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OS IMPASSES E DESAFIOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO
DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Maria Sueli Corrêa dos Prazeres1
Resumo: O texto analisa a formação de professor no contexto da
educação a distância. Inicia realizando uma breve revisão da literatura
acerca da temática, analisando os principais autores e suas proposições
e contribuições para o debate. Depois, faz um debate acerca da
interferência dos organismos internacionais nas políticas destinadas a
formação do professor e finaliza com breves considerações acerca da
temática.
Palavras-chave: Formação de professor, educação a distância, políticas
educacionais, organismos internacionais.
Abstract: The text examines the training of teachers in the context of
distance education. Start doing a brief review of the literature on the
subject, analyzing the main authors and their proposals and contributions
to the debate. Then is a debate about the interference of international
agencies in policy for the training of teacher and ends with brief
comments about the topic.
Key words: Teacher training, distance education, educational policy,
international bodies.
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Doutorando. Universidade da Amazônia/UNAMA. E-mail: [email protected]
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INTRODUÇÃO
O início do milênio nos colocado diante de inúmeras reflexões e questionamentos. Será
que o fim da história destacado por Fukuyama não tenha sido apenas o início de uma nova
história? Talvez nessa virada de século, finais sejam inícios de novos tempos, outras
expectativas, novas formas de ensinar e aprender. A literatura remete a novos conceitos de
sociedade, ora sociedade do conhecimento (FRIGOTTO, 2003); era da aprendizagem
(PAPERT, 2008); sociedade comunicacional, informática e globalizada (LIBÂNEO, 2007).
Nessa sociedade são atribuídos novos papéis a educação, a escola e ao docente. A
educação assume importância fundamental para alavancar o desenvolvimento do país, sendo
que nessa perspectiva a educação é concebida não como direito, mas como privilégio seguindo
na lógica da mercadorização do conhecimento (MANCEBO, MAUÉS E CHAVES, 2006), o
professor como mediador/consultor/facilitador do processo educacional (MORAN, BEHRENS E
MASETTO, 2000) e os cidadãos como clientes/consumidores (SGUISSARDI, 2000).
É nesse contexto que insere nossas reflexões acerca da formação de professor no
contexto da educação à distância (EAD). Essa nova modalidade suscita preocupantes reflexões
quanto às suas contribuições para o cenário educacional. Isso por que essa modalidade teve
acelerado crescimento no Brasil nos últimos anos e imprime novos contornos à dinâmica
escolar ao ser associada à EAD (PRETI, 2001).
2 REVISITANDO A LITERATURA
Nos últimos anos houve um crescimento significativo da EAD em nosso país, e trás
como proposta um ensino mais flexível, interativo, aberto, intermediado pelas tecnologias da
informação e da comunicação (TIC). Essa modalidade modifica a relação professor/aluno;
espaço/tempo; presencial/virtual. Diversos autores entre eles MORAN, BEHRENS E
MASETTO, (2000); MAIA E MATTAR (2007); LÉVY (2005, 2001); TENÓRIO, (2003); BELLONI
(2005); PAPERT (2008) destacam a necessidade da introdução das novas tecnologias da
informação e da comunicação no meio educacional.
Propugnam que na sociedade do conhecimento e da informação educação e tecnologias
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devem caminhar juntas. Defendem que numa sociedade marcadamente pelos avanços
tecnológicos a palavra de ordem é “aprender a aprender”. No entanto, reconhecem que um dos
grandes desafios das escolas é introduzir às novas tecnologias nos processos pedagógicos.
São recursos tecnológicos que prometem superar a dita forma “tradicional” de ensino, a sala de
aula, o quadro e o giz, por tecnologias “modernas” como computadores, Datashow, televisão,
diversas técnicas como a teleconferência, Chat, correio eletrônico (e-mail), internet e outros.
Nessa configuração mudam-se os tempos e os espaços pedagógicos onde temos ao
invés das escolas o Cyberespaço, as salas de aulas em ambientes virtuais, o professor em
mediadores/motivador/facilitador, o aluno em aprendiz virtual, a comunicação falada e escrita
em comunicação virtual e on-line. É importante assinalar que existem posicionamentos
divergentes em relação a temática. Para Belloni (2002) no Brasil, neste inicio de século,
observamos novos modos de socialização e mediações decorrentes de artefatos tecnológicos
extremamente sofisticados que inserem os jovens em novos contextos de aprendizagem
(virtual) onde os jovens buscam seu próprio conhecimento (autodidaxia) lidando com máquinas
inteligentes e interativas.
De acordo com a autora não há como contestar que as diferentes mídias eletrônicas
assumem um papel cada vez mais importante no processo de socialização do conhecimento,
ao passo que a escola não consegue atender minimamente as demandas cada vez maiores e
mais exigentes da sociedade. Para Couto (2006) os cursos na modalidade à distância
constituem-se em aligeiramento, em formação em massa, em desobrigação com o processo
ensino aprendizagem de qualidade. Por outro lado, também se subestima o potencial e a
capacidade das TIC em nome de cursos que parecem não traduzir responsabilidade com a
formação e com o cidadão. Na mesma direção Cysneiros (1999) assinala que a introdução das
tecnologias nas salas de aula tem sido uma história de insucesso, com uso limitado e ganhos
educacionais modestos.
De acordo com o autor, o que tem ocorrido na realidade, ao invés de qualidade na
educação, uma “inovação conservadora” onde os sujeitos escolares não exploram todo o
potencial que as tecnologias podem ofertar e que na maioria das vezes aumentam a
capacidade expositiva do professor e diminui a possibilidade criativa dos alunos. Ou seja,
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substituem-se os artefatos, mas conservam-se as mesmas lógicas, não introduzindo mudanças
significativas no contexto educacional. Nesse sentido, diante do atual contexto torna-se
relevante refletir e problematizar sobre a temática para compreender seus objetivos, diretrizes,
pressupostos metodológicos e quais as concepções subjacentes a sua implementação.
3 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR, EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E ORGANISMOS
INTERNACIONAIS.
Ao analisarmos o cenário educacional do ensino superior brasileiro nos últimos anos é
possível identificar uma extraordinária expansão, principalmente em relação a educação à
distância. Entretanto, apesar da velocidade com que cresce esse setor, os recursos humanos
para atuar nessa nova modalidade não se desenvolveram de forma satisfatória. De acordo com
Maia e Mattar (2007) ainda não existe uma formação adequada ou um completo entendimento
sobre os papéis de cada um, seus direitos, deveres e responsabilidades perante o novo
processo.
As discussões sobre a necessidade da formação de professores para enfrentar os
desafios atuais da educação se apresenta na ordem do dia. Contrariando as algumas
perspectivas, Libâneo (Op. Cit, p. 07) destaca que “o tema da formação de professores assume
importância crucial”. Para o autor, professores são necessários sim, entretanto, surgem novas
exigências educacionais que exigem um profissional capaz de ajustar a sua didática às novas
realidades da sociedade, do conhecimento, do aluno, dos meios culturais e dos meios de
comunicação.
Diante das atuais transformações no setor social, econômico e político num contexto de
reestruturação produtiva do capital2, onde este em face da crise cria estratégias para se
perpetuar no poder, é preciso estar atento para o que Bourdieu (1999) denominou de vigilância
epistemológica. No contexto da EAD no Brasil torna-se imprescindível estar atento para analisar
se as políticas relacionadas esta modalidade não estão caminhando paralelamente às
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perspectivas dos organismos internacionais
No atual cenário onde são implementadas reformas que traduzem a lógica do capital é
preciso estar atento para a análise dos direcionamentos/prescrições internacionais para a
educação e seus rebatimentos nas políticas públicas educacionais de ensino superior. Estas
transformações sociais, econômicas e políticas ocorridas no contexto da “acumulação flexível” e
no contexto do “empresariamento no capitalismo tardio” (HARVEY, 1998, 1996) têm
rebatimentos nas políticas sociais, apontando a para o mercado educacional.
Nos últimos anos, intensificou-se o processo de reformas em todos os setores, para
atender as demandas do mercado. Tal como ocorrera no passado, nos anos de 1990 essa
tendência ganha força e intensifica-se através de inúmeros acordos internacionais. Shiroma
(2000) analisa que a educação brasileira tem vindo a reboque do vem sendo prescrito pelos
organismos internacionais, como solução para levar o país ao progresso, e o que é mais
preocupante é que essas prescrições servem de referencial para a definição de nossas políticas
educacionais operando um verdadeiro transformismo na educação.
]Esses novos reordenamentos das políticas educacionais não são “novos” e seguem
dentro do contexto das reformas do Estado. Para entendermos a privatização do sistema
educacional buscamos suas origens no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado
(MARE, 1995, p. 03) onde “reformar o estado significa, transferir para o setor privado as
atividades que podem ser controladas pelo mercado”. Desta forma, a educação passa a ser
considerada como serviço não exclusivo do estado, sujeito, portanto, a ser “fornecido” por
quaisquer outras instituições. Desta forma, a educação passa a ser considerada como serviço
não exclusivo do Estado3, sujeito, portanto, a ser “fornecido” por quaisquer outras instituições.
Refletindo sobre as reformas e suas implicações Mancebo, Maués, e Chaves (2006)
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Segundo Chesnais (1997) a atual etapa do desenvolvimento capitalista é marcada pela predominância do capital
financeiro “um regime de acumulação mundial predominantemente financeiro que requisita aos Estados, os
instrumentos necessários à satisfação das demandas insaciáveis do mercado”.
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Esse processo pode ser evidenciado nas concepções de Bresser Pereira (1998, p. 25) quando este destaca que
existem no Estado uma série de atividades na área social e científica que não lhe são exclusivas. Incluem-se nestas
categorias as escolas, as universidades os centros de pesquisa científica e tecnológica, as creches, os ambulatórios, os
hospitais, as entidades de assistência aos carentes, principalmente aos menores e aos velhos, os museus, as orquestras
sinfônicas, as oficinas de arte, as emissoras de rádio e televisão educativa ou cultural, etc.
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destacam que o trabalho docente é afetando em cheio por essas mudanças, que forçam o ritmo
da produção, incrementam as tarefas a serem realizadas, instituem horários atípicos, com
aceleração no desempenho das atividades e o aprofundamento de uma dinâmica produtivistaconsumista. Ou seja, em conseqüência da adoção das perspectivas gerenciais no campo da
educação ocorre uma naturalização dos princípios neoliberais e capitalistas em detrimento da
formação humana. Estas estratégias seguem no sentido de imprimir nos profissionais da
educação a lógica do pensamento único acerca das políticas educacionais para a educação
superior.
CONSIDERAÇÕES
No atual contexto brasileiro, é inegável que as diretrizes/prescrições emanadas pelos
organismos internacionais tenham encontrado campo fértil em nossa agenda educacional,
assim como, também é inegável que nossos governos tiveram e tem participação ativa e
consentida no processo de internacionalização da agenda educacional brasileira. É importante
clarificar que essa subordinação não deve ser compreendida como uma imposição de “fora”,
mas articulada aos próprios interesses da burguesia brasileira em reproduzir, internamente,
relações de dominação ideológica e exploração econômica. (LIMA E LIMA, Op. Cit, p. 02)
Ao analisar a implementação das políticas públicas para a educação devemos estar
atentos para qual concepção de escola e ensino estão permeando suas diretrizes e princípios,
no caso, a lógica que as fundamenta. Concordo com as afirmativas de Maués (2006, p. 88)
quando esta enfatiza que a contradição está presente na sociedade e por isso existem
movimentos que constroem a “contra-hegemonia”, que vem no sentido oposto de uma
educação a partir dos valores e interesses de uma classe no poder. Entendo que esse processo
é complexo, mas não impossível.
Ao longo dos anos as políticas educacionais têm sido direcionadas para atender a
demanda do sistema produtivo, seguindo assim na contra-mão de um processo educativo
realmente inclusivo. Isso nos leva a síntese de que a educação tem servido a diferentes
interesses e grupos. Mészáros (2005, p. 27) destaca que é necessário “romper com a lógica do
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capital se quisermos contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente
diferente”. Essa concepção ganhará materialidade quando fortalecermos nos espaços sociais,
acadêmicos, na família, nas esferas públicas de que a educação que queremos não é a
educação vista sob a ótica do capital, mas uma educação para formar o ser humano e suas
especificidades.
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Disponível
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novas
exigências
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