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PODER JUDICIÁRIO
IÇA
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ST
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L DE JU
NA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RS
JLD
Nº 70046045548
2011/CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE GUARDA.
GUARDA PROVISÓRIA DE MENOR. INTERESSE
DA CRIANÇA. Em se tratando de pedido de guarda
provisória de menor é necessário atender,
primordialmente,
ao
interesse
da
criança.
Considerando que o menor apresenta sinais do quadro
de depressão, prudente mantê-lo sob os cuidados dos
agravantes, situação fática já consolidada no tempo e
cuja mudança poderá acarretar danos à higidez da
criança.
Agravo de instrumento provido, de plano.
AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº 70046045548
SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
COMARCA DE PASSO FUNDO
A.J.H.
..
A.C.H.
..
L.S.S.
..
AGRAVANTE
AGRAVANTE
AGRAVADO
DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.
1. A. J. H. e A. C. H. agravam de instrumento da decisão (por
cópia à fl. 106) que, na ação de guarda ajuizada contra L. S. S., indeferiu o
pedido de guarda provisória do menor A., mantendo-o acolhido.
Em razões, os agravantes alegam que o menor permaneceu
por mais de um ano e seis meses sob a sua guarda, uma vez que foi
entregue de forma espontânea pela mãe, logo após o seu nascimento.
Informam que a mãe biológica do menor é dependente química e tem mais
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quatro filhos, manifestando seu interesse em que a criança permaneça com
os agravantes. Alegam que o Conselho Tutelar retirou o menor da sua
guarda, transferindo-o a uma instituição de acolhimento, razão pela qual
ajuizaram a presente ação, requerendo a guarda provisória do menino.
Contudo, o juízo a quo entendeu de apreciar o pedido após a realização do
estudo psicossocial dos agravantes. Sustentam que o laudo psicológico
realizado com a criança e a informação da psicóloga judiciária sugerem que
o convívio entre os agravantes e o infante seja restabelecido, registrando
que ele, inclusive, apresenta quadro de depressão anaclítica. Pedem o
provimento do recurso, a fim de que seja deferida, em sede de antecipação
de tutela, a guarda provisória do menor (fls. 02-31).
Deferi a tutela antecipada (fls. 144/145).
Não foram apresentadas contrarrazões (fl. 149).
O Ministério Público opinou pelo provimento do recurso (fls.
150-153).
É o relatório.
2.
Manifesta
a
procedência
deste
recurso,
consoante
jurisprudência desta Corte, o que permite o julgamento singular, nos termos
do art. 557, § 1º-A, CPC.
A questão foi bem enfrentada pela digna agente do Ministério
Público, Doutora Marcia Leal Zanotto Farina, motivo pelo qual acolho e
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agrego suas ponderações como razão de decidir, exaradas nos seguintes
termos:
Merece provimento a inconformidade recursal.
Os agravantes ajuizaram Ação de Guarda, no
dia 24/10/2011, postulando a guarda provisória de A.,
filho biológico de L. (fls. 34/39).
Antes de analisar a antecipação de tutela
postulada, o Juízo a quo determinou fosse realizada
avaliação psicossocial dos agravantes, bem assim
avaliação psicológica do menor, que se encontra
abrigado (fls. 93/94).
Os recorrentes peticionaram ao Juízo de
origem, requerendo, então, fosse determinado o
retorno da criança ao convívio do casal até o término
do estudo social (fls. 101/104).
Em seguida, foi proferida a decisão agravada,
que possui o seguinte teor (fl. 106/106v):
“[...] Indefiro os pedidos formulados pela parte autora
nas fls. 67/70, uma vez que mantenho a decisão das
fls. 59/60, pelas razões lá expostas. A avaliação
determinada é a psicossocial, que é realizada
conjuntamente com a Assistente Social e Psicóloga,
na residência dos autores.
Outrossim, consigno que este Juízo analisará a guarda
provisória da criança após a elaboração dos laudos,
inclusive da avaliação psicológica do infante, bem
como do parecer do Ministério Público. [...]”
A irresignação é referente ao indeferimento da
guarda provisória de A. ao casal agravante.
É de ser reformada a r. decisão.
Observa-se que, quando deferida a liminar
neste recurso, já havia sido realizado o estudo com o
menor, de forma que todos elementos do autos
apontam para o deferimento da guarda provisória
nesta oportunidade processual, confirmando-se a
decisão do eminente Relator, Des. Jorge Luis Dall’
Agnol.
A., nascido em 13/05/2010 (certidão de
nascimento, fl. 46), conta 01 ano de idade.
De acordo com informação da exordial (fls.
34/35), declaração da fl. 48, termo de declarações das
fls. 86/87, laudo psicológico das fls. 110/113 e termo
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de audiência da fl. 123, o menor está sob a guarda
fática do casal desde o nascimento.
A. esteve acolhido na Casa Roberto Pirovano
Zanatta, desde 24/10/2011, consoante informação das
fls. 110/111.
A lista de adoção, prevista no Estatuto da
Criança e do Adolescente, foi criada para proteção dos
menores, objetivando evitar a colocação de crianças
em famílias que não estejam preparadas para recebêlas, evitando situações de risco.
Todavia, em atenção ao prioritário interesse do
menor, a lista não é absoluta.
A propósito, já decidiu este Tribunal:
APELAÇÃO CÍVEL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE. ADOÇÃO E GUARDA PROVISÓRIA.
ADOÇÃO
INTUITO
PERSONAE.
AUSÊNCIA
DE
PREVISÃO LEGAL. ADMISSÃO, NO CASO CONCRETO,
ANTE A EXCEPCIONALIDADE DA SITUAÇÃO FÁTICA.
GUARDA PROVISÓRIA PREJUDICADA. Tendo a mãe da
menor entregue a sua filha em adoção a um casal, não é de
se desconsiderar tal vontade apenas em razão da existência
de uma listagem de casais habilitados para adoção, uma
vez que a lista serve para organizar a ordem de preferência
na adoção de crianças e adolescentes, e segue a ordem de
antigüidade, não podendo, ao fim e ao cabo, ter maior
importância que o ato da adoção em si, ainda que se
reconheça que, em nosso ordenamento jurídico, não há
previsão para a adoção intuito personae. Outrossim, os
apelantes são pessoas já habilitadas para adoção e
encontram-se na lista. Ademais, uma vez verificado o sólido
estabelecimento de laços afetivos entre as partes
envolvidas na relação familiar, e tendo em conta que o
Estatuto da Criança e do Adolescente estrutura-se de
maneira a que sempre se priorize a melhor situação para o
menor, o deferimento do pedido de adoção do menor é
medida que se impõe. Recurso provido. (Apelação Cível Nº
70015033319, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em
16/08/2006)
In casu, o laudo psicológico das fls. 110/113
refere
literatura
científica
que
aponta
as
consequências decorrentes do afastamento do menor
das figuras parentais.
“Na literatura científica, autores como Bowlby
1
(1990) e Spitz (1991)2, que se detiveram no estudo do
1
John Bolwby, psicanalista, descreveu a importância das primeiras relações para o
desenvolvimento infantil, formulando a teoria do apego.
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desenvolvimento
infantil,
descreveram
as
manifestações infantis decorrentes da separação e da
privação das figuras parentais que exerciam os
cuidados necessários para a manutenção da vida da
criança.
Bowlby (1990) enfatiza que esta separação
pode causar sérios prejuízos ao desenvolvimento
infantil, principalmente, quando ocorrer antes dos três
anos de idade, tendo em vista que desde os seis
meses de vida o apego entre a criança e os
pais/cuidadores já é evidente. O autor entende que a
privação emocional decorrente da ruptura do vínculo
mantido com as figuras de apego aporta, ao psiquismo
em formação, a sensação de descontinuidade de sua
existência. Neste sentido, a saúde psíquica da criança
depende da estabilidade dos vínculos afetivos
estabelecidos com seus cuidadores.
Aponta Spitz (1991), que a criança que contou
com experiências iniciais positivas, quando privada do
convívio com os cuidadores, apresenta num primeiro
momento
um
comportamento
de
protesto,
reivindicando pela falta deste vínculo. Porém, na
medida em que o período de separação transcorre, a
criança torna-se apática e pode inclusive desenvolver
um quadro de depressão anaclítica, o que
compromete seriamente o seu desenvolvimento
emocional.
[...]
A depressão anaclítica, segundo Spitz (1991),
é um quadro que evidencia o quanto a privação afetiva
pode comprometer o desenvolvimento na primeira
infância, sendo o quadro mais precoce e mais grave
de depressão infantil, cuja etiologia é de caráter
relacional, sendo desencadeada pela ruptura da
relação com os cuidadores, principalmente a mãe.
Esta ruptura significa a perda do bem-estar físico e
emocional da criança, quando antes da separação ela
mantinha bom vínculo de apego com os cuidadores,
pois se observa que as crianças que tem história de
negligência e maus-tratos não apresentam este
quadro de depressão.”
A informação da fl. 121, prestada pela
psicóloga judiciária que elaborou o laudo, aponta que
2
René Spitz, psicanalista, dedicou-se ao estudo e às pesquisas relativas aos vínculos
estabelecidos entre a criança e seus pais ou cuidadores. Descreveu o resultado da ausência
dos pais e do afeto como fator determinante da psicopatologia infantil.
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A. está apresentando sinais do quadro de depressão
anaclítica, explanada no laudo supracitado.
Ademais, o mesmo parecer relata que o menor
estava sendo bem cuidado pelos agravantes (fl. 111),
não havendo motivos para que seja indeferido o
pedido de guarda provisória.
Registre-se, por fim, que a genitora biológica
do infante foi ouvida em Juízo, ocasião em que
afirmou não possuir condições de assumir o filho, pois
possui outros quatro filhos em relação aos quais
depende do auxílio de sua mãe. Declarou, ainda, ser
usuária de crack (fl. 123).
Assim é de se manter a medida liminar deferida
em sede recursal, procedendo-se a integralidade da
prova, a fim de se averiguar se há genuíno interesse
dos recorrentes na proteção do menor.
Ademais, a jurisprudência é uníssona no sentido de que a
guarda deve atender, essencialmente, ao interesse da criança, devendo
permanecer o status quo quando não há motivos para alteração, in verbis:
GUARDA DE MENOR. ALTERAÇÃO. INTERESSE DA
GENITORA. DESCABIMENTO. MELHOR INTERESSE DA
CRIANÇA. 1. A alteração de guarda reclama a máxima
cautela por ser fato em si mesmo traumático, somente se
justificando quando provada situação de risco atual ou
iminente, o que não ocorre na espécie. 2. Deve sempre
prevalecer o interesse da infante acima de todos os demais,
sendo que, no caso em tela, os elementos de convicção são
eloqüentes em apontar a conveniência da guarda pela
recorrida, que sempre a atendeu em todas as suas
necessidades. Recurso desprovido. (Apelação Cível n.
70030281356, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves,
julgado em 16/12/2009).
ALTERAÇÃO DE GUARDA. DISPUTA ENTRE OS PAIS DA
CRIANÇA. 1. As alterações de guarda devem ser evitadas
tanto quanto possível, pois em regra, são prejudiciais à
criança, que tem modificada a sua rotina de vida e os seus
referenciais, gerando-lhe transtornos de ordem emocional.
2. O principal interesse a ser protegido é o da criança. 3. Se
a infante sempre morou com a sua genitora, que sempre
atendeu satisfatoriamente suas necessidades, não há razão
para alterar a guarda da menor, mesmo demonstrando
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intenso afeto pelo pai. 4. Definida a guarda em favor da
mãe, é cabível estabelecer a regulamentação de visitas do
pai, pois materializa o direito do filho de conviver com o
genitor não-guardião, assegurando o desenvolvimento de
um vínculo afetivo saudável entre ambos. Recurso
desprovido. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível n.
70030016281, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves,
julgado em 25/11/2009).
Portanto, relativamente ao mérito do presente recurso,
manifesta sua procedência, o que impõe o seu acolhimento de logo, na
esteira dos precedentes referidos, admitindo julgamento singular com base
no art. 557, § 1º-A, CPC, até para evitar desdobramentos desnecessários e
que só protrairiam o desfecho, já sabido, do recurso.
Nestes termos, dou provimento, de plano, ao agravo de
instrumento, forte no art. 557, § 1º-A, do CPC, para o efeito de manter o
menor sob os cuidados dos agravantes, a fim de evitar insegurança e
instabilidade emocional na vida da criança.
Intime-se.
Porto Alegre, 20 de janeiro de 2012.
DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL,
Relator.
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