MINHA VISÃO DO CAP
6 - COLÓIDES MICELARES
Existem várias classificações de sistemas coloidais.
A classificação dos sistemas coloidais quanto à estrutura da partícula, os separa em
dois grupos: os moleculares e os micelares. Já a sua classificação quanto à energia
termodinâmica os divide em três grupos:
- dispersões coloidais, irreversíveis e instáveis;
- soluções verdadeiras de macromoléculas, reversíveis e estáveis;
- colóides de associação, reversíveis e estáveis.
Pode-se observar que os sistemas coloidais moleculares, que são as soluções
verdadeiras de macromoléculas as quais, na qualidade de soluções verdadeiras, são estáveis e
termodinamicamente reversíveis. Esses sistemas se comportam como sistemas coloidais em
virtude de suas partículas constituíntes terem pelo menos uma de suas dimensões
compreendida na faixa 10-9 a 10-7 m (1 a 100nm).
Todos os outros tipos de sistemas coloidais são ditos micelares, ou seja, colóides de
associação, porque sua micela é constituída por associação de moléculas até um conjunto
(micela) cujo tamanho esteja compreendido na faixa acima.
Entretanto, nesses tipos de sistemas coloidais (micelares) podem ser distinguidos
perfeitamente dois grandes e importantes grupos, cujas formações, natureza, estabilidade e
comportamento termodinâmico são totalmente diferentes.
O primeiro desses grupos se refere aos colóides de associação formados por
aglomeração de moléculas simples, através de complicado processo termodinâmico, qual seja,
a nucleação (formação dos núcleos das partículas da nova fase) e o crescimento (deposição de
novas moléculas na superfície desses núcleos até atingir o tamanho coloidal). São as
chamadas dispersões coloidais, que são termodinamicamente irreversíveis e instáveis devido a
sua alta tensão interfacial, razão pela qual apresentam forte tendência a crescer
indefinidamente e a coalescer para diminuir sua energia interfacial, o que os leva a se separar
em fases macroscópicas novamente. Por essa razão, são tipicamente liófobos, e são
primordialmente inerentes aos sistemas inorgânicos. Em virtude de sua forte tendência a
coalescer (devido à alta tensão interfacial) só se tornam estáveis pela adição ao sistema, de um
terceiro componente de polaridade intermediária, que tende a diminuir a diferença de
polaridade na interface partícula-meio (regra da igualação de polaridades de Rebinder) que,
por essa razão, é um agente tensoativo de interface, também chamado peptizante.
O segundo grupo se refere aos colóides de associação formados por aglomeração de
moléculas de substâncias tensoativas (STA), que são moléculas que apresentam difilia
marcante, isto é, uma parte (cabeça) polar, com alta hidrofilia, e uma longa cadeia
hidrocarbonada apolar, com alta oleofilia (hidrofobia). Esses sistemas são
termodinamicamente estáveis e reversíveis. Portanto, não precisam de estabilização
complementar por agente peptizante, por já apresentarem baixíssima tensão interfacial micelameio.
Por essa razão, os sistemas coloidais formados por associação de moléculas de
substâncias tensoativas em micelas, são os representantes típicos dos sistemas coloidais
liófilos.
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Nem todas as substâncias tensoativas têm capacidade de formar micelas, só as que têm
relações ótimas entre a parte polar e a parte apolar das moléculas, isto é, certos valores de
HLB (balanço hidrófilo-lipófilo), também chamado EHL (equilíbrio hidrofilia-lipofilia).
A associação em micelas, dependendo do HLB da substância tensoativa e da
polaridade do meio de dispersão (hidrofílico ou oleofílico) pode se dar de forma direta ou
inversa. Quando dissolvidas em meio polar, as substâncias tensoativas se unem pelas cadeias
orgânicas apolares (hidrófobas) ficando com as cabeças polares (hidrofílicas) na parte externa
da micela, protegendo o núcleo apolar do contato com o meio de dispersão polar. Já no meio
apolar, as substâncias tensoativas se unem pelas cabeças polares, formando o núcleo das
micelas inversas, por fortes ligações químicas, ficando com as cadeias orgânicas apolares na
parte externa das micelas, protegendo o núcleo polar do contato com o meio de dispersão
apolar.
As micelas diretas já são amplamente estudadas e conhecidas na ciência dos colóides.
Já o estudo das micelas inversas é pequeno, e a maioria das citações sobre elas são feitas
através de comparações e referências às diretas. As citações de maior interesse para o presente
trabalho são reproduzidas a seguir:
a) as soluções de substâncias tensoativas muito diluídas agem como eletrólitos, mas
em concentração razoável, ocorrem variações bruscas nas propriedades físicas (pressão
osmótica, condutância, turbidez, tensão superficial, e outras). A baixa velocidade de
crescimento da pressão osmótica com o aumento da concentração sugere considerável
associação de partículas, mas ainda há dissociação iônica, pois continua havendo condutância.
Esse comportamento anômalo foi explicado por Mc Bain através da associação em micelas;
b) importante característica na propensão da substância tensativa de formar micela é a
capacidade de seus grupos polares de proteger o núcleo hidrocarbonado da água, que é função
não só do tamanho, mas também de sua natureza e do caráter da interação com o solvente;
c) a concentração de equilíbrio da substância que se encontra em solução aquosa em
forma molecular ou iônica é pequena, sendo da ordem de 10-3 mol/l para as iônicas e muito
menor ainda para as não iônicas;
d) a concentração de substância, acima da qual ocorre a formação de micelas é
chamada concentração micelar crítica (cmc);
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e) a cmc só depende da natureza da parte liófoba da substância tensoativa. Se a micela
tivesse algum tipo de arranjo cristalino, os grupos polares também teriam importância;
f) para as substâncias tensoativas formadoras de micelas, a cmc é muito pequena (106
a 10-2 mol/l), isto é, o equilíbrio micela  solução, corresponde a baixas concentrações de
soluções moleculares, evidenciando que partículas com d  dM se tornam
termodinamicamente desvantajosas, ou seja, a transição de partículas com dM (tamanho da
micela) até d (tamanho da molécula) é acompanhada de aumento na energia livre do sistema,
que mostra que a curva  X log d tem um mínimo em dM. Portanto, esse aumento de 
pode ser condicionado pelo brusco aumento da tensão interfacial ();
g) o caráter hidrofílico do envoltório que protege o núcleo apolar do contato com a
água, faz com que a tensão interfacial () no limite micela-meio fique rebaixado até   C
justamente o que condiciona a estabilidade termodinâmica dos sistemas micelares;
h) o tamanho das micelas quando se formam é fixo e definido e só depende da
natureza da parte apolar da molécula de substância tensativa. O raio deve ser levemente
menor que o comprimento da cadeia, o que é comprovado por estudos ópticos. Com
tensoativos de cadeia normal há relação entre o número de monômeros por micela e o número
de átomos de carbono da molécula, que dá o grau de associação, cuja expressão é:
N =
N
N
0,139
. (1,25.n - 1)3
n
onde:
é o número de cadeias na micela;
é o número de átomos de carbono na molécula;
i) importantíssima característica dos sistemas coloidais liófilos é que a distribuição de
equilíbrio das partículas em função do tamanho, não varia com o tempo;
j) diminuíndo o número de monômeros na micela também diminui o tamanho, logo,
aumenta a proporção de substância apolar na superfície de separação, pelo que diminui o grau
de proteção do núcleo pelos grupos polares, o que aumenta muito a tensão interfacial. O valor
ótimo para o raio de uma micela é aproximadamente o valor do comprimento da cadeia
orgânica da STA formadora da micela (r  ℓMOL );
k) com o aumento da concentração de STA, além de aumentar a concentração de
micelas esféricas, também tem lugar sua gradativa troca de forma, pois o aumento de “r”
torna a micela esférica instável (entra grupo polar no núcleo apolar). Com isso, as micelas se
tornam anisométricas (elipsoidais e cilíndricas) e depois assimétricas (formas de bastão, de
cinta e laminares) com assimetria marcante. Na fluência de soluções de substâncias
tensoativas que têm micelas de Mc Bain, há desvio da lei de Newton. A existência de micelas
de Mc Bain é confirmada experimentalmente por métodos ópticos, reológicos e raios X. As
propriedades superficiais das micelas assimétricas é dissímile: parte com o núcleo bem
protegido e parte não. Com o aumento do conteúdo do tensoativo (ou com a diminuição do
meio) a mobilidade das micelas diminui e elas se engancham pelos setores terminais
formando uma rede volumétrica, ou seja, uma estrutura de coagulação (GEL);
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l) acima da cmc, toda nova molécula de substância tensoativa introduzida no meio,
passa ao estado micelar aumentando a concentração de micelas e a concentração da substância
tensoativa molecularmente dissolvida fica constante e igual à cmc, conforme a expressão;
CMIC = C0 - CMOL = m .
n
N
MIC
onde:
Cmol = cmc
A
m) o potencial químico das moléculas da substância tensoativa no sistema não varia.
Como a tensão superficial fica constante e é determinada pela quantidade de substância
tensoativa em forma molecular, torna-se claro que para c0  cmc, então  fica constante.
Como a equação de Gibbs nos dá: d = -  . d, vê-se que se d é igual a zero é claro que d
é igual a zero, o que impõe que para concentração maior que a cmc, o potencial químico
permanece constante;
n) a agitação térmica e a repulsão elétrica das superfícies se opõem à agregação. Por
isso, uma baixa cmc deverá ser favorecida por: abaixamento da temperatura, adicionando sais
que reduzem as forças repulsivas e aumentando a cadeia em uma série homóloga. Cada novo
CH2 na cadeia diminui a cmc pela metade;
o) as investigações mostram que a formação de micelas tanto por dispersão como por
condensação, só se dá acima de determinada temperatura, chamada ponto de Kraft (Tk).
Abaixo do Tk a solubilidade é pequena e fica menor que a cmc. Para substâncias com Tk alto
normalmente não se observa a formação de micelas. Os tensoativos não iônicos, que são
líquidos, não apresentam Tk e sim ponto de turvação;
p) os tensoativos formadores de micelas, como os ordinários, seguem a regra de
Duclaux-Traube, isto é, com o aumento de cada CH2 na cadeia a solubilidade diminui
enquanto a atividade superficial aumenta 3 a 3,5 vezes. Como próximo a Tk o valor da cmc se
diferencia muito pouco da solubilidade molecular, a cmc também diminui 3 a 3,5 vezes ao
passar ao homólogo seguinte;
q) a formação de micelas é geralmente um processo exotérmico, logo, favorecido pelo
abaixamento de temperatura. Entretanto, há casos em que a entalpia de formação, ou seja,
HMIC = - R T2 . m .
d . ln .cmc
d .T
é positiva (endotérmica). Nesse caso a formação de micelas é função exclusivamente da
entropia;
r) a adição de quantidades grandes de substâncias orgânicas polares dificulta a
formação de micelas, porque aumenta a solubilidade molecular. Mas, a adição de
pequeníssimas quantidades delas, ou de hidrocarbonetos apolares, leva à diminuição da cmc,
isto é, facilita a formação de micelas. É o fenômeno da solubilização direta. A solubilização
relativa é a relação do número de moles da solubilizada (NSOL) pelo número de moles de
tensoativo em estado micelar (NMIC): s =
N
N
SOL
. Quando as micelas são esféricas, s é
MIC
constante. Com o aumento da concentração as micelas ficam assimétricas e s aumenta muito,
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com a micela voltando a ser esférica. Durante o contato da solução micelar com o
hidrocarboneto (em fase macroscópica, quando há excesso da substância que se solubiliza) há
uma distribuição de equilíbrio do hidrocarboneto entre sua fase macroscópica, a solução
aquosa verdadeira e as micelas, que é dependente da temperatura, sendo esta dependência
descrita pela equação:
 H SOL
d . ln .s
=
2
dT
R.T
onde:
s
é a solubilização relativa;
dHSOL é a entalpia de solubilização, que é determinada pela variação de energia
envolvida na transição do hidrocarboneto da fase macroscópica até as micelas e também pela
reestruturação das próprias micelas durante a solubilização. Caráter diferente tem a
solubilidade de substâncias orgânicas polares inclusive as que não formam micelas. A
existência de difilia faz com que as moléculas que se solubilizam se incluam na estrutura da
micela, gerando as micelas mistas.
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Colóides Micelares - Francisco Guerreiro Martinho