Conselhos Milliman
SOLVÊNCIA NA SAÚDE
Por Daniela Mendonça e Mary Van Der Heijde – 28 de setembro de 2015
Em 2001 a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS introduziu no mercado de saúde,
como uma de suas garantias financeiras, a margem de solvência (RDC nº 77/2001). O
conceito tradicional de solvência pode ser resumido como a capacidade da Operadora de
Planos de Saúde- OPS/Seguradora Especializada em Saúde - SES honrar com todos os
custos assistenciais e compromissos financeiros assumidos, mesmo nas situações mais
adversas. Para tal, é necessário que as OPS/SES mantenham recurso suplementar às
provisões técnicas necessárias.
Ficou estabelecido pela ANS que o valor desta solvência deverá ser aportado na forma de patrimônio, seja social
ou liquido, e que este considerará o fluxo financeiro da empresa. Assim, a fórmula padrão de cálculo proposta
pela ANS estabeleceu que a solvência será de 20% do valor das contraprestações pecuniárias arrecadas no ano
ou de 33% da média anual dos últimos 36 meses do valor dos eventos líquidos reconhecidos, o que for maior
entre os dois valores. Esta formulação sofre alguma alteração quando se trata de produtos em pós-pagamento.
No entanto, é dado a liberdade da OPS/SES apresentar requerimento de modelo de cálculo do capital
econômico (ou capital de risco) em substituição a margem de solvência, desde que este cumpra o objetivo do
conceito da mesma. Este modelo é baseado na mensuração e modelagem dos riscos, aos quais a empresa está
exposta. Contudo, neste ponto surge o primeiro problema, pois não existe um conceito unânime quanto aos
melhores riscos a serem analisados.
Por exemplo, o modelo de capital americano é baseado nos riscos de subsidiárias, default no ativo, preço, taxa
de juros e negócios em geral.
Já o modelo canadense se reporta aos riscos de crédito, mercado, seguro, operacional, legal, liquidez e
estratégico.
No Brasil a Superintendência de Seguros Privados - SUSEP adotou o risco de mercado, subscrição, crédito e
operacional, este último inclui o risco legal. Já na ANS, a única diferença é que ela estratificou o risco
operacional em operacional e legal, o que julgamos correto, visto que o último deve ser de extrema relevância
uma vez que a regulamentação de saúde suplementar é recente e passível de diversas modificações.
Assim o risco, para os modelos internos da ANS ficou subdividido da seguinte forma:
Figura 1
Fonte: O Capital Baseado em Risco – Tese Mestrado Renata Gasparello
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De forma geral, os mercados seguem um modo operacional similar de acordo com sua cultura, assim a
diversificação dos riscos apontada acima, ocorre em função das peculiaridades de cada mercado e/ou país.
Contudo, esta similaridade não ocorre no mercado de saúde suplementar brasileiro.
De acordo com a RN nº 209/2009, a ANS identificou 19 segmentos distintos cada um com seu modo operacional
e, portanto apresentando diferente exposição aos riscos. Assim, é provável que os 5 riscos estabelecidos pela
ANS, para o modelo que substitui a margem de solvência, sejam insuficientes para apreciar todas peculiaridades
de cada OPS/SES.
Como exemplo, ressaltamos as OPS que possuem rede própria. O risco do “negócio hospital” deveria também
ser mensurado e considerado entre os riscos do modelo.
Isto posto, entendemos que seguindo somente os riscos obrigatórios da ANS é possível calcular um modelo
interno, mas jamais um modelo próprio, visto que este não apreciará todas as possíveis exposições inerentes a
uma OPS/SES.
Então, para possuir um modelo realmente próprio, cada OPS/SES deverá fazer uma análise taxonômica para
identificar os riscos que ela está exposta. Este procedimento está previsto como opcional na IN DIOPE
n.14/2007.
Outro grande problema que a ANS enfrentará ao analisar estes modelos vem da própria definição de margem.
Sabemos que a margem de solvência é o recurso suplementar as provisões necessárias. Quando falamos em
provisões necessárias não significa que estamos nos reportando às provisões regulamentadas, mas sim às
provisões tecnicamente necessárias em função do risco assumido.
Todos os materiais e artigos dos atuários brasileiros referentes à margem de solvência no mercado de saúde
foram unânimes em apontar um déficit em relação à Provisão de Insuficiência de Prêmios/Contraprestações
(PIP) e Provisão de Benefícios a Conceder, no caso da garantia de remissão, pois estas provisões são antigas
conhecidas no mercado de seguros e a falta delas salta aos olhos dos nossos atuários.
Nos permitimos aqui sermos mais técnicos e dissertar sobre algumas premissas atuariais. Na atuária é permitido
o uso de 3 regimes financeiros de acordo com o beneficio a ser percebido: Capitalização, Repartição de Capitais
de Cobertura (RCC) e Repartição Simples.
Quadro 1: Tipos de Regimes Financeiros de acordo com o benefício
REPARTIÇÃO
SIMPLES
RCC
CAPITALIZAÇÃO
Morte
SIM
NÃO
SIM
Invalidez
SIM
NÃO
SIM
Aposentadoria
NÃO
NÃO
SIM
Morte Titular
NÃO
SIM
SIM
Invalidez
NÃO
SIM
SIM
BENEFÍCIOS
Pecúlio
Renda
Fonte: FAQ - SUSEP
Quanto as provisões ligadas ao tipo de regime teremos as provisões matemáticas que são em duas: provisão de
benefícios a conceder e provisão de benefícios concedidos.
Estas provisões são nulas quando o regime financeiro escolhido pelo atuário é o de repartição simples. Isto
porque não há formação de fundos para assegurar o pagamento de benefícios já concedidos ou aqueles ainda a
conceder.
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No caso de adoção do regime financeiro de repartição de capitais de cobertura, não há provisão para os
benefícios a conceder, contudo é exigida a constituição de provisão matemática de benefícios concedidos na
data da concessão do benefício.
Nos planos baseados no regime de capitalização, ambas as provisões devem ser constituídas visto que há lastro
nos fundos antes e após o fato gerador do benefício.
Para facilitar entendimento disponibilizamos quadro resumo da constituição das provisões matemáticas em
relação ao regime escolhido pelo atuário:
Quadro 2: Tipos de provisão matemáticas de acordo com o tipo de regime financeiro
RCC
CAPITALIZAÇÃO
Benefícios a Conceder
REPARTIÇÃO
SIMPLES
NÃO
NÃO
SIM
Benefícios Concedidos
NÃO
SIM
SIM
Provisão Matemática
Voltemos agora a garantia de remissão. A situação da garantia de remissão nada mais é que um benefício de
renda por morte do titular. Podemos observar pelo Quadro 1, que para este benefício podemos utilizar tanto o
Regime de Capitalização ou o Regime de RCC.
Quando se é utilizado o Regime de Capitalização demanda-se a constituição da provisão de benefícios a
conceder (Quadro 2). Contudo, esta provisão tem uma característica singular, pois é de propriedade do usuário.
Então, caso o usuário optasse pela troca de plano esta provisão deveria acompanhá-lo, tal como as carências na
portabilidade ou caso o usuário desistisse do plano haveria a possibilidade de resgate.
Como o mercado de saúde suplementar ainda não chegou a tamanho requinte, nós da Milliman optamos por
basear nossas Notas Técnicas de Remissão no Regime de Repartição por Capitais de Cobertura, que também é
permitido para este benefício e isenta a OPS deste tipo de provisão, conforme Quadro 2.
Então, podemos concluir que das duas provisões apontadas pelos atuários brasileiros como necessárias apenas
a PIP é devida, desde que usado o RCC para o beneficio de remissão? A resposta é não.
A saúde suplementar demanda outros tipos de provisões desconhecidas na área de seguros e muitas delas
sequer têm uma tradução oficial para português, Citamos:
1. Provisão de Vida Ativa - A combinação da Provisão de Contrato e provisão de Prêmios/Contraprestação
Não Ganhas (PPCNG).
2. Provisão de Contratos - A provisão de contratos é estabelecida quando uma parte do
prêmio/contraprestação coletado no início de duração de um contrato é intencionalmente projetado para
ajudar a pagar os custos de sinistros previstos mais elevados em períodos posteriores.
3. Provisão de Regulação de Sinistros/Eventos - Esta provisão nada mais é que uma PEONA das
despesas administrativas associadas a eventos/sinistros que ainda não foram pagos.
4. Provisão de Responsabilidade do Provedor: Especifico de planos de saúde que adotam sistema de
captation ou outros pacotes de serviços.
A morosidade da ANS em estabelecer todas as provisões necessárias ao setor acarretará no aumento
desnecessário do valor do modelo interno, uma vez que a margem de solvência consiste na alocação de capital,
cuja contrapartida contábil corresponde a ativos que se destina a arcar com despesas inesperadas, ou seja, tudo
que não foi provisionado, e deveria ser, também entrará nestas despesas.
Assim como as provisões, a ANS deveria cobrar a constituição de passivos aplicáveis ao mercado: Teste de
Adequação de Passivos (exigidos das Seguradoras), default, etc.
Além disso, faz-se necessário que a ANS abra amplo debate para se definir qual a probabilidade de limite de
ruína que ela espera no mercado para assim poder definir o Requerimento de Capital de Solvência (RCS) e
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assim definir também qual o Requerimento de Capital Mínimo (RCM), abaixo do qual a OPS estaria exposta a
uma intervenção.
Para melhor entendimento ilustramos com o gráfico abaixo.
Fonte: Sandström, A., 2006. Solvency: Models, Assessment and Regulation. Chapman & Hall /CRC.
A publicação da IN DIOPE nº 51/2015 demonstra que a ANS está se preparando para receber modelos internos,
mas entendemos que muito ainda há de se caminhar e se discutir neste sentido.
Saiba mais
Para maiores informações, entre em contato com algum dos profissionais da Milliman através do telefone
(21) 2210-6313 ou através do e-mail saú[email protected] ou ainda acesse www.milliman.com.br.
Autora
Daniela Mendonça
Diretora e Consultora Milliman
Revisora
Mary Van Der Heijde
Equity Principal e Consultora Milliman
Milliman
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