ACAFE 2013
I. A Hora da Estrela - Clarice Lispector
Estrutura da obra
É uma obra composta de três histórias que se entrelaçam e que são marcadas,
principalmente, por duas características fundamentais da produção da autora:
originalidade de estilo e profundidade psicológica no enfoque de temas aparentemente
comuns.
A linguagem narrativa de Clarice é, às vezes, intensamente lírica, apresentando
muitas metáforas e outras figuras de estilo. Há, por exemplo, alguns paradoxos e
comparações insólitas, que realmente surpreendem o leitor. E também é peculiaridade
da autora a construção de frases inconclusas e outros desvios da sintaxe
convencional, além da criação de alguns neologismos.
Foco narrativo
Quanto à linguagem, o livro a apresenta fartamente, em todos os momentos em que o
narrador discute a palavra e o fazer narrativo. Interessante notar que, antes de iniciar a
narrativa e logo após a 'Dedicatória do autor', aparecem os treze títulos que teriam
sido cogitados para o livro.
O recurso usado por Clarice Lispector é o narrador-personagem, pois conforme nos
faz conhecer a protagonista, também nos faz conhecê-lo. Ele escreve para se
compreender. É um marginalizado conforme lemos: "Escrevo por não ter nada a fazer
no mundo: sobrei e não há lugar pra mim na terra dos homens". Quanto à sua relação
com Macabéa, ele declara amá-la e compreendê-la, embora faça contínuas
interrogações sobre ela e embora pareça apenas acompanhando a trajetória dela, sem
saber exatamente o que lhe vai acontecer e torcendo para que não lhe aconteça o
pior.
Macabéa, a protagonista, é uma invenção do narrador com a qual se identifica e com
ela morre. A personagem é criada de forma onisciente (tudo sabe) e onipresente (tudo
pode). Faz da vida dela um aprendizado da morte. A morte foi a hora de estrela.
O enredo de A hora da Estrela não segue uma ordem linear: há flashbacks iluminando
o passado, há idas e vindas do passado para o presente e vice-versa.
Além da alinearidade, há pelo menos três histórias encaixadas que se revezam diante
dos nossos olhos de leitor:
1. A metanarrativa - Rodrigo S. M. conta a história de Macabéa: Esta é a narrativa
central da obra: o escritor Rodrigo S.M. conta a história de Macabéa, uma nordestina
que ele viu, de relance, na rua.
2. A identificação da história do narrador com a da personagem - Rodrigo S.M. conta a
história dele mesmo: esta narrativa dá-se sob a forma do encaixe, paralela à história
de Macabéa. Está presente por toda a narrativa sob a forma de comentários e
desvendamentos do narrador que se mostra, se oculta e se exibe diante dos nossos
olhos. Se por um lado, ele vê a jovem como alguém que merece amor, piedade e até
um pouco de raiva, por sua patética alienação, por outro lado, ele estabelece com ela
um vínculo mais profundo, que é o da comum condição humana. Esta identidade, que
ultrapassa as questões de classe, de gênero e de consciência de mundo, é um
elemento de grande significação no romance, Rodrigo e Macabéa se confundem.
3. A vida de Macabéa - O narrador conta como tece a narrativa.
Narrador e protagonista, inseridos em uma escrita descontínua e imprevisível,
permitem ao leitor a reflexão sobre uma época de transição, de incoerência, como um
movimento em busca de uma nova estruturação da obra literária similar à insegurança,
à ansiedade e ao sofrimento. O tema é oferecido, socializando a possibilidade de
ruptura.
O narrador revela seu amor pela personagem principal e sofre com a sua
desumanização, mas, também, com a própria tendência em tornar-se insensível.
O foco narrativo escolhido é a primeira pessoa. O narrador lança mão, como recurso,
das digressões, o que parece dar à narrativa um caráter fragmentado. Não se
engane: ele foge para o passado a fim de buscar informações.
Espaço / Tempo
O Rio de Janeiro é o espaço. Ocorre que o espaço físico, externo, não importa muito
nesta história. O "lado de dentro"das criaturas é o que interessa aos intimistas.
Pelos indícios que o narrador nos oferece, o tempo é época em que Marylin Monroe já
havia morrido - possivelmente a década de 60 em seu fim ou a de 70 em seus
começos - mas faz ainda um grande sucesso como mito que povoa a cabeça e os
sonhos de Macabéa.
Personagens
Macabéa: Alagoana, 19 anos e foi criada por uma tia beata que batia nela (sobre a
cabeça, com força); completamente inconsciente, raramente percebe o que há à sua
volta. A principal característica de Macabéa é a sua completa alienação. Ela não sabe
nada de nada. Feia, mora numa pensão em companhia de 3 moças que são
balconistas nas Lojas Americanas (Maria da Penha, Maria da Graça e Maria José).
Macabéa recebe o apelido de Maca e é a protagonista da história. Possivelmente o
nome Macabéa seja uma alusão aos macabeus bíblicos, sete ao todo, teimosos,
criaturas destemidas demais no enfrentamento do mundo; a alusão, no entanto, faz-se
pelo lado do avesso, pois Macabéa é o inverso deles.
Olímpico: Olímpico se apresentava como Olímpico de Jesus Moreira Chaves.
Trabalhava numa metalúrgica e não se classificava como "operário": era um
"metalúrgico". Ambicioso, orgulhoso e matara um homem antes de migrar da Paraíba.
Queria ser muito rico, um dia; e um dia queria também ser deputado. Um secreto
desejo era ser toureiro, gostava de ver sangue.
Rodrigo S. M.: Narrador-personagem da história. Ele tem domínio absoluto sobre o
que escreve. Inclusive sobre a morte de Macabéa, no final.
Glória: Filha de um açougueiro, nascida e criada no Rio de Janeiro, Glória rouba
Olímpico de Macabéa. Tem um quê de selvagem, cheia de corpo, é esperta, atenta ao
mundo.
Madame Carlota: É a mulher de Olaria que porá as cartas do baralho para "ler a
sorte"de Macabéa. Contará que foi prostituta quando jovem, que depois montou uma
casa de mulheres e ganhou muito dinheiro com isso. Come bombons, diz que é fã de
Jesus Cristo e impressiona Macabéa. Na verdade, Madame Carlota é uma
enganadora vulgar.
Outras personagens: As três Marias que moram com Macabéa no mesmo quarto, o
médico que a atende e diagnostica a gravidade da tuberculose e o chefe, seu
Raimundo, que reluta em mandá-la embora.
Enredo
Macabéa (Maca) foi criada por uma tia beata, após a morte dos pais quando tinha dois
anos de idade. Acumula em seu corpo franzino a herança do sertão, ou seja, todas as
formas de repressão cultural, o que a deixa alheia de si e da sociedade. Segundo o
narrador, ela nunca se deu conta de que vivia numa sociedade técnica onde ela era
um parafuso dispensável.
Ignorava até mesmo porque se deslocara de Alagoas até o Rio de Janeiro, onde
passou a viver com mais quatro colegas na Rua do Acre. Macabéa trabalha como
datilógrafa numa firma de representantes de roldanas, que fica na Rua do Lavradio.
Tem por hábito ouvir a Rádio Relógio, especializada em dizer as horas e divulgar
anúncios, talvez identificando com o apresentador a escassez de linguagem que a
converte num ser totalmente inverossímil no mundo em que procura sobreviver. Tinha
como alvo de admiração a atriz norte-americana Marilyn Monroe, o símbolo social
inculcado pelas superproduções de Hollywood na década de 1950.
Macabéa recebe de seu chefe, Raimundo Silveira, por quem ela estava secretamente
apaixonada, o aviso de que será despedida por incompetência. Como Macabéa aceita
o fato com enorme humildade, o chefe se compadece e resolve não despedi-la
imediatamente.
Seu namorado, Olímpico de Jesus, era nordestino também. Por não ter nada que
ajudasse Olímpico a progredir, ela o perde para Glória, que possuía atrativos materiais
que ele ambicionava.
Glória, com certo sentimento de culpa por ter roubado o namorado da colega, sugere a
Macabéa que vá a uma cartomante, sua conhecida. Para isso, empresta-lhe dinheiro e
diz-lhe que a mulher, Madame Carlota, era tão boa, que poderia até indicar-lhe o jeito
de arranjar outro namorado. Macabéa vai, então, à cartomante, que, primeiro, lhe faz
confidências sobre seu passado de prostituta; depois, após constatar que a nordestina
era muito infeliz, prediz-lhe um futuro maravilhoso, já que ela deveria casar-se com um
belo homem loiro e rico - Hans - que lhe daria muito luxo e amor.
Macabéa sai da casa de Madame Carlota 'grávida de futuro', encantada com a
felicidade que a cartomante lhe garantira e que ela já começava a sentir. Então, logo
ao descer a calçada para atravessar a rua, é atropelada por um luxuoso Mercedes
Benz amarelo. Esta é a hora da estrela de cinema, onde ela vai ser "tão grande como
um cavalo morto".
Ao ser atropelada, Macabéa descobre a sua essência: “Hoje, pensou ela, hoje é o
primeiro dia de minha vida: nasci”. Há uma situação paradoxal: ela só nasce, ou seja,
só chega a ter consciência de si mesma, na hora de sua morte. Por isso antes de
morrer repete sem cessar: “Eu sou, eu sou, eu sou, eu sou”.
Por ter definido a sua existência é que Macabéa pronuncia uma frase que nenhum dos
transeuntes entende: “Quanto ao futuro.” (...) “Nesta hora exata Macabéa sente um
fundo enjôo de estômago e quase vomitou, queria vomitar o que não é corpo, vomitar
algo luminoso. Estrela de mil pontas.”
Com ela morre também o narrador, identificado com a escrita do romance que se
acaba.
II. Amar, verbo intransitivo, de Mário de Andrade
Publicado em 1927, Amar, Verbo Intransitivo, de Mário de Andrade, chama a atenção
por inúmeros aspectos. O primeiro é a sua linguagem, provavelmente considerada
“errada” na época, pois se afasta do português castiço ao imitar (às vezes de forma
eficiente, às vezes não) o padrão coloquial brasileiro. É como se o texto escrito
imitasse a maneira de falar do nosso povo. É um livro para se fazer de conta que se
está ouvindo e, não, lendo.
Há numerosas características em Amar, Verbo Intransitivo que o enquadram como
modernista. Um romance modernista da primeira frase (1922 – 1930), impregnado de
um espírito de destruição até ao exagero. O espírito da “Semana de Arte Moderna”:
destruir para construir tudo de novo. A mola real de toda a obra do autor é a pesquisa,
a busca.
O romance apresenta no próprio título uma contradição gritante, afinal, o verbo "amar"
é transitivo direto e não intransitivo. Se isto já não bastasse, ainda recebe uma curiosa
classificação: é apresentado na capa como Idílio. A perplexidade é inevitável, uma vez
que idílio implica numa forma singela de amor em que não pairam dúvidas quanto à
reciprocidade entre dois sujeitos.
Outro aspecto interessante é o constante emprego das digressões, boa parte delas
metalinguísticas, outra parte sociológicas, que fazem lembrar o estilo machadiano.
Mais uma vez, a obra apresenta elementos formais que a colocam à frente de seu
tempo, caracterizando-a, portanto, como moderna.
Dentro do aspecto sociológico, há que se entender uma posição meio ambígua de
Mário de Andrade, como se ele mostrasse uma “paixão crítica” por seu povo,
principalmente o paulistano. Note-se que critica valores brasileiros, ao mesmo tempo
que diz que é a nossa forma de comportamento, deixando subentendido um certo ar
de “não tem jeito”, “somos assim mesmo”. Além disso, ao mesmo tempo em que
elogia o estrangeiro, principalmente a força dos alemães, desmerece-os ao mostrá-los
como extremamente metódicos, ineptos para o calor latino. Sem mencionar que
reconhece que o imigrante está sendo como que simpaticamente absorvido por nossa
cultura.
Mas o que mais chama a atenção é a utilização da teoria freudiana (grande paixão do
autor) como embasamento da trama.
O inusitado da profissão de Fräulein pode parecer inverossímil numa visão separada
da totalidade socioeconômica e histórica (como também seu sonho de retornar à
Alemanha, “depois de feito a América, e o casamento, o vago amado distante à espera
de proteção, espécie de redenção wagneriana pelo amor.” Professora de amor,
profissão que uma “fraqueza” lhe permitiu exercer, no entanto “é uma profissão”,
insistiria Fräulein.
Foco narrativo
A narrativa é feita na terceira pessoa, por um narrador que não faz parte do romance.
É o narrador tradicional, um narrador onisciente e onipresente. Mas há ainda um outro
ponto de vista: o autor se coloca dentro do livro para fazer suas numerosas
observações marginais. Para comentar, criticar, expor ideias, concordar ou discordar...
É uma velha mania do romance tradicional. E os comentários são feitos na primeira
pessoa. Observe:
Isto não sei se é bem se é mal, mas a culpa é toda de Elza. Isto sei e afirmo...
Volto a afirmar que o meu livro tem 50 leitores. Comigo 51.
Linguagem e Estrutura
A narrativa corre sem divisões de capítulos. Mário de Andrade usa as formas
conhecidas de discurso. É mais frequente o discurso direto, nos diálogos, mas em
algumas vezes, usa também o discurso indireto e o discurso indireto livre.
A narrativa segue, de modo geral, uma linha linear: princípio, meio e fim. Começa com
a chegada de Fräulein, se estende em episódios e incidentes, acaba com a saída de
Fräulein. Quando termina o idílio, o autor escreve “Fim” e, depois, ainda narra um
pequeno episódio: um encontro de longe entre Carlos e Fräulein, num corso de
carnaval. Frequentemente a narrativa fica retardada pelos comentários marginais do
autor: algumas vezes exposição de tese.
Apesar de certos alongamentos em seus comentários marginais, o autor escreve com
rapidez, dinamicamente, em frases e palavras com jeito cinematográfico. Mário de
Andrade usa uma linguagem sincopada, cheia de elipses que obrigam o leitor a ligar e
completar os pensamentos. Em vez de dizer e de explicar tudo, apenas sugere em
frases curtas, mínimas.
A pontuação da frase é muito liberal. Conscientemente liberal. O ritmo de leitura
depende muito da capacidade de cada leitor. Abandona a pontuação quando as frases
se amontoam, acavalando-se umas sobre as outras, polifônicas, simultâneas, fugindo
das regrinhas escolares de pontos e vírgulas. É preciso lembrar que Mário de Andrade
é sempre um experimentador em busca de soluções novas para a linguagem. Para
alcançar ou tentar suas inovações ele trabalhou suadamente: fazia e refazia suas
redações em versões diferentes. Assim em Amar, Verbo Intransitivo e mais ainda
em Macunaíma. Sobre Fräulein: Agora primeiro vou deixar o livro descansar uma
semana ou mais sem pegar nele, depois principiarei a corrigir e a escrever o livro na
forma definitiva. Definitiva? Não posso garantir nada, não. Fräulein teve quatro
redações diferentes! (Carta a Manuel Bandeira, pág. 184).
Personagens
As personagens do livro são, em geral, fabricadas, artificiais, sem muita vida ou
substância humana.
Os personagens de Amar, Verbo Intransitivo são bem parecidos, e socialmente
domesticados. Para ver, praticamente, todos os personagens em ação, com certa
espontaneidade, o melhor momento é a volta de trem, depois daquela viagem ao Rio
de Janeiro. Um dos momentos narrativos mais interessantes em todo o romance. Mas
a ação principal está em Fräulein: seu domínio sexual, com imperturbável serenidade
bem alemã, contrasta com a espontaneidade sexual, com a impetuosidade bem
brasileira do excelente aluno (em sexo), Carlos.
O narrador gosta de ver os seus personagens. É um espectador pirandeliano que
acompanha suas criaturas. Que mentira, meu Deus!! Dizerem Fräulein, personagem
inventado por mim e por mim construído! Não constrói coisa nenhuma. Um dia Elza
me apareceu, era uma quarta-feira, sem que eu a procurasse.... E continua a sua
pequena teoria o personagem. São os personagens que escolhem os seus autores e
não estes que constroem as suas heroínas. Virgulam-nas apenas, pra que os homens
possam ter delas conhecimento suficiente....
Felisberto Sousa Costa - pai de Carlos. É, possivelmente um doutor em qualquer
coisa, mania muito comum e que Eça de Queiróz criticou numa saborosa carta a
Eduardo Prado: todo mundo é doutor, todo mundo tem a mania do diploma e do anel
do dedo. É o centro, não afetivo, mas administrativo da casa em que mantém, mais ou
menos, o regime patriarcal.
D. Laura - mãe de Carlos, esposa de Felisberto. Como devia, sempre obedece ao
marido. É uma senhora bem composta, acomodada, burguesa. Uma senhora da
sociedade e que mantém todas as aparências de seriedade religiosa e familiar.
Concorda com os argumentos tão convincentes... do marido, na educação do único
filho-homem.
Carlos Alberto - filho de Felisberto e D. Laura, com idade entre 15 e 16 anos. Uma
espécie de “enfant gaté” (um queridinho da família, porque único) e que, certamente,
deverá ser o principal herdeiro do nome, da fortuna e das realizações paternas. Como
era costume, possivelmente, deveria ser a projeção do pai, a sua continuação.
Centraliza a narrativa, é personagem do pequeno drama amoroso do livro, ao lado da
governanta alemã, Elza.
Elza - Fräulein (= senhorita), governanta alemã. Tão importante que ela dava nome ao
romance. Como é Fräulein? Ela é a mais humana e real, mais de carne e osso. Talvez
arrancada da vida. Ela, sem muito interesse, cuida também da educação ou instrução
das meninas: principalmente para ensinar alemão e piano. São três meninas que,
apenas, completam a família burguesa. São três meninas que brincam de casinha.
Maria Luísa - irmã de Carlos, tem 12 anos. Ela vai ser o centro de uma narrativa
dentro do romance: a sua doença e a viagem ao Rio de Janeiro, para um clima mais
saudável em oposição ao frio paulistano.
Laurita - irmã de Carlos, tem 7 anos.
Aldina - irmã caçula de Carlos. Tem 5 anos.
Enredo
A história, classificada como idílio pelo próprio autor, é sobre a iniciação sexual do
protagonista, Carlos Alberto. Seu pai, Sousa Costa, preocupado em prepará-lo para a
vida, contrata uma profissional para isso, Fräulein Elza (o grande medo de Sousa
Costa é que, se seu filho tivesse sua iniciação num prostíbulo, poderia ser explorado
pelas prostitutas ou até se tornar toxicômano por influência delas). Oficialmente, ela
entra no lar burguês de Higienópolis para ser governanta e ensinar alemão aos quatro
filhos do casal Sousa Costa, D. Laura.
Muitos aspectos são dignos de nota aqui. Em primeiro lugar, o tema é completamente
inédito em nossa literatura e deve ter sido motivo de certo escândalo em sua época.
Além disso, a iniciação sexual tranqüila e segura é vista como garantia para uma vida
madura e até para o estabelecimento de um lar sagrado. Em suma, sexo é a base de
tudo. Freud, portanto, mostra-se marcante.
Pode-se afirmar que a intenção do chefe da família é fadada ao fracasso, pois Carlos
não era virgem. Bem antes de iniciada a história, ele havia tido sua experiência sexual
no Ipiranga, em meio à farra de seus amigos, com uma prostituta. Mas fora um ato
mecânico, seco, pressionado pelos amigos. Não tinha sido, pois, uma iniciação
completa.
Interessante é que Fräulein (em alemão essa palavra significa “senhorita”, mas
também tem o valor e todo o peso do termo “professora”) realiza seu serviço com
dignidade, não enxergando relação com prostituição. Assume estar realizando uma
missão. É um elemento que destoa do olhar de Sousa Costa e até do próprio narrador.
Além disso, esse disfarce, meio que hipócrita, de Fräulein ser na aparência governanta
e na verdade iniciadora do amor, revela toda a complexidade em que a sexualidade
humana está mergulhada (as teorias freudianas). Há aqui todo um jogo de querer e
esconder, negar e afirmar, que vai perpassar a relação que Elza estabelecerá naquela
casa.
Deve-se notar o comportamento de Sousa Costa. Sua atitude de contratar uma
profissional do amor para realizar os serviços debaixo do seu próprio teto revela
determinados valores da burguesia da época. Comporta-se como o novo rico que acha
que o dinheiro pode tomar posse de tudo, até da iniciação sexual. São ricos que ainda
não têm, no entender de Mário de Andrade, estrutura para merecer seu presente
status.
Nesse aspecto o autor mostra-se bastante cruel. Ficaram notórias as suas críticas à
burguesia paulistana e à sua mania de tentar ser o que não é ou esconder o que no
fundo é. Observa-se a genialidade do narrador ao descrever Sousa Costa usando
brilhantina até no bigode. Assemelha-se à esposa, que também usa produto para
alisar o cabelo. Querem esconder que são tão mestiços quanto o resto do país.
O fato é que Carlos realmente precisava ser educado. Constantemente ao brincar com
suas três irmãs mais novas acabava, sem querer, machucando-as. Há aqui toda uma
conotação freudiana, mas o que mais importa é entender que o protagonista fere
porque não sabe controlar sua força. É um desajeitado. Nesse aspecto sua iniciação
será importante, pois servirá para domar seus impulsos, sua energia, sua afetividade.
Fräulein tem plena consciência desse objetivo. Quer ensinar o amor em sua forma
tranquila, sem descontroles, sem paixões. O problema é que o garoto é aluado. Por
mais que Elza se apresente sedutora nos momentos em que os dois ficam sozinhos
na biblioteca (outra crítica é dirigida à burguesia paulistana. Os livros da biblioteca são
comprados por questão de status, muitos nem sequer sendo abertos, chegando
alguns até a estarem com as páginas coladas), estudando alemão, o garoto não
percebe as intenções dela, o que a deixa em alguns momentos irritada.
No entanto, o que chega a reforçar a tese da professora, com a convivência brota o
interesse do menino pela mestra. É algo que não se quer revelar claro de primeira.
Começa com o interesse que o garoto tem repentinamente por tudo o que se refere à
Alemanha, acelerando até o conhecimento da língua. Se antes tinha um desempenho
sofrível, agora apreende vocabulário de forma acelerada.
Revelando muito bem as características da sexualidade humana (Freud), a atração
mostra-se mergulhada num jogo de avanços e recuos, de desejos e de medos. Os
toques de Fräulein tornam-se cada vez mais constantes. A tensão torna-se máxima
quando o menino masturba-se inspirado na professora (é um episódio descrito de
forma extremamente indireta, tangencial, dificultando em muito sua percepção. É
necessário um malabarismo mental para entendê-lo. Talvez a intenção do narrador é,
além de evitar o escândalo de ser claro em aspecto tão delicado (várias vezes diz que
não quer produzir obra naturalista), mostrar como a questão está problemática na
cabeça de Carlos. Tanto é que pouco após esse episódio, há a menção a anjos
lavando com esponja santa o pecado que acabara de ser cometido. Essa noção de
prazer e pecado, de o instinto desejar algo, mas a educação e a formação religiosa
marcarem isso como condenável, é outro elemento muito analisado por Freud). Toma
consciência, portanto, de que a deseja.
Até que, pressionada pelas trapalhadas da família Sousa Costa (Sousa Costa havia
descumprido o combinado quando contratara Fräulein: deixar claro para D. Laura qual
era a função da professora. A mãe, alheia ao que estava acontecendo, estranhara o
apego do filho à mestra e vai conversar com a alemã, ingenuamente preocupada com
a possibilidade de o menino fazer besteira. Inconformada com a quebra do prometido,
Elza força uma reunião entre ela e os pais, na qual tem como intenção deixar todo o
acerto claro. O resultado é que tudo se complica. Fräulein decepciona-se com a
maneira como os “latinos” tratam aquele assunto e os pais de Carlos não sabem
exatamente o que fazer, se querem ou se não querem a governanta), torna-se mais
apelativa. O contato corporal é mais intenso, o que assusta Carlos. Medo e desejo.
Delicadamente Fräulein vence. Inicia, ainda que sensualmente, Carlos. Mas em pouco
tempo a iniciação sexual torna-se efetiva. O garoto passa a freqüentar de noite a cama
de Elza.
Os dois acabam assumindo uma cumplicidade gostosa, o que indica o
amadurecimento de Carlos. È uma situação preocupante, pois Fräulein acaba se
envolvendo. Na verdade, o que acontece é que isso acirra o conflito entre os dois
alemães que o narrador afirma que a governanta carrega dentro dela. O primeiro é
dedicado ao sonho, à fantasia. É um coitado que anda sufocado em Elza. O segundo
é o prático, que planeja, que é metódico. Esse é quem domina sua personalidade.
Carlos, no entanto, vem fortalecer o primeiro, comprometendo o segundo.
Para complicar sua situação, uma das irmãs de Carlos fica doente. A governanta
passa a cuidar dela. Tudo em sua mão funciona perfeitamente. A família Sousa Costa
cria uma enorme dependência em relação à alemã. E ela começa a se sentir a mãe de
todos. Aliás, um papel que ela assumirá no final da narrativa.
Preocupada em não perder controle da situação, decide acelerar o término de sua
tarefa. Quer que tudo termine de forma dramática, pois acredita que a lição sentida no
corpo é mais efetiva. O trauma amadurece. Acerta com Sousa Costa um flagrante.
Os amantes são surpreendidos no quarto da governanta. Dentro da armação, o pai dá
uma bronca no filho, ensinando-o a tomar cuidado, pois sempre havia o risco de
gravidez, casamento forçado e outros problemas. Fräulein, recebidos seus oito contos,
parte, mergulhando Carlos num luto monstruoso. Faz parte de seu crescimento.
Após isso, a narrativa flagra Fräulein ensinando um outro garoto da burguesia de
Higienópolis, Luís. Não sente prazer nesse serviço agora, talvez por ter em sua mente
Carlos, mas o está seduzindo, abrindo-lhe o caminho para o amor. É sua profissão.
Precisa ser prática para juntar dinheiro e voltar para a Alemanha.
É Carnaval. Em meio à folia de rua, Elza localiza Carlos. Atira-lhe uma serpentina para
chamar a sua atenção. O rapaz a vê e a cumprimenta formalmente. Parecia estar mais
ocupado em curtir a garota que lhe faz companhia.
Fräulein tem um misto de emoções. Ao mesmo tempo em que seu lado sonhador
sente-se frustrado – o rapaz, depois do tanto que ocorreu, mostrou-se frio –, sente-se
realizada ao lembrar de todos os que iniciou, os que ensinou o amar,
intransitivamente, ou seja, a amar não importa qual seja o objeto, o alvo. É como se
quisesse ensinar que o mais importante é aprender a amar intransitivamente para
depois poder amar alguém, transitivamente.
O livro tem uma estrutura incomum: não há capítulos em si, apenas espaços em
branco que separam passagens; a palavra FIM aparece após o Idílio, apenas após
isso dá-se a conclusão da história.
III. Clarissa - Érico Veríssimo
Trata-se de uma composição realista que assegura a veracidade do cenário retratado
e dos seres que nele se movimentam. O romancista não se impõe às personagens; ao
contrário, prefere ver o mundo através das personagens; e isso as faz viver como
gente de carne e osso.
O universo de Clarissa, dependendo do ângulo em que observamos, pode ser muito
limitado ou infinitamente amplo em sugestões e promessas. Na verdade, está
circunscrito no estreito território da pensão da Tia Zina e sua população pequenoburguesa consumida na luta inglória pelo ganha-pão de cada dia. Entretanto, a
presença de Clarissa amplia pouco a pouco a significação desse cenário, porque a
narrativa se organiza em torno de seu desdobramento psicológico, e o que de fato
interessa é a sua descoberta em relação aos seres e às coisas que a cercam.
Imperceptivelmente, o autor se dissimula, quase escondendo-se num segundo plano,
e deixa que a revelação do mundo observado se apresente através das surpresas,
dúvidas e curiosidades que preenchem a consciência de Clarissa. Assim, fica aberto
um caminho que permite a passagem da simples fotografia para o romance
psicológico, de maneira que o leitor já não perceba a história como coisa "armada",
sentindo-a antes como parte integrante de uma experiência vivida.
A "naturalidade" do relato guarda esse atributo indispensável à grande ficção de onde
nasce o verdadeiro mundo das personagens: a possibilidade de existir na realidade.
Este segredo do romancista é a prova da sua sensibilidade diante do assunto
extremamente complexo que escolheu - o mundo banal e opaco de todas as horas,
redescoberto através da perspectiva (meio lógica, meio fantástica) da adolescência:
"...sobre uma coluna de madeira escura, a um canto da sala rebrilha o aquário. Pirolito
está agitado. Será que a luz elétrica o assusta? Clarissa se aproxima do vaso de
cristal. Agora nota que a água parece toda cheia de rebrilhos. A janela, as lâmpadas
elétricas, os móveis da sala, tudo se reflete no aquário."
Ultrapassando o perigo, Érico Veríssimo preferiu que Clarissa, ela própria, o
conduzisse entre coisas que vão aparecendo no fluxo da descoberta. O mundo juvenil,
povoado de sonhos e fantasias, possuía uma peculiaridade inconfundível: estava todo
ele "refletido no aquário", mudando o desenho a todo momento, metade de cada coisa
revelada e a outra metade ainda interrogável na sombra. A realidade teria de ser
captada no contorno do aquário, respeitando o mistério do universo de Clarissa que só
a ela pertence. Trata-se, basicamente, de um problema de linguagem, isto é, encontrar
a linguagem que narre a consciência fantasiosa de Clarissa e, ao mesmo tempo,
preserve a sua identidade, sem se confundir com a perspectiva adulta e racional do
seu criador.
Personagens
Clarissa - adolescente que morava numa fazenda e foi estudar na cidade grande.
Ondina - a infiel, casada com Barata.
Amaro - um musico que cortejava Clarissa.
Tonico - garoto que perdera as duas pernas num acidente, era muito frágil e acaba
morrendo.
Vasco - primo de Clarissa que vive em Jacarecanga.
Linguagem
Fiel à estrutura da narrativa psicológica e à natureza da personagem, Érico Veríssimo
optou por um estilo pictórico, no qual as descrições valorizam sobremaneira a
visualidade. Tudo se oferece mediante uma infinita gama de variações cromáticas,
tonalidades e reflexos que buscam estabelecer, na órbita do cenário físico, o espelho
das filigramas psicológicas que compõem a imaginação juvenil. Daí a preferência do
romancista, neste livro, pelo adjetivo, pelas imagens que realçam a natureza e
integram uma visão caleidoscópica, iluminando o espaço circundante. Justamente sob
esse aspecto, o autor de Clarissa evidencia sua vinculação com o panorama literário
da época. Se a linguagem pictórica, o estilo cromático, tornam-se um recurso
inteligente na elaboração da personagem, não é menos verdade que já pertencia a
uma longa tradição da literatura sulina, que iria alcançar um de seus pontos altos
naqueles dias da publicação de Clarissa. Trata-se da tradição simbolista, na qual
germinaram as obras de Eduardo Guimaraens e Alceu Wamosy, cujas raízes
profundas se estendem por toda a produção literária do início do século para
alcançarem, por volta de 1930, as melhores manifestações do modernismo no Rio
Grande do Sul.
Na linguagem de Clarissa encontra-se muito dessa herança simbolista presente no
ambiente da época, os mais profundos estados de ânimo entregando-se na pura
visualidade.
O trabalho criador de Érico Veríssimo exerceu-se na reelaboração dessa vertente
estilística, transferindo uma linguagem até aí mais própria à poesia para a prosa
descritiva de Clarissa. A expressão apoiada no adjetivo e na seqüência de imagens
visuais garante o clima encantatório da narrativa, aliás o único em que poderia nascer
com verossimilhança a história de uma adolescente de quatorze anos ainda
mergulhada no deslumbramento do descobrir-se. O próprio Érico viria a considerar,
mais tarde, o seu livro como "uma coleção de aquarelas e poemetos em prosa em
torno da vida cotidiana".
No entanto, também o lado obscuro e amargo da vida ganha lugar no contexto
de Clarissa. Está refletido na personagem de Amaro, o músico frustrado, já na casa
dos quarenta anos, que contempla na vitalidade física e espiritual de Clarissa tudo
aquilo que a vida lhe negou: segurança, alegria, imaginação - o sentimento de
participar do mundo que se constrói a cada instante. Mas é tarde para voltar atrás; o
tecido do tempo passado não se recompõe; e Amaro ama Clarissa à sua maneira,
transferindo para ela a imagem da mulher que sempre idealizara e sabe que nunca
chegará a possuir. Em certa altura, essa personagem, marcada pelo curso dos dias
opacos e inglórios que lhe couberam, expressa a melancolia diante do futuro que não
está mais ao seu alcance:
"O raio de sol é de um outro mundo. Clarissa, se pudesse falar, se tu pudesses
entender. Eu te diria que nunca desejasses que o tempo passasse. Eu te pediria que
fizesses durar mais e mais este momento milagroso."
Ao opor entre si as personagens de Clarissa e Amaro, como se tratasse de dois pólos
da existência, a luz e a sombra, o passado e o futuro, este romance permite vislumbrar
uma preocupação que, alimentada por Érico Veríssimo em livros posteriores, veio a
ser um de seus temas recorrentes - o tempo; o comportamento dos seres perante o
decurso do tempo, que é vida e morte, descoberta e esquecimento.
Outra marca da identidade do romancista é a preferência por personagens femininas.
Neste romance, a "parte forte" da vida está representada muito mais nas mulheres
(autoritárias como Tia Zina, promessas futuras como Clarissa) do que nos homens,
que em geral, são indolentes, frustrados ou insensíveis.
Enredo
Clarissa marca o início de uma atividade criadora no qual Érico Veríssimo elevou o
romance sulino ao seu ponto mais alto: recém-chegada do interior, Clarissa vai morar
numa pequena pensão em Porto Alegre. Em contato com criaturas frustradas,
entregues às pequenas misérias do cotidiano, a garota descobre a vida aos poucos,
ora tranquila ora aos sobressaltos.
Nesta história, espécie de iniciação à vida adulta, Clarissa se depara com uma
realidade que se revela em toda a sua crueza. Seu sonho, porém, é maior do que
tudo.
Retrato lírico de uma adolescente às vésperas de se transformar em mulher, Clarissa
é um romance comovente que integra a observação social e o realismo psicológico.
Acredita-se que a cidade para qual Clarissa se muda é Porto Alegre devido a algumas
descrições, no livro o autor não especifica a localidade. Na pequena pensão ela
conhece a infiel Ondina e seu marido Barata; Tonico um menino com deficiência física
e sua mãe Dona Tatá; Levinsky, um judeu comunista e; o músico Amaro que é
apaixonado por Clarissa.
Amaro é um personagem que chama atenção, ele é um bancário que sonha em ser
pianista e está sempre compondo. Ele possui uma paixão secreta e platônica por
Clarissa. A personagem principal se torna amiga de Tonico, um menino deficiente que
tem apenas a mãe, uma pessoa simples que precisa trabalhar de costureira para
sustentar o filho. Clarissa chega a ter contato com o Dr. Maia que mora na casa rica
ao lado da pensão. Quando o menino Tonico morre, ela passa a fantasiar um romance
com ele.
Não há grandes reviravoltas ou emblemas dramáticos nesta obra. A menina relata
com naturalidade e certa inocência o que acontece a sua volta, a única grande
revelação da obra é quando ela descobre que dona Ondina é casada com um caixeiro
viajante, Barata, e possui um caso com Nestor, um solteirão de boa vida. A maneira
como Veríssimo narra a história prende o leitor, assim como a riqueza de detalhes, é
possível ter uma ideia de como eram as coisas no Brasil durante esse período.
IV. Helena - Machado de Assis
Personagens
Helena - Protagonista. Era sensível, emotiva, romântica e muito forte, personagem
esférica.
Estácio - Suposto irmão de Helena.
Conselheiro Vale - Pai adotivo de Helena (o qual deixa-lhe a herança).
D. Úrsula - Irmã de Conselheiro Vale.
Eugênia - Queria se casar com Estácio.
Dr. Camargo - Pai de Eugênia e amigo da família.
Padre Melchior - Amigo e confessor de Estácio.
Mendonça - Amigo de Estácio.
Ângela - Mãe de Helena.
Salvador - Legítimo pai de Helena.
Enredo
No espaço do Rio de Janeiro colonial, Conselheiro Vale, um homem importante e rico
mantém caso amoroso com uma mulher que havia migrado do Rio Grande do Sul e se
separara do marido, devido a dificuldades financeiras. A mulher já possuía uma filha,
que, mais tarde, foi perfilhada pelo amante rico.
Conselheiro Vale morre, e em seu testamento ele alegava que Helena era sua filha e
que ela devia tomar seu lugar na família, todos acreditam nisso, porém Helena sabe
que não é verdadeiramente sua filha, mas na sua ânsia de ascender socialmente
acaba aceitando isso. À princípio, D. Úrsula reage com um certo preconceito à
chegada de Helena, mas no decorrer da narrativa ela vai ganhando o amor de D.
Úrsula, Estácio porém, era um bom filho, e faz a vontade do pai sem indagar nada. Dr.
Camargo acha aquilo um absurdo, pois ele queria casar sua filha, Eugênia, com
Estácio para que eles se tornassem ricos às custas do dinheiro de Estácio, e mais um
familiar só iria diminuir a parte da herança de Estácio.
Helena toma seu lugar na família como uma mulher de fibra, uma verdadeira dona de
casa, cuida muito bem de sua nova família, dirige a casa melhor do que D. Úrsula o
fazia, e impressiona não só a família como toda a sociedade em geral, porque além de
ser uma mulher equilibrada como poucas que existiam, era linda, sensível e rica.
Ao decorrer da narrativa, Helena vai impressionando mais e mais Estácio, e nisso
acaba se apaixonando por ela, e ela por ele. Aí vem o dilema do livro, de um lado
Estácio, se martirizando por se apaixonar por sua suposta irmã, o que era um pecado,
e do outro Helena, também apaixonada por Estácio, esta sabia de toda verdade, mas
não podia jogar tudo para o alto e ficar com ele, afinal havia recebido uma fortuna de
herança. Neste ponto então surge Mendonça, que se apaixona por ela. Então pede
Eugênia em casamento também para tentar esquecer Helena.
A família possuía uma chácara, e perto dessa chácara tinha uma casa simples, pobre,
e Helena costuma a visitar sempre essa chácara, um dia Estácio resolveu segui-la, e
lá conheceu Salvador, e foi tirar satisfações sobre as visitas de Helena, Salvador
começou a lhe contar uma grande história, e surpreendeu Estácio ao lhe revelar que
Helena era sua filha, não de Conselheiro Vale, e toda a história da vida de Helena até
ali. Nesse mesmo dia, Helena após uma forte chuva fica debilitada, à beira da morte,
Estácio, tomado por seu forte amor vai cuidar de Helena e lhe faz essa declaração.
Helena morre.
V. Gabriela Cravo e Canela – Jorge Amado
Escrita por Jorge Amado em 1958, a obra Gabriela Cravo e Canela, um romance
regionalista, rendeu ao autor cinco importantes prêmios e uma excepcional aceitação
pelo público, sendo também êxito no estrangeiro, tendo sido traduzida em quinze
línguas. Este sucesso deve se principalmente a maneira do autor, com seu espírito
jovial, de escrever e trabalhar tão bem suas personagens.
Ao lermos o livro percebemos duas principais vertentes que ocorrem paralelamente e
que conduzem todo o romance:
a.. O amor entre a mulata Gabriela e o sírio Nacib. O campo amoroso da narrativa.
b.. A chegada do progresso em Ilhéus, local onde se passa a história. O campo social
e político da narrativa.
Personagens
Iremos a seguir mostrar os personagens principais e secundários divididos de acordo
com seus papéis.
a.. Personagens Protagonistas (no campo amoroso).
Consideramos Gabriela e o turco Nacib os protagonistas da história devido ao
romance vivido entre eles e a importância deste no romance.
Gabriela- Moça de grande vitalidade que reúne grandes características do biótipo
nortista do interior, sendo retirante fugida da seca. Animada, bem disposta, era bonita
e por onde passava chamava atenção dos homens, provocando inveja nas mulheres.
Não era mulher de relacionamentos mais sérios como o casamento nos quais se
sentia "presa". A traição na sua relação com Nacib ocorreu devido a este fato.
Importante: é Gabriela que dá ênfase à trama.
"Caído o braço roliço, o rosto moreno sorrindo no sono, ali, adormecida na cadeira,
parecia um quadro. Quantos anos teria? Corpo de mulher jovem, feições de menina."
Este trecho exemplifica e exalta a beleza física de Gabriela.
Nacib - O personagem é fundamental não só pela sua relação com Gabriela mas
também pelo fato de ser dono do mais importante ponto de encontro da região, o Bar
Vesúvio. Era imigrante vindo da Síria e não gostava de fazer parte de nenhum laço
político. Pensava ele que se fizesse parte da política poderia perder clientela em casos
de desentendimento, já que todos da sociedade frequentavam seu bar. É ele o
primeiro homem, na narrativa, a se encantar com a beleza de Gabriela. Era, de acordo
com o próprio livro, "um enorme brasileiro, alto e gordo, cabeça chata e farta cabeleira,
ventre demasiadamente crescido..." Possuía ainda frondosos bigodes, um rosto gordo
e bonachão, além de uma boca grande de sorriso fácil.
"Do que não se recordava mesmo era da Síria, não lhe ficara lembrança da terra natal
tanto se misturara ele à nova pátria e tanto se fizera brasileiro e ilhense."
Trecho da narrativa referente a Nacib e sua nacionalidade.
2.Personagens Antagonistas (no campo amoroso)
Para considerarmos uma personagem antagonista devemos analisá-la e assim ver o
seu verdadeiro papel na narrativa. No caso deste romance consideramos a
personagem Tonico Bastos como a antagonista. Pelo fato de ele ser o fator
determinante na traição entre Gabriela e Nacib.
Tonico Bastos- Filho do coronel Ramiro Bastos, possuía a fama de conquistador. Sua
razão de viver era esta, o de ser o irresistível. Andava sempre bem vestido, e com um
andar despreocupado. Tinha muito sucesso com as mulheres e as opiniões sobre ele
variavam em Ilhéus, uns o consideravam bom rapaz e inofensivo. Outros achavam ele
burro, covarde e preguiçoso.
Foi este seu jeito que conquistou Gabriela, fazendo com que ela se esquecesse de
Nacib por um momento.
"De nenhum outro temera tanto Nacib a concorrência, ao contratar Gabriela, quanto de
Tonico. Não era ele o conquistador sem rival, o tombador de corações?"
Trecho que mostra a preocupação de Nacib em relação a seu amor Gabriela e o
conquistador Tonico Bastos.
3. Personagens Secundários (no campo amoroso)
São personagens da conturbada vida amorosa e doméstica de Ilhéus ou ainda
personagens relacionados ao cotidiano de Gabriela, Nacib ou de Tonico Bastos. A
seguir citaremos algumas personagens neste campo.
As irmãs dos Reis- Duas grandes cozinheiras de Ilhéus, Quinquina e Florzinha eram
também muito conhecidas por terem construído um enorme presépio. Neste
encontravam-se além de imagens santas, imagens de personalidades que foram
importantes na história do Brasil.
Malvina- Por ser jovem e mulher era muito controlada pelo pai, o que era muito comum
na época. Por outro lado era a única que possuía coragem para requerir seus direitos.
Acabou fugindo de Ilhéus para não ter que casar com quem não queria.
Filomena- Empregada de Nacib desde que ele comprara o bar, acaba indo embora
para morar com o filho Vicente. Abrindo então uma vaga que posteriormente será
ocupada por Gabriela.
No campo político os personagens estão divididos em duas principais alas: a ala dos
que querem e estimulam o tão falado progresso e aqueles que são contra os desejos
desta ala progressista. Através da leitura podemos perceber que os progressistas são
(no campo político) os protagonistas. O antagonismo está na maneira conservadora de
pensar da outra ala, anti-progressista. Os membros desta ala são os antagonistas
neste campo.
Alguns protagonistas (campo social e político).
Mundinho Falcão- Raimundo Falcão, exportador de cacau. O seu principal objetivo era
aumentar a produção de cacau, e possibilitar que o cacau fosse exportado sem ter que
antes passar pelo porto da Bahia. Era o símbolo do progresso.
"Mundinho Falcão chegou aqui outro dia, como diz Amâncio. E veja quanta coisa já
realizou: abriu a avenida ...Trouxe os primeiros caminhões, sem ele não saía o Diário
de Ilhéus nem o clube Progresso."
Este trecho define bem o espírito progressista de Mundinho Falcão.
Capitão- Miguel Batista de Oliveira, o Capitão, era aliado a Mundinho Falcão nas
disputas políticas. Possuía um nariz grande e curvo, era moreno e estava sempre
vestido de impecável roupa branca. Era uma das grandes personalidades da cidade.
O russo Jacob e seu sócio Moacir Estrela- Foram eles que organizaram uma empresa
de transportes para explorar a ligação rodoviária entre as duas principais cidades de
produção de cacau. Isto foi um progresso já que a viagem rodoviária através das
marinetes era muito mais rápida e barata que através da ferrovia, a mais comum na
época.
"Que coisa! Quem diria! Trinta e cinco quilômetros em hora e meia...Antigamente a
gente levava dois dias, a cavalo..."
Percebe-se por este trecho da narrativa a vantagem da viagem por rodovias através
das marinetes.
Alguns membros da Igreja podem aqui ser incluídos (Padre Basílio), já que muitos
deles possuíam terras sendo interessante a chegada do progresso.
Antagonistas (campo social e político)
Coronel Ramiro Bastos- Considerado um verdadeiro cacique local, por ser um dos
mais antigos moradores de Ilhéus. Era contra a política progressista de Mundinho
Falcão, com o qual disputava o poder político da região.
Coronel Amâncio Leal- Era um homem calmo, porém que já havia lutado muito por
terras da região, era um célebre chefe de jagunços. A ele pouco interessava todas
aquelas inovações do progresso.
Na verdade podemos dizer que praticamente todos os coronéis, os homens com
origem naquela terra e que lutaram por ela, não queriam o progresso, não queriam
que seu tipo de vida mudasse.
Principais Momentos
Por ser um romance percebemos dentro do enredo várias "sub-histórias" podendo
então se localizar pequenos conflitos e até pequenos desfechos caracterizando um
pequeno universo. Mas de qualquer forma podemos dividir a obra de acordo com seus
principais acontecimentos.
Download

ACAFE 2013 I. A Hora da Estrela - Clarice Lispector Estrutura da