As Desventuras da Burocracia Oligárquica que Domina o PT “A política é como a perfuração lenta de tábuas duras. Exige tanto paixão como perspectiva”. (Max Weber) *Tássia Rabelo e Bruno Roger Considerando a proximidade do início de um processo congressual que se estenderá durante quase quatro meses, no qual a Juventude do PT terá o desafio de debater seu rumo estratégico, organização interna, bem como renovar suas direções, a maior parte das forças políticas que constroem esta organização considerou fundamental elaborar um balanço coletivo, não apenas sobre a última gestão da Secretaria Nacional de Juventude eleita em 2011, mas também sobre a opção política adotada pela direção do partido na relação com sua juventude. Dada a ausência de debate na instância nacional, os grupamentos internos do PT: Articulação de Esquerda, Esquerda Popular e Socialista, Movimento de Ação e Identidade Socialista (MG e AP), Mensagem ao Partido, Movimento PT, Militância Socialista, Partido dos Trabalhadores de Lutas e de Massa (AP) e Tribo (MG), construíram ao longo de aproximadamente duas semanas uma síntese que unificasse essas forças políticas em um balanço. Em meio a este processo foi publicado um texto (http://migre.me/r7IO6) assinado pelo Secretário Nacional da Juventude do PT que fazia uma compilação do que afirmava serem feitos de sua gestão. Diante do conteúdo, que na nossa avaliação se distanciava da realidade concreta da JPT, consideramos ainda mais importante expressar nossa opinião sobre o atual estado de coisas e, assim o fizemos. Elaboramos um texto (http://migre.me/r7ITH) crítico que resgatava o processo de debate que levou à convocação do I Congresso Nacional da JPT, bem como a opção realizada pela Juventude do PT de construir uma organização de massas e com autonomia política, à altura dos desafios de nosso tempo. Apontamos ainda que ao longo dos últimos anos, a energia presente em 2007 e 2008 foi soterrada por uma recomposição burocrática de domínio sobre a juventude petista. Ousadia e inovação foram substituídas por subserviência e estagnação. O balanço apontava a derrota prática da concepção de juventude que havia sido vitoriosa no interior da JPT, mas encontrava resistência no seio da direção majoritária do partido. Dizia ainda que como conseqüência desse processo, pode-se mencionar o alheamento da Juventude do PT da disputa da sociedade, dos movimentos de juventude e das lutas políticas em curso. Isto é, acompanhamos a transformação da JPT em uma estrutura altamente burocratizada. Em meio à crise política mais profunda da história do PT e após as jornadas de junho de 2013, a implementação das cotas geracionais no partido, as eleições 2012 e 2014, e tantos outros acontecimentos do último período, ressaltamos que uma gestão de quatro anos, personalista, distante da base, e que não deu conta das principais demandas apontadas pelo II Congresso da JPT, serviu para aprofundar ainda mais a distância entre nossa organização de juventude e a sociedade. Buscando compartilhar nossas posições com o conjunto da militância, solicitamos na terça-feira (04 de agosto), que nosso balanço fosse publicado no site nacional do PT, recebemos o retorno de que este seria publicado, mas ao término do dia o texto não estava disponível. Fiando-nos na boa-fé dos atores envolvidos, no dia seguinte perguntamos quando o texto iria para o ar e nos deparamos com a reposta de que havia a orientação de que os textos polêmicos seriam publicados em um hotsite específico da JPT quando este ficasse pronto. Ao menos duas questões podem ser imediatamente levantadas: de onde partiu tal orientação? E quem define o que é uma polêmica? Sobre a orientação, nos foi informado que seria da JPT, instância que compomos e na qual nenhuma orientação desta natureza foi debatida. Mais uma vez, contando com a boa-fé alheia, questionamos aos integrantes da executiva nacional da JPT que não subscreviam o balanço, se essa orientação havia sido expressa. Primeiramente fomos solenemente ignorados, e depois informados que se tratava de um equívoco, mas ainda assim o texto não foi publicado. Sobre o segundo ponto. Para nós, militantes do Fora da Ordem que assinamos o balanço crítico, há muitas afirmações no texto de balanço anterior que poderiam gerar polêmicas, dado que não há convergência na análise realizada pelas forças da JPT. Por exemplo, não há acordo de que II CONJPT foi um grande Congresso, nem numérica e muito menos qualitativamente; desconhecemos a “histórica aliança” entre 2012-2015, se esta existiu não contou com nossa presença; e não vimos a mencionada Caravana que percorreu o Brasil nas eleições de 2012, mas sim a marcha de um homem só, sem impacto na base, e influência nos processos em curso. Poderíamos passar todo o artigo apresentando pontos com os quais divergimos do balanço do candidato à reeleição, mas citamos poucos exemplos apenas para demonstrar que se o nosso texto pode ser considerado polêmico, o outro, prontamente publicado no site do PT, também o poderia. No fim, após uma verdadeira saga que contou com o empenho de várias forças políticas, conversas com membros da executiva nacional do PT, operadores do site, e da política de comunicação como um todo, finalmente o dito balanço polêmico foi publicado, quase uma semana depois da solicitação. Ora, se é assim, poderiam nos indagar,: se o tal texto foi finalmente publicado, porque motivo eles estão esbravejando mesmo? Seguimos criticando a postura da direção majoritária do PT porque para nós essa discricionariedade expressa na simples solicitação de publicação de um artigo no site do partido é sintomática e parte de um processo mais amplo. Trata-se de um exemplo da oligarquização em curso no partido e que mostra sua face mais perversa na JPT. O solapamento da democracia interna do PT agora se expressa em sua juventude, uma das últimas zonas de incerteza ainda existente após o processo de controle avassalador iniciado em 1995. Em momentos graves como esses, não nos faz mal recorrer aos pensadores clássicos, nem tampouco analisar experiências similares na história. Em sua análise sobre o funcionamento do Partido Social-Democrata Alemão (SPD), Robert Michels alertou, ainda em 1915, para o processo de oligarquização deste que é (ou foi) um dos principais partidos de massa da história da esquerda. Este autor postulou que o processo de oligarquização seria mais intenso quanto mais centralizada fosse a burocracia - formada por dirigentes remunerados -, e que grande parte desses militantes transformados em dirigentes/funcionários do partido, tornarse-iam financeiramente dependentes do mesmo, deixando de primar por sua ideologia, tendo antes dessa o desejo de se perpetuar no poder e garantir a sobrevivência da organização. Segundo sua formulação, o processo de oligarquização diz respeito a concentração de poderes nas mãos de uma reduzida elite partidária, autonomizada em relação à base e praticamente inamovível, com seus membros permanecendo longos períodos de tempo nos cargos e ampliando sua influência/independência com relação às massas. O antídoto para o fim da democracia interna seria, portanto, a frequente alteração dos dirigentes por meio de eleições amplamente participativas. Ao olharmos para a JPT o que vemos? Uma pujante organização democrática ou uma instância distante da base e cujos dirigentes buscam se perpetuar no poder? Quando vemos a burocracia partidária mobilizada em prol de um setor majoritário em detrimento dos demais, podemos dizer sem sombra de dúvidas que está em curso um processo em que a crítica será abafada e seus porta-vozes relegados ao gueto. Não podemos deixar que isso aconteça. Que o III Congresso Nacional da JPT seja uma atividade meramente protocolar e, acima de tudo, que a maquina partidária esteja a serviço do fortalecimento de uma única tendência em detrimento do conjunto das forças que compõem nosso partido. Reiteramos, portanto, a importância de efetivarmos mecanismos estatuários que garantam condições mais igualitárias de disputa, tal como o FEI (Fundo Eleitoral Interno), conforme abordamos em artigo anterior (http://migre.me/r8IxN). Exigimos mais democracia, mais transparência, mais coerência. Em suma, que coloquemos em prática tudo aquilo que defendemos enquanto mudanças necessárias no sistema eleitoral. Em “A Política como Vocação”, Max Weber, estabelece uma diferenciação entre os que vivem para a política e aqueles que vivem da política que pode contribuir com a nossa reflexão. Os que vivem “para” a política transformam-na no significado último de sua vida, dando a ela um caráter vocacional, enquanto os que vivem “da” política possuem uma relação meramente econômica e financeira com a sua prática. Destacamos, tal como o próprio, que essas não são realidades contraditórias, que o central não é se o político precisa receber algum vencimento para atuar, afinal com o advento da democracia de massas a política deixa de ser um espaço exclusivo da elite, mas sim se o líder político vocacionado é caracterizado por acreditar e guiar suas ações de forma responsável em prol de uma causa e não na busca por altos rendimentos ou o privilégio do poder. Nós, jovens militantes do PT, acreditamos que nossa geração tem a tarefa de recolocar o socialismo no horizonte estratégico do partido, lutar para que o PT consiga superar esse processo de degeneração burocrática, que nossos governos e nossas ações sejam firmemente voltadas aos interesses da classe trabalhadora. Definitivamente, precisamos fazer deste Congresso da JPT um espaço de discussão sobre estes temas. Um congresso que se volte para si mesmo, que não tenha a coragem de enfrentar as questões que nos afligem, e siga na linha plástica e superficial que orienta a JPT hoje, de nada servirá nem a militância nem tampouco a construção de uma saída à esquerda para a bucólica inércia que atinge nosso partido.