ID: 61116996
25-09-2015
Tiragem: 35268
Pág: 49
País: Portugal
Cores: Preto e Branco
Period.: Diária
Área: 13,25 x 30,90 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 1
A ADSE está
na moda
O
Debate Sistemas de saúde
José Mário Martins
subsistema de saúde dos
trabalhadores em funções
públicas e seus familiares,
conhecido como ADSE, é um
dos principais assuntos em
análise no presente debate
eleitoral sempre que se discute
a saúde. A sua extinção chegou
a ser defendida por Vital
Moreira, há cerca de dez anos,
e por Álvaro Beleza, enquanto secretáriogeral adjunto de António Seguro. Já Pedro
Pita Barros, por exemplo, afirma que,
sobre a ADSE, “... é simples ter opiniões
extremadas...”, e que o leque de alternativas
é variado, sendo que a extinção não merece
a sua simpatia. Exporei, de seguida, aqueles
que creio serem os três principais mitos
sobre a ADSE e, por fim, o que entendo
poder vir a ser o seu futuro caminho. Mitos:
1) O Serviço Nacional de Saúde (SNS)
torna dispensável a ADSE, porque é
universal, geral e tendencialmente
gratuito no acto da prestação. Como
todos sabemos, o SNS não é universal, já
que, neste momento e segundo contas que
Passos Coelho não contestou no debate com
António Costa, haverá mais de um milhão
de portugueses sem médico de família,
apesar da “importação”. Por isso, a ADSE é
necessária, tendo a vantagem de desonerar
o SNS. Eugénio Rosa, um economista
insuspeito de simpatia pelas teses
neoliberais, afirma que “... a ADSE liberta
o SNS da prestação de muitos serviços
médicos, tornando o SNS mais acessível aos
outros portugueses”. Imagine-se o que seria
se a ADSE desaparecesse e os cerca de 1,3
milhões de quotizados passassem, de um
dia para o outro, a frequentar os serviços do
SNS. Por certo iriam agravar-se, e muito, as
esperas nas urgências hospitalares, que, em
situações de pico, já chegaram a ultrapassar
as 24 horas.
2) A ADSE é o grande financiador dos
hospitais privados. Pedro Pita Barros, num
post de Outubro de 2014 no seu blogue,
afirma que o principal financiador dos
hospitais privados é o “bolso dos cidadãos”,
com uma quota de 35%, seguido do SNS com
31%. A totalidade dos subsistemas, dos quais
a ADSE é o principal, só contribuirá com 21%.
Já Marina Marques, citando a Associação
Portuguesa de Hospitalização Privada, afirma
que os subsistemas serão os responsáveis por
30% do financiamento dos hospitais. Assim,
mesmo assumindo os 30%, os subsistemas
serão, no seu conjunto, apenas o terceiro
financiador dos hospitais privados.
3) A ADSE não é sustentável, e só subsiste
porque é devedora ao SNS. Já vimos atrás
que sem a ADSE muito provavelmente seria o
SNS a ser insustentável com o actual nível de
financiamento.
Com base na premissa da não
sustentabilidade, este Governo decidiu
aumentar a taxa de contribuição dos
quotizados para 3,5% do vencimento. Este
aumento não decorreu de necessidades
de tesouraria da ADSE, nem de melhores
cuidados aos quotizados e não foi precedido
de qualquer estudo, conforme afirma o
Tribunal de Contas (TdC) numa auditoria
à ADSE. Apesar do aumento feito sem
sustentação técnica, a ADSE deu, em 2014,
cerca de 215 milhões de euros de lucro,
pelo que o TdC concluiu que, em 2015, uma
contribuição de 2,25% seria suficiente para
garantir a sustentabilidade, criando um
excedente de cerca de 10%.
Os quotizados da ADSE pagam impostos
como os restantes cidadãos, pelo que têm
direito a usufruir de todos os serviços do
SNS. Porém, os quotizados pagam, através
das suas contribuições, serviços que
deveriam ser da responsabilidade do SNS.
Segundo as contas
do TdC, partindo
de dados de 2013, o
aumento estimado
para o SNS por
encargos que este
teria de suportar se
a ADSE não existisse
seria superior a 210
milhões de euros.
Quais devem ser
por conseguinte,
em meu entender,
os caminhos para o
futuro:
Em primeiro lugar,
a evolução para um
serviço de prestação
alternativo ao SNS,
aberto a todos os
cidadãos que se
queiram quotizar,
bem como a todos
os profissionais
que se queiram
convencionar, e
em que haja um
encontro de contas directo entre os dois
prestadores (ADSE e SNS) em função dos
serviços que cada um presta ao outro.
Depois a alteração da forma de governo
da ADSE, de modo a permitir que os
quotizados, enquanto parte interessada,
participem na gestão e, consequentemente,
na definição de objectivos estratégicos.
Finalmente, a existência de uma entidade
auditora externa e de uma estrutura
arbitral médica, tripartida, composta por
elementos da ADSE, da Ordem dos Médicos
e dos Prestadores Convencionados, para
dirimir conflitos técnico-científicos, éticos e
deontológicos que possam envolver ADSE,
quotizados e prestadores.
O aumento
estimado
para o SNS por
encargos que
este teria de
suportar se
a ADSE não
existisse seria
superior a 210
milhões...
Estomatologista; membro da Associação
de Medicina de Proximidade
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A ADSE está na moda