A EXPERIÊNCIA DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA
NO PRÉ-VESTIBULAR DE NOVA IGUAÇU
Marcia Andrade Morais
Margareth Andrade Morais
Sinézio Gomes da Silva
[email protected]
INTRODUÇÃO
Diversas pesquisas acerca do ensino de Língua Portuguesa
vêm confirmando que somente a chamada “decoreba” de regras
gramaticais não demonstra ser o método mais eficaz para o desempenho dos alunos na aprendizagem de língua. Embora ineficiente no
ensino da Língua, o ensino tradicional vinha se mostrado deficiente,
uma vez que os alunos não eram levados a refletir sobre a Língua,
tampouco conseguiam relacionar este aprendizado a algo que pudesse ser acrescentado em suas vidas. Além disso, este método de memorização de normas indicava suas deficiências quando alunos,
mesmo tendo estudado português ao longo da vida escolar, concluíam seus estudos declarando não saber português ou considerando a
disciplina muito complexa.
A reflexão que propusemos fazer aqui é de que forma poderíamos arriscar uma tentativa de tornar o ensino de Língua mais atraente, mais dinâmico, de modo que o aluno pudesse se apropriar do
conhecimento da estrutura da língua, tendo em vista, principalmente,
que, como falante da língua, tem domínio total sobre esta e que a escola (em nosso caso, o Curso Pré-Vestibular de Nova Iguaçu, doravante CPN-NI) teria o papel, dentre outros, de aperfeiçoar o conhecimento que o aluno traz consigo e melhorar o seu desempenho como falante desta língua.
A tarefa dos professores da equipe de Língua Portuguesa, então, seria um pouco mais árdua, já que, por se tratar de um prévestibular, teríamos a missão fundamental de rever os conteúdos apreendidos, melhor dizendo, decorados durante toda a vida escolar
destes alunos a fim de prepará-los para as provas dos grandes vestibulares. Neste ponto, deparamo-nos com uma grande dificuldade ao
apostarmos na ousadia de tentar um ensino diferente dos moldes tra-
dicionais, que foi passar a apresentar um modelo diferente do ensino
(mostrar a variedades de gêneros textuais, variações lingüísticas, a
intencionalidade de cada texto, entre outros) com o qual os alunos
estavam acostumados (memorização de regras, distinção entre norma
certa e errada, etc.).
Nessa perspectiva, nossa primeira missão foi elaborar um novo material didático, apoiado fundamentalmente nas estratégias de
ensino baseados em textos, a fim de concedermos ao aluno a oportunidade de, primeiramente, verificar de que forma se utiliza a língua,
passando, posteriormente, a uma reflexão dela e, por fim, voltar-se
para a atividade de produção textual, completando o ciclo postulado
pelos PCN: USO ßà REFLEXÃO ßà USO.
É importante deixar claro que, em momento algum, abandonamos a Gramática Tradicional ou desprezamos o ensino da norma
culta, até porque um dos papéis principais do ensino de língua, como
já foi dito anteriormente, é fornecer ao aluno ferramentas para que
ele possa desempenhar bem a função de falante, leitor e produtor de
textos em sua língua. Nesse sentido, o domínio de todas as normas é
fundamental. A nossa preocupação, no entanto, é informar como essas normas são ensinadas ao aluno, reservando-nos o cuidado de não
reproduzir um modelo de memorização de regras, tampouco privilegiar uma norma em detrimento de outra.
Desta sorte, neste artigo, procuramos expor uma tentativa dos
professores do Pré-Vestibular de Nova Iguaçu de tornar o ensino de
Língua mais atraente e dinâmico a partir da perspectiva do trabalho
em sala com as atividades que buscam valorizar os diferentes gêneros textuais e a interdisciplinaridade/intertextualidade como uma ferramenta importante no ensino de Língua. Desejamos que todos apreciem a leitura deste artigo que, assim como todo o trabalho realizado
em Nova Iguaçu, tem como princípio “o saber como arma de transformação da classe trabalhadora”.
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A IMPORTÂNCIA DOS GÊNEROS TEXTUAIS
NO DESENVOLVIMENTO DA HABILIDADE DE LEITURA
DOS ALUNOS DO CPV - NI
O texto como base de ensino
Neste tópico, pretende-se mostrar a relação entre os gêneros
textuais e o ensino de Língua Portuguesa, de forma a mostrar como
tal atividade pode ser mais coerente e mais atrativa para os alunos
sem perder o foco no desenvolvimento de habilidades como a leitura
e a produção textual.
Essa estratégia de ensino tenta propiciar ao aluno meios para
que ele compreenda e reflita sobre os principais gêneros textuais em
circulação na sociedade. Como a quantidade de gêneros é imensa,
escolhemos alguns (que serão usados aqui como exemplos) para
compor a apostila do curso, nosso principal material de trabalho.
Nosso objetivo é permitir que o aluno reconheça as estruturas
lingüísticas, compreenda a sua função textual e consiga compreender
os sentidos do texto. Em uma etapa posterior, esperamos que a reflexão sobre os usos lingüísticos o leve à produção textual, formando
um círculo: uso – reflexão – uso, assim como apregoam os Parâmetros Curriculares Nacionais, citado anteriormente.
Por que pensar em gêneros textuais
nas aulas do curso pré-vestibular?
Estimular e desenvolver a leitura em um corpo discente composto, em sua maioria, por jovens cuja realidade está bem distante
dos livros não é tarefa fácil. Para tentar diminuir a distância dos alunos à cultura escrita, a equipe de língua portuguesa busca algumas
estratégias diferenciadas, tentando integrar pesquisa e ensino.
Segundo essa perspectiva, procuramos trabalhar com vários
gêneros textuais e diferentes linguagens a fim de trazer o aluno para
o ambiente da leitura, fazer com que ele se aproxime, inicialmente,
por interesse próprio. Dessa forma, focaliza-se o desenvolvimento da
habilidade da leitura, da formação de um leitor mais atento, crítico e
consciente. O trabalho com os gêneros textuais também visa ao auxílio e à melhora na atividade de produção textual, visto que se inves-
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tiga não só os sentidos do texto, mas as formas lingüísticas que atuaram na produção daquele sentido. Tal objetivo não exclui o nosso
desejo maior, a aprovação desses alunos no vestibular. Além disso, o
incentivo à leitura vai muito além do âmbito de uma sala de aula de
língua portuguesa. A leitura traz benefícios incalculáveis para a vida
do aluno, que vão além do vestibular ou quaisquer tipos de provas,
pois só a prática da leitura é capaz de ampliar o universo cultural do
aluno, só ela é capaz de muni-los de uma bagagem intelectual suficiente para motivá-los a transformar a sua realidade e a daqueles que o
cercam. Isso se torna importante se nos atentarmos para o fato de que
os conteúdos ministrados pela escola e a própria cultura escolar são
mais identificáveis com certo grupo social, uma vez que a escola,
mesmo que inconscientemente, tende a privilegiar certos grupos sociais em detrimento de outros. Dessa forma, contribuímos também
para uma diminuição das distâncias sociais, trazendo o aluno de Nova Iguaçu, baixada fluminense, para um novo universo cultural ao
qual muitas vezes lhe é negado o acesso. Cumpre destacar ainda, sobre esse aspecto, que essa é uma postura não só da equipe de língua
portuguesa, mas da equipe como um todo, como pode ser evidenciado nas diversas atividades que ocorrem no curso; a saber, aulas campo, aulões interdisciplinares, filmes com debates etc.
Nossa atividade docente busca se aproximar do que cada vez
mais tem sido exigido do aluno numa prova de Língua Portuguesa,
não só nos vestibulares do Rio de Janeiro, mas de São Paulo também, como é o caso da Unicamp. As provas atuais exigem do aluno
uma leitura crítica, saber ler, compreender um texto (verbal ou não
verbal) e ser capaz de descrever, analisar e classificar as unidades
lingüísticas em questão. O candidato que se propõe a decorar nomes
e estruturas, geralmente, não obtém bons resultados nesses exames,
pois é necessário compreender o seu uso, a sua função textual.
Por fim, podemos dizer que os esforços da equipe de Língua
Portuguesa concentram-se em tentar tornar os alunos de Nova Iguaçu
leitores e escritores competentes, já que nossa atividade pedagógica
não se concentra só no vestibular, ela vai além desse exame e caracteriza-se como uma tentativa de formar os alunos para obterem sucesso em suas vidas.
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Conceituação dos gêneros textuais
Na perspectiva bakhtiniana, os gêneros possuem uma forma
de composição e distinguem-se pelo conteúdo temático e pelo estilo.
Além disso, os gêneros são atrelados à necessidade temática, aos participantes e à intenção do interlocutor. De acordo com a necessidade
comunicativa, pode-se criar gêneros textuais ou adaptar os já existentes.
Dizer que os gêneros possuem uma forma não corresponde a
uma invariabilidade. Contudo, cumpre destacar que há uma unidade
na diversidade, isto é, embora seja infinita a variedade de gêneros, há
neles certas características (como a composição, conteúdo e estilo)
que nos permitem identificar um e-mail, uma carta, um artigo sem
nos confundirmos.
Vejamos um exemplo:
Texto 1
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Texto 2
A Flor e a náusea
(...)
Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
Resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres, mas levam jornais
E soletram o mundo, sabendo que o perdem.
(...)
Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
(...)
(Carlos Drummond de Andrade, Um Eu Todo Retorcido, 1945.)1
Ao lermos os dois textos, conseguimos identificar que o texto
1 é uma tirinha e que o texto 2 é uma poesia, pois eles possuem uma
composição, ou seja, uma estruturação características a eles. Num
aspecto geral, sabemos que a poesia se divide em estrofes e a tirinha
com balões representando a fala dos personagens e frases curtas. Ademais, o conteúdo temático dos textos também nos indica que se
tratam de gêneros diferentes. Na poesia há a expressão dos sentimentos de um sujeito, de suas emoções e, em geral, constitui-se na primeira pessoa. Já na tirinha o conteúdo refere-se a uma crítica bemhumorada sobre os comportamentos e valores. Por fim, há de se ressaltar que cada texto tem um estilo próprio. Na poesia, temos a expressão máxima da linguagem, extraem-se das palavras escolhidas
pelo autor diversas significações, ao passo que na tirinha, como o autor dispõe de pouco espaço, há uma produção breve e, geralmente,
marcada por um maior grau de informalidade.
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Ambos os textos foram retirados da Apostila de conteúdos do CPV- NI, volume 3.
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Gêneros textuais e interação social
É fato que o desenvolvimento de um indivíduo pressupõe a
sua inserção no ambiente social em que vive. No grupo social com o
qual se comunica, trocamos informações, experiências e adquirimos
conhecimentos sobre o presente, sobre o nosso passado, almejamos o
nosso lugar na sociedade, construímos relações afetivas, construímos
a nossa realidade. Todas essas atividades são mediadas pela linguagem, é através dela que enxergamos o mundo e que criamos a nossa
realidade.
Nessa constante troca, as pessoas produzem textos com diferentes formas de expressão verbal ou não verbal a fim de modificar,
atuar no grupo social no qual vivem. Assim, os gêneros textuais, como práticas sociocomunicativas, permitem a interação entre produtores e interlocutores em todas as esferas de atuação humana. Nessa
seqüência de eventos, muitos textos são produzidos e com eles criam-se fatos sociais, realidades que afetam as ações, direitos e deveres das pessoas. Cada texto bem sucedido realiza para seus leitores
ações sociais significativas através da linguagem, por isso, estudar e
trabalhar com os gêneros em sala de aula é compreender o seu funcionamento na sociedade e na sua relação com os indivíduos situados
naquela cultura. É no texto, entendido como um todo organizado de
sentido que o usuário da língua concretiza a sua capacidade de organizar, transmitir idéias, informações, opiniões e propiciar situações
de interação comunicativa.
Quando enviamos um curriculum uitae para uma empresa,
por exemplo, e ele é lido, bem avaliado, modificamos a nossa realidade, passamos de aspirante a uma vaga naquela empresa a um real
funcionário dela. Outro exemplo de interação social a partir da escrita poderia ser a de um aluno do CPV – NI que, ao se inscrever no
processo seletivo de uma Universidade, através daquela ficha de inscrição, tem a possibilidade de ampliar seus horizontes, caso seja aprovado no certame. Se ele não realiza tal inscrição, seu desejo de se
tornar um estudante universitário, não será concretizado. O mesmo
ocorre com esse livro, o presente trabalho pode propiciar a quem se
dispõe a sua leitura outras interpretações possíveis e visualizar um
pouco melhor o universo de atuação de um pré-vestibular comunitário situado na baixada fluminense, ou até quem sabe, inspirar novos
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projetos como esse. Todos esses exemplos servem para ilustrar a capacidade que a linguagem tem de modificar ou criar uma realidade.
A sua importância no mundo letrado é imensa, viabiliza a interação
entre os indivíduos, está em todas as nossas atividades cotidianas.
Gêneros textuais e o processo de ensino aprendizagem
Tendo em vista esse poder da linguagem, principalmente a
escrita que está em discussão aqui, o professor de Língua Portuguesa
deve priorizar, em sua atividade docente, o trabalho com os diversos
gêneros textuais. O trabalho de leitura/produção textual deve levar o
aluno a identificar e adquirir estratégias de organização textual, perceber as características de composição dos gêneros textuais, seus objetivos e em que situações eles se realizam. É claro que, para isso,
deve-se trabalhar com as possibilidades de construção textual e de
sentidos. Muitas vezes, nota-se uma variedade de gêneros nos livros
didáticos, o que pode pressupor uma nova metodologia de trabalho.
No entanto, ao analisar a sua sugestão de atividades, descobre-se que
priorizam um sentido para o texto, um que seja mais conveniente,
aquele que está no gabarito, ao invés de discutir com os alunos os
possíveis sentidos de determinado texto e os elementos lingüísticos
que comprovam essas interpretações.
No que tange à produção textual, percebe-se que muitos exercícios priorizam a estruturação textual em detrimento dos objetivos
de produção de determinado texto, o interlocutor, o seu contexto de
produção. A equipe de língua portuguesa, ao elaborar o material didático do curso pré-vestibular de Nova Iguaçu, tenta resolver esses
problemas, ou pelo menos minimizá-los. Embora trabalhemos com
alunos que ou estão no último ano do ensino médio ou já o concluíram, ou seja, estão no fim do processo formal de ensino, tentamos
mudar a visão que eles têm da língua, estimulando a se sentirem donos dela. Por isso, organizamos a apostila de conteúdos com uma variedade de gêneros textuais, usados em diferentes contextos a fim de
desenvolver competências nos alunos que os levem a reconhecer a
pluralidade de discursos.
Nesse sentido, estamos indo ao encontro do que indicam os
Parâmetros Curriculares Nacionais:
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A compreensão oral e escrita, bem como a produção oral e escrita de
textos pertencentes a diversos gêneros supõem o desenvolvimento de diversas capacidades que devem ser enfocadas nas situações de ensino. É
preciso abandonar a crença na existência de um gênero prototípico que
permitiria ensinar todos os gêneros em circulação social.
Como pudemos perceber, já há um esforço institucional com
o intuito de melhorar o ensino de língua portuguesa, visto que a prática com os gêneros já foi sugerida pelos PCNs. Portanto, por mais
que o professor não se sinta preparado para trabalhar com essa nova
perspectiva, ele precisa buscar meios de se aprimorar e aprimorar as
habilidades lingüísticas de seus alunos, não podemos mais manter
uma postura ingênua frente às mudanças.
A equipe de Língua Portuguesa do CPV-NI valeu-se dessas
mudanças para elaborar o seu material didático e intervir, de um modo, mais consistente, no ensino de Língua. Abaixo, seguir-se-ão alguns exemplos de atividades da nossa apostila:
Texto IV
Estrogonof de chocolate e nozes
Ingredientes:
2 latas de leite condensado
2 latas de creme de leite
1 lata de leite
3 gemas
3 claras em neve
5 colheres de chocolate
1 cálice de rum
200g de nozes picadas
200g de chocolate ao leite ralado
200g de chocolate meio amargo ralado
Modo de preparar:
Faça um brigadeiro mole com leite condensado, o chocolate em pó, o leite e as gemas.
Deixe esfriar;
Junte o creme de leite, rum, chocolates ralados e nozes;
Bata as claras em neve, misture e leve à geladeira;
Enfeite com chocolate picado e nozes;
Detalhe: bata a mistura de brigadeiro no liquidificador, antes de levar ao
fogo.
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Texto V
Mil-folhas com foie gras
Ingredientes:
200g de beterraba
200g de massa folhada
2 escalopes de foie gras
Modo de preparar:
Cozinhe as beterrabas no vapor por 10’;
Corte em lâminas fininhas;
Deixe secar e frite em óleo quente;
Asse a massa folhada em camadas de mais ou menos meio cm;
Doure o foie grãs em pouquíssimo azeite;
Fatie em lâminas de 1cm;
Grelhe rapidamente as lâminas de foie gras e salgue. Ao servir, intercale,
em forma de torre, a massa folhada e as lâminas de foie gras;
Decore com os chips de beterraba.
Vamos dialogar com os textos:
a. A que gênero textual esses textos pertencem?
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b. O que marca esse gênero? Por quê?
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c. Que efeito de sentido os verbos provocam nos textos?
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d. Se trocássemos o modo e o tempo verbal (imperativo por fut. Imperfeito do indicativo) dos verbos no texto, que efeito de sentido teríamos com o novo modelo?
_______________________________________________________
e. Baseado apenas no modo de preparar, escreva um parágrafo coerente, usando os elementos de ligação, formando a unidade do parágrafo.
_______________________________________________________
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As atividades propostas visam ao reconhecimento do gênero
textual, suas marcas, e a verificação dos efeitos de sentido provocados pelos elementos lingüísticos característicos do gênero em questão. Por fim, há um exercício voltado especificamente para a produção textual.
Além das atividades explícitas na apostila, tentamos fazer
com o aluno um levantamento da forma, composição e função daquele gênero. A receita é um gênero cujo objetivo é ensinar as pessoas a fazer algo, em geral, um prato, por isso, organiza-se discursivamente por meio da injunção, ou seja, diz como fazer algo. O autor
de uma receita tem em mente que as ações designadas por ele ocorrerão em um momento posterior à produção do texto. Também é interessante mostrar aos alunos que as ações são enunciadas em uma seqüencialidade que deve ser obedecida para se garantir a eficácia do
processo.
Após essas considerações sobre a forma e organização do gênero textual, cabe analisar as estruturas lingüísticas em questão, verificando a sua função no texto. Os recursos lingüísticos utilizados pela receita em questão são uso do verbo no imperativo, substantivos,
adjetivos, expressões adverbiais que denotam modo, tempo e intensidade, utilização de procedimentos sintáticos coordenativos, predominantemente.
Temos, nesse gênero, uma excelente oportunidade para trabalharmos verbo, principalmente, o modo imperativo. Ao partirmos da
sua função no texto, esclarecendo para o aluno a sua relação com o
modo injuntivo, podemos chegar a sua descrição, a sua forma. O exercício correspondente à letra C, exposto acima, vai ao encontro da
função textual do verbo na receita. Pedimos ao aluno que ele troque
esse modo pelo futuro do pretérito do modo indicativo. Ao fazer tal
alteração, o aluno deve perceber que não se trata de uma mudança
apenas na forma, mas que essa alteração modificará diretamente o
sentido do texto, já que ao realizar a atividade proposta, tiraremos a
noção de ordem do texto para colocar no lugar a possibilidade. O
professor deve levar o aluno a verificar que essa modificação desca-
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racteriza o gênero receita, pois inviabiliza a sua função. Não é possível ensinar algo sobre o qual não se tem certeza. Após trabalhar com
essas habilidades verbais, o professor pode chegar à sistematização
das formas verbais e as suas flexões, já que o exercício pede a utilização de um tempo e modo verbais que podem não ser de domínio
de todos os alunos. É interessante notar que não se exclui a sistematização dos conteúdos gramaticais, não se exclui o ensino de gramática, apenas consideramos mais inteligente, como estratégia de ensino, partir do texto, do gênero textual, da sua função discursiva para
chegar aos elementos lingüísticos que nele atuam e à descrição dos
constituintes gramaticais.
Outro conteúdo que poderia ser trabalhado a partir da receita,
embora não tenha sido trabalhado nessa apostila por se tratar de um
assunto do final do programa, é a coordenação das orações. Note que
a receita é um gênero prototípico para esse tipo de organização sintática, visto que há uma seqüencialidade nas ações e uma lista do que
deve ser feito. Geralmente, as estruturas subordinativas que costumam ser utilizadas nesse gênero denotam um conteúdo semântico relativo ao tempo em que as ações devem ser feitas e ao modo como
elas devem ser feitas.
Poderia ser discutida também a noção de subordinação psicológica, uma vez que as ações não podem ser invertidas, pois obedecem a uma ordem lógica no mundo. Por exemplo, no trecho: “Bata
as claras em neve, misture e leve à geladeira”, não é possível levar à
geladeira antes de transformar a gema do ovo em claras de neve. Esse conteúdo, além de interessante, é importante, pois o aluno geralmente confunde a definição de coordenação trazida pelas gramáticas.
Apregoa-se que são orações independentes do ponto de vista sintático, característica também utilizada para diferenciá-las das orações
subordinadas. Contudo, por vezes, os alunos não conseguem apreender bem que elas são independentes apenas do ponto de vista sintático, ou seja, estrutural, e levam essa definição para o plano do conteúdo, inferindo que os sentidos veiculados por essas orações não mantêm relação entre si, o que fica totalmente refutado quando trabalhamos com um texto, como uma receita, por exemplo. Cumpre destacar ainda que tal prática vai ao encontro do nosso objetivo de deixar
o ensino de língua mais atrativo. Coordenação e subordinação são
assuntos que não despertam muito o interesse dos alunos, visto que
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eles, imediatamente, associam tais conteúdos à memorização de nomes e à classificação de estruturas. O mesmo acontece com o estudo
dos verbos. Essa estratégia mostra-se muito boa não só no ensino obrigatório, mas também em um pré-vestibular, pois é importante
manter o aluno motivado e interessado ao longo do ano.
Por fim, gostaríamos de ressaltar a validade do último exercício no qual há um pedido para que o aluno escreva a parte da receita,
formando um parágrafo. Para a resolução desse exercício, ele terá de
lançar mão dos mecanismos coesivos, observando a relação lógica
entre as sentenças a fim de não lhes modificar o sentido. Um exercício aparentemente simples, mas que envolve conteúdos não tão claros para o aluno como os mecanismos de coesão textual. Como o
texto a ser produzido é de um tamanho pequeno, fica mais fácil de
ele perceber como atuam os recursos coesivos.
Para além do gênero: o intergênero
A intergenericidade ou a intertextualidade intergêneros (Cf.
Marcuschi, 2002, p. 31) é o processo pelo qual um gênero pode assumir a forma de outro gênero ou pode acontecer uma mescla de gêneros de acordo com intenção comunicativa do autor. Tal fenômeno
não é raro e pode ser verificado em crônicas, tirinhas, anúncios e em
outros gêneros textuais. Analisemos o exemplo a seguir, retirado de
uma das nossas apostilas:
Amigo(a), se você ama o Brasil Leia até o final! Leiam este apelo e
façam o possível e o impossível para atender. Agradeço a sua prestimosa
colaboração. Por favor, leiam com muita atenção!!!!
AVISO URGENTE !!!
A Toda Sociedade Brasileira. Precisamos da sua ajuda!!!
O “P.C.C.” seqüestrou um grupo completo de deputados do: PSDB,
PT, PTB, PL, PPB e PMDB. Estão solicitando US$ 1.000.000,00 para
sua libertação.
Se o pagamento pelo resgate não for cumprido dentro das próximas
24 horas, os seqüestradores vão banhá-los com combustível e os queimarão vivos. Estamos organizando uma coleta e necessitamos da sua ajuda
!!!!!!
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Veja o que conseguimos até agora:
-580 litros de Gasolina Aditivada
-320 litros de gasolina Premium
-125 litros de diesel
-175 de gasolina convencional
-38 caixas de fósforos e...
-21 isqueiros
OBS: Não mandem álcool, pois o mesmo pode ser consumido pelos
deputados!...
Aceita-se também botijão de gás.
Se você apagar essa mensagem, é porque não tem coração e não ama
o Brasil ... Por favor, leia e ajude.
O BRASIL PRECISA DE VOCÊ!!!
Repasse este apelo para 10 pessoas urgentemente!!!2
Esse texto, em princípio, articula-se como um apelo, um pedido ao leitor como aqueles que anunciam pessoas desaparecidas ou
seqüestradas. Geralmente, são constituídos de seqüências argumentativas e injuntivas que visam ao convencimento e à ordenação para
que os leitores sigam as instruções contidas no texto a fim de que o
autor atinja seu objetivo (de encontrar entes queridos). Devido a essa
situação, na maioria das vezes, são textos de caráter sério. No texto
em questão, trata-se de um suposto seqüestro de deputados de diversos partidos.
No entanto, ao prosseguimos com a leitura do texto, vemos
que a lista organizada a fim de ajudar os possíveis seqüestrados não
busca a libertação deles, mas a morte dos mesmos, o que produz humor no texto, caracterizando-o como uma piada. Logo, o leitor não
levará a sério o pedido, pois o sabe que o objetivo desse gênero é
somente o humor, zombar de fatos ou situações políticas. Temos
nesse exemplo uma mescla de gêneros textuais, como a piada, o ape2
Texto retirado da apostila de conteúdos do CPV- NI, volume 3.
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lo, a lista de itens necessários para a suposta queima dos deputados,
etc. Contudo, pode-se perceber que os gêneros em questão funcionam em conjunto, de modo a construir uma relação em que um está a
serviço do outro. Esse texto, portanto, constitui uma amostra do que
foi caracterizado acima como intergenericidade ou intertextualidade
intergêneros. Trabalhar com o intergênero em sala de aula é, fundamentalmente, trabalhar com a capacidade de leitura dos alunos e percepção da forma e composição dos gêneros como já foi discutido aqui. Além disso, é possível criar uma ponte entre o intergênero e a
intertextualidade.
A IMPORTÂNCIA SOCIAL DA INTEXTUALIDADE
E INTERDISCIPLINARIDADE NO CURSO PRÉ-VESTIBULAR
DE NOVA IGUAÇU
Barthes: “Todo texto é um inter-texto;
outros textos estão presentes nele,em níveis variáveis, sob formas mais ou menos
reconhecíveis [...]”
Intertextualidade: uma ponte recriada ou criada?
Segundo Koch e Elias, a intertextualidade é o fenômeno que
ocorre quando, em um texto, se insere outro já produzido, resgatando
à memória social de uma coletividade. Assim,
A intertextualidade é elemento constituinte e constitutivo do processo de escrita/ leitura e compreende as diversas maneiras pelas quais a
produção/recepção de um dado texto depende de conhecimentos de outros textos por parte dos interlocutores. (Koch & Elias, 2006).
É considerável também falar da Polifonia visto que é um fenômeno que engloba o intertexto. Em Problemas da Poética de Dostoiévski (1970), Bakhtin caracteriza a polifonia como a multiplicidade de vozes e consciências independentes e distintas que representam
pontos de vista sobre o mundo. Ela representa o diálogo que se estabelece entre visões diferentes de mundo. Diante de tal definição, as
várias vozes existentes em cada texto, explícita ou implicitamente,
possibilitam novas construções de sentido e, assim, o professor deve
– consciente de sua subjetividade e das marcas discursivas que a re-
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fletem – criar espaços que levem os alunos a interagir. Ou seja, em
lugar de sujeito passivo, o aluno deve ter chance de assumir um papel mais ativo, de maneira a permitir que ele possa se apropriar das
informações presentes nos textos, estabelecendo uma rede de correlações com base em sua própria cultura e relacionando-a com culturas alheias.
Por que pensar o intertexto nas aulas do curso pré-vestibular?
Sem dúvida, refletir sobre o texto é pensar a proposta dos
PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) que propõe uma mudança
nos rumos do nosso ensino, remetendo-nos a uma escola que precisa
propiciar mecanismos que garantam ao discente o exercício de sua
cidadania, a partir do reconhecimento e da identificação das diversidades existentes na Língua. Portanto, torna-se indispensável que o
professor tenha preocupações não apenas com a transmissão de conteúdos gramaticais, mas também com sua própria visão sobre língua
e de como ela influencia a formação de seus alunos.
Essa conscientização docente compõe o tecido social com informações que estabelecem um vínculo pertinente aos sujeitos/alunos e que lhes conferem uma identidade como grupo. Logo, o
que se encontra em jogo é a competência cultural dos indivíduos, visando à formação dos discentes de modo que estejam aptos não só
nas provas de concursos, escolas, exames de vestibular, etc., como
também obterem condições de potencializar sua competência lingüística e interpretativa de modo amplo.
A intertextualidade no mundo social como meio de diálogo.
Observe os textos que se seguem:
TEXTO I
Letra do Hino Nacional Brasileiro
I
Ouviram do Ipiranga as margens plácidas
De um povo heróico o brado retumbante,
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E o sol da Liberdade, em raios fúlgidos,
Brilhou no céu da Pátria nesse instante.
Se o penhor dessa igualdade
Conseguimos conquistar com braço forte,
Em teu seio, ó Liberdade,
Desafia o nosso peito a própria morte!
Ó Pátria amada,
Idolatrada,
Salve! Salve!
Brasil, um sonho intenso, um raio vívido
De amor e de esperança à terra desce,
Se em teu formoso céu, risonho e límpido,
A imagem do Cruzeiro resplandece.
Gigante pela própria natureza,
És belo, és forte, impávido colosso,
E o teu futuro espelha essa grandeza
Terra adorada,
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!
Terra adorada
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!
TEXTO II
Num posto da IPIRANGA, às margens plácidas,
De um VOLVO heróico BRAHMA retumbante
SKOL da liberdade em RIDER fúlgido
Brilhou no SHELL da Pátria nesse instante.
Se o KNORR dessa igualdade
Conseguimos conquistar com braço FORD
Em teu SEIKO, ó liberdade
Desafio nosso peito à MICROSOFT
O PARMALAT, MASTER CARD, Salve a SHARP
AMIL um sonho intenso, um rádio PHILIPS
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De amor e LUFTANSA a TERRA desce
INTEL formoso céu risonho OLYMPICUS
A imagem do BRADESCO resplandece
GILLETTE pela própria natureza
És belo FORD impávido colosso
E o teu futuro espelha essa GRENDENE
CERPA gelada
Entre outras mil é SUVENIL, COMPAQ amada.
Do PHILCO deste Solo és mãe DORIL,
COCA-COLA, BOM BRIL.3
Baseado nos textos acima, pode-se perceber que essas referências nacionais são socialmente compartilhadas em forma de diálogo entre os diferentes textos, que, por sua vez, remetem a universos
de experiência e a domínios culturais diferenciados do aluno como,
por exemplo, o contexto histórico em que ambos os textos estão inseridos. A esse fenômeno dá-se o nome de intertextualidade. Ademais,
o enriquecimento cultural que o aluno constrói ao interpretar tais textos é com certeza uma das melhores formas de fazer dele um cidadão
reflexivo.
Uma outra forma de buscar o intertexto aparece com evidência no campo da literatura, visto que a intenção dos contos, romances
etc., está no fato de, além de refletir o censo crítico do estudante/ aluno, obriga-o, numa concepção ampla, a expor sua manifestação
textual-discursiva como condição necessária do ser humano.
Tomemos por base o excerto a seguir:
TEXTO III
O MENOR CONTO DE FADAS DO MUNDO
Era uma vez um rapaz que pediu a uma linda garota:
- Você quer casar comigo?
Ela respondeu:
- NÃO!
Aí, o rapaz viveu feliz para sempre, foi pescar, jogou futebol, conheceu muitas outras garotas, visitou muitos lugares, foi morar na praia,
comprou outro carro, mobiliou sua casa, estava sempre sorrindo e de
3
Texto retirado da apostila do CPV-NI Volume II, de autor desconhecido.
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bom humor, nunca lhe faltava grana, bebia cerveja com os amigos, chegava a hora que queria e ninguém mandava nele.
A moça teve celulite, estrias e varizes; os peitos caíram, a bunda
murchou e ficou sozinha.
FIM!4
Nessa linha, o jogo intertextual que o conto promove através
de frases e expressões cria vários efeitos de sentido na (re) elaboração de uma visão de mundo. Esse jogo se constitui tanto numa estratégia de argumentação como numa forma de captação de outros textos do público alvo que, no nosso caso, é o aluno do CPV- NI.
O texto O Menor Conto de Fadas do Mundo foi trabalhado
em sala de aula e mostrou-se bem produtivo, visto que foge à prática
social comum de que qualquer conto, no qual o final feliz é uma característica comum, esperada. O conto encaminha o aluno a uma interpretação diferente da corriqueira; no entanto, este direcionamento
de leitura do autor só é possível ser percebida pelo leitor caso este
tenha um prévio conhecimento sobre textos do gênero-conto.
Observando a grande importância intertextual, os professores
do CPV-NI procuraram, por meio de exercícios, direcionar os alunos
de modo que a interpretação fundisse dois objetivos: análise lingüística e interpretação crítica do aluno.
1- O texto acima, requintado de humor, mostra um conceito de felicidade, muitas vezes, ignorado pela maioria das pessoas, exemplificado nas
atitudes do rapaz diante das armadilhas da vida. Sobre isso, podemos afirmar que:
a- O comportamento do rapaz demonstra melancolia diante do não de
sua amada – para ele, é impossível ser feliz sem o outro.
b- O comportamento do rapaz demonstra resignação diante da resposta
negativa – para ele, felicidade é saber esperar pacientemente.
c- O comportamento do rapaz demonstra uma visão ampla acerca da felicidade – para ele, a felicidade está na capacidade de superação.
e- O comportamento do rapaz demonstra que a felicidade é uma via de
mão única – para ele, a felicidade é condicional.
4
Texto retirado da apostila do CPV-NI Volume III.
19
02- “Na tradição gramatical brasileira, o estudo dos conectivos tem visado, principalmente, à análise do período composto, sem qualquer preocupação com o papel desses elementos de ligação” – (KOCH, Ingedore
Villaça. “Apresentação”. In: Articulação textual na literatura infantil e
juvenil. Rio de Janeiro: Lucerna, 2003). Como se pode ver, por meio da
citação e do próprio texto, o articulador “aí” não é um vício de linguagem como apregoam alguns gramáticos, e sim um importante articulador
textual, cuja função é ligar não só períodos compostos, mas também parágrafo se até mesmo estruturas maiores, mantendo, assim, a coesão do
tecido textual. Isso mostra que a seleção aleatória dos conectivos produz
efeitos de sentido no processo da construção do texto. A opção que tem o
mesmo sentido do “aí” no texto é:
a- A chuva inundou a plantação, submergiu as casas, AÍ os moradores
ficaram desabrigados, AÍ perderam tudo que tinham.
b- Era uma vez uma princesinha que morava em um castelo, AÍ, um dia,
foi raptada pelo dragão...
c- Os dois se amavam muito; começaram a viver um grande romance.
AÍ tudo terminou de repente: só sabiam brigar.
d- Pegue dois ovos, AÍ tire as gemas, AÍ misture com a farinha de trigo
e, AÍ coloque um pouco de leite e pronto.
O que o professor junto ao aluno deve retirar desse conto?
Em primeiro lugar, o docente não deve fechar as várias leituras que o
texto promove para os leitores, mas sim encaminhá-los a uma e, posteriormente, deve ficar claro para os discentes que todo texto é formado a partir de outros, constituindo a intertextualidade. Por fim, um
texto não possui um sentido acabado, ou seja, está em constante
construção e recebe novos sentidos de acordo com o sujeito que o lê,
já que este, para estabelecer ditas relações, deverá “acrescentar-lhe”
seu próprio conhecimento de mundo.
A interdisciplinaridade:
origem e aplicação no processo de ensino-aprendizagem.
Essa idéia e a proposta pedagógica contida na interdisciplinaridade são trazidas por Georges Gusdorf no final da década de 60.
Este autor influenciou os dois maiores teóricos brasileiros: Hilton
Japiassu e Ivani Fazenda, sendo que o primeiro veio a trabalhar o
conceito no que denominamos campo epistemológico, enquanto Fazenda continua a produzir uma obra extensa no campo pedagógico.
São esses dois teóricos que influenciam praticamente toda produção
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bibliográfica sobre a interdisciplinaridade no Brasil. E é com base
neste último que iremos conduzir a análise.
Desde há muito, a proposta fundamental no contexto interdisciplinar foi apresentar um saber unificado à necessidade humana. Isso só se evidencia caso o fenômeno seja mostrado pelas diversas vias
de desenvolvimento das ciências para uma construção. Dessa forma,
qualquer estudante consegue resgatar suas origens embora de modo
tímido e subjetivo.
Cabe, contudo, ao professor esclarecer todo o processo da origem humana, possibilitando uma nova visão das disciplinas distintas que se entrelaçam como: História, Linguagem, Biologia, entre
outras.
Qual é a importância do estudo interdisciplinar no curso prévestibular? Esse fenômeno pode e deve, com a participação do professor, levar o aluno a se defender como um novo tipo de pessoa,
mais aberta, mais flexível e isso atualmente tem relevância à polivalência pessoal, porque o maior pecado que se pode cometer ao discente é pôr limite em sua capacidade interdisciplinar. Nesse caso, ela
traduz um novo olhar, que permite compreender e transformar o
mundo, na busca pela reconstrução do saber.
Na verdade, a questão da interdisciplinaridade deve ser responsabilidade da escola, sobretudo. Em termos mais específicos, fica evidente uma cobrança direcionada aos professores de Língua
Portuguesa, já que a representação do mundo sócio-cultural se dá através da Língua. Dessa forma, qualquer disciplina escolar, sem dúvida, depende “da linguagem para desenvolver... sua disciplina”
(PCN, 1998, p. 31).
Baseado nos PCN, a equipe de Língua Portuguesa buscou, em
termos práticos, elaborar um material didático que unisse diversas
áreas a fim de que o aluno utilize as diversas ciências em sua prática
social.
Além disso, esse processo contribuiu para o desenvolvimento
da escrita. E nisso, os docentes de outras matérias cooperaram de
modo eficaz para tal questão. Tal procedimento é baseado nos PCN
que diz: “É tarefa de todo professor independente da área ensinar
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os procedimentos de que o aluno precisa dispor para acessar os
conteúdos da disciplina que estuda” (PCN, 1998, p. 32).
E foi pautado, nesse procedimento, que o mestre atingiu dois
objetivos fundamentais no processo ensino-aprendizagem do PréVestibular de Nova Iguaçu: o incentivo à produção textual por meio
de resumos, esquemas, roteiros de aula, entre outros e a fusão interdisciplinar entre a Língua Portuguesa e outras disciplinas, tendo em
vista que a produção de textos deve estar presente na aula de outras
matérias, através da elaboração de minitextos de respostas, redações,
etc. Assim, o discente estará inserido de maneira graciosa no mundo
biossocial que o cerca.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscamos apresentar, nestes dois artigos, de que forma o trabalho com a diversidade de gêneros textuais e com a intertextualidade pôde proporcionar aos alunos do CPV-NI um olhar mais crítico
sobre a realidade que os cerca, além de expor a pertinência destes
dois tópicos no que diz respeito ao aperfeiçoamento da capacidade
interpretativa dos alunos e, conseqüentemente, na melhora de seu desempenho na disciplina de Língua Portuguesa.
No que concerne à inserção de variados gêneros textuais no
ensino de Língua, procuramos evidenciar de que forma a capacidade
comunicativa de nossos alunos está intimamente relacionada a sua
interação com a sociedade, interação esta que se constitui por muitas
vezes através de textos caracterizados por diferentes composições,
estilos ou conteúdos. Assim, tornar íntima a relação de nossos alunos
com esta gama de gêneros textuais, significa, sobretudo, oferecer
condições para que eles sejam falantes/leitores mais competentes.
Como prática educacional, o fenômeno da intertextualidade
no CPV-NI foi trabalhado de maneira eclética. É evidente que não só
priorizamos nessa árdua jornada o “texto como produto de sua relação com outros textos” (Soares, 2005), mas sim como estratégia interacional entre aluno e texto, sendo atribuída à leitura sempre um
novo olhar acerca do texto (re)produzido.
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Vale salientar também que o estudo intertextual deve ser trabalhado com os discentes numa perspectiva coletiva abordando as
diferentes ciências. Por conseguinte, os mestres puderam focalizar as
transformações sociais não só na linha interdisciplinar, como também intertextual, tornando eventualmente o saber de seu discípulo
mais produtivo e o ajudando a verificar os saberes.
Ademais, foi através do incentivo à leitura e escrita que os
docentes buscaram atingir as diversas áreas as quais compõem o tecido social dos discentes. Em virtude disso, o professor deve fazer da
leitura o elo entre sala de aula e sociedade e nós, professores do prévestibular de Nova Iguaçu acreditamos, baseados em uma nova metodologia de ensino, oferecer não só uma tentativa de tornar o ensino
mais atraente para o aluno, mas também torná-los cidadãos mais críticos e conscientes do espaço em que vivem.
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