDENTÁRIO DE PREVENÇÃO - FAP.....................................................................................38
4.1 DISTORÇÕES DEVIDO AO PORTE DAS EMPRESAS ...........................................................................................39
4.2 O PROBLEMA DOS PERCENTIS ..................................................................................................................40
4.3 TRATAMENTO DESIGUAL PARA ATIVIDADES COM MELHORA GENERALIZADA NOS ÍNDICES DE ACIDENTALIDADE ..........42
4.4 FALTA DE TRANSPARÊNCIA NO CÁLCULO DO FAP.........................................................................................43
4.5 TRAVA DA MORTALIDADE........................................................................................................................44
4.6 TRAVA DA ROTATIVIDADE .......................................................................................................................45
5. CRÍTICAS GERAIS ..............................................................................................................................46
5.1 MAIOR ONERAÇÃO DO SETOR FORMAL DA ECONOMIA ..................................................................................46
5.2 ACIDENTE DE TRAJETO............................................................................................................................49
5.3 ACIDENTES DE TRAJETO E DISCRIMINAÇÃO..................................................................................................49
5.4 DESPROPORÇÃO ENTRE CUSTOS E ENCARGOS ..............................................................................................50
6. SÍNTESE E CONCLUSÕES ...................................................................................................................52
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................54
ANEXO - O NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO PREVIDENCIÁRIO (NTEP) ..............................................55
A. ASSOCIAÇÕES ESPÚRIAS ENTRE ATIVIDADE ECONÔMICA E ACIDENTALIDADE ........................................................56
B. INCENTIVOS À DISCRIMINAÇÃO DE TRABALHADORES .......................................................................................57
C. INCENTIVOS À UTILIZAÇÃO INDISCRIMINADA DA NTEP ...................................................................................60
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AUMENTO NA TRIBUTAÇÃO E OUTRAS DISTORÇÕES PROVOCADAS
PELAS MODIFICAÇÕES NO SEGURO ACIDENTE DE TRABALHO (SAT)
SUMÁRIO EXECUTIVO
O SAT (Seguro Acidente de Trabalho) é um tributo que incide sobre a folha de
pagamentos das empresas.
Hoje esse tributo representa 1%, 2% ou 3% da folha, de acordo com o grau de
acidentalidade da atividade em que a empresa está classificada (conforme o
enquadramento da empresa na CNAE - Código Nacional de Atividade Econômica)1.
Em 2010, esse ônus pode aumentar em até 500% (quinhentos por cento)!
O aumento decorre de profundas alterações na metodologia de cálculo do SAT que
entram em vigor em 2010.
A primeira grande mudança é a reclassificação do risco de acidentes de trabalho
dos setores de atividade. Das 1.301 subclasses da CNAE, dois terços foram
reenquadradas para alíquotas de SAT mais elevadas.
Antes, 48% das atividades pagavam SAT de 1%, 41% tinham SAT de 2% e apenas
11% das atividades pagavam SAT de 3%. Agora, somente 14% dos setores pagarão
SAT de 1%, enquanto 30% serão onerados com SAT de 2% e 56% com SAT de 3%.
Reclassificação do grau de risco das subclasses da CNAE
730
626
536
391
180
1%
138
2%
2007
3%
2010
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V. Elaboração: Tendências.
Para 67% das atividades econômicas, haverá um aumento do tributo cobrado,
estando prevista redução somente em 4% das atividades.
1
A alíquota a ser paga por cada empresa depende do risco de acidentes de trabalho do setor de atividade
em que ela atua. Se o risco de determinada atividade for considerado leve, a alíquota paga por todas as
empresas que desempenham essa atividade será de 1%. Se a atividade for de risco médio, a alíquota é de
2%. E, por fim, atividades com risco elevado pagam SAT de 3%.
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Deslocamentos derivados do reenquadramento na alíquota do SAT
866 atividades;
67% do total
379 atividades;
29% do total
55 atividades;
4% do total
Redução
Constante
Aumento
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V. Elaboração: Tendências.
Como as informações necessárias para se calcular o impacto disso sobre a
arrecadação do SAT não estão disponíveis, pode-se apenas fazer uma estimação
com base em um exemplo hipotético simplificado.
Caso todos os setores de atividades possuíssem o mesmo número de empresas, e
se essas empresas fossem homogêneas em número de funcionários e massa
salarial, o reenquadramento do grau de risco do SAT, isoladamente, poderia ter um
impacto de até 50% sobre a arrecadação.
A segunda grande mudança é a criação do FAP (Fator Acidentário de Prevenção).
O FAP é um número, diferente para cada empresa, que multiplica a alíquota do SAT
paga pela empresa. Assim, se a empresa estiver enquadrada em uma atividade
com SAT de 3% e tiver um FAP igual a 2 (o máximo), ela pagará esse tributo com
uma alíquota de 6% sobre o total da folha de pagamentos.
O FAP é calculado com base na acidentalidade específica da empresa, comparada à
média da atividade em que atua.
Ao introduzir um elemento individual, considerando diretamente o histórico de
doenças e acidentes de trabalho de cada empresa, no cálculo da alíquota do SAT, o
FAP tem o objetivo de incentivar investimentos em segurança e saúde do trabalho.
A idéia é punir as empresas que apresentem maior acidentalidade e beneficiar
aquelas que se destacam positivamente nesse quesito.
Assim, não são todas as empresas que sofrerão aumento de ônus. Aquelas que
receberem FAP menor do que 1 por apresentarem, teoricamente, baixa
acidentalidade em relação à atividade em que atuam, terão sua alíquota de SAT
reduzida. Por exemplo, se a empresa atua em um setor que tem alíquota de SAT de
3% e tiver FAP de 0,5, irá pagar um alíquota 50% menor, de 1,5% (= 3% x 0,5).
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SAT
FAP
Determinado de
forma coletiva
De acordo com grau
de acidentalidade
médio de cada setor
de atividade (CNAE)
1%, 2% ou 3%
Determinado de
forma individual
x
De acordo com grau
de acidentalidade de
cada empresa
De 0,5 a 2,0
=
Alíquota final a ser
paga por cada
empresa a título de
SAT, a partir de
2010
De 0,5% a 6,0%
A combinação desses dois fatores – SAT e FAP – é que pode produzir aumentos de
até 500%.
Se a empresa atuava em uma atividade antes considerada de risco leve (alíquota
de 1%) e sua atividade foi reenquadrada para um grau de risco alto (alíquota de
3%), somente aí já haveria um aumento de 200%. Porém, se o seu FAP for de 2, ela
pagará uma alíquota de 6%, ou seja, 6 vezes mais o que pagava antes, o que
corresponde a um aumento de 500%.
Esse aumento, porém, não acontecerá todo em 2010. Para este ano,
excepcionalmente, haverá um desconto no FAP, que não chegará ao máximo
possível de 2, mas “apenas” a 1,75. Isso significa que a alíquota de SAT paga por
algumas empresas pode sofrer em 2010 um aumento de “somente” 425%.
Apesar do intuito do FAP, de promover uma maior flexibilização na cobrança do SAT
e prover incentivos econômicos às empresas para que invistam mais em segurança e
saúde do trabalho, sua metodologia esconde alguns problemas críticos, que podem
produzir resultados não-previstos ou não-desejados.
As grandes empresas, que empregam maior número de funcionários e que
representam grande parte dos empregos gerados no Brasil, dificilmente terão um
FAP menor do que um. Esse é um problema grave: discriminação de empresas.
De uma forma geral, as grandes empresas sofrerão grandes aumentos desse
encargo trabalhista.
Como essas empresas representam a maior parcela da massa salarial paga, os
encargos sobre a folha e a arrecadação do tributo irão aumentar.
Ao mesmo tempo, a maioria das empresas de pequeno porte, que têm menor
número de funcionários, foi beneficiada, tendo recebido FAP menor do que 1.
No entanto, por motivos que serão vistos a seguir, a maioria dos descontos
concedidos é pequeno, mesmo para as empresas que apresentaram zero acidente.
Assim, tem-se, de um lado, um grande número de empresas pequenas com
pequenos descontos no pagamento do SAT, e do outro lado, as grandes empresas,
que mais contribuem para a arrecadação do SAT, com grandes aumentos no
pagamento desse tributo, como ilustrado na figura abaixo.
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Massa salarial das
médias e grandes
empresas, com
grandes aumentos
de SAT
Massa salarial das
pequenas empresas,
com pequenos
descontos sobre o SAT
0,5
1,0
2,0
Para se calcular os efeitos, em termos de aumento de arrecadação, que esse
sistema de bonificação e punição do FAP pode representar, são necessários dados
individualizados de cada empresa (FAP), que não estão disponíveis para o público.
Mas tendo em vista que:
i) um grande número de empresas pequenas receberam pequenos
descontos;
ii) as empresas de médio e grande portes, apesar de terem participação
pequena entre o total de empresas, são as que possuem maior número
de empregados, maior massa salarial e, portanto, são as que mais
contribuem para a arrecadação do SAT;
iii) estas empresas sofrerão grandes aumentos de encargos devido ao FAP;
pode-se concluir que o FAP levará a um aumento substancial da arrecadação do SAT,
uma vez que os descontos concedidos serão bastante inferiores ao aumento de ônus
que será imposto às grandes empresas.
Assim, o FAP reforça o aumento do tributo havido quando do reenquadramento
das alíquotas do SAT.
Apenas para se ter uma idéia desse aumento, pode-se recorrer a um exercício
simplificado de estimação.
Suponha um mundo hipotético em que existem 100 empresas que pagam SAT,
sendo 90 de pequeno porte e as restantes 10, de grande porte.
Antes da introdução do FAP, o grupo de empresas de pequeno porte arrecadava
um total de R$ 1.000 a título de SAT, enquanto as de grande porte, apesar de
serem em número reduzido, arrecadavam, juntas, um total de R$ 4.000 (essa
diferença se justifica pelo fato de terem um número bastante superior de
funcionários e pagarem maiores salários). Dessa forma, o SAT arrecadado total era
de R$ 5.000.
Se, por conta do FAP, as pequenas empresas receberem um desconto de 5%,
passando a arrecadar R$ 950, e as empresas grandes tiverem um aumento médio
da alíquota de 60%, passando a pagar R$ 6.400, a arrecadação total sobe para
R$ 7.350, um aumento de 47%.
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Pequenas empresas
Grandes empresas
+
=
+ 60%
6.400
Arrecadação
total de SAT
+ 47%
7.350
5.000
4.000
1.000
Antes
- 5%
950
Depois do FAP
Antes
Depois do FAP
Antes
Depois do FAP
Este exemplo, meramente ilustrativo, é válido para alertar sobre o potencial de
aumento do ônus que a introdução do FAP pode representar.
Lembrando que o reenquadramento do grau de risco das atividades econômicas
também terá um impacto altista sobre a arrecadação, os efeitos combinados do
SAT e do FAP devem levar a um aumento expressivo no montante recolhido de
tributos.
O resultado é o oposto, portanto, do discurso do Ministro da Previdência Social,
José Barroso Pimentel, que afirma que “não há intenção de arrecadar. Bom seria se
tivéssemos ‘zero’ de receita do Seguro de Acidente, pois evidenciaria um
extraordinário e salutar ambiente de trabalho”.
Por outro lado, representantes do governo defendem a necessidade desse
aumento de arrecadação, argumentando que existe um déficit nas contas da
Previdência referente aos gastos com benefícios decorrentes de acidentes e
doenças do trabalho. Contudo, esse argumento não é aceitável.
Os gastos da Previdência com acidentes e doenças do trabalho não constituem
uma conta isolada das demais, a qual deve ter seu saldo zerado. A Previdência
concede um amplo conjunto de pensões e benefícios que são custeados a partir de
diversas fontes de recursos, não havendo uma correspondência direta entre a
arrecadação de cada fonte e despesa.
Assim, ainda que o montante arrecadado com o SAT não possa ser utilizado para
custear gasto público diverso daqueles oriundos de acidentalidade no trabalho,
não existe a necessidade de que esse montante seja de valor correspondente ao
dos gastos da Previdência decorrentes de acidentes e doenças do trabalho. Até
porque esses gastos incluem custos gerados por todas as empresas que atuam no
Brasil, independentemente de elas contribuírem ou não para o SAT.
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Além do aumento da arrecadação, as mudanças propostas trazem uma série de
problemas decorrentes de imperfeições na metodologia utilizada para definição do
SAT.
A metodologia para classificação do grau de risco das atividades econômicas se dá
a partir do uso de percentis. Trata-se de uma forma de ordenar as atividades, de
acordo com os índices de acidentalidade de cada uma.
Número de setores
Esta técnica não é a mais adequada, já que pequenas diferenças nos índices de
acidentalidade podem resultar em alíquotas de SAT muito distintas.
Apesar de o setor B ter acidentalidade
parecida a do setor A, sua alíquota de
SAT é 100% maior!
1%
2%
3%
Índices de acidentalidade
A B
Ainda no caso da SAT, a alíquota é definida de acordo com a atividade
preponderante da empresa. Esta regra parte do pressuposto de que empresas que
desempenham uma mesma atividade são homogêneas.
Isso não é verdade. Dentro de cada atividade econômica, coexistem empresas de
diferentes portes, que utilizam processos de produção e tecnologias diferentes, e
cujos trabalhadores estão sujeitos a riscos distintos no ambiente de trabalho. Nada
disso é considerado na atribuição do grau de risco da empresa.
Como visto, o FAP deveria corrigir esta distorção, acrescentando um elemento
individual, que considera as especificidades de cada empresa. No entanto, a
metodologia de definição do FAP também apresenta problemas, o que resulta em
distorções ainda mais graves.
O FAP é determinado a partir de uma comparação dos índices de acidentalidade de
determinada empresa com os índices apresentados pelas demais empresas que
atuam na mesma atividade econômica.
Justamente pelo fato de coexistirem empresas de diferentes portes dentro de cada
segmento, as grandes acabam sendo prejudicadas na comparação, como já foi dito
acima.
Existe uma enorme quantidade de pequenas empresas que apresentam zero
acidente/ doença do trabalho anualmente.
Já para as empresas de grande porte, por mais que invistam em saúde e segurança
do trabalho, é improvável que tal situação aconteça. Por uma mera questão de
probabilidade estatística, é difícil imaginar que uma empresa de 10 mil
funcionários passe todo o ano sem registrar qualquer evento acidentário.
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Assim, ainda que a empresa ofereça um ambiente bastante seguro de trabalho,
com investimentos constantes nessa área, se ela atuar em um setor com diversas
empresas pequenas que apresentam zero acidentalidade, sua posição no ranking
de classificação será bastante desfavorável, recebendo FAP elevado. Como
resultado, a empresa será punida, com aumentos elevados de encargos sobre toda
a sua folha de pagamentos.
Por outro lado, em empresas com quadro de funcionários reduzido, qualquer
evento acidentário pode resultar em altos índices de acidentalidade e, portanto,
em aumentos na alíquota final de SAT a ser paga.
Mesmo empresas que apresentam zero acidente ou doença do trabalho podem ser
prejudicadas pela metodologia do FAP. Isso porque a forma de cálculo desse fator
faz com ele seja sempre superior a 0,5 (máximo desconto possível) quando há duas
ou mais empresas com acidentalidade zero dentro de um mesmo setor.
Além disso, foi arbitrada uma regra que eleva artificialmente o valor do FAP dessas
empresas, fazendo com que o desconto final seja pequeno.
Posição
correta
0,50
Posição média das
empresas empatadas
com acid. = 0
0,67
0,83
Posição arbitrada pela
regra FAP = 0,5 + (IC *0,5),
sem base legal
1,00
FAP
2,00
Ou seja, registrar zero evento acidentário não é garantia para receber o maior
desconto possível, de 50% (FAP = 0,5), sobre a alíquota do SAT.
A discriminação de empresas de diferentes portes integra um terceiro grupo de
problemas acarretados pelas mudanças do SAT: a introdução de distorções no
tratamento de empresas e setores (e mesmo regiões), penalizando determinados
tipos de empresas e atividades.
Para empresas que atuam em diversas atividades, as distorções surgem do fato de
que apenas o grau de risco da atividade preponderante é considerado.
Veja como exemplo uma grande empresa do setor alimentício. Caso ela possua o
maior número de funcionários trabalhando na atividade de abate de frangos,
classificada como de risco alto, a empresa deverá pagar alíquota de 3% sobre o
salário de todos os seus empregados. Mesmo que um grande número deles
trabalhe em linhas de produção menos arriscadas, como a produção de alimentos
industrializados (ou desempenhe tarefas administrativas e comerciais) todos terão
um ônus de 3% para a empresa.
Outra distorção se deve ao fato de a metodologia do SAT não considerar que,
dentro de uma mesma atividade, existem discrepâncias regionais nos índices de
acidentalidade das empresas.
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Ao ignorar esse fato, admitindo mesma alíquota de SAT para empresas que atuam
em uma mesma CNAE, independente de sua localização, acaba-se por penalizar as
empresas localizadas em regiões com ambiente de trabalho mais seguro.
Por fim, um problema comum ao SAT e ao FAP diz respeito à falta de transparência
em sua definição.
Não é possível reproduzir exatamente os índices de acidentalidade calculados para
cada atividade econômica e de enquadrá-las segundo o grau de risco, dado que
não se dispõe de todo o conjunto de dados utilizado.
Uma análise das informações disponíveis – percentis de freqüência, gravidade e
custo de cada atividade, e sua respectiva alíquota de SAT – deixa dúvidas quanto à
consistência da metodologia utilizada. Por exemplo, das 130 atividades econômicas
que apresentaram os menores percentis de freqüência, gravidade e custo (11,03,
11,2 e 11,57 respectivamente), 41% delas receberam alíquota de SAT igual a 1%, a
40% foi atribuída alíquota de 2% e a 19%, alíquota de 3%.
O fato de algumas atividades aparentemente de baixo risco, como lojas de flores
naturais, casas de suco e de chá, lanchonetes, estacionamentos, agências
matrimoniais, entre outras, estarem enquadradas no grau de risco mais elevado
(3%) também suscita dúvidas, uma vez que os parâmetros usados para esse
enquadramento não foram demonstrados.
Outro fato que gera dúvidas devido à falta de clareza das informações disponíveis
consiste na existência de diversas atividades aparentemente muito similares, mas
para as quais foram atribuídos distintos graus de risco.
Exemplos de atividades similares que têm SAT distintos
CNAE
Descrição
6461100
Holdings de instituições financeiras
SAT
2
6462000
Holdings de instituições não-financeiras
3
6422100
Bancos múltiplos, com carteira comercial
3
6423900
Caixas econômicas
2
6201500
Desenvolvimento de programas de computador sob encomenda
1
6202300
Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis
2
6203100
Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador não-customizáveis
1
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V.
O valor do FAP foi calculado individualmente para cada empresa. Apenas a
empresa tem acesso ao valor de FAP, assim como do seu índice de freqüência,
gravidade e custo, através de identificação e senha. Isso impede que sejam
realizados cálculos precisos sobre os impactos do FAP na arrecadação do SAT,
assim como análises sobre os critérios efetivamente utilizados em sua atribuição e
a verificação de isonomia no tratamento das empresas.
As informações que cada empresa tem acesso também carecem de transparência e
objetividade, dificultando até mesmo para a empresa a reprodução dos cálculos
dos seus próprios índices.
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Outros problemas envolvidos na tributação do SAT são:
Considerar acidentes de trajeto no cálculo dos índices de acidentalidade das
empresas, o que pode levar à discriminação de trabalhadores que vivem longe ou
utilizam meios de transportes mais arriscados para ir ao trabalho.
Induzir a discriminação de trabalhadores, como os mais idosos ou que apresentam
determinados tipos comuns de problemas de saúde (pressão alta, por exemplo),
pois a contratação de um indivíduo pode acarretar ônus para a folha de
pagamentos da empresa como um todo.
Em síntese, apesar do intuito expresso de se prover incentivos para que as empresas
melhorem a segurança em seu ambiente de trabalho, as mudanças no SAT
produzirão alguns efeitos perversos, não-desejados, devido a inconsistências
presentes em sua metodologia. Entre esses efeitos, destaca-se uma maior oneração
do uso de mão-de-obra pelas empresas, sobretudo as maiores. Ademais, discrimina e
penaliza determinados tipos de atividade e empresas em função de seu tamanho,
setor ou modo de atuação, bem como determinados perfis de trabalhadores.
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AUMENTO NA TRIBUTAÇÃO E OUTRAS DISTORÇÕES
PROVOCADAS PELAS MODIFICAÇÕES NO SEGURO
ACIDENTE DE TRABALHO (SAT)
1. Introdução
O Seguro Acidente de Trabalho (SAT) é um tributo que incide sobre a folha de
pagamento das empresas nas alíquotas de 1%, 2% ou 3% de acordo com o
enquadramento do grau de risco do segmento de atividade econômica (CNAE) exercido
pela empresa.
Para 2010, o governo está promovendo duas significativas alterações no SAT: (i) a
reavaliação do grau de risco das atividades da CNAE, resultando para a maioria das
atividades aumento do percentual de risco; e (ii) a introdução do Fator Acidentário de
Prevenção (FAP), que consiste em um multiplicador do Risco de Acidente de Trabalho
(RAT/SAT), calculado para cada empresa, variando entre 0,5 e 2. Assim, dentro de uma
mesma atividade econômica, cada empresa pode ter seu percentual incidente sobre a
folha reduzido até pela metade (multiplicado por um FAP de 0,5) ou até duplicado
(multiplicado por um FAP de 2). Em 2010, excepcionalmente, o valor máximo do FAP
será 1,75.
Entre os objetivos da nova legislação, destaca-se o incentivo à melhora nas condições de
trabalho, com redução de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Conforme José
Barroso Pimentel, Ministro da Previdência Social, “não há intenção de arrecadar. Bom
seria se tivéssemos ‘zero’ de receita do Seguro de Acidente, pois evidenciaria um
extraordinário e salutar ambiente de trabalho”2.
No entanto, como resultado dessas mudanças, inúmeras empresas sofrerão ônus sobre
sua folha de pagamentos, pagando um valor maior de SAT, seja pelo enquadramento em
um grau de risco mais elevado da atividade econômica em que a empresa atua, seja por
um FAP atribuído a empresa maior do que 1 ou, ainda, por efeito de ambos. O efeito
oposto, de redução desse ônus, também pode acontecer, mas à primeira vista, atingirá
um número menor de empresas ou, de forma agregada, será inferior ao aumento.
Este estudo econômico descreve essas modificações, procurando avaliar seus resultados
e os fundamentos e metodologias utilizadas em sua definição.
Para atender a esses objetivos, recorreu-se a uma série de informações e dados sobre as
modificações que estão sendo realizadas:
Em primeiro lugar, destaca-se o livro “Novo Seguro de Acidente e o Novo Fap“
organizado por Remígio Todeschini e Wanderley Codo e editado em novembro
de 2009 pela LTr.
2
In Todesquini e Codo (2009).
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12
Em segundo lugar, destaca-se o conjunto de leis e regulamentações que
instituíram o novo sistema, desde a previsão constitucional até as leis e os
diversos decretos e normas que implementaram essa diretriz, também citados no
livro acima referido.
Outra referência importante é a tese de doutorado Paulo Rogério Albuquerque de
Oliveira, denominada “Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário – NTEP e o
Fator Acidentário de Prevenção – FAP: Um Novo Olhar Sobre a Saúde do
Trabalhador”. Nesse trabalho, definido pelo próprio autor como “pesquisa
acadêmica por demanda induzida pelo Estado”, desenvolveu-se grande parte da
base metodológica das modificações implementadas pelo MPAS. Ainda segundo
o autor, “a metodologia do FAP foi aprovada pelo CNPS (Res. 1.236/2004),
inclusive, a revisão, pela Res 1.269/2006, antes mesmo de a academia dar o
veredicto...” e “O NTEP vira lei em dezembro de 2006 (Lei 11.430). É
regulamentado em fevereiro pelo Decreto Presidencial 6.042 e instrumentalizado
pelo INSS pela Instrução Normativa 16”.
Por fim, o MPAS disponibiliza um amplo conjunto de dados sobre as relações de
trabalho e saúde do trabalhador em seu site na Internet. Esses dados permitiram a
realização de alguns cálculos e estimativas ao longo desta avaliação.
Infelizmente, até mesmo por razões de confidencialidade, esse conjunto de dados
é muito mais restrito que o utilizado pelo MPAS em sues cálculos e estimativas,
o que impossibilita a reprodução de boa parte dos resultados reportados pelo
ministério.
Este trabalho foi organizado em seis seções, incluindo esta Introdução. A Seção 2 traz
um breve histórico do arcabouço legal do SAT, abordando as sucessivas mudanças em
sua regulação, passando pela introdução do NTEP e do FAP.
A Seção 3 analisa os resultados do reenquadramento do grau de risco das subclasses da
CNAE e, portanto, da alteração na alíquota do SAT, chamando a atenção para os
possíveis resultados perversos ocasionados pelas mudanças a serem introduzidas em
2010. Nela são exploradas questões como o aumento da alíquota de SAT para a maioria
das atividades e a discriminação de empresas que atuam em diversas atividades ou que
utilizam tecnologias mais sofisticadas. Também são apresentadas críticas ao uso dos
percentis na comparação entre as subclasses da CNAE para definição da alíquota de
SAT de cada uma, e a possíveis inconsistências do enquadramento do RAT.
A Seção 4 discute os principais conceitos envolvidos no FAP e apresenta algumas
críticas a sua metodologia de cálculo. São questionadas as distorções causadas na
comparação de empresas de diferentes portes e no uso dos percentis, as travas da
mortalidade e da rotatividade, o tratamento desigual dispensado para segmentos de
atividades que produzem uma melhora generalizada nos índices de acidentalidade e a
falta de transparência no seu cálculo.
A seção 5 traz críticas sobre outros aspectos envolvidos na tributação do SAT, com
destaque para o problema de se considerar os acidentes de trajeto nos índices de
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acidentalidade das empresas e o conseqüente incentivo à discriminação dos
trabalhadores. Também são ressaltados os indícios de aumento da carga tributária, com
maior oneração do setor formal da economia.
Por fim, a seção 6 traz as sínteses e conclusões desse trabalho. As referências foram
listadas ao final.
O trabalho contém ainda um anexo, abordando os principais conceitos envolvidos no
NTEP (Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário). Alerta-se para o risco de seu uso
indiscriminado pelos médicos do INSS, dada a existência de associações espúrias em
sua metodologia, e para o risco de incentivos à discriminação dos trabalhadores.
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2. Descrição
O SAT, Seguro Acidente de Trabalho, é um tributo que incide sobre a folha de salário
das empresas, nas alíquotas de 1%, 2% ou 3%. É uma das fontes de financiamento da
Previdência Social para a cobertura de acidentes e doenças advindos dos riscos
ambientais do trabalho.
2.1 A evolução histórica
No Brasil, a legislação que trata dos acidentes de trabalho existe desde a década de
1920. O primeiro normativo a tratar da questão foi editado em 1919 e introduziu o
conceito de risco profissional determinando o pagamento de indenização ao segurado ou
à família, proporcionalmente à gravidade das seqüelas do infortúnio.
Na década de 1930, durante o Governo Getúlio Vargas, foi editado o Decreto
24.6371934, que enunciava que se incluíam como doenças profissionais as doenças
inerentes ou peculiares a determinados ramos de atividade. Quanto à cobertura, o
Decreto instituiu a indenização tarifada e obrigava os empregadores à garantia de seguro
contra acidentes do trabalho em instituição particular ou a optar por um depósito nas
Caixas Econômicas da União ou do Banco do Brasil, em moeda corrente, ou título da
dívida pública federal. Essa norma estabeleceu ainda a pensão para os herdeiros ou
beneficiários do acidentado, desde que inscritos em instituição de seguro social
oficialmente reconhecida.
Na década de 1940 o Decreto nº 7036/1944 alargou o conceito de acidente de trabalho,
incluindo como acidente o in itinere, ou seja, aquele verificado na condução especial
dada pelo empregador, e obrigou aos empregadores proporcionar aos empregados a
segurança e higiene do trabalho, protegendo-os especialmente contra as imprudências
que possam resultar do exercício habitual da profissão.
Na década de 1970 foi editada a Lei nº 6.195/1.974 que tratou do regime rural de
acidentes do trabalho. Também foi sancionada a Lei nº 6.367 que, além de incluir no
conceito de empregado o trabalhador temporário e o avulso, introduziu novo conceito
de doença profissional, restringindo a abrangência da cobertura, pois considerava como
doença as previstas na relação organizada pelo Ministério da Previdência Social.
Atualmente, a Constituição Federal de 1988 estabelece o direito social ao trabalho
seguro, bem como a obrigação do empregador pelo custeio do seguro de acidente do
trabalho. Estes direitos estão consagrados nos Artigo 7º, inciso XXVII, Artigo 195,
inciso I e artigo 201 inciso I, todos da Carta Política. Neste sentido são os dispositivos:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social: XXVIII - seguro contra
acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a
indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;
(...)
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Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de
forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos
provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma
da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
20, de 1998)
(...)
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime
geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados
critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá,
nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20,
de 1998)
I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
Quanto aos dispositivos constitucionais dois pontos merecem destaque. O primeiro é
que a Constituição de 1988 introduziu a teoria do risco social, segundo o qual os riscos
dos acidentes do trabalho são socializados, divididos entre todos da sociedade. A
responsabilidade passa a ser do Estado, que paga uma indenização ao segurado que for
vítima de acidente do trabalho, enquanto permanecer impossibilitado para o trabalho. O
segundo ponto é que Emenda Constitucional nº 20/98, que alterou as disposições do
artigo 201, da Constituição Federal de 1988, excluiu o acidente do trabalho dos eventos
protegidos exclusivamente pelo Regime Geral de Previdência Social. Estabeleceu, dessa
forma, que pode ser permitida a cobertura do risco concorrentemente pelo Regime Geral
de Previdência Social e pela previdência privada. Com isto, a emenda estabelece um
novo marco na temática do acidente do trabalho, permitindo concorrentemente a
atuação do Regime Geral de Previdência Social e do setor privado. Porém, para a sua
implementação da participação concorrente entre a iniciativa privada e o Estado na
gestão de seus recursos, há a necessidade da elaboração de uma lei que regulamente
esse novo dispositivo, o que ainda não ocorreu.
2.2 O enquadramento da empresa – atividade preponderante
A regulamentação do novo texto constitucional ocorreu com a edição da Lei 8.212/91.
Esta Lei define as alíquotas do SAT, de acordo com uma graduação de risco prédefinida e delega a ato normativo infralegal (regulamento) a definição dos eventos que
configuram a obrigação de pagar a contribuição social (hipótese tributária). A norma
dispõe apenas sobre o recolhimento com base em alíquotas fixadas em razão do grau de
risco da atividade preponderante do contribuinte, sem definir o que seria risco leve,
médio ou grave. Assim, as alíquotas constantes da Lei são de 1%, para risco leve, de
2%, para risco médio, e de 3% de risco grave
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Ante tal lacuna, coube ao Decreto 612/1992 a determinação do grau de
periculosidade de cada atividade bem como a definição de atividade
preponderante aquela atividade econômica que ocupa o maio número de
empregados da empresa. Determinou também, como responsabilidade da empresa, o
enquadramento de seus estabelecimentos nos correspondentes graus de risco, segundo a
atividade preponderante de cada um deles, ficando o Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS) com a faculdade de rever essa classificação.
De acordo com este Decreto, o contribuinte com vários estabelecimentos matriz e filiais
deveria buscar o enquadramento para efeito de recolhimento ao SAT. Cada
estabelecimento da mesma empresa poderia ser considerado de forma individualizada e,
portanto, classificado de forma diferenciada para efeitos de SAT, observada a natureza
das atividades e peculiaridades.
Porém, em 1997 a Medida Provisória 1.523-9/1997 deu nova redação à Lei 8.212/91.
Apesar de manter as alíquotas anteriores, a MP determinou que o recolhimento da
Contribuição ao SAT seria feito ".... em razão do grau de incidência de incapacidade
laborativa decorrente dos riscos de trabalho, conforme dispuser o regulamento..."
Neste sentido, o Decreto n° 2.173/1997 foi editado dispondo que a atividade
preponderante seria aquela que, na empresa, ocupa o maior número de segurados
empregados, trabalhadores avulsos ou médicos-residentes. Como será visto mais à
frente, o pagamento da contribuição pela atividade preponderante parece equivocada já
que o tributo deveria levar em consideração a graduação de risco da empresa como um
todo, não obstante a mesma possuir diversos estabelecimentos, com diferentes
atividades e, portanto, com efetiva e real graduação de riscos não uniformes.
Este decreto também obriga as empresas a pagarem a alíquota de 3% (risco grave) sem
que se leve em consideração o percentual de empregados que realmente exercem
funções de risco. É o caso, por exemplo, de empresas que têm escritórios onde está
lotado o pessoal de função eminentemente administrativa. Mesmo assim, pagam a
alíquota máxima. Há o "nivelamento pelo alto" que acaba elevando os custos das
empresas.
A partir da edição deste Decreto, a possibilidade de enquadramento de cada
estabelecimento com grau de risco e taxa do Seguro Acidente do Trabalho compatíveis
deixou de existir. Os estabelecimentos ficaram obrigados a enquadrar-se de acordo com
a atividade preponderante da empresa como um todo. Logo, o enquadramento passou a
ser por empresa e não mais por estabelecimento. Também deve se destacar que o anexo
do texto trouxe uma nova relação de atividades preponderantes e correspondentes graus
de risco, conforme a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE). Essa
nova relação aumentou ou reduziu alguns graus de risco de determinadas atividades
econômicas.
Entre 22 de julho de 1992 e 5 de março de 1997, o mesmo artigo 26 do regulamento
aprovado pelo Decreto 612/92 passou a considerar preponderante a atividade econômica
que ocupa, em cada estabelecimento da empresa, o maior número de segurados
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empregados, trabalhadores avulsos e médicos-residentes, exigindo com no regulamento
anterior CGC próprio, e atividade profissional dentro do estabelecimento.
Em 1997 o Decreto nº 2.173/97 passou a considerar preponderante a atividade que
ocupa, na empresa, o maior número de segurados empregados, trabalhadores avulsos ou
médicos residentes. O Decreto trouxe anexa relação de atividades preponderantes e
correspondentes Graus de Risco.
A nova regulamentação excluiu qualquer referência a estabelecimentos, definindo que a
atividade preponderante seria aquela que ocupasse o maior número de segurados na
empresa. De forma que o enquadramento passou a ser por empresa e não mais por
estabelecimento.
Em 1999 o regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99 manteve o mesmo conceito de
atividade preponderante. Apesar de este Decreto estabelecer que a atividade
preponderante deveria ser considerada como aquela em que está alocado o maior
número de empregados, a Jurisprudência Superior Tribunal de Justiça, em razão das
diversas modificações já mencionadas se posicionava ambiguamente, algumas vezes no
sentido de que a alíquota da contribuição para o SAT deve corresponder ao grau de
risco da atividade desenvolvida em cada estabelecimento da empresa3, e outras vezes no
sentido de que a alíquota da contribuição para o SAT deve levar em conta a atividade
preponderante da empresa, considerada em seu todo.
Somente em 2008 o Tribunal firmou posicionamento no sentido de que a alíquota
da contribuição para o SAT deve corresponder ao grau de risco da atividade
desenvolvida em cada estabelecimento da empresa, ao publicar a Súmula
351/20084.
2.3 Alterações recentes: o novo SAT, o NTEP e o FAP
As principais alterações no SAT ocorreram a partir de 2007 com a edição do Decreto
6042/2007 que regulamentou o Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP) e a variação da
alíquota do SAT básica feita a partir do Fator Acidentário Previdenciário (FAP).
O NTEP foi criado efetivamente pela Lei nº 11.430 de dezembro de 2006 que dispõe:
“Art. 21-A A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza
acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico
3
Recurso Especial RESP 572416 PR 2003/0133756-2 (STJ). Tributário - Contribuição Previdenciária Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) - Princípio da Legalidade - CTN, art. 97 - Grau de Risco Apuração - Atividade Desenvolvida em Cada Estabelecimento da Empresa - Precedentes/STJ. - A eg. 1ª
Seção de Direito Público desta Corte pacificou o entendimento no sentido de que não afronta o princípio
da legalidade (CTN, art. 97) estabelecer-se, por meio de decreto, o grau de risco (leve, médio ou grave),
partindo-se da "atividade preponderante da empresa", para efeito de Seguro de Acidente do trabalho
(SAT). - Alíquota da contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho - SAT - deve corresponder ao
grau de risco da atividade desenvolvida em cada estabelecimento da empresa, mesmo quando esta possui
um único CGC. - Recurso especial conhecido e parcialmente provido.
4
Súmula STJ nº 351 de 11 de jun. de 2008. Publicada no DJe em 19 de jun. de 2008. Alíquota de
Contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho (SAT). A alíquota de contribuição para o Seguro de
Acidente do Trabalho (SAT) é aferida pelo grau de risco desenvolvido em cada empresa, individualizada
pelo seu CNPJ, ou pelo grau de risco da atividade preponderante quando houver apenas um registro.
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epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a
atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade
elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade
com o que dispuser o regulamento”.
Além do Decreto 6042/2007 destaca-se a Instrução Normativa 16 – INSS de março de
07 que definiu os critérios e fundamentos do NTEP.
O NTEP é uma metodologia que objetiva identificar se existe correlação entre
determinado setor de atividade econômica e determinadas doenças. Pela metodologia,
para cada código da CNAE foi estipulada uma correspondência de doenças presumidas
para as referidas atividades, de acordo com a CID-10 da Organização Mundial da Saúde
(OMS), estabelecendo-se um correlação das doenças com o ramo de atividade.
O objetivo principal desse conjunto de mudanças foi a redução da sub-notificação de
acidentes e doenças do trabalho. Com isso, ocorreu um aumento considerável no
número de eventos reconhecidos como de natureza acidentária; em 2007, além dos
casos de notificação destes eventos contabilizados pela CAT (514.135 acidentes e
doenças do trabalho), a Previdência Social reconheceu mais 138.955 casos, um
acréscimo de 21,28%.
Isso ocorreu porque ao adoecer e buscar a perícia do INSS, o trabalhador passou a ter
um enquadramento automático da doença dado o setor de atividade. Antes da Criação
do NTEP, os auxílios doença-acidentários (B-91)5 eram concedidos pelo INSS quando o
empregador emitia a Comunicação de Acidentes do Trabalho (CAT). As demais CATs
não emitidas pelo patronato eram rejeitadas, apesar da previsão da Lei 8.213/91 de que a
CAT deveria ser emitida até mesmo pelo trabalhador, seu sindicato profissional, etc.
Aos trabalhadores com reconhecida incapacitação laboral mas trabalhadores que não
recebiam o auxílio-doença acidentário, o INSS concedia o benefício auxílio doençacomum (B-31). A inexistência da fonte de custeio acabava ocasionando um déficit pela
concessão de benefício doença comum.
A presunção relativa ao nexo ocupacional do NTEP passou a ser dada quando da
realização da Perícia Médica pelo INSS, mesmo que a CAT não tenha sido
realizada pelo empregador. Por este motivo a empresa poderá requerer a não
aplicação do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP) ao caso concreto mediante a
demonstração de inexistência de nexo causal entre o trabalho e o agravo (poderá ser
apresentado no prazo de 15 dias). O INSS informará ao segurado sobre a contestação da
empresa, para, querendo, impugná-la (formulando alegações e apresentando provas),
sempre que a instrução do pedido evidenciar a possibilidade de reconhecimento de
inexistência do nexo causal entre o trabalho e o agravo.
5
O Ministério da Previdência Social referencia cada espécie de benefício por um código. Assim, B31
corresponde a auxílio doença previdenciário, B32 corresponde a aposentadoria por invalidez
previdenciária, B91 corresponde a auxilio doença acidentário, B92 corresponde a aposentadoria por
invalidez acidentária, B93 corresponde a pensão por morte acidentária e B94 corresponde a auxilio
acidente.
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19
O Nexo Técnico Epidemiológico vigora deste abril de 2007, em conformidade com o
art. 5º, I, do Decreto nº. 6042/2007.
Já o Fator Acidentário de Prevenção (FAP) foi criado pela Lei nº. 10.666/03, apesar da
regulamentação verificada somente com a edição do Decreto 6042/2007. O Artigo 14 da
Lei dispõe que o Poder Executivo regulamentará a questão da redução ou incremento do
SAT (Seguro Acidente do Trabalho), em razão do desempenho da empresa em relação à
respectiva atividade econômica. Já o Decreto 6042/07 inseriu o art. 202-A no
Regulamento da Previdência Social (Decreto 3048/1999) fixando que a variação da
alíquota do SAT básica será feita a partir do Fator Acidentário Previdenciário (FAP).
Vale salientar aqui que a metodologia utilizada na aferição do grau de risco frequência e
gravidade de cada atividade econômica constante da CNAE foi aprovada em 2004, com
a edição da Resolução MPS/CNPS Nº 1.236, de 28 de abril de 2004. Esta Resolução,
tendo em vista a edição da Lei 10.666/03 que criara o SAT, além de dispor sobre a
metodologia de vinculação de atividade da CNAE às doenças constantes Classificação
Internacional de Doenças, também apresenta as fórmulas de cálculo de freqüência
gravidade e custo bem como da vinculação entre os riscos (e alíquotas respectivas, se
leve, médio e grave) por CNAE preponderante. Neste sentido, a Resolução apenas
dispõe:
“O primeiro passo para a atribuição de um fator acidentário para a empresa é
a revisão do enquadramento da empresa, por código CNAE, para fins da
contribuição de 1%, 2% ou 3%, previsto no Anexo V do Regulamento da
Previdência Social - RPS. Por determinação legal, cada CNAE preponderante
constitui um grupo homogêneo de risco que deverá receber as alíquotas de 1%,
2% ou 3%.
Parte-se para conglomeração em três grupos por intermédio da Técnica
Multivariada de Análise de Conglomerados, com fixação em 3 nuvens de pontos,
clusters. Para a nuvem mais negativa em relativa à origem cartesiana, risco
leve; para a mais positiva, risco grave e para a intermediária, grau médio. A
adoção dessa técnica preconiza a utilização de software estatístico adequado”6.
A forma como este cálculo foi efetuado (ou, ao menos, uma aplicação desta
metodologia) apenas encontra-se pormenorizada por Oliveira (2008) na seção 7.5 de sua
tese.
Segundo definição legal, o FAP é um multiplicador sobre a alíquota de 1%, 2% ou 3%
correspondente ao enquadramento da empresa segundo a Classificação Nacional de
Atividades Econômicas (CNAE) preponderante, nos termos do Anexo V do
Regulamento da Previdência Social - RPS, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 06 de
maio de 1999. Esse multiplicador deve variar em um intervalo fechado contínuo de 0,5
a 2,0, segundo a definição apontada pela Resolução MPS/CNPS n. 1.308/09.
6
Resolução MPS/CNPS Nº 1.236, de 28 de abril de 2004, publicada no DOU de 10 de mai. de 2004.
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20
Com o FAP, cada setor de atividade econômica receberá uma classificação de risco, que
equivalerá a 1 %, 2 % ou 3 % de contribuição sobre a folha salarial. Dentro desses
setores, as empresas serão monitoradas e receberão uma classificação anual, feita de
forma individualizada com base no indicador de sinistralidade, calculado de acordo com
a gravidade, freqüência e os custos dos acidentes de trabalho.
Assim, se a empresa se classifica com o SAT ótimo (1%) e FAP ótimo (0,5),
multiplicará sua alíquota 1% por 0,5 obtendo 0,5% sobre a folha de pagamento. Mas,
por outro lado, se a empresa possuir SAT elevado (3%) e FAP também elevado (2),
multiplicará sua alíquota 3% por 2, resultando em encargo de 6% sobre a folha de
pagamento.
Inicialmente previsto para entrar em vigor em janeiro de 2009, o FAP somente vigorará
a partir de janeiro 2010 por decisão do governo que reformulou a metodologia de
reenquadramento das alíquotas. Neste sentido, em setembro de 2009 foi publicado o
Decreto nº 6957/09 com a definição das novas regras para o FAP que leva em
consideração a acidentalidade total da empresa, com a Comunicação de Acidente de
Trabalho (CAT) e todos os nexos técnicos sem CAT, incluído todo o Nexo Técnico
Epidemiológico (NTEP) a partir de abril de 2007.
A nova metodologia de cálculo do FAP consta das Resoluções 1308/09 e da Resolução
1309/09 ambas do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS). Estas resoluções
atribuem pesos diferentes para as acidentalidades o qual segue indicações da Norma
Brasileira de Cadastro de Acidentes (NBR 14.280/99). Além disso, o cálculo leva em
consideração a acidentalidade total da empresa, com a CAT e todos os nexos técnicos
sem CAT, decorrentes do uso do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP).
Anteriormente, o cálculo levava em consideração apenas a acidentalidade presumida do
Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP), sem a CAT, e não havia distinção entre os tipos
de benefícios na avaliação da gravidade do acidente. Ainda consta das novas regras a
criação de uma trava de mortalidade e de invalidez, segundo a qual as empresas com
óbitos ou invalidez permanente não receberão os bônus do FAP.
A Resolução 1308/2009
A Resolução 1308/2009 determina a metodologia de cálculo dos índices de freqüência,
de gravidade e de custo, bem como a metodologia de cálculo do FAP por Empresa. As
definições e fórmulas constantes da Resolução são apresentadas a seguir.
• Índice de Freqüência:
Indica a incidência da acidentalidade em cada empresa. Para esse índice são computadas
as ocorrências acidentárias registradas por meio de CAT e os benefícios das espécies
B91 e B93 sem registro de CAT, ou seja, aqueles que foram estabelecidos por nexos
técnicos, inclusive por NTEP. Podem ocorrer casos de concessão de B92 e B94 sem a
precedência de um B91 e sem a existência de CAT e nestes casos serão contabilizados
como registros de acidentes ou doenças do trabalho.
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21
Índice de freqüência = número de acidentes registrados em cada empresa, mais os
benefícios que entraram sem CAT vinculada, por nexo técnico/número médio de
vínculos x 1.000 (mil).
• Índice de gravidade:
Indica a gravidade das ocorrências acidentárias em cada empresa. Para esse índice são
computados todos os casos de afastamento acidentário por mais de 15 dias, os casos de
invalidez e morte acidentárias, de auxílio-doença acidentário e de auxílio-acidente. É
atribuído peso diferente para cada tipo de afastamento em função da gravidade da
ocorrência. Para morte o peso atribuído é de 0,50, para invalidez é 0,30, para auxíliodoença o peso é de 0,10 e para auxílio acidente o peso é 0,10.
O cálculo do índice de gravidade é obtido da seguinte maneira:
Índice de gravidade = (número de benefícios auxílio doença por acidente (B91) x 0,1 +
número de benefícios por invalidez (B92) x 0,3 + número de benefícios por morte (B93)
x 0,5 + o número de benefícios auxílio-acidente (B94) x 0,1)/número médio de vínculos
x 1.000 (mil).
• Índice de custo:
Representa o custo dos benefícios por afastamento cobertos pela Previdência. Para esse
índice são computados os valores pagos pela Previdência em rendas mensais de
benefícios. No caso do auxílio-doença (B91), o custo é calculado pelo tempo de
afastamento, em meses e fração de mês, do trabalhador. Nos casos de invalidez, parcial
ou total, e morte, os custos são calculados fazendo uma projeção da expectativa de
sobrevida a partir da tábua completa de mortalidade construída pela Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, para toda a população brasileira,
considerando-se a média nacional única para ambos os sexos.
O cálculo do índice de custo é obtido da seguinte maneira:
Índice de custo = valor total de benefícios/valor total de remuneração paga pelo
estabelecimento aos segurados x 1.000 (mil).
• FAP por Empresa
Após o cálculo dos índices de freqüência, de gravidade e de custo, são atribuídos os
percentis de ordem para as empresas por setor (Subclasse da CNAE) para cada um
desses índices.
Desse modo, a empresa com menor índice de freqüência de acidentes e doenças do
trabalho no setor, por exemplo, recebe o menor percentual e o estabelecimento com
maior freqüência acidentária recebe 100%. O percentil é calculado com os dados
ordenados de forma ascendente.
O percentil de ordem para cada um desses índices para as empresas dessa Subclasse é
dado pela fórmula abaixo:
Percentil = 100 x (Nordem - 1)/ (n - 1)
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22
Onde: n = número de estabelecimentos na Subclasse; Nordem = posição do
índice no ordenamento da empresa na Subclasse.
A partir dos percentis de ordem é criado um índice composto, atribuindo ponderações
aos percentis de ordem de cada índice. O critério das ponderações para a criação do
índice composto pretende dar o peso maior para a gravidade (0,50), de modo que os
eventos morte e invalidez tenham maior influência no índice composto. A freqüência
recebe o segundo maior peso (0,35) garantindo que a freqüência da acidentalidade
também seja relevante para a definição do índice composto. Por último, o menor peso
(0,15) é atribuído ao custo. Desse modo, o custo que a acidentalidade representa faz
parte do índice composto, mas sem se sobrepor à freqüência e à gravidade. Entende-se
que o elemento mais importante, preservado o equilíbrio atuarial, é dar peso ao custo
social da acidentalidade. Assim, a morte ou a invalidez de um trabalhador que recebe
um benefício menor não pesará muito menos que a morte ou a invalidez de um
trabalhador que recebe um salário de benefício maior.
O índice composto calculado para cada empresa é multiplicado por 0,02 para a
distribuição dos estabelecimentos dentro de um determinado CNAE-Subclasse variar de
0 a 2. Os valores inferiores a 0,5 receberão o valor de 0,5 que é o menor fator
acidentário.
A fórmula para o cálculo do índice composto (IC) é a seguinte:
IC = (0,50 x percentil de gravidade + 0,35 x percentil de freqüência + 0,15 x
percentil de custo) x 0,02
O FAP será publicado anualmente e serão utilizados os dados de dois anos
imediatamente anteriores ao ano de processamento. Excepcionalmente, o primeiro
processamento do FAP utilizará os dados de abril de 2007 a dezembro de 2008.
A Resolução 1309/2009
Já a Resolução nº 1.309/2009 diz respeito à metodologia de cálculo da trava de
mortalidade e de invalidez. As empresas que apresentam taxa média de rotatividade
acima de setenta e cinco por cento não poderão receber redução de alíquota do FAP,
salvo se comprovarem que tenham sido observadas as normas de Saúde e Segurança do
Trabalho em caso de demissões voluntárias ou término de obra.
Segundo a Resolução, a taxa média de rotatividade faz parte do modelo do FAP para
evitar que as empresas que mantém por mais tempo os seus trabalhadores sejam
prejudicadas por assumirem toda a acidentalidade.
Esta taxa consiste na média aritmética resultante das taxas de rotatividade verificadas
anualmente na empresa, considerando o período total de dois anos, sendo que a taxa de
rotatividade anual é a razão entre o número de admissões ou de rescisões (considerandose sempre o menor), sobre o número de vínculos na empresa no início de cada ano de
apuração, excluídas as admissões que representarem apenas crescimento e as rescisões
que representarem diminuição do número de trabalhadores do respectivo CNPJ.
O cálculo da taxa de rotatividade para cada ano é obtido da seguinte forma:
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23
Taxa de rotatividade anual = mínimo (número de rescisões ocorridas no
ano ou número de admissões ocorridas no ano)/número de vínculos no
início do ano x 100.
Em seguida, calcula-se a taxa média de rotatividade da seguinte maneira:
Taxa média de rotatividade = média das taxas de rotatividade anuais dos
últimos dois anos Aplicação da taxa média de rotatividade.
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3. Risco Acidente de Trabalho (RAT)/SAT
O Seguro Acidente de Trabalho – SAT é um tributo que constitui uma fonte de
financiamento para os benefícios concedidos a trabalhadores incapacitados devido a
acidentes e doenças decorrentes dos riscos do ambiente de trabalho.
A alíquota desse tributo, que pode ser de 1, 2 ou 3%, incidente sobre a folha de
pagamento da empresa, tem como base o risco a que os trabalhadores estão sujeitos em
cada atividade econômica (CNAE – subclasse):
A alíquota de 1% é atribuída a empresas cujo risco é considerado leve;
A alíquota de 2% é atribuída para atividades cujo risco é considerado
médio; e
A alíquota de 3% é atribuída quando o risco da atividade é considerado é
alto.
A metodologia para cálculo do risco das atividades econômicas considera três
elementos fundamentais: os índices de freqüência, gravidade e custo. A freqüência
representa o número de eventos previdenciários, em determinado tempo. A gravidade se
refere ao tempo de afastamento do trabalhador beneficiado. Já o custo equivale ao
desembolso previdenciário pago ao trabalhador ou dependente pelo INSS.
Para 2010, o novo RAT (Risco Acidente de Trabalho) sofrerá algumas modificações em
relação ao SAT, tendo seu cálculo grande similaridade com a metodologia usada para o
FAP, conforme as regras aprovadas nas Resoluções CNPS ms.1.308 e 1.309 de 2009.
3.1 O aumento da alíquota de RAT para a maioria das atividades
A principal mudança do RAT com relação a 2007, data da última mudança de
metodologia e classificação, é o reenquadramento da maioria das atividades econômicas
quanto ao risco do ambiente de trabalho e, portanto, da alíquota a ser paga.
A reclassificação do risco das atividades econômicas efetuada, ilustrada na figura
abaixo, mostra uma grande elevação no número de atividades econômicas consideradas
de risco alto. Estas, que somavam 138 atividades na classificação de 2007, totalizarão
730 em 2010, um aumento de 430%. Concomitantemente, nota-se uma queda
considerável no número de subclasses da CNAE avaliadas como de risco leve, de 626
para 180.
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Figura 1
Reclassificação do grau de risco das subclasses da CNAE
730
626
536
391
180
138
1%
2%
2007
3%
2010
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V.
Elaboração: Tendências.
Como resultado, as empresas que atuam em 866 das 1301 atividades econômicas da
CNAE terão sua alíquota do SAT aumentada, sendo que em apenas 4% das atividades
haverá redução.
Figura 2
Deslocamentos derivados do reenquadramento na alíquota do SAT
866 atividades;
67% do total
379 atividades;
29% do total
55 atividades;
4% do total
Redução
Constante
Aumento
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V.
Elaboração: Tendências.
Das 866 subclasses da CNAE que tiveram aumentado o seu grau de risco, 44% sofrerão
um aumento de 50% na alíquota do SAT, e 56% das atividades terão aumento de 100%
ou 200%.
Tabela 1.
Aumento de alíquota do SAT
50%:
100%:
200%:
2 para 3
1 para 2
1 para 3
nº de atividades
383
247
236
%
44%
29%
27%
Total
866
100%
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V.
Elaboração: Tendências.
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A princípio, esse reenquadramento indica que haverá um aumento da arrecadação
do SAT, dado que houve alíquota para a maioria das atividades econômicas. No
entanto, os aumentos de alíquota descritos acima podem não significar,
necessariamente, aumento de arrecadação nessa mesma proporção. Isso porque,
juntamente com o reenquadramento do grau de risco das atividades econômicas, está
prevista a introdução de um multiplicador da alíquota, calculado por empresa, que
permitirá que a as empresas individualmente sejam bonificadas com uma redução da
alíquota vigente para a sua atividade.
Como o FAP prevê, por outro lado, um aumento de até 200% do SAT para empresas
que forem enquadradas como tendo acidentalidade acima da média do segmento, é
possível que algumas empresas tenham sua contribuição aumentada em até 500% (caso
seu segmento seja reenquadrado de RAT leve para elevado e receba FAP igual a dois).
Como exemplos, pode-se citar uma grande companhia de informática, que pagava à
Previdência R$ 2 milhões ao ano a título de SAT e passará a recolher R$ 9 milhões; e
uma montadora, que desembolsava R$ 20 milhões e terá de arcar com R$ 35 milhões7
Este fator multiplicador, denominado FAP, e seus possíveis efeitos, serão discutidos em
maiores detalhes na seção seguinte. Antes, serão analisados alguns problemas presentes
na metodologia de cálculo do SAT e no último reenquadramento do RAT das atividades
econômicas.
3.2 O problema da utilização dos percentis
Segundo Soratto, Coto e Soares (2009)8, “os riscos de acidente são identificados por
áreas econômicas de modo que aquelas cujas atividades representem maior risco para
os seus trabalhadores contribuam com maior valor financeiro para custear as despesas
decorrentes da acidentalidade. (...) O RAT deve ser um retrato, o mais fiel possível, da
distribuição dos riscos pelas áreas econômicas.”
Para determinar o risco que cada atividade econômica representa, calculou-se, para cada
subclasse da CNAE, um percentil de ordem de freqüência, gravidade e custo. Esses
percentis foram então comparados entre todas as atividades econômicas, a fim de
determinar o grau de risco e, conseqüentemente, a alíquota de SAT de cada uma.
Porém, a comparação entre as subclasses da CNAE com base em percentis não parece
adequada para o caso. Para se entender o porquê, explicar-se-á brevemente o conceito
por detrás da utilização dos percentis.
Estatisticamente, um percentil é uma medida da posição relativa de uma unidade
observacional em relação a todas as outras. O p-ésimo percentil tem, no mínimo, p%
dos valores abaixo daquele ponto e, no mínimo, (100 - p)% dos valores acima.
Exemplificando, se uma altura de 1,80m é o 90º. percentil de uma turma de estudantes,
então 90% da turma tem alturas menores que 1,80m e 10% têm altura superior a 1,80m.
7
8
Jornal O Globo, 19/12/2009.
In TODESQUINI e CODO (2009).
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27
Se a distribuição é normal (com uma curva em forma de sino), a classificação por
percentil pode ser inferida a partir do desvio em relação ao score padrão.
Figura 3
Distribuição Normal
Seguindo os percentis uma distribuição normal, quando há o ranqueamento de
indivíduos e este ranqueamento ocorre verificando-se uma distância muito pequena
entre eles, estas pequenas diferenças levam os indivíduos a ficarem em percentis
diferentes.
Como, no caso em tela, o ranqueamento por percentis é método utilizado para relacionar
as CNAES às alíquotas que seguem valores discretos (igual a 1, 2 ou 3), uma pequena
variação de percentil (por exemplo de 24,974 para 24,975) faz com que uma atividade
da CNAE X tenha alíquota de 1% enquanto uma atividade da CNAE Y, esta com
percentil muito próximo daquela CNAE X, tenha uma alíquota de 3%.
3.3 Possíveis inconsistências do enquadramento no RAT
Segundo Oliveira (2008), o enquadramento das atividades econômicas no RAT é feito
”com uso da técnica multivariada de análise de discriminantes (conglomeração) que
consiste em agrupar os CNAE pela similaridade da distância euclidiana quadrática no
espaço tridimensional das variáveis padronizadas dos coeficientes de freqüência,
gravidade e custo, segundo o critério de ward combinado ao k-means”.
Não é possível reproduzir exatamente os índices de freqüência, gravidade e custo para
cada subclasse da CNAE e, portanto, de enquadrá-los no RAT, dado que não se dispõe
de todo o conjunto de dados utilizado.
No entanto, a Portaria Interministerial n.254/2009, Anexo I, divulgou os percentis de
freqüência, gravidade e custo de cada atividade econômica. Utilizando-se de uma
metodologia bem mais simples e intuitiva do que a descrita por Oliveira, a qual consiste
em ponderar esses indicadores pelos mesmos pesos utilizados no cálculo do FAP9,
obtém-se um indicador ponderado de acidentalidade para cada atividade. Este indicador
pode ser ordenado do menor para o maior e comparado com o RAT efetivamente
atribuído pelo MPAS à atividade. A tabela abaixo traz os resultados exemplificados
para algumas das 1.301 subclasses da CNAE.
9
A metodologia do RAT segue a metodologia divulgada para o FAP.
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Percentis de freqüência, gravidade e custo, índice ponderado e RAT
das atividades selecionadas
SubClasse
da CNAE
2.0
1830003
4789003
7119704
6461100
7739001
6142600
9102302
6435202
6319400
3513100
Nome da subclasse
Reprodução de software em
qualquer suporte
Comércio varejista de objetos
de arte
Serviços de perícia técnica
relacionados à segurança do
trabalho
Holdings de instituições
financeiras
Aluguel de máquinas e
equipamentos para extração de
minérios e petróleo, sem
operador
Operadoras de televisão por
assinatura por microondas
Restauração e conservação de
lugares e prédios históricos
Associações de poupança e
empréstimo
Portais, provedores de
conteúdo e outros serviços de
informação na internet
Comércio atacadista de energia
elétrica
Percentil
de Custo
freq+gra
v+custo
com
pondera
dor
Ranking
Tendências
Decreto
6957/2009
Percentil de
Freqüência
Percentil
de
Gravidade
1
23,14
11,2
11,57
15,43
2
1
24,61
11,2
11,57
15,95
3
1
24,95
11,2
11,57
16,07
4
2
26,76
11,2
11,57
16,70
5
1
30,05
11,2
11,57
17,85
6
2
23,47
24,28
11,57
22,09
7
1
23,74
24,88
11,57
22,48
8
1
22,13
22,54
23,54
22,55
9
1
22,27
22,67
23,27
22,62
10
1
22,94
22,47
23,14
22,74
11
Para melhor visualização, os 700 primeiros colocados nessa classificação são
apresentados na figura abaixo. Esse gráfico mostra no eixo X a posição na classificação
decorrente do cálculo efetuado pela Tendências e no eixo Y o SAT efetivamente
atribuído à atividade. Observa-se a existência de grande número de exceções, ou seja, de
SAT de 2% ou mesmo 3% para atividades econômicas cujo indicador ponderado indica
um ranking baixo, similar ao de inúmeras outras atividades que têm SAT de 1%. Isso
ocorre até a posição 647. A partir daí, todas as alíquotas atribuídas são de 3%. Por outro
lado, enquanto se verificam posições baixas no ranking Tendências com alíquota
superior a 1% ou 2%, não se verifica o contrário, ou seja, não ocorrem posições
elevadas nesse ranking estimado que tenham recebido alíquotas inferiores a 3%.
Distribuição de alíquotas de SAT entre as atividades que ocupam as 700 primeiras
posições no ranking construído pela Tendências
Elaboração: Tendências.
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Além disso, das 130 atividades que apresentaram os menores percentis de freqüência,
gravidade e custo (11,03, 11,2 e 11,57 respectivamente), 41% delas receberam alíquota
de SAT igual a 1%, a 40% foi atribuída alíquota de 2% e a 19%, alíquota de 3%.
3.4 Atividade similares com RAT/SAT muito distintos
A tabela abaixo exemplifica algumas atividades econômicas, sua descrição e alíquota
atribuída. Fica claro que existem atividades aparentemente muito similares, mas para as
quais foram atribuídos distintos graus de risco e, portanto, distintas alíquotas de SAT.
Exemplos de atividades similares que têm SAT distintos
CNAE
Descrição
6461100
Holdings de instituições financeiras
2
6462000
Holdings de instituições não-financeiras
3
6422100
Bancos múltiplos, com carteira comercial
3
6423900
Caixas econômicas
2
6201500
Desenvolvimento de programas de computador sob encomenda
1
6202300
Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis
2
6203100 Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador não-customizáveis
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V.
SAT
1
Como mostram os exemplos acima, trabalhar em uma holding de empresa nãofinanceira é mais arriscado do que trabalhar em uma instituição financeira, apesar de
serem atividades a princípio muito similares, de caráter puramente administrativo. O
mesmo ocorre com bancos múltiplos e caixas econômicas. As atividades de
desenvolvimento de programas de computador também têm risco distinto dependendo
se o programa for customizável ou não.
A explicação para essas aparentes contradições pode estar no fato de que a idade média
de um segmento é superior ao outro, no caso das holdings, por exemplo. Ou que
desenvolvedores de programas customizáveis fazem mais visitas a clientes, estando
mais expostos a acidentes de trajeto.
Essas justificativas, baseadas em características sutis, como porte da empresa ou
tecnologias utilizadas, são meras suposições, sem qualquer comprovação empírica.
Falta uma explicação mais clara do motivo pelo qual atividades tão similares
apresentam RAT/SAT tão distintos. Da mesma forma, o fato de algumas atividades
aparentemente de baixo risco, como lojas de flores naturais, casas de suco e de chá,
lanchonetes, estacionamentos, agências matrimoniais, entre outras, estarem enquadradas
no grau de risco mais elevado também suscita dúvidas, uma vez que os parâmetros
usados para esse enquadramento não foram explicitamente demonstrados.
Essa falta de clareza gera desconfianças em relação à consistência da metodologia de
classificação do risco utilizada para definir o SAT de cada subclasse da CNAE.
3.5 Discriminação de empresas com atuação em várias atividades
Como já visto, o conceito fundamental por trás do SAT é o risco envolvido no ambiente
de trabalho. Ou seja, a alíquota do SAT é definida com base na probabilidade de um
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trabalhador sofrer um acidente ou doença do trabalho, dada a atividade econômica da
empresa em que ele atua.
Conforme apontado por Soratto, Coto e Soares (2009)10, existe um reconhecimento,
portanto, de que “os riscos ambientais podem ser bastante diferenciados em razão do
tipo de atividade, dos equipamentos e insumos envolvidos na produção, da cultura de
prevenção mais ou menos forte no local, entre outros fatores”.
Sendo o SAT um tributo de caráter setorial, torna-se fundamental que cada grupo de
empresas a ser classificado quanto a seu grau de risco seja o mais homogêneo possível.
Assim, para empresas que atuam em diversas atividades, tendo, por exemplo, um grande
quadro de funcionários que trabalham diretamente em distintas linhas de produção,
assim como uma grande equipe desempenhando tarefas administrativas ou serviços, o
critério de separação das empresas por atividade econômica preponderante pode não ser
adequado.
No caso de empresas pequenas, esse tipo de situação não ocorre com tanta freqüência, já
que estas costumam ser mais especializadas. Mas em grandes empresas, sobretudo do
setor produtivo, é muito comum a existência de diversas áreas de atividade, com
funções bastante diferenciadas e condições distintas de trabalho, havendo, não raro, uma
separação física entre os departamentos. Assim, a realidade de um funcionário que
trabalha na linha de produção de um bem de consumo em uma indústria do interior, por
exemplo, provavelmente é distinta da realidade vivida por um funcionário de uma outra
linha de produção e bem diferente da que se verifica na área financeira dessa mesma
empresa, mas que trabalha em um prédio de escritórios em uma grande metrópole.
Veja como exemplo uma grande empresa do setor alimentício, intensiva em mão-deobra, que atua nas atividades de abate de frangos, produção de alimentos
industrializados (frios, pratos prontos congelados, empanados), produção de rações e
ainda possui um grande número de funcionários que desempenham tarefas
administrativas e comerciais.
Por ser o abate de frangos a atividade econômica preponderante, com maior número de
trabalhadores, a empresa é classificada provavelmente na subclasse 1012101 da
CNAE. Esta atividade é considerada de risco alto, recebendo alíquota de SAT de 3%
pelo Decreto 6957/2009, em vigor a partir de 2010. No entanto, diversas outras
atividades que também ocupam grande parte do pessoal da empresa são classificadas em
atividades de menor risco.
10
In TODESQUINI e CODO (2009).
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31
Tabela 2.
Classificação do grau de risco das atividades
econômicas de uma empresa do setor alimentício
e suas respectivas alíquotas de SAT
SubClasse da
CNAE 2.0
Descrição
Decreto
6957/2009
1066000
Fabricação de alimentos para animais
3
1096100
Fabricação de alimentos e pratos prontos
3
1012101
Abate de aves
3
8211300
Serviços combinados de escritório e apoio administrativo
1
6920601
Atividades de contabilidade
1
6911701
Serviços advocatícios
1
Fonte: Decreto n. 6.957/2009, Anexo V.
Apesar de que cada atividade da empresa implica condições de trabalho e riscos
diversos, a empresa terá seu risco acidente de trabalho definido apenas com base no
risco médio do setor em que se enquadra sua atividade econômica preponderante, ou
seja, aquela que emprega maior número de trabalhadores. No exemplo acima, a
atividade provavelmente preponderante da empresa (abate de frangos), expõe o
trabalhador a um risco mais elevado que outras atividades, de caráter administrativo e
comercial, como atividades de contabilidade e serviços advocatícios, por exemplo.
Dessa forma, a empresa, que teria ganhos de produtividade e eficiência por integrar
diversas atividades, acaba sendo prejudicada, pois recairá sobre ela uma alíquota única
de SAT, relativa à atividade que pode ser a mais arriscada. Essa alíquota incidirá não
apenas sobre a remuneração dos funcionários que desempenham essa atividade
específica, mas sobre toda a sua folha de pagamentos.
Em suma, empresas com atuação em diversas atividades podem ser penalizadas devido
ao fato de o SAT considerar apenas uma atividade preponderante, ainda que haja um
grande quadro de funcionários desempenhando funções que envolvem riscos distintos.
3.6 Discriminação de setores com diversidade tecnológica
Um dos pressupostos para a atribuição de um mesmo fator de risco a toda uma atividade
econômica é de que todas as empresas empenhadas nessa atividade operam de forma
similar. Esse pressuposto é confirmado por Oliveira (2008), que procura justificar essa
mesma classificação, argumentando que o sistema capitalista promoveria a
homogeneização e similaridade de métodos de trabalho entre empresas de uma mesma
CNAE:
A empresa tem duas facetas (dupla personalidade) existenciais: uma individual,
dada pela personalidade jurídica que representa a si mesmo, sob visão interna
corporis, segundo seu registro de nascimento (CNPJ); e uma outra, dita
coletiva, pela roupagem econômica que representa a todos, dada pelo CNAE ao
qual pertence o CNPJ, em perspectiva externa corporis, em que a parte
representa o todo e o todo prenuncia a parte.
Falar em uma empresa é dizer em qual vocação socioeconômica ela se encaixa
e afirmar o CNAE é presumir a forma segundo a qual a empresa atende sua
razão de ser. Ou seja, há que se considerar essa dupla personalidade sob os
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primas individuais da fisiologia da empresa, de um lado, e da sociologia entre
empresas dentro do segmento econômico (CNAE), de outro.
A CNAE assim, sob esse prisma, assume a figura de um ser social cujos
indivíduos, cada uma das empresas (CNPJ) integrantes comungam, convivem,
concorrem, compram, vendem, apreçam, contratam, escrituram, licitam,
alienam, participam do mercado bursátil, terceirizam, empregam, protegem e
adoecem de maneira verossimilhante, entre outros, e, portanto reproduzem
práticas multidimensionais de plurais representações. Eis o porquê ontológico.
(Oliveira, pág. 33-34).
Assim, conclui Oliveira, “As empresas de uma mesma atividade econômica (CNAE)
possuem modos, processos, objetos, meios e organizações de produção
verossimilhantes, até por força do mercado, bem como apresentam uma quantidadealocação de pessoal que se distribui uniformemente em toda estrutura empresarial.
Essas empresas de um CNAE adotam práticas comuns nos campos da administração,
da engenharia, da mercadologia, dos recursos humanos, entre outros, que as tornam
homogêneas do ponto de visto empírico, bem como do teórico”.
No entanto, esse “porquê ontológico” desconsidera as evidências empíricas de que as
empresas de uma mesma CNAE são heterogêneas. Essa homogeneização e similaridade
de métodos de trabalho entre empresas de uma mesma CNAE não se verificam na
prática. Evidências empíricas mostram que, em todos os setores, convivem empresas
que operam de forma diferenciada, com porte diferente e que contratam trabalhadores
com perfis distintos, etc.
Por exemplo, a atividade de criação de aves pode ser feita de forma quase artesanal, sem
nenhuma sofisticação técnica, ou em granjas integradas a grandes produtores, que
operam com uma tecnologia e controle muito sofisticados. O mesmo exemplo se aplica
à criação de suínos, bovinos, pecuária de leite, etc.
No setor de bancos múltiplos, convivem instituições de pequeno porte, com poucas
dezenas de funcionários, operando em nichos específicos e com apenas uma agência
central, e instituições gigantescas, com milhares de funcionários, milhares de agências e
sistemas complexos.
A atividade de transportes urbanos conta com empresas que operam com equipamentos
modernos em regiões desenvolvidas, tendo grande escala, e pequenas empresas usando
ônibus antigos em estradas precárias.
Dentro do segmento fabricação de aviões, pode haver uma empresa de grande porte
como a Embraer, que produz aviões para mais de 100 passageiros, e outras que se
dedicam à fabricação de componentes ou de pequenos modelos não tripulados (mas com
demanda crescente no meio militar), cujo processo produtivo é muito distinto. Da
mesma forma, na fabricação de automóveis, há plantas de larga escala, com milhares de
unidades produzidas por dia, e empresas que produzem de forma artesanal, buscando
nichos de mercado.
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33
Outro exemplo é do segmento de emissoras e produtoras de TV. Ao lado de empresas
com também milhares de funcionários, que criam a própria programação e até a
exportam para outros países, exercem atividade de mesma classificação afiliadas locais,
que apenas retransmitem uma programação de terceiros, complementando-a com um
conteúdo regional mínimo.
Em grande parte das subclasses da CNAE, é possível encontrar exemplos desse tipo, em
que as empresas, apesar de terem a mesma atividade preponderante, atuam com
tecnologias mais ou menos sofisticadas, condições de trabalho distintas e, portanto,
diferentes índices de acidentalidade. Tal heterogeneidade é característica do próprio
funcionamento do setor econômico, em que convivem empresas de diferentes portes,
seja por especialização ou pela existência de nichos específicos, seja pelo fato de que o
setor admite distintas técnicas de produção.
A metodologia para definição do grau de risco da CNAE faz com que todas as empresas
que atuam em uma determinada atividade recebam uma mesma alíquota de SAT. O
FAP tem como intuito corrigir essa distorção, ao criar a possibilidade de diferenciar a
alíquota, de acordo com o perfil de acidentalidade de cada empresa.
No entanto, como será visto nas seções 5.1 e 5.2, a metodologia de cálculo do FAP
acaba por prejudicar as empresas de grande porte, as quais, em geral, utilizam
tecnologias mais sofisticadas e proporcionam melhores condições de trabalho. Isso
ocorre pelo simples fato de essas empresas contarem com um número muito elevado de
funcionários, sendo alta a probabilidade de registro de algum evento acidentário, ao
passo que as pequenas empresas, ainda que atuem com tecnologias mais precárias e
perigosas, têm maior probabilidade de não registrarem acidentes em determinados anos.
Por fim, tal classificação desconsidera que existem diferenças regionais entre empresas,
que podem decorrer até mesmo da necessidade de as empresas se adaptarem as distintas
características regionais, como a qualificação da mão-de-obra ou os recursos onde estão
instaladas. Oliveira imagina que as empresa procuram adaptar a mão-de-obra às suas
necessidades11, o que é verdade em algumas situações para as quais a tecnologia
11
Vide Oliveira, p. 46-47:
“Um exemplo dessa assertiva está nos processos seletivo e de recrutamento de pessoal que, para
muito além dos requisitos morfobiopsíquicos do posto de trabalho, invariavelmente consideram as
características sociológicas dispostas por Contandrioupoulos para fins de aquisição da força de
trabalho.
Essas características sócio-determinantes da contratação da força de trabalho reproduzidas pelas
empresas no CNAE, segundo os cânones do isomorfismo coercitivo, mimético e normativo, são
elencadas e submetidas à aquiescência do empregador que, em última análise, as define. Isso
evidencia objetivamente que o modo de produção representado na CNAE é definidor, a priori, do
tipo de mercadoria, nos termos Gosta Esping-Andersen que integrará a produção.
Por sucedâneo, é razoável estabelecer uma linha tracejada, algumas vezes linha cheia, entre saúde e
doença, bem como suscitar um processo saúde-doença inerente às condições sociológicas definidas
pelo CNAE, por exemplo: a pobreza, baixa higidez sanitária, condições inadequadas de moradia,
alimentação, transporte e educação, até mesmo inanição. Dessa forma tais atributos deixam de ser
gerais e passam a ser característicos da atividade econômica. Eis o novo olhar”
Tem-se, então, que o adoecer originariamente oriundo das condições socioeconômicas da população
economicamente ativa, com esse crivo de admissibilidade dos empregadores, homogeneizado por
CNAE, passa à condição de característico da atividade econômica.
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34
empregada exige uma determinada característica, mas em outras situações as empresas
buscam uma forma de atuação melhor adaptada à disponibilidade de recursos existentes.
A classificação homogênea com base na CNAE simplesmente poderá prejudicar e
desincentivar esse tipo de adaptação. Na Seção 3.7, é feita uma análsie mais detalhada da
questão regional.
3.7 Diferenças regionais
Com base nos dados do Anuário Estatístico do Ministério da Previdência, realizou-se
uma série de exercícios para identificar eventuais disparidades entre os estados
brasileiros nos índices de acidentalidade. As informações disponíveis permitiram a
comparação, por classe de CNAE (que é o nível mais desagregado disponível), da
Incidência de Doenças Ocupacionais (por 1.000 vínculos), Incidência de Acidentes
Típicos (por 1.000 vínculos) e Taxa de Mortalidade (por 100.000 vínculos) para todos
os estados brasileiros12.
Primeiramente, para cada classe da CNAE, os estados foram classificados de forma
crescente em relação à incidência de acidentes típicos. Foi então calculada a diferença,
em termos relativos, entre os índices do primeiro e último colocados. O gráfico abaixo
mostra a porcentagem de classes da CNAE que apresentam intervalos de diferença de 0
a 50%, 50% a 100% e assim por diante.
Distribuição das classes da CNAE quanto à diferença entre o estado
que apresenta maior e menor incidência de acidentes típicos
+ de 3000%
14%
0-50%
7% 50-100%
4%
2000-3000%
8%
100-500%
21%
1000-2000%
21%
500-1000%
25%
Fonte: Anuário Estatístico 2007 – Ministério da Previdência.
Como pode ser visto, em mais de dois terços das classes da CNAE (68,7%), verifica-se
uma diferença de mais de 500% entre os estados que apresentam a menor e a maior
incidência de acidentes típicos por mil vínculos. A tabela abaixo exemplifica alguns
12
Os dados para o estado de Sergipe não estão disponíveis.
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casos, explicitando a classe de atividade considerada, os estados melhor e pior
classificados e suas respectivas taxas de incidência de acidentes.
Incidência de acidentes típicos (por 1.000 vínculos)
Mínimo
Máximo
Setor (Classe da CNAE)
Valor
Estado
Valor
Estado
Consultoria em Tecnologia da Informação
0,44
MG
370,95
PA
Obras de Urbanização - Ruas, Praças e Calçadas
0,68
PB
271,37
PA
Fabricação de Intermediários para Resinas e
Fibras
0,23
DF
96,86
SC
Fonte: Anuário Estatístico 2007 – Ministério da Previdência.
O mesmo procedimento foi então repetido para a taxa de doenças ocupacionais,
obtendo-se resultados similares. Para 59% das classes da CNAE, a diferença entre os
estados que apresentam a menor e a maior incidência de doenças ocupacionais por
1.000 vínculos é maior que 500%, havendo diversos casos em que essa diferença
ultrapassa os 3.000%.
Distribuição das classes da CNAE quanto à diferença entre o estado
que apresenta maior e menor incidência de acidentes típicos
+ de 3000%
2000-3000% 5%
4%
1000-2000%
7%
500-1000%
8%
100-500%
9%
50-100%
2%
0-50%
65%
Fonte: Anuário Estatístico 2007 – Ministério da Previdência.
Incidência de doenças ocupacionais (por 1.000 vínculos)
Mínimo
Máximo
Setor (Classe da CNAE)
Valor
Estado
Valor
Estado
Fabricação de Intermediários para Fertilizantes
0,12
MG
20,85
CE
Consultoria em Tecnologia da Informação
0,11
MG
18,55
PB
Distribuição de Energia Elétrica
0,17
PA
29,97
RS
Fonte: Anuário Estatístico 2007 – Ministério da Previdência.
Por fim, foram analisadas as disparidades regionais quanto à taxa de mortalidade das
atividades por 100.000 vínculos. Apesar de as disparidades não serem, para a maioria
das atividades, tão gritantes como nos dois indicadores mostrados acima, a diferença
entre os estados com maior e pior resultado é superior a 100% em um terço dos casos.
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Distribuição das classes da CNAE quanto à diferença entre o
estado que apresenta maior e menor taxa de mortalidade
+ de 3000%
2000-3000% 5%
4%
1000-2000%
7%
500-1000%
8%
100-500%
9%
50-100%
2%
0-50%
65%
Fonte: Anuário Estatístico 2007 – Ministério da Previdência.
Taxa de mortalidade (por 100.000 vínculos)
Mínimo
Setor (Classe da CNAE)
Valor Estado
Fabricação de Automóveis
2,41
SP
Abate de suínos, aves e outros pequenos animais
2,91
RS
Comércio Varejista de outros produtos novos, não indicados
anteriormente
2,58
MG
Máximo
Valor Estado
640,79
CE
647,96
PI
414,37
RR
Fonte: Anuário Estatístico 2007 – Ministério da Previdência.
A análise acima mostra que, dentro de uma mesma atividade, existem discrepâncias
regionais nos índices de acidentalidade das empresas. Ao se desconsiderar esse fato,
admitindo mesma alíquota de SAT para empresas que atuam em uma mesma CNAE,
independente de sua localização, acaba-se por penalizar as empresas localizadas em
regiões com ambiente de trabalho mais seguro.
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4. Fator Acidentário de Prevenção - FAP
O debate sobre a necessidade de uma tributação individualizada para o SAT não é nova.
Em 2003, a Lei nº 10.666 definiu que as empresas que causam mais acidentes e doenças
devem ter aumentada a sua alíquota de SAT em até 100% – princípio malus – ao passo
que as empresas que investem mais na melhoria do ambiente de trabalho, causando
menos acidentes e doenças, devem ter reduzida a sua alíquota de SAT em até 50% –
princípio bonus. No entanto, essa determinação ficou restrita apenas ao âmbito jurídico.
Somente a partir do desenvolvimento do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) e da
aprovação de sua metodologia de cálculo pelo Conselho Nacional de Previdência Social
(CNPS), através da Resolução n. 1.308/2009, é que tal proposta passou a se
materializar.
O FAP corresponde a um fator multiplicativo da alíquota do SAT, calculado por
empresa. Seu valor varia de 0,5 a 2, de forma que a alíquota do SAT passa a assumir um
valor:
0,5% a 2% para empresas que atuam em atividades econômicas de risco leve,
cujo RAT é 1% (1% multiplicado por um fator entre 0,5 e 2);
1% a 4% para atividades de risco médio (2% multiplicado por um fator entre 0,5
e 2); e
1,5% a 6% para empresas enquadradas em atividades de risco alto (3%
multiplicado por um fator entre 0,5 e 2).
O cálculo do FAP, assim como o RAT, considera três fatores fundamentais: os índices
de freqüência, gravidade e custo. O primeiro corresponde à incidência de acidentes e
doenças do trabalho em cada empresa. O índice de gravidade indica, como o nome
supõe, a gravidade dos eventos acidentários ocorridos em cada empresa. São
computados nesse índice todos os casos de afastamento por mais de 15 dias decorrentes
de acidentes ou doenças de natureza acidentária, os casos de invalidez e morte
acidentárias, de auxílio-doença acidentário e de auxílio-acidente. Para cada um desses
eventos, é atribuído um peso diferente, sendo de 0,50 para morte, 0,30 para invalidez e
0,10 para auxílio-doença e auxílio-acidente.
Após calculados os três índices descritos acima para cada empresa, realiza-se uma
análise comparativa de como cada empresa se comporta em relação às outras que se
enquadram na mesma subclasse da CNAE. A partir dessa comparação é que se atribui
um valor de FAP menor do que 1 (bonus) ou maior do que 1 (malus).
O cálculo considera os dados relativos a 2 anos, sendo que os índices finais resultam de
uma média aritmética dos índices anuais. A esses índices médios são atribuídos os
percentis de ordem para a empresa, conforme a performance dela em relação às demais.
Utilizando os valores encontrados para os percentis de ordem de freqüência, gravidade e
custo, é então calculado um Índice Composto (IC). O IC atribui ponderações aos
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percentis de ordem de cada índice, sendo que o de gravidade tem peso 0,5; o de
freqüência, peso 0,35; e o de custo, 0,15.
Apesar de legítimo o intuito do FAP, de promover uma maior flexibilização na cobrança
do SAT e prover incentivos econômicos às empresas para que invistam mais em
segurança do trabalho, sua metodologia esconde alguns problemas críticos, que serão
explorados a seguir.
4.1 Distorções devido ao porte das empresas
Os três índices que compõem o FAP, de freqüência, gravidade e custo, têm, em seu
denominador, uma variável relacionada ao porte da empresa quanto a seu número de
funcionários. Para o índice de freqüência e gravidade, considera-se o número médio de
vínculos, enquanto para o índice de custo utiliza-se a massa salarial.
Como resultado, distorções podem ser observadas na comparação dos índices entre as
empresas de pequeno e grande porte dentro de uma mesma atividade econômica.
Para as empresas de pequeno porte, o inconveniente é claro: falta de representatividade
estatística de freqüência no cálculo do FAP. Havendo um número reduzido de
funcionários, é natural que qualquer acidente ou doença de natureza acidentária levem a
índices de freqüência, gravidade e custo muito maiores que de uma empresa com um
grande número de funcionários, uma vez que o denominador da primeira é muito baixo.
Por esse mesmo motivo, qualquer evento adicional que vier a ocorrer causa um impacto
maior sobre o desempenho da empresa de pequeno porte, deixando-a mais sujeita a
oscilações bruscas na alíquota do SAT.
Por outro lado, quanto mais funcionários a empresa possui, maior a probabilidade de
ocorrer um acidente ou doença relacionada ao trabalho. Ainda que a empresa invista
pesadamente em melhorias do ambiente de trabalho, é difícil imaginar que uma empresa
com milhares de funcionários, por exemplo, passe dois anos sem registrar qualquer
evento acidentário. Até porque, ainda que não ocorram acidentes, é grande a
probabilidade de que pelo menos um de seus funcionários apresente alguma
enfermidade que venha a ser considerada como do trabalho.
É razoável supor, porém, que uma empresa de 10 funcionários, ainda que não invista
muito em segurança no trabalho, mantenha-se durante 2 anos e mais sem registrar
acidente ou doença do trabalho. Estando as duas empresas classificadas na mesma
subclasse da CNAE nesse caso hipotético, a primeira receberia, provavelmente, um FAP
maior do que a segunda, pagando maior alíquota de SAT.
Ou seja, é improvável que as empresas de maior porte registrem zero ocorrências de
acidente/ doença de trabalho em um período de dois anos. Mas para empresas pequenas,
essa situação é factível. Conseqüentemente, dentro de uma mesma subclasse da CNAE
em que há empresas de diferentes portes, é muito difícil que uma empresa com um alto
número de funcionários, por mais que invista em segurança e saúde do trabalho, ocupe
as primeiras posições, obtendo FAP próximo de 0,5.
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39
A situação em que não ocorre qualquer evento acidentário é muito mais comum do que
se imagina. Os dados sobre acidentalidade disponíveis no site do Ministério da
Previdência Social, tendo como fonte DATAPREV e CAT, indicam a ocorrência de 748
mil acidentes do trabalho em 2008. Esse número inclui os acidentes com CAT
registrada (típico, de trajeto e doença do trabalho) e sem registro de CAT de todas as
empresas brasileiras.
Tomando-se como hipótese que metade dos acidentes ocorreram em micro e pequenas
empresas, isentas do pagamento do SAT13, tem-se um total de 374 mil acidentes para as
cerca de 950 mil empresas que pagaram o SAT em 2008. Caso o número máximo de
acidentes ocorridos por empresa fosse igual a 1, concluir-se-ia que 60% das empresas
registraram zero acidente/ doença de trabalho em 2008. Como em grandes empresas
esse número não raro chega a dezenas de ocorrências, possivelmente a quantidade de
empresas que apresentaram acidentalidade zero é bem superior a 60% do total.
Esse dado reforça o argumento de que a metodologia do FAP causa distorções para
empresas de diferentes portes, prejudicando as maiores, que constituem uma minoria
absoluta. Segundo dados da RAIS, do Ministério do Trabalho e Emprego, a grande
maioria (cerca de 94%) das empresas brasileiras possuem, no máximo, 19 funcionários.
Número de empresas segundo o número de funcionários - 2008
1.600.000
57%
1.400.000
1.200.000
1.000.000
800.000
600.000
16%
1%
0%
0%
0%
0%
1000 OU
MAIS
5%
DE 500 A
999
9%
200.000
DE 250 A
499
12%
DE 100 A
249
400.000
DE 50 A 99
DE 20 A 49
DE 10 A 19
DE 5 A 9
ATE 4
ZERO
0
Fonte: RAIS.
Fica evidente, portanto, a dificuldade de se comparar diretamente índices de empresas
de portes tão diferentes e o risco de acabar penalizando, injustamente, aquelas que mais
investem em segurança do trabalho.
4.2 O problema dos percentis
Na prática, o bonus máximo (FAP = 0,5) só pode ser obtido por uma empresa que tenha
registrado zero acidente/ doença de trabalho e que seja a única em sua subclasse da
CNAE com esse perfil.
13
Empresas do Simples não pagam SAT.
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40
Isso porque o FAP foi calculado de tal forma que, caso haja empate entre as primeiras
colocadas, estas não podem ocupar a primeira posição, mas sim uma posição arbitrada,
que corresponde à posição média, conforme o número de empresas empatadas. Para a
maioria das empresas, essa forma de ranqueamento determina um FAP maior do que 0,5
e, dependendo do tamanho do segmento e da quantidade de empresas com
acidentalidade zero, este número pode estar bem próximo a 1. Observa-se, portanto,
uma contradição: em um segmento de atividade, quanto mais empresas zerarem seus
níveis de acidentalidade, menor será sua bonificação.
Além dessa arbitrariedade na determinação da posição das empresas no rol de
freqüência, gravidade e custo, foi aplicada ao índice composto uma fórmula não prevista
na metodologia do FAP, que majorou ainda mais o seu valor. Segundo essa fórmula:
FAP = 0,5 + 0,5 * IC. Para se ter idéia do impacto da aplicação dessa metodologia de
cálculo sobre empresas com acidentalidade zero, o próprio Ministério da Previdência
Social fornece um exemplo em seu site.
Para uma empresa que atua em uma subclasse da CNAE com 600 empresas, em que 400
delas têm todos os índices calculados iguais a zero, o cálculos dos percentis de ordem
resultará em percentis de freqüência, gravidade e custo todos iguais a 33,31. Aplicandose a forma do índice composto: IC = (Percentil de ordem de freqüência * 0,35) +
Percentil de ordem de gravidade * 0,50) + (Percentil de ordem de custo * 0,15) * 0,02,
obtém-se um valor de 0,66611. Feito isso, aplica-se uma nova fórmula do IC, descrita
acima, resultando em um FAP para as 400 empresas de 0,8331.
Posição
correta
0,50
Posição média das
empresas empatadas
com acid. = 0
0,67
0,83
Posição arbitrada pela
regra FAP = 0,5 + (IC *0,5),
sem base legal
1,00
FAP
2,00
Foram registrados mesmo casos em que a empresa, apesar de não ter apresentado
qualquer acidente/ doença de trabalho, recebeu FAP maior do que 1. A CNI forneceu
exemplo de uma empresa com, em média, 30 funcionários por ano, sem qualquer
registro de acidente ou doença do trabalho, e que recebeu um FAP de 1,7357.
Dado que existe um enorme número de empresas que apresentam acidentalidade zero
em praticamente todas as subclasses da CNAE, qualquer ocorrência de acidente ou
doença relacionado ao trabalho pode deixar uma empresa em situação bastante
desfavorável na comparação com as demais, resultando em um FAP maior do que 1.
Com isso, as grandes empresas, onde a probabilidade de não se registrar qualquer
evento acidentário é extremamente baixa, acabam sendo prejudicadas. Por mais que
invistam em melhorias e segurança no trabalho, uma única ocorrência pode significar
um aumento significativo de encargos sobre toda sua folha de pagamentos.
Outra deformação resultante do uso dos percentis deriva do fato de que esse método
ordena valores dentro de uma sequência, sem considerar, no entanto, o aspecto
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41
quantitativo das grandezas. Ou seja, o que diferencia o FAP de uma empresa para outra
não é a diferença absoluta entre os valores numéricos de freqüência, gravidade e custo,
mas a posição relativa, ou número de ordem, que essas empresas ocupam dentro de um
setor de atividade. Dessa maneira, não é o método adequado para a definição do FAP,
pois não atende ao princípio de bonus/ malus pretendido.
Para ilustrar esse argumento, tome-se o mesmo exemplo dado acima, retirado do próprio
site da Previdência: um setor de atividade com 600 empresas, em que as 400 primeiras
registraram zero de acidentalidade. O exercício segue com as seguintes hipóteses: (i) a
empresa de ordem 401 apresenta 10 acidentes; (ii) as empresas de ordem 402 e 403
apresentam 100 acidentes; (iii) as 196 penúltimas empresas, de ordem 404 a 599
apresentam 150 acidentes; e (iv) a empresa de ordem 600, 151 acidentes.
Calculando-se o FAP de cada uma com base na metodologia utilizada pelo governo,
tem-se que as empresas de ordem 402 e 403, apesar de apresentarem 10 vezes menos
acidentes, possuem quase o mesmo FAP que as empresas dos 196 percentis seguintes.
Isso porque a regra de desempate, da mesma forma que afeta as empresas de menor
acidentalidade do FAP = 0,5, também afasta empresas que empataram, com os maiores
índices de acidentalidade, do FAP = 2,0. Por fim, a empresa de ordem 600, que
apresenta 151 acidentes, terá FAP bem superior às 196 anteriores, apesar de ter apenas 1
acidente a mais que elas.
4.3 Tratamento desigual para atividades com melhora generalizada nos
índices de acidentalidade
O objetivo do FAP, de premiar as empresas, dentro de uma mesma atividade
econômica, que mais investem em saúde e segurança do trabalho, e penalizar aquelas
que se destacam negativamente nesses quesitos, parece bastante adequado e justo. Dessa
maneira, criam-se incentivos para que as empresas melhorem seu ambiente de trabalho,
algo que não existia até então, dado que a alíquota de SAT paga era única para todas as
empresas dentro de uma mesma subclasse da CNAE.
Figura 4
Distribuição de empresas segundo o FAP
0,5
1
2
3
4
FAP
1,0
5
6
7
8
9
10
Índice de frequência, gravidade e custo
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2,0
11
12
13
42
A figura acima ilustra uma situação em que as empresas de um mesmo grupo seguem
uma distribuição normal. As empresas que que possuem menores índices de freqüência,
gravidade e custo (em torno de 5,514) localizam-se no primeiro segmento da curva e
apresentam FAP mais próximo de 0,5, enquanto as empresas com piores índices (12)
obtêm FAP próximo de 2.
Considerando, porém, que os objetivos do governo sejam atingidos, ou seja, que esse
incentivo seja bem sucedido e produza os efeitos esperados individualmente em cada
empresa dessa subclasse da CNAE, o que ocorre, na verdade, é apenas um
deslocamento da curva para a esquerda.
Figura 5
0,5
1
2
3
FAP
4
Deslocamento da curva de FAP
1,0
2,0
5
6
7
8
9
10
Índice de frequência, gravidade e custo
11
12
13
Nesse caso, as empresas, apesar de terem melhorado o ambiente de trabalho, continuam
todas com o mesmo valor de FAP. Assim, para que uma empresa seja beneficiada pelo
FAP, é preciso não apenas que ela invista mais em segurança e saúde do trabalho,
reduzindo seus índices de acidentalidade, mas também que as demais empresas do seu
ramo de atividade continuem apresentando índices de acidentalidade no mínimo iguais
aos que registravam antes. Ou seja, é preciso que o incentivo não seja plebamente
efetivo.
É verdade que, está previsto um recálculo periódico, a cada três anos pelo menos, do
grau de risco de cada atividade, o que pode levar a uma menor alíquota de SAT para
todo o segmento. Porém, isso não é válido para atividades cujo SAT já seja de 1%, pois
não há alíquota inferior a essa.
4.4 Falta de transparência no cálculo do FAP
O valor do FAP foi calculado individualmente para cada empresa. Os dados não foram
publicados em nenhuma fonte oficial, sendo que apenas a empresa tem acesso ao valor
de FAP, assim como do seu índice de freqüência, gravidade e custo, através de
identificação e senha.
14
A escala utilizada na figura para os índices de freqüência, gravidade e custo é puramente ilustrativa e
serve apenas para simplificar a explicação do exemplo.
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43
Isso impede que sejam realizadas simulações sobre os impactos do FAP sobre a
arrecadação do SAT. Inviabiliza ainda análises sobre os critérios efetivamente utilizados
na atribuição do FAP, a verificação de isonomia no tratamento de empresas de uma
mesma atividade econômica e a comparação do desempenho de cada empresa em
relação às demais dentro de determinada subclasse da CNAE.
Mesmo as informações que cada empresa tem acesso carecem de transparência e
objetividade. Para os índices de freqüência, gravidade e custo, é computado diretamente
o valor final, sem maiores detalhes sobre os parâmetros utilizados no cálculo. Dessa
forma, fica difícil até mesmo para a empresa reproduzir os cálculos dos seus próprios
índices.
4.5 Trava da mortalidade
Está prevista na regulação do FAP a impossibilidade de bonificar empresas que
apresentem casos de morte ou invalidez permanente. Essa cláusula, conhecida como
“trava da mortalidade”, determina que, caso o FAP calculado tenha valor inferior a um,
a ocorrência de um desses eventos no período-base de cálculo anula o bonus, elevando o
FAP a um.
Dessa forma, mesmo que a empresa apresente grandes investimentos em segurança e
condições de trabalho diferenciadas, tendo obtido FAP 0,5 (ou qualquer número menor
do que 1), ela perde o benefício adquirido e passa a pagar a alíquota integral da
Subclasse da CNAE em que sua atividade preponderante se enquadra.
A trava da mortalidade acaba por prejudicar as maiores empresas. Conforme
argumentado acima, em empresas com grande número de funcionários, é alta a
probabilidade de que pelo menos um deles apresente uma enfermidade que pode ser
considerada do trabalho. Caso este funcionário torne-se inválido ou venha a falecer em
decorrência dessa doença, parece desproporcionado que a empresa tenha sua alíquota de
SAT aumentada em até 100%, a qual incidirá sobre toda sua folha de pagamentos.
Para ilustrar o argumento, pode-se imaginar uma empresa de 10.000 funcionários
enquadrada em uma CNAE de alíquota 2%. Por destacar-se em relação às demais
empresas em termos de segurança e condições de trabalho, essa empresa recebe FAP de
valor 0,5, passando a pagar uma alíquota de 1%. Um de seus funcionários falece em
decorrência de uma doença que é considerada de natureza acidentária. Mesmo
apresentando uma taxa de acidentalidade mais baixa do que a verificada no setor, a
empresa perde seu bonus e passa a pagar uma alíquota de SAT 100% maior sobre os
salários dos 10.000 funcionários.
Está prevista a possibilidade de manter a bonificação caso comprovados investimentos
em recursos materiais, humanos e tecnológicos em melhoria na segurança do trabalho,
com o acompanhamento dos sindicatos dos trabalhadores. Contudo, o procedimento
exige comprovação, aprovação por órgão do governo, custos relacionados a essa
tramitação e um certo grau de incerteza e arbitrariedade quanto ao resultado.
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44
4.6 Trava da rotatividade
Outro fator que pode levar à perda do bonus em empresas que obtiveram FAP abaixo de
um é a chamada “trava da rotatividade”. Trata-se do seguinte critério: empresas com
taxa média de rotatividade superior a 75% não podem ser bonificadas, sendo seu FAP
mínimo igual a 1.
A taxa média de rotatividade por empresa corresponde à média aritmética resultante das
taxas de rotatividade verificadas anualmente na empresa, considerando o período total
de dois anos. A taxa de rotatividade anual é a razão entre o número de admissões e
rescisões, sobre o número de vínculos na empresa no início de cada ano de apuração,
descontando as admissões que representarem aumento e as demissões que
representarem redução no quadro de funcionários da empresa.
As empresas que apresentarem taxa média de rotatividade superior a 75% não poderão
ser beneficiadas com um FAP menor do 1, salvo se comprovarem que foram observadas
as normas de Saúde e Segurança do Trabalho em caso de demissões voluntárias ou
término de obra.
Para empresas de pequeno porte, porém, essa trava pode ser discriminatória. Isso porque
uma empresa que tenha 4 funcionários, por exemplo, atingir uma rotatividade de 75% é
muito mais provável do que uma empresa de médio ou grande porte.
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45
5. Críticas gerais
Esta seção explora alguns outros problemas envolvidos na tributação do SAT, que não
se enquadram especificamente na metodologia do SAT/RAT ou FAP, alertando para o
risco de efeitos perversos.
Primeiramente se discute o possível aumento de carga tributária resultante das
mudanças previstas no SAT, e os eventuais impactos de aumentos de alíquotas sobre a
folha no emprego, salário e nível de formalidade da economia. Em seguida, critica-se o
fato de os acidentes de trajeto integrarem as estatísticas de acidentalidade das empresas,
uma vez que tais acidentes nada tem a ver com o ambiente de trabalho da empresa, além
de incitarem a discriminação de trabalhadores com base no seu local de residência e
meio de transporte utilizado para ir ao trabalho.
5.1 Maior oneração do setor formal da economia
Os dados disponíveis hoje sobre o SAT/RAT e o FAP não permitem que seja calculado
o impacto das mudanças previstas para 2010 sobre a arrecadação desse tributo. Isso
porque, apesar de ser pública a informação da alíquota de SAT que incide sobre cada
subclasse da CNAE, os dados referentes ao FAP são disponibilizados individualmente
para cada empresa brasileira, a qual tem acesso ao número calculado através de uma
senha.
Existem fortes indícios, contudo, de que ocorrerá um aumento da carga tributária.
Em primeiro lugar, o reenquadramento das alíquotas do SAT resultou em um aumento
de alíquota para dois terços de todas as atividades econômicas da CNAE.
A princípio, não é possível calcular o impacto disso sobre a arrecadação do SAT, uma
vez que o conjunto de informações necessárias para realizar a conta não estão
disponíveis. Mas apenas para se ter uma idéia da dimensão que essa mudança poderia
representar em termos de arrecadação do tributo, pode-se recorrer a uma estimação
baseada em um exemplo hipotético simplificado.
Caso todos os setores de atividades possuíssem o mesmo número de empresas, e se
essas empresas fossem homogêneas em número de funcionários e massa salarial, o
reenquadramento do grau de risco do SAT, isoladamente, poderia ter um impacto de até
50% sobre a arrecadação.
Como não se sabe a alíquota final a ser paga por cada empresa, poder-se-ia argumentar
que existe uma probabilidade de que o efeito líquido do bonus e do malus atribuído às
empresas seja nulo em termos de FAP, fazendo com que a alíquota média que incide
sobre as empresas de uma mesma subclasse da CNAE seja exatamente igual àquela
definida com base no RAT do segmento.
No entanto, mesmo tendo grande parte das empresas recebido FAP abaixo de 1 (como
alegado pelo MPAS), as demais empresas, as quais foi atribuído FAP maior do que 1,
são justamente aquelas que mais contribuem para a arrecadação do tributo. Além disso,
devido a forma como foi calculado, a maior parte dos descontos concedidos é pequena,
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46
mesmo para empresas que tiveram acidentalidade zero; ao passo que as empresas que
tiveram sua alíquota majorada receberam grandes aumentos. Isso indica que o FAP
também levará a um grande aumento da arrecadação.
Massa salarial das
médias e grandes
empresas, com
grandes aumentos
de SAT
Massa salarial das
pequenas empresas,
com pequenos
descontos sobre o SAT
1,0
0,5
2,0
O cálculo preciso só pode ser feito com dados individualizados de cada empresa (FAP),
que não são disponíveis. Mas apenas para se ter uma idéia desse aumento, pode-se
recorrer, mais uma vez, a um exercício simplificado de estimação.
Suponha um mundo hipotético em que existem 100 empresas que pagam SAT, sendo 90
de pequeno porte e as restantes 10, de grande porte.
Antes da introdução do FAP, o grupo de empresas de pequeno porte arrecadava um total
de R$ 1.000 a título de SAT, enquanto as de grande porte, apesar de serem em número
reduzido, arrecadavam, juntas, um total de R$ 4.000 (essa diferença se justifica pelo
fato de terem um número bastante superior de funcionários e pagarem maiores salários).
Dessa forma, o SAT arrecadado total era de R$ 5.000.
Se, por conta do FAP, as pequenas empresas receberem um desconto de 5%, passando a
arrecadar R$ 950, e as empresas grandes tiverem um aumento médio da alíquota de
60%, passando a pagar R$ 6.400, a arrecadação total sobe para R$ 7.350, um aumento
de 47%!
Pequenas empresas
Grandes empresas
+
=
+ 60%
6.400
Arrecadação
total de SAT
+ 47%
7.350
5.000
4.000
1.000
Antes
- 5%
950
Depois do FAP
Antes
Depois do FAP
Antes
Depois do FAP
Este exemplo, meramente ilustrativo, é válido para alertar sobre o potencial de aumento
do ônus que a introdução do FAP pode representar.
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Lembrando que o reenquadramento do grau de risco das atividades econômicas também
terá um impacto altista sobre a arrecadação, os efeitos combinados do SAT e do FAP
devem levar a um aumento expressivo no montante recolhido de tributos.
O resultado é o oposto, portanto, do discurso do Ministro da Previdência Social, José
Barroso Pimentel, que afirma que “não há intenção de arrecadar. Bom seria se
tivéssemos ‘zero’ de receita do Seguro de Acidente, pois evidenciaria um extraordinário
e salutar ambiente de trabalho”.
Por outro lado, representantes do governo defendem a necessidade desse aumento de
arrecadação, argumentando que existe um déficit nas contas da Previdência referente
aos gastos com benefícios decorrentes de acidentes e doenças do trabalho. Contudo,
esse argumento não é aceitável.
Os gastos da Previdência com acidentes e doenças do trabalho não constituem uma
conta isolada das demais, a qual deve ter seu saldo zerado. A Previdência concede um
amplo conjunto de pensões e benefícios que são custeados a partir de diversas fontes de
recursos, não havendo uma correspondência direta entre a arrecadação de cada fonte e
despesa15.
Assim, ainda que o montante arrecadado com o SAT não possa ser utilizado para
custear gasto público diverso daqueles oriundos de acidentalidade no trabalho, não
existe a necessidade de que esse montante seja de valor correspondente ao dos gastos da
Previdência decorrentes de acidentes e doenças do trabalho. Até porque, esses gastos
incluem custos gerados por todas as empresas que atuam no Brasil, independentemente
de elas contribuírem ou não para o SAT.
Existe uma ampla literatura que relaciona a rigidez contratual e os custos impostos pela
legislação trabalhista com uma das principais razões para a existência de altas taxas de
informalidade no mercado de trabalho brasileiro. A idéia geral é de que as excessivas
restrições impostas pela legislação, assim como os elevados encargos trabalhistas,
produzem incentivos tanto para empregadores quanto para trabalhadores atuarem no
setor informal.
15
Segundo a Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991: “Art. 10. A Seguridade Social será financiada por
toda sociedade, de forma direta e indireta, nos termos do art. 195 da Constituição Federal e desta Lei,
mediante recursos provenientes da União, dos Estados Distrito Federal, dos Municípios e de
contribuições sociais.
Art. 11. No âmbito federal, o orçamento da Seguridade Social é composto das seguintes receitas:
I - receitas da União;
II - receitas das contribuições sociais;
III - receitas de outras fontes.
Parágrafo único. Constituem contribuições sociais:
a) as das empresas, incidentes sobre a remuneração paga ou creditada aos segurados a seu serviço;
(Vide Lei nº 11.098, de 2005) (Vide Lei nº 11.196, de 2005) (Regulamento)
b) as dos empregadores domésticos;
c) as dos trabalhadores, incidentes sobre o seu salário-de-contribuição; (Vide Lei nº 11.098, de 2005)
(Vide Lei nº 11.196, de 2005) (Regulamento)
d) as das empresas, incidentes sobre faturamento e lucro;
e) as incidentes sobre a receita de concursos de prognósticos”.
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Reis e Ulyssea (2006) mostram que “reduções na alíquota do imposto sobre a folha
podem ter impactos significativos sobre alguns dos principais indicadores do mercado
de trabalho nacional”. Ocorreriam reduções substanciais da taxa de desemprego,
aumentando, em contrapartida, o total de ocupados, assim como a participação dos
trabalhadores formais no total de ocupados. Segundo os autores, quanto mais rígidos
forem os salários no setor formal, maior será o impacto sobre a composição do emprego
(entre os setores formal e informal) e sobre o desemprego.
O estudo de Ulyssea (2008) corrobora este último resultado, ao mostrar que alterações
na alíquota que incide sobre os trabalhadores do setor formal afetam significativamente
o diferencial de salários entre os dois setores (formal e informal), somente sem afetar o
emprego caso os salários sejam flexíveis.
5.2 Acidente de trajeto
De acordo com a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, o acidente sofrido pelo funcionário,
ainda que fora do local e horário de trabalho, será considerado acidente de trabalho
quando ocorrer “no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para
aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do
segurado16”.
Devido a este tratamento dispensado ao acidente de trajeto, ele integra as estatísticas de
acidentalidade no trabalho, contribuindo para o aumento do SAT e do FAP das
empresas. Quando analisado à luz do intuito principal do SAT e FAP, porém, fica claro
que se trata de uma interpretação inadequada.
Como já visto, o SAT tem como objetivo custear as despesas decorrentes de eventos
ocorridos em função de riscos do ambiente de trabalho. Não prevê o custeio, portanto,
de acidentes causados por fatores externos ao ambiente de trabalho, como é o caso do
trajeto que a pessoa faz para ir de casa ao trabalho, e vice-versa. Isto porque, por mais
que a empresa invista em melhorias de seu ambiente de trabalho, ela não pode prover
vias públicas de boa qualidade, segurança no trânsito ou boas condições de transporte.
Estes fatores, que determinam os riscos reais de se sofrer um acidente no trânsito,
dependem de maiores investimentos do Governo em infra-estrutura e segurança pública,
assim como de políticas específicas para garantir um transporte de qualidade aos
cidadãos.
Ademais, o sistema tem por objetivo prover incentivos para que as empresas melhorem
o ambiente de trabalho e reduzam a acidentalidade. No entanto, as empresas
normalmente somente podem atuar nos limites de suas instalações.
5.3 Acidentes de trajeto e discriminação
Ao incluir os acidentes de trajeto no cálculo da acidentalidade de trabalho, acaba-se por
acentuar o problema da discriminação de trabalhadores. Diferente do argumentado na
seção 3.2, em que a discriminação se dá por predisposição a doenças, neste caso o
trabalhador corre o risco de ser dispensado de seu emprego – ou de um processo
16
Art. 21, inciso IV, alínea d.
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seletivo – devido ao local onde mora ou o meio de transporte que utiliza no caminho
para o trabalho. Trabalhadores que moram em lugares mais afastados e que transitam
por vias consideradas mais perigosas, ou utilizam meios de transporte mais inseguros,
por exemplo, poderiam perder seu emprego ou uma oportunidade de trabalho,
simplesmente por terem um risco de trajeto elevado. Por exemplo, um trabalhador que
utiliza uma motocicleta para ir ao trabalho, por exemplo, poderia ser discriminado
devido à alta incidência de acidentes de motos em algumas cidades.
Um comportamento discriminatório por parte dos patrões e proprietários de empresas é
facilmente compreensível e é resultado do incentivo econômico proporcionado pelo
mecanismo. Como o índice de acidentalidade de sua empresa pode resultar em um FAP
mais elevado, onerando toda a sua folha de funcionários, é razoável que sejam tomadas
todas as medidas possíveis para reduzir o risco de acidentes e doenças no trabalho.
Como os investimentos que a empresa realiza em melhorias de suas condições de
trabalho não garantem uma redução do risco de acidente de trajeto, é racional que se
discriminem trabalhadores com risco de trajeto mais elevado, preservando e contratando
apenas aqueles que contribuem para a redução desse risco.
A trava da mortalidade, discutida na seção 5.2, consiste em mais um incentivo para esse
tipo de discriminação. Isso porque caso ocorra algum acidente de trajeto seguido de
morte, a empresa fica impossibilitada de ser bonificada com um FAP menor do que 1, o
que, em alguns casos, pode representar um aumento de até 100% da alíquota de SAT
paga sobre a folha de pagamentos de toda a empresa17.
5.4 Desproporção entre custos e encargos
Diversas empresas relatam desproporção entre os encargos pagos a título de SAT e os
custos efetivamente causados por elas ao INSS, devido a acidentes e doenças de
trabalho.
Esta queixa é geralmente rebatida com o argumento de que o SAT é, antes de mais
nada, um seguro, de forma que o pagamento do “prêmio” não decorre das despesas
causadas por determinados eventos, mas da probabilidade de se incorrer em tais
despesas. Essa probabilidade é hoje determinada com base no grau de risco da atividade
preponderante da empresa.
O que causa desconfiança no sistema é, na verdade, a falta de transparência nos dados
divulgados pelo Ministério da Previdência Social. Com as informações disponíveis, não
se pode verificar se existe um equilíbrio dentro de cada atividade econômica entre o
montante arrecadado de SAT e os custos da Previdência com benefícios decorrentes de
eventos acidentários. Ou ainda, se as empresas de uma determinada atividade estão, na
realidade, custeando os benefícios concedidos a trabalhadores que atuam em outras
atividades.
17
Empresas que têm FAP entre 0,5 e 1,0 podem ter seu FAP aumentado para 1 caso ocorra um único caso
de morte ou invalidez permanente decorrente de acidente ou doença do trabalho.
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50
A partir da introdução do FAP, a idéia é que essa probabilidade de se gerar despesas
decorrentes de acidentes, que define a alíquota de SAT a ser paga por uma empresa,
passe a depender não apenas do risco do segmento em que ela atua, mas também dos
seus próprios índices de acidentalidade.
Um problema, nesse caso, é que a metodologia do FAP contabiliza todas as CAT
(Comunicação Acidente de Trabalho) geradas para cálculo dos índices de acidentalidade
da empresa, mesmo quando o acidente/ doença que motivou a CAT não implica custos
para a Previdência. Ou seja, ainda que o funcionário não tenha sido afastado por mais de
15 dias, não tendo gerado, portanto, qualquer despesa à Previdência, a empresa pode ser
considerada como de risco maior, sendo penalizada com um aumento dos encargos a
serem pagos.
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6. Síntese e conclusões
O presente trabalho analisou as inconsistências, do ponto de vista econômico, por trás
de conceitos e metodologias envolvidas na definição do grau de risco e alíquota SAT
das diferentes atividades econômicas e no cálculo do FAP de cada empresa.
O principal resultado encontrado foi maior oneração da folha de pagamento das
empresas devido ao reenquadramento do grau de risco da maior parte das atividades
econômicas e da introdução do FAP.
Cerca de 67% de todas as subclasses da CNAE tiveram sua alíquota SAT aumentada, ao
passo que houve redução de alíquota apenas para 4% das atividades. Supondo que todos
os setores de atividade possuem o mesmo número de empresas, e que as empresas são
homogêneas em termos de número de funcionários e massa salarial, conclui-se que o
efeito isolado dessa reclassificação do risco das atividades é um aumento da arrecadação
de até 50%.
Para se calcular os impactos da introdução do FAP, seriam necessários os dados de
todas as empresas. Como essa informação, contudo, é sigilosa, é necessário traçar
algumas hipóteses para se realizar uma simulação do resultado.
Uma importante deficiência verificada na metodologia do FAP é a discriminação de
empresas de grande porte. Apesar de apresentarem, de modo geral, melhores condições
de trabalho e investimentos mais elevados em segurança e saúde dos funcionários, essas
empresas apresentam alta probabilidade de se registrar algum caso de acidente ou
doença, dado o grande número de funcionários. Por outro lado, como grande parte das
pequenas empresas tem acidentalidade zero, as grandes acabam sendo bastante
prejudicadas na comparação com as demais para definição do FAP. Dessa forma,
espera-se que as empresas que serão punidas, podendo ter sua alíquota de SAT
majorada em até 100%, são de grande porte e, portanto, as que mais contribuem com a
arrecadação.
Ao mesmo tempo, haverá um enorme número de pequenas empresas que receberá FAP
menor do que 1, tendo sua alíquota reduzida. Mas mesmo que tais empresas apresentem
acidentalidade zero, elas deverão receber pequenos descontos, dada a utilização
inadequada dos percentis na definição do FAP.
Esse fator foi calculado de tal forma, que o seu valor depende não apenas dos índices de
acidentalidade de cada empresa, mas também do tamanho do segmento e da quantidade
de empresas com mesmos índices de acidentalidade. Isso porque, além de arbitrar a
posição das empresas no rol de freqüência, gravidade e custo, para empresas empatadas
nesses quesitos, foi aplicada ao índice composto uma fórmula não prevista na
metodologia do FAP, que majorou ainda mais o seu valor.
Consequentemente, ainda que um pequeno desconto seja dado a uma infinidade de
pequenas empresas, o grande aumento de ônus que recairá sobre um número reduzido
de grandes empresas será suficiente para elevar significativamente a arrecadação do
tributo.
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Também foram identificadas inúmeras inconsistências na metodologia do SAT e do
FAP, que podem gerar efeitos contrários aos pretendidos. É importante frisar que parte
das críticas se deve à falta de transparência na divulgação de informações por parte da
Previdência, o que gera desconfianças e dúvidas por parte das empresas.
Em síntese, o aumento da alíquota do SAT para a maioria das atividades econômicas e
as assimetrias no cálculo do FAP, com a oneração das empresas de maior porte,
constituem claros indícios de que a nova regulamentação deverá acarretar um aumento
de carga tributária para as empresas. Muitos dos incentivos operam de forma ineficiente
ou distinta da pretendida. Assim, o mecanismo proposto acarreta distorções sérias, como
o incentivo à discriminação de trabalhadores; a falta de isonomia para as empresas em
função de tamanho, atividade e região que atuam, bem como para o setor formal da
economia como um todo.
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JOHANSEN, S. (1988). Statistical Analysis of Cointegration Vectors. Journal of
Economic Dynamics and Control, vol.12.
LEVITT, S. D. & DUBNER, S. J. (2009). Super Freakonomics – O Lado Oculto do Dia
a Dia. Ed. Elsevier.
LOPES, O. B. (2001) A questão da discriminação no trabalho Synthesis. São Paulo, n.
32, p. 131-33, jan./jun.
OLIVEIRA, P. R. A. (2008). Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário NTEP e o
Fator Acidentário de Prevenção FAP: Um Novo Olhar Sobre a Saúde do
Trabalhador. Tese de doutorado. Universidade de Brasília.
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Econometrics, 31, 311-340.
REIS, M.C.; ULYSSEA, G. (2006) Imposto sobre trabalho e seu impacto nos setores
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TODESQUINI, R. e CODO, W. (Org.). (2009). O Novo Seguro de Acidente e o Novo
FAP. São Paulo. Editora LTR.
ULYSSEA, G. (2008). Instituições e a Informalidade no Mercado de Trabalho. Estudos
Econômicos. São Paulo, v.38, n.3, julho-setembro 2008.
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Anexo - O Nexo Técnico
Epidemiológico Previdenciário (NTEP)
No sistema até hoje vigente, o INSS reconhece a existência de um acidente de trabalho a
partir da perícia do trabalhador.
Existe um conjunto de normas e leis que determinam as condições em que a empresa
deve emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), com penalidades para seu
descumprimento. No entanto, o sistema é vulnerável a uma serie de falhas que podem
resultar em comunicação imprecisa de um acidente de trabalho ou doença funcional,
como ressaltado por Oliveira no capítulo 3 de sua tese. Alguns exemplos são dados a
seguir18:
“A empresa assume o risco de descumprir a lei ao não emitir a CAT em função
dos baixos valores das multas administrativas; da inércia fiscalizatória do MTE;
eterna possibilidade de acordo judicial; da baixa representatividade e
fragmentação sindical em tempos de terceirização e principalmente por não
envolver responsabilização pessoal (CPF) dos empresários, pois nos raros casos
em que perde a lide é a empresa (CNPJ) que arca com as custas”;
“A empresa assume o risco de não emitir a CAT por confiar na ausência de
estudos epidemiológicos que façam o contraponto, pois inexistem exatamente por
falta ou indisponibilidade dos dados e prontuários acidentários das próprias
empresas.”
Codo, Soratto e Lino19 também destacam a existência de subnotificação no sistema
anterior, “que poderia se dar por desconhecimento ou má-fé; ou não se sabia do nexo
entre aquele agravo e aquele trabalho , ou se escondia o fato para efeito de redução de
custos, sonegando impostos pela omissão de informações”.
Para superar essas insuficiências, Oliveira propôs como fonte primária de informações
sobre acidentes de trabalho a Classificação Internacional de Doenças (CID), da
Organização Mundial da Saúde - OMS que se encontra atualmente na 10ª Revisão (CID
10). A classificação do problema de saúde apresentado pelo trabalhador é um dado
“preenchido pelo médico que prestou o atendimento, sendo de sua responsabilidade
profissional”. “O CID, assim, [para Oliveira] não padece dos vícios de subjetividade
administrativa da CAT, uma vez que independe da comunicação da empresa”20.
A associação entre as doenças e a atividade econômica exercida pelo trabalhador é feita
mediante procedimentos estatísticos. Assume-se como hipótese a ser testada que “o
emprego em uma empresa pertencente a um determinado segmento econômico (CNAE
18
Oliveira, p. 30.
In Todesquini e Codo (2009), p. 95.
20
Em função disso, afirma Oliveira, “(...) a variável CID é analítica devido ao referencial
epistemológico positivista em que, não raro, se pauta a clínica médica na busca da lesão tissular quando
faz uso ostensivo de ferramentas tipicamente analíticas como a patogênese, fisiopatologia,
anatomoclínica, propedêutica segundo a semiologia médica”.
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classe) não constitui fator de risco para o trabalhador apresentar um determinado
Agrupamento-CID-10 [tipo de doença]”21. Ao se rejeitar essa hipótese, conclui-se que a
classe de atividade econômica da empresa empregadora é causadora de doença.
Utilizou-se um intervalo de confiança elevado (99%) para atribuir “baixíssimo peso ao
acaso”, sendo que para as 68.753 relações possíveis entre CNAE-Classe e
Agrupamento-CID analisadas por Oliveira, 65.957 (96%) não apresentam associação,
restando portanto 265 associações.
A NTEP e sua metodologia podem acarretar diversos problemas, analisados a seguir.
A. Associações espúrias entre atividade econômica e acidentalidade
As associações obtidas entre as doenças e a atividade econômica exercida pelo
trabalhador podem ser objeto de questionamento, como reconhece o próprio Oliveira,
pois esse tipo de análise estatística corre o risco de resultar em associações sem sentido
entre doença e ramo de atividade da empresa. Em alguns casos, a relação obtida é óbvia,
mesmo para leigos, como, por exemplo, em traumatismos de punho e mão em
atividades que implicam a manipulação de máquinas e instrumentos cortantes. Em
outros casos, não parece haver uma relação entre a doença e a atividade. Nos termos de
Oliveira, há “causalidade sem plausibilidade”. O exemplo dado pelo autor (p. 124) são
os “outros NTEP relacionados a transtorno mental, neoplasias, doenças hipertensivas
que ainda não possuem o requisito de plausibilidade biológica”.
No entanto, a associação é mantida sob o argumento de que a relação encontrada,
mesmo que não plausível, decorre da suposição de “que é muito provável que haja
relação de causalidade sem a plausibilidade, dado que essa última resulta do
conhecimento humano acumulado e necessariamente defasado quanto aos fenômenos a
que se pretende conhecer”. Em outras palavras, por essa argumentação, a associação
estatística não seria espúria e sem sentido: haveria uma causa, mas ainda desconhecida.
Essa conclusão é metodologicamente contestável. O problema da relação espúria é
antigo na estatística e na economia. Na literatura econômica mais recente, em 1974,
Granger e Newbold22 mostraram, por meio de simulações, que há uma alta probabilidade
de se aceitar estatisticamente a existência de causalidade entre duas variáveis geradas por
processos totalmente independentes. A esse tipo de situação, em que duas variáveis
são estatisticamente relacionadas, sem que haja qualquer fundamento teórico para
explicar essa relação, dá-se o nome de “correlação espúria”.
Um bom exemplo de correlação espúria pode ser constatado no caso das séries de
produção de manteiga em Bangladesh e o desempenho do mercado financeiro nos
Estados Unidos. Segundo artigo publicado pela revista Money23, no período entre 1983 e
1993, essas duas variáveis inteiramente distintas seguiram um comportamento muito
parecido. Na média, quando a produção de manteiga de Bangladesh crescia 1%, o índice
21
Oliveira. P. 89,
Clive Granger recebeu o prêmio Nobel de Economia em 2003 pelos seus trabalhos em econometria
(descobertas fundamentais na análise da série de dados em tempo).
23
MONEY Magazine. 01/03/1998. Disponível em: http://money.cnn.com/magazines/moneymag/
moneymag_archive/1998/03/01/238606/index.htm, acesso em Nov/2009.
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56
S&P 50024 crescia 2% no ano seguinte. Já no caso de uma queda de 10% na produção de
manteiga, o S&P 500 chegava a cair 20%. Outro exemplo interessante envolve a
produção de porcos no Brasil e o PIB do Canadá. Através da estimação de um modelo
relacionando as duas variáveis, para o período de 1948 a 1971, conclui-se que para um
crescimento de 1% do PIB canadense, a produção de porcos no Brasil aumentaria, em
média, 0,74%. Tais resultados mostram-se estatisticamente significantes, indicando que,
a princípio, existe uma grande aderência entre as séries de dados.
Esses dois exemplos deixam claro que, ao se notar que as trajetórias passadas de
dois eventos totalmente isolados possuem forte correlação, deve-se proceder com
cautela. A falta de coerência técnica ou científica que explique de forma satisfatória
esse fenômeno é um bom indício de que os resultados encontrados, apesar de
parecerem robustos, escondem uma correlação espúria.
Desde o famoso artigo de Granger e Newbold, inúmeros acadêmicos têm se debruçado
sobre o tema, a fim de encontrar uma solução para o problema. Entre eles, pode-se citar
Philips (1986), que demonstrou que é possível trabalhar com duas séries temporais de
dados sem correr o risco de regressões espúrias caso essas séries sejam cointegradas de
uma determinada ordem. A análise de cointegração, em que merecem destaque os
trabalhos de Engle & Granger (1987) e, posteriormente, Johansen (1988), propõe indicar
se existe uma relação de equilíbrio (estável) de longo prazo entre as variáveis.
No estudo do NTEP, ao tentar relacionar uma ampla base de dados de doenças com todas
as atividades econômicas listadas na CNAE, os autores identificam inúmeros casos de
correlação entre doenças e atividades econômicas que não possuem nexo cientificamente
demonstrado. No entanto, em vez de seguir as propostas e metodologias econométricas
que auxiliam na verificação da real causalidade, os autores assumem que a simples
significância estatística é suficiente para estabelecer relação de causa e efeito entre as
variáveis testadas, sem realizar testes conhecidos que melhor testasse a relação espúria.
Em síntese, em alguns casos, ocorre na NTEP a atribuição de vínculo entres doenças e
CNAE por mera correlação estatística, sem justificativa etiológica, com pressuposição,
entre outros argumentos, de que tal justificativa poderia ser descoberta no futuro.
Reconhece-se que não é sabida a causa para algumas associações entre doença e
atividade, mas, um dia, pode ser que se venha saber. Mas enquanto isso, cobra-se um
imposto por uma suposta e desconhecida causa, que pode muito bem ser espúria.
Isso pode acarretar, no mínimo, questionamentos judiciais da metodologia.
B. Incentivos à discriminação de trabalhadores
Conseqüências não intencionais de uma ação, obtendo resultados não desejados,
acontecem com freqüência. Como indica Levitt e Dubner, “Os governos, por exemplo,
não raro promulgam leis com o objetivo expresso de proteger seus públicos mais
vulneráveis, mas a boa intenção não raro surte o efeito contrário”. E os autores
24
O S&P 500, calculado pela Standard & Poor´s, é um índice de mercado que reúne as 500 maiores
empresas americanas negociadas nas duas bolsas mais importantes dos EUA: a Bolsa de Valores de Nova
York e a Nasdaq.
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complementam com um exemplo: “Veja o caso da lei Americans with Disabilities Act
(ADA), promulgada para proteger da discriminação trabalhadores com deficiências.
Intenção nobre, não? Sem dúvida – mas os dados demonstram de maneira convincente
que o resultado líquido foi menos empregos para americanos com deficiências. Por
quê? Depois da promulgação do ADA, os empregadores ficaram tão receosos de não
terem condições para punir ou demitir maus trabalhadores com deficiências que, como
prevenção, simplesmente deixaram de contratar trabalhadores nessas condições” 25.
Esse tipo de conseqüência indesejável pode resultar dos incentivos proporcionados pelo
novo SAT. Como visto, as mudanças propostas para o SAT têm como objetivo expresso
a produção de incentivos para que as empresas invistam na melhoria das condições de
saúde e segurança no ambiente de trabalho.
Para tanto, está prevista a introdução de um fator de desconto no pagamento do SAT
para empresas que se destacam positivamente na sua área de atuação em relação a esses
quesitos (FAP menor do que 1), e de um fator punitivo para as empresas que apresentam
padrões de segurança e saúde aquém do desejável (FAP maior do que 1).
Dessa maneira, dentro de uma mesma atividade econômica, as empresas que
apresentarem maior acidentalidade, maior número de trabalhadores doentes e com
maior gravidade e maior custo, serão punidas mediante pagamento de tributo (SAT)
mais elevado.
Esse mecanismo, ao mesmo tempo em que incentiva as empresas a melhorarem seu
ambiente de trabalho, gera, por outro lado, um incentivo para que elas selecionem
candidatos que não apresentem propensão ou sintomas de doenças que, segundo o
NTEP, possuem nexo com a atividade econômica em que atuam. Isso porque, caso a
pessoa selecionada venha a apresentar a doença e seja afastada, existe um grande risco
de que a perícia médica do INSS se utilize do NTEP para considerar a enfermidade
apresentada de natureza acidentária26. Como resultado, a empresa sofre um aumento dos
seus percentis de freqüência, custo e gravidade, elevando o valor do seu FAP e, com
isso, a alíquota do SAT a ser pago.
Desta forma, por conta da doença apresentada por um funcionário, que poderia
ser propenso ou mesmo já apresentar tal doença, não havendo, portanto, qualquer
relação entre sua enfermidade e o ambiente de trabalho, a empresa passa a ter que
pagar mais tributos sobre toda a sua folha de pagamentos.
Para não correr o risco de arcar com esse ônus, é de se esperar que as empresas tornemse mais seletivas em seus quadros de funcionários, no sentido de discriminar aqueles
que apresentem propensão ou sintomas de doenças relacionadas a sua área de atividade
econômica, de acordo com o NTEP. Isso pode se refletir em processos admissionais
mais rigorosos e mesmo na demissão de funcionários que, apesar de encontrarem-se
25
LEVITT e DUBNER (2009), p.126.
Como será visto na seção 3.3, a partir da introdução do NTEP, os peritos médicos do INSS passaram a
ter incentivos para classificarem as enfermidades detectadas em trabalhadores como de natureza
acidentária.
26
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saudáveis, possuem maior risco de desenvolverem doenças que possam ser consideradas
como do trabalho em caso de afastamento.
Seguindo esse raciocínio, é razoável supor que trabalhadores que apresentem
hipertensão, por exemplo, doença que pode ser facilmente identificada no exame
admissional e que tem inúmeras causas, serão prontamente rechaçados ao se
candidatarem a uma vaga em serviços de “construção de rodovias e ferrovias”, ou em
“limpeza de prédios” ou em “transporte rodoviário de cargas” – para citar apenas alguns
de diversos exemplos –, ainda que sejam qualificados para o trabalho.
A discriminação poderia ocorrer ainda em função da idade do trabalhador, uma
vez que, para um grande número de enfermidades, o risco de adoecer aumenta com a
idade. Dessa maneira, é de se esperar que será cada vez ainda mais difícil para um
trabalhador mais velho conseguir emprego, dado que seu risco mais elevado de contrair
uma doença o coloca em situação de grande desvantagem em relação a um candidato
mais jovem. A hipertensão constitui outro bom exemplo de doença cuja freqüência se
intensifica com a idade.
O que reduz sensivelmente a atratividade do candidato mais velho deixa de ser apenas
custo que ele causaria para a empresa caso viesse a adoecer e fosse afastado. Mas sim o
fato de que, caso isso ocorra, e seja estabelecido algum nexo entre sua doença e o
trabalho, a empresa será onerada sobre toda a sua folha de pagamentos, o que pode
comprometer seriamente a competitividade da mesma.
Devido à trava da mortalidade, cláusula que determina que em caso de falecimento ou
invalidez permanente de natureza acidentária, a empresa não pode ter FAP menor do
que 1, o maior risco de falecimento ou de invalidez permanente de uma pessoa mais
velha também inibe a sua contratação.
O mesmo raciocínio é válido não apenas para a admissão de novos funcionários, mas
também atinge a manutenção de funcionários em seus cargos atuais. Ou seja, a nova
legislação, ao induzir uma discriminação de pessoas mais velhas, deve contribuir para
um aumento do desemprego entre as faixas de idade mais avançadas.
A possibilidade de se identificar uma maior probabilidade de ocorrência de uma doença
entre a população masculina ou feminina pode levar também a uma discriminação de
trabalhadores por sexo.
Ou seja, o mesmo mecanismo de incentivo econômico que o FAP, segundo o
governo representaria para reduzir a acidentalidade, tem um efeito perverso: o
NTEP e o FAP acabam por produzir um incentivo econômico à discriminação no
mercado de trabalho, configurando um retrocesso na política brasileira de
promoção da igualdade.
Como destaca Lopes (2001), “a Constituição de 1988, logo em seu Preâmbulo, alude à
igualdade como valor supremo de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, fundada na harmonia social, e traça como objetivo a redução das
desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de
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origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º,
incisos III e IV)”. O princípio isonômico é ainda invocado em diversos dispositivos da
Constituição, estando garantida, inclusive, a "proibição de diferenças de salários, de
exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado
civil”.
Na prática, porém, a discriminação no mercado de trabalho ainda é um problema crítico
na sociedade brasileira. As novas mudanças previstas para o SAT devem agravar ainda
mais esse quadro, indo em sentido contrário ao esforço que tem sido feito para assegurar
uma efetiva igualdade no mercado de trabalho.
C. Incentivos à utilização indiscriminada da NTEP
É importante frisar que a discriminação do trabalhador abordada na seção acima é um
efeito perverso que não decorre diretamente da tarifação individual a que o FAP se
propõe, mas sim do elevado risco de se estabelecer, com base no NTEP, uma relação, na
verdade inexistente para aquele indivíduo, entre a doença e a atividade em que ele atua.
Conforme amplamente divulgado pelo Governo, o NTEP foi desenvolvido para ser um
instrumento de auxílio para a perícia médica do INSS na investigação da natureza das
doenças diagnosticadas em trabalhadores, se acidentária ou não. No entanto, o NTEP
tem sido usado, muitas vezes, como único argumento para se reconhecer doenças
relacionadas ao trabalho, sem que haja maior esforço em se identificar, com argumentos
médicos e de histórico do paciente, as reais causas da enfermidade. Uma análise
comparativa de benefícios acidentários previdenciários concedidos antes e depois da
introdução do NTEP corrobora esse resultado.
Tabela 3.
Benefícios Acidentários Previdenciários por grupos de CIDs
2006
2007
2008
Cap. XIX - Lesões e causas externas
99.490 141.790 199.112
Cap. XII - Doenças osteomusculares
19.956
95.473 117.353
Cap V - Transtornos mentais e comportamentais
612
7.690
12.818
Demais capítulos
20.940
29.993
27.053
Total
140.998 274.946 356.336
Fonte: Todesquini e Codo (2009).
A tabela mostra um enorme aumento do reconhecimento das doenças relacionadas ao
trabalho antes dessa metodologia (2006) e após sua aplicação (2007 e 2008). Para as
doenças relacionadas ao Capítulo XIX, houve um crescimento de 100% no período,
enquanto as doenças osteomoleculares, especificamente, LER/DORT tiveram um
aumento de 488%. Já no capítulo relacionado aos transtornos mentais e
comportamentais, o número de benefícios acidentários foi quase 20 vezes superior ao
registrado em 2006.
Esses números deixam claro que os médicos peritos do INSS mudaram o procedimento
dos seus exames a partir de 2007, deixando de valer-se apenas de uma investigação
clínica sobre o nexo entre a doença e o trabalho e passando a adotar o simples
procedimento de cruzar a doença diagnosticada com a área de atuação do paciente e
verificar se essa correspondência estava prevista no NTEP.
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À primeira vista, pode parecer estranha essa mudança de tratamento por um profissional
da área médica. Do ponto de vista econômico, porém, existem incentivos para que os
médicos do INSS ajam dessa forma. Em primeiro lugar, pela maior comodidade que a
automaticidade decorrente do uso do NTEP proporciona ao profissional, reduzindo seu
esforço e risco.
Em segundo lugar, e provavelmente constituindo o fator de maior importância, porque,
ao identificar um maior índice de doenças do trabalho, aumenta-se o risco associado às
atividades econômicas. Isso leva, em última instância, a um aumento de arrecadação de
SAT que, por sua vez, deve custear os gastos da Previdência com a concessão dos
benefícios.
Com a introdução do FAP, essa lógica passa a ser ainda mais óbvia, já que um único
caso de doença na empresa pode ser suficiente para alterar seus índices de freqüência,
gravidade e custo, podendo levar a um aumento do FAP e, conseqüentemente, do valor
devido de SAT.
De acordo com Todesquini e Codo (2009), “com o advento da nova legislação do art.
21-A da Lei n. 8.213/91, incorporado pela Lei n. 11.430/06, os motivos e relações a
serem estabelecidos para as doenças profissionais, do trabalho ou o Nexo Técnico
Epidemiológico não estão adstritos na simples relação de causalidade funcional direta,
pois a existência ou não existência de nexo pode também advir da concausalidade e
mesmo da multicausalidade”. Ou seja, mesmo quando há um reconhecimento de que a
doença pode ter sido causada por inúmeros fatores, que não apenas o trabalho, o
arcabouço legal chancela a associação direta entre doença e trabalho pelo perito médico,
elevando artificialmente as estatísticas sobre acidentalidade e doenças no trabalho.
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