POLÍTICA25
SEXTA-FEIRA, 2 DE OUTUBRO DE 2015 A GAZETA
PODER JUDICIÁRIO
Estado tenta derrubar liminar
que permite drible à lei fiscal
Amages entrou com ação
para aliviar as contas do
TJES, mudando cálculo
da folha de pagamento
NATALIA DEVENS
[email protected]
Com adespesa compessoal
alcançando 6,32% da receita corrente líquida e extrapolando o limite legal de
6% estabelecido pela Lei de
Responsabilidade Fiscal
(LRF), o Poder Judiciário
conseguiu alterar, por meio
de liminar, a forma de calcular os gastos com a folha,
enquadrando-se no limite
legal com 5,74%.
Mas a mudança pode
não produzir resultados
efetivos, pois um dia após
a decisão judicial, a Procuradoria Geral do Estado
(PGE) anunciou que irá
recorrer. Em nota, o governodoEstadodissequetem
“trabalhado pela reorganização das contas públicas e respeito à LRF”, o que
embasa o recurso.
O imbróglio começou na
última terça-feira, quando a
Associação dos Magistrados
do Espírito Santo (Amages)
ingressou com ação na 3ª
FERNANDO MADEIRA
CONFIANTE
“O governador vai
fazer tudo que puder
pelo Judiciário, já
demonstrou sua boa
vontade. Não vai nos
deixar no abandono”
SÉRGIO BIZZOTTO
PRESIDENTE DO TJES
dos do país já há entendimento de que o Imposto
de Renda não deve ser somado aos gastos com folha de pagamento, mas
admite que esta não é uma
questão pacificada. Contudo, o magistrado não
considera a liminar como
um drible à LRF.
Vara da Fazenda Pública de
Vitória requerendo que o
Imposto de Renda retido na
fonte dos servidores públicos não seja considerado no
cálculo do limite de despesa
com pessoal do TJ.
Assim, o valor da despe-
sacompessoalcontabilizado teria R$ 101 milhões a
menos. A juíza Paula Mazzei acolheu os argumentos
da Amages, o processo foi
despachado e decidido
ainda no mesmo dia. A liminarsuspendeuosefeitos
deumadecisãoplenáriade
2011 do Tribunal de Con-
tas Estadual (TCES) que
trata do assunto.
O presidente da Amages, Ezequiel Turíbio, destacou que em quatro Esta-
ARGUMENTO
“Até 2011 era assim, depois o TCES mudou o entendimento. Quem paga o
Imposto de Renda à União
é o servidor, não o Estado.
A liminar não traz nenhum centavo novo para
os cofres do Judiciário, e
não sai nenhum centavo a
mais do Estado. É simplesmente uma operação contábil”, defende.
Após a sessão do Pleno
deontem–e,portanto,antes do recurso da PGE –, o
presidente do TJES, Sérgio Bizzotto reconheceu
que a medida foi a única
forma de não extrapolar
os limites legais: “A LRF estabelece índices irreais para a gente cumprir com o
funcionalismo público”,
argumentou.
dimento do Tribunal de
Contas do Estado, em
2011, de computar o Imposto de Renda na formação do cálculo de gasto com pessoal da LRF,
deveria ser invalidado.
Essa alteração não
desmoraliza a LRF?
Os Tribunais de Contas
de quatro Estados já têm
esse entendimento, assim como o tinha o
TCES até 2011. Depois
ele mudou. Qual deles
está certo? É uma questão controvertida, que só
será pacificada pelo STF,
onde já há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre o assunto.
Qual é o entendimento
da Amages?
Da forma como é hoje, é
como se o Estado tivesse
duas receitas. Pagasse o
salário do servidor e
também o seu Imposto
de Renda. O que não é
verdade, pois quem paga é o servidor. É uma
operação contábil, como
se a mesma despesa fosse lançada duas vezes.
Contabilmente até se
justifica, mas não deveriam levar em consideração para formar o índice da LRF. Vale lem-
brar que isso não traz
nenhum centavo novo
para os cofres do poder
Judiciário, e não sai nenhum centavo a mais
dos cofres do Estado.
Esta foi a única
forma encontrada
para que o
Judiciário não
extrapolasse o
limite?
Estudamos essa possibi-
lidade desde junho. Primeiro, esperamos para
ver quais efeitos os cortes de gastos surtiriam.
Como não foi suficiente,
ingressamos com a ação.
Se o TJES descumprir a
LRF, uma das sanções é
cortar pessoal. Dessa forma, 52 juízes que ainda
não são estáveis, cumprem estágio probatório,
estarão ameaçados.
RECURSO
“O trabalho do
governo é de
reorganização das
contas públicas e de
respeito à LRF”
PROCURADORIA
GERAL DO ESTADO,
POR MEIO DE NOTA
Desembargador Sérgio Bizzotto avalia que não houve afronta à legislação
ENTREVISTA
“ESTÁ HAVENDO
UMA CONTAGEM
DUAS VEZES”
Ezequiel Turíbio
Presidente da Amages
O presidente da Associação dos Magistrados,
Ezequiel Turíbio, defende que o último enten-
Especialista diz que liminar é preocupante
A manobra autorizada
para retirar o Imposto de
Renda dos servidores do
Judiciário capixaba do
cálculo de despesas com
pessoal é duramente criticada pelo especialista em
finançaspúblicasJoséMatias-Pereira, professor de
Administração da Universidade de Brasília (UnB).
“Não conheço o mérito
da decisão liminar, mas,
por onde passa um boi,
passa uma boiada. A deci-
são não é adequada para o
ajuste de despesas e colabora para o descontrole
das contas públicas no Estado de vocês”, salienta.
Para o professor, a manobra com gastos de pessoal
paraficar,oficialmente,dentro dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) é
umpaliativoparaocontexto
de crise, mas abre brechas
para que outros Poderes
usem o mesmo artifício.
“Se um dos Poderes faz
isso, em breve outros vão
copiá-lo. E se concede para um, vai ser estendido
aos demais, até pela própria questão da isonomia”, acrescenta.
RECURSO
Segundo avalia Matias-Pereira,umrecursofeito pela Procuradoria Geral
do Estado serve para que a
prática não prospere e não
desorganize as contas de
órgãos públicos que ve-
nham a se achar na mesma
situação de arrocho orçamentário, como é o caso do
Tribunal deJustiça do Estado (TJES) atualmente.
“Qualquer medida que
afronte a LRF é muito preocupante. É bom lembrar
que abre uma porteira e colocaemriscoagestãocomo
umtodo.Esperoqueoutras
instituições não caminhem
para essa estratégia”, observaoespecialistadaUnB.
(Rondinelli Tomazelli)
DAIANE SOUZA/UNB AGÊNCIA
José Matias-Pereira: liminar cria mau exemplo
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Estado tenta derrubar liminar que permite drible à lei fiscal