1 Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Faculdade de Medicina Departamento de Terapia Ocupacional Curso de Pós-Graduação em Acessibilidade Cultural André Luiz Fernandes Andries A TRAJETÓRIA DA ASSOCIAÇÃO VSA BRASIL E O PROGRAMA ARTE SEM BARREIRAS 1990 – 2004 Trabalho de monografia apresentado como requisito necessário à conclusão do Curso de Pós-Graduação Lato sensu Especialização em Acessibilidade Cultural, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Medicina, Departamento de Terapia Ocupacional, para obtenção do título de especialista. Orientadora: Dorneles Rio de Janeiro Março de 2014 Profa. Dra. Patrícia 2 Agradecimentos A professora Patrícia Dorneles, pela generosa orientação; A Andrea Chiesorin Nunes, a Magra, o incentivo para o resgate dessa história; A Valtair Romão, o Vavá, companheiro de jornada, guerreiro; Aos colegas do Curso de Especialização em Acessibilidade Cultural; A Kris, Thiago e Leopoldo, pela providencial formatação; A Astor, meu Quincas Borba, companheiro de caminhadas; A Valeria Andries, a Ursa Maior, estrela da vida inteira. 3 Resumo Narrativa sobre uma experiência de uma política pública de cultura desenvolvida no período entre 1990 até 2004 pelo Programa Arte Sem Barreiras da Associação Very Special Arts Brasil em parceria com a então Secretaria de Educação Especial (SEESP) do MEC, CORDE/SEDH e Funarte/ Ministério da Cultura. Nessa descrição algumas questões serão postas à discussão, a saber: o pioneirismo de várias entidades da sociedade civil na formulação de ações culturais para pessoas com deficiência; a criação de uma legislação sobre os direitos das pessoas com deficiência e seus efeitos numa formulação de políticas públicas educacionais e culturais; o artista com deficiência nos projetos e ações das entidades culturais não governamentais e públicas; Palavras-chave: Políticas públicas de cultura; artistas e deficiência; educação especial 4 Abstract: Narrative about an experience of a public political culture developed in the period between 1990 until 2004 by the Program Art Without Barriers of Brazil Very Special Arts Association in partnership with the then Department of Special Education (SEESP) MEC, CORDE / SEDH and Funarte / Ministry Culture. This description, some issues will be submitted for discussion: the pioneering of various civil society in the formulation of cultural activities for people with disabilities; the creation of a law on the rights of persons with disabilities and their effects in formulating educational and cultural policies; the artist with disabilities in the projects and actions of nongovernmental and public cultural entities; Key-words: Public cultural policy; artists and disabilities; special education 5 Sumário 5 Apresentação 7 Objetivo geral 9 Objetivo específico 9 Metodologia 10 Capítulo 1 Conceituação de política cultural e suas aplicações no Brasil 1.1 Conceituação e campo de estudo 12 12 1.2 Os postulados da UNESCO no Brasil 13 1.3 Cultura Viva, políticas culturais como recurso social 19 1.4 Políticas culturais: avaliações contemporâneas 20 Capítulo 2 VSA Brasil e as políticas públicas educacionais 25 2.1 Arte e Educação, as pioneiras 25 2.2 Direitos sociais e pessoas com deficiência 27 2.3. Educação, Arte e pessoas com deficiência 29 2.4 Brasília 2000 – V Congresso Nacional de Arte-Educação na Escola para todos e VI Festival Nacional de Arte sem Barreiras 34 2.5 A conquista de legislação educacional 42 Capítulo 3 As trajetórias da Associação VSA Brasil e o Programa Arte sem Barreiras 50 3.1 Primeiro ato ou primeira Ata 50 3.2 O desmonte colorido 56 3.3 Albertina Brasil Santos, breve perfil 59 6 3.4 Ação nacional, a criação dos comitês 60 3.5 Memorial, 1990- 2005 63 3.6 Celebração 15 anos, CCBB-RJ 73 3.7 Um período de recesso para balanço e reflexões 75 3.8 Cidadania cultural das pessoas e artistas com deficiência 77 Considerações Finais 85 Bibliografia 93 7 Apresentação Este trabalho monográfico que apresento à banca examinadora é um acerto de contas comigo mesmo. Também com uma centena de tantos - amigos, voluntários e colaboradores do Programa Arte Sem Barreiras. Mas há outro e mais interessante embate: homenagear a memória da professora Albertina Brasil Santos, que formulou, articulou e implementou no Brasil a mais consequente ação de política pública voltada para artistas e pessoas com deficiência. Trata-se de uma personagem universal e estrelar que, por certo, ainda será tema de estudos de maior fôlego. Este acerto de contas é o resgate de um débito narrativo que restava pendente com esse grupo de tantos. Faço aqui esse resgate, sabendo de antemão que ele é parcial, e que restam outras histórias e versões para inúmeras interpretações. Porém, o que foi determinante na consecução desta monografia foi uma inadiável necessidade publicização dos muitos acontecidos, que ficaram atados a um importante período das políticas públicas de cultura do Brasil. Aqui eles serão revistos, sob uma dupla e privilegiada mirada de um mesmo observador: sob o horizonte de uma política pública que se descortina quando observamos as ações culturais e educacionais do governo federal e, num campo de visão mais próximo, sob a perspectiva de uma entidade cultural da sociedade civil. É bom que se esclareça que esse local ou ponto de observação não foi uma exclusividade deste narrador. Pelo contrário. Por mais uma década um grupo de servidores públicos, articuladores e gestores culturais, vivenciaram conjunta e concomitantemente essas duas experiências por conta de um mesmo projeto: o Arte sem Barreiras, criado pela Associação Very Special Arts Brasil/ VSA Brasil. A dedicação desse grupo, somado a de centena de voluntários reforça uma constatação de Dagnino (2002) - na condição de organizadora da pesquisa Sociedade civil e espaços públicos no Brasil– sobre a existência de indivíduo(s) em posição-chave no interior do aparato estatal que se compromete(m) individualmente com a execução políticas e projetos. Na pesquisa, essa dedicação é apontada pela autora como determinante e avaliada pelos setores da sociedade civil como um componente decisivo na implementação bem-sucedida das várias experiências e projetos analisados. 8 Por um período fiz parte desse grupo, como servidor da Funarte e, ao mesmo tempo, voluntário, colaborador e, por fim, dirigente da Associação VSA/Brasil. Por essa dupla dedicação, tudo o que aqui será dito e impresso se faz com a pena da suspeição e a tinta indelével da paixão, o que não costuma ser admissível em narrativas com esse escopo acadêmico. É um risco a ser enfrentado, haja vista essa necessidade imperiosa de tornar público um percurso que julgo não ser apenas marcante a um profissional atuante na área cultural, mas que pode conter alguma relevância para o campo de estudo das Políticas Culturais, dada as características, singularidades e os pioneirismos do Programa Arte sem Barreiras. Assim mesmo no plural, porque também precursor nas áreas da Educação Especial e dos Direitos Humanos. Por isso, é pertinente admitir que ao estudar a performance de uma entidade cultural da sociedade civil, possamos estender e refletir nossas observações e comentários a espaços mais amplos, ao campo das políticas governamentais, quiçá às políticas de Estado, vigentes no período pesquisado. No entanto, tamanho envolvimento com um objeto de estudo costuma ser desastroso para quem o descreve e enfadonho para quem se obriga a lê-lo. Por essa razão, mesmo evocando a necessidade desse acerto de contas, é pertinente, por certo, o autor se precaver, e sempre que possível for adentrar e caminhar nesse reino de palavras- que se descortina cediço e complexo apenas nesta apresentação-, respeitando os silêncios, como aconselhou o poeta e também servidor público federal da Cultura, Carlos Drummond de Andrade1, em A procura do poema, 1945. Esta monografia é uma primeira abordagem, uma sondagem para estudos sequentes, que se faz sob a consideração de que as reflexões sobre as políticas públicas culturais nas últimas décadas do Século XX e primeira década do XXI são estudos postos num campo ainda em construção. Portanto, é razoável acautelar-se nos postulados analíticos, poupando os examinadores e leitores do verbo desnecessário, de uma pletora de 1 Carlos Drummond de Andrade (1902- 1987). Formou-se em farmácia, em Belo Horizonte, mas optou pelo jornalismo e a poesia. Em 1928, ingressou no serviço público. Na década de 1930, transferiu-se para o Rio de Janeiro para exercer a chefia de gabinete de Gustavo Capanema, Ministro da Educação de Getúlio Vargas. Sua carreira literária ganhou expressão a partir dos anos 50, sobretudo a partir de 1962, quando se aposentou e passou a se dedicar exclusivamente a uma vasta e significativa produção, que o levou a ser considerado por seus contemporâneos um dos maiores poetas brasileiros. 9 palavras e de fatos que aqui serão desbastados ou suprimidos, fugindo de assertivas imperativas e pré-concebidas. No entanto, não é recomendável valer-se de palavras evasivas e dissimulações em trabalhos com esse enunciado. Porque não convém negar o que foi vivenciado, relegando ao esquecimento uma história que pertence a muitos. São com esses tantos que essa narrativa pretende dialogar, indivíduos e entes públicos. Por isso, se impõe um postulado de Weber (1969) sobre tema similar, o problema da interpretação: (...) muitos dos “valores” e “fins” de caráter último que parecem orientar a ação de um homem frequentemente não são compreendidos por nós com plena evidência e só conseguimos captá-los intelectualmente e em certas circunstâncias, encontrando dificuldades crescentes para poder revivê-los por meio da fantasia empática, à medida que se afastam mais radicalmente de nossos próprios valores últimos. Temos, então, que nos contentar, segundo o caso, com sua interpretação exclusivamente intelectual ou, em determinadas circunstâncias – se bem que isso possa falhar – em aceitar aqueles fins e valores simplesmente como dados, e tratar logo de tornar compreensível o desenvolvimento da ação, por eles motivada, através da melhor interpretação intelectual possível, ou através de uma revivência o mais próxima possível de seus pontos de orientação” (WEBER, MAX,1969, apud Castro; Dias, 1975, p. 107) Objetivo Geral Postas essas considerações iniciais, o nosso objetivo geral é estabelecer uma narrativa sobre uma experiência de uma política pública de cultura desenvolvida no âmbito de um Programa cujo foco principal era artistas com deficiência. A referência principal a esse estudo são as ações desenvolvidas entre 1990 até 2004 pelo Programa Arte Sem Barreiras da Associação Very Special Arts Brasil em parceria com a então Secretaria de Educação Especial (SEESP) do MEC, CORDE/SEDH e Funarte/ Ministério da Cultura. Objetivo específico O campo mais especifico volta-se para descrever e problematizar a trajetória dessa experiência protagonizada pela entidade em referência no estudo e suas parcerias com intuições públicas e privadas. Nessa descrição e problematização algumas questões 10 serão postas à discussão, a saber: o pioneirismo de várias entidades da sociedade civil na formulação de ações culturais para pessoas com deficiência; a criação de uma legislação sobre os direitos das pessoas com deficiência e seus efeitos numa formulação de políticas públicas educacionais e culturais; o artista com deficiência nos projetos e nas ações das entidades culturais não governamentais e públicas. Metodologia Para consecução deste trabalho monográfico, foi imprescindível uma pesquisa em meu acervo pessoal, que ainda preserva publicações, folders, filmes em VHS e relatórios anuais do Programa Arte Sem Barreiras, por simples razão afetiva: quase todos são de minha própria autoria. Fiz bem em preservá-los. O mesmo não posso dizer da consulta feita à documentação do Arte Sem Barreiras depositada no Centro de Documentação, CEDOC, da Funarte. É pífia, parcial e tendenciosa – ao guardar mais documentos relativos a um projeto realizado durante os anos de 2005 a 2007, um arremedo que atendia pelo nome de Arte sem Limites. Mas disso não sabem os arquivistas, bibliotecários e assistentes técnicos que lá trabalham em condições insuficientes e adversas, responsáveis por um dos mais importantes banco de dados e de informações sobre as artes no país. Desconhecem que toda a documentação, impressa, audiovisual e eletrônica, além de equipamentos da Associação Very Special Arts foi confiscada em junho de 2004, no auge de processo de intervenção administrativa da Funarte. E que de lá só pode ser retirada, seis meses depois, por medida liminar judicial. O que retornou, era um nada. Pacotes de vazios. O substancial fora posto fora. O site eletrônico do Arte Sem Barreiras com mais de 80 páginas, abrangendo publicações, artigos, filmes e links para mais de duas centenas de assuntos e instituições, foi retirado do ar. Era lá que também estava posta toda a sua memória, ano a ano, dia a dia. Como tantos atos de desinteligência, o processo de confisco memória do Arte sem Barreiras, conduzido por diretores de ocasião, afinal se concretizou. Uma visita ao CEDOC da Funarte comprova tais fatos cabalmente. Em prosseguimento à pesquisa para esta monografia, fiz novas leituras e uma revisão bibliográfica, especialmente daquelas publicações atinentes às políticas públicas de cultura e gestão cultural. Também pela proximidade com os campos de atuação do Programa e por conta de suas inúmeras parcerias empreendidas no período, 11 pesquisamos as políticas públicas nas áreas de Educação Especial e Direitos Humanos, atinentes às pessoas com deficiência; por fim, agregamos a leitura de artigos, resultante de palestras em Seminários e Fóruns de Políticas Culturais, muitos dos quais estive presente como ouvinte, além de muitos outros artigos publicados em periódicos e sítios eletrônicos de instituições governamentais e privadas. Ao ensejo, é importante reiterar algumas considerações: sobre o esforço pessoal e metodológico para minimizar minha atuação e protagonismo nessa experiência cultural e política. Tentei, declaro, no limite possível, estabelecer o necessário distanciamento emocional do objeto de estudo. Também porque nesta monografia estão postas questões sobre conceitos ainda uso pela atual gestão do Ministério da Cultura. Esse confrontamento de idéias, no entanto, não deve ser interpretado com julgamento, sanção ética ou moral sobre a atuação de governos, gestores e formuladores de políticas públicas. Optamos por uma abordagem descritiva e interpretativa, com um olhar qualitativo, supondo que essa opção faculta questionamentos sobre uma experiência concreta de política cultural pública cuja ação ocorreu por meio de uma entidade da sociedade civil, vista aqui não só como objeto, mas como sujeito dessas políticas. O primeiro capítulo é dedicado a uma breve apresentação sobre o conceito de política cultural pública. No capítulo segundo, um relato sobre as convergências entre as políticas públicas de educação, cultura e direitos humanos no âmbito das atividades da Associação VSA Brasil. O capítulo terceiro concentra-se sobre a trajetória da Associação Very Special Arts e o Programa Arte sem Barreiras no período de 1990 a 2004. A conclusão se destina a considerações sobre os limites e os avanços dessa experiência de gestão cultural pública. Por fim, gostaríamos de assinalar que a escolha do tema de estudo decorreu das nossas atividades desenvolvidas no âmbito do Programa, reforçada pelas discussões travadas no ambiente do Curso de Pós Graduação em Acessibilidade Cultural, posteriormente ampliadas em vários encontros com a orientadora desta monografia, Professora Doutora, Patrícia Dorneles, no Rio de Janeiro. As falhas e omissões existentes no texto devem ser atribuídas exclusivamente ao autor que, de antemão, reconhece como modesta e limitada sua reflexão sobre o instrumental teórico e o tema escolhido. 12 Capítulo 1. Conceituação de política cultural e suas aplicações no Brasil Súmula Os conceitos de política cultural e suas aplicações no Brasil, especialmente em projetos desenvolvidos a partir de 2003, quando da assumição ao poder do Partido dos Trabalhadores. 1.1 Conceituação e campo de estudo Alguns autores dizem que é recente a abertura de um campo de estudo das políticas culturais e seu estabelecimento enquanto objeto de estudo acadêmico. As investigações nessa área, asseguram, tem se articulado em torno de um campo de pesquisa próprio, que reúne diversos estudos e diferentes abordagens ao redor de uma questão comum: a atuação do Estado no campo cultural (LIMA, ORTELLANO e SOUZA, 2013). Sobre esse mesmo campo de estudo, visto sob outro viés, Teixeira Coelho, em seu Dicionário Crítico de Política Cultural, dizia que conceito de política cultural ainda carecia de substância, flutuando, de forma excessiva, numa rede teórica, onde as malhas são abertas demais e à deriva de empréstimos ocasionais junto a outras disciplinas. E que a expressão máxima da Política Cultural está na figura da ação cultural (...) entendida como criação de condições para que os indivíduos e grupos criem seus próprios fins (COELHO, 1997, Apud DORNELES, 2011, págs. 29 e 31). É uma assertiva correta, já que a própria cultura não pode ser dissociada de tudo que possa ser abrangido e incorporado ao cultural naquele sentido amplo, que vai do econômico tradicional ao tecnocientífico. As políticas culturais são, por vocação, transversais, mesmo que isso seja apenas um discurso, sem uso e aplicação prática. As ações públicas têm de ter fundamentos e coerência entre o que se diz buscar e o que se faz de concreto para isso. No campo das políticas culturais, a relação causa e efeito não é direta. Os resultados dependem de uma apreciação de outros fatores, estranhos ao processo cultural estrito senso. (CALABRE, Lia, 1ª Conferência Nacional de Cultura, pág. 112) No entanto, persistindo em reafirmar esse campo de estudo, a trinca de autores citados, assegura que desde 1990, as políticas culturais não só se consolidaram como objeto de investigação acadêmica, como ganharam alguns periódicos específicos e a produção de obras de referência, entre os quais estão citados o International Journal of Cultural 13 Policy, editado a partir de 1994, e o Journal of Arts Management Law and Society, a partir de 1992. Mais importante e definitivo nessa questão, é que a conferência O que são políticas Culturais? Uma Revisão crítica das modalidades de atuação do Estado no campo da cultura foi realizada pelos autores, em 2013, no IV Seminário Internacional de Políticas Culturais, organizado pelo Setor de Políticas Culturais da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB), sob a direção da historiadora Lia Calabre. Lá, anualmente, desde 2004, são postas narrativas sobre experiências nacionais e internacionais no campo das políticas públicas de cultura e da gestão cultural. Em decorrência, esse setor da FCRB, é hoje o mais volumoso, abrangente e atualizado portal de estudos acadêmicos sobre as políticas culturais brasileiras. Uma consulta às centenas de textos dispostos para estudos no site da instituição é uma prova do quanto é nuançado e rico esse novo campo de estudo também no Brasil. É o bastante para necessários esclarecimentos já que não é de nosso interesse adentrar nessa discussão sobre a existência ou não de um campo de pesquisa exclusivo ou transversal sobre as políticas de cultura. Porém, vamos nos valer, de uma definição padrão de política cultural posta pela UNESCO, em 1969: um conjunto de princípios operacionais, práticas administrativas e orçamentárias e procedimentos que fornecem uma base para a ação cultural do Estado. É sintético e razoável para o desenvolvimento desse capítulo que está restrito a atuação do Estado nas tratativas culturais, nas quais os postulados emitidos pela UNESCO serão decisivos e norteadores. 1.2 Os postulados da UNESCO no Brasil A UNESCO, aliás, tem precedência nesses estudos culturais em razão de seguidas Conferências realizadas a partir dos anos 1940, e com mais intensidade, nas décadas seguintes e princípios do século XXI. Delas resultaram duas principais recomendações ou vertentes para os países membros: implantação de políticas para a democratização da cultura e políticas de democracia cultural. Eram formulações tão próximas que tiveram de ser distinguidas: a democratização dizia respeito a um acesso indistinto às atividades culturais, a cultura enquanto um direito de todos os cidadãos. Já o tema da democracia cultural, impregnada de uma conceituação antropológica da cultura, 14 propunha a valorização das práticas culturais simbólicas dos diversos segmentos culturais em contraponto ao que estava até então estabelecido e consagrado, cuja fruição e acesso eram restritos às pessoas e grupos com maior renda. Democratização cultural pode ser entendida como compartilhamentos de processos de gestão desde a etapa inicial, passando pelo desenvolvimento, manutenção e, por fim, pela avaliação de todo o fluxo de uma ação de política pública. Dessa forma, não consiste apenas em ter ou ampliar acesso a recursos governamentais para garantir um rol de atividades – produção e difusão cultural. O eixo principal da democratização cultural está na abertura ou concessão de espaços participativos pelo poder executivo por meio de pactuações ativas, horizontais, com alta representação social e hibridismo na resolução de arranjos institucionais. É uma proposta de um modelo de gestão cultural que não tem uma raiz administrativa em outros modos de gestão até então usuais na administração das políticas públicas de cultura. Três conceitos sustentam essa idéia de democracia cultural. São os seguintes: autonomia, protagonismo e empoderamento. O primeiro, diz respeito à dimensão simbólica da cultura, atividade essencial ao imaginário humano; o segundo está associado à cidadania, a conquista de direitos básicos como alimentação, saúde, moradia, educação e voto; e, finalmente, o empoderamento, decorrente da emancipação econômica por meio de atividades culturais facilitadoras de geração de emprego e renda. Entre essas atividades, a construção de redes e teias de cooperação entre entidades e grupos culturais, resulta em expressivo acúmulo de capital pessoal e social. São recursos básicos para a consolidação e a mobilização de grupos e entidades em torno de temas e demandas comuns que dilatam o espaço das políticas públicas incorporando novos espaços deliberativos. Ao analisar recentemente os conceitos de cultura e desenvolvimento no âmbito do repertório discursivo da UNESCO, Elder Maia Alves, diz que a dilatação desses conceitos criou condições discursivas para a formação de novas “categorias nativas”, responsáveis, entre outros aspectos, pela justificação, formulação e execução de políticas públicas e privadas, como as categorias de economia criativa e indústrias da 15 criatividade, afora a extensão do conceito de desenvolvimento para desenvolvimento humano. A organização [UNESCO], diz ele, passou a mobilizar o conceito de desenvolvimento humano como uma espécie de norte de cobrança, controle e sugestão de políticas públicas em todo o mundo. A pedra de toque desse novo conceito é representada pela noção de qualidade de vida e tem no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) o seu instrumento de aferição por excelência. A partir da segunda metade do século dos anos oitenta e durante os anos noventa, o IDH passa a figurar nas campanhas eleitorais e programas de gestão de governos, nos documentos internacionais, nos relatórios de gestão e nas metas administrativas de diversas organizações nacionais e transnacionais (ALVES, 2011, págs. 202 e 231) O Relatório de Desenvolvimento Humano (PNUD: 2004), afirmava que para alcançar os objetivos do desenvolvimento e erradicar a pobreza do mundo, primeiro se deveria enfrentar com êxito o desafio de construir sociedades inclusivas e diversas em termos culturais. O pesquisador Jaime Nualart, secretário técnico do Conselho Nacional para a Cultura e as Artes, do México, durante palestra proferida na abertura da 1º Conferência Nacional de Cultura, em Brasília, a 13 de dezembro de 2005, realçou os componentes sociais da cultura nos seguintes termos: “o desenvolvimento cultural de um país é componente fundamental da coesão social e um instrumento de extensão da democracia. Contribui para que uma sociedade seja cada vez mais aberta e participativa, valorize a pluralidade, respeite a legalidade, reconheça a importância de proteger a liberdade de expressão e criação e faça sempre valer estes direitos fundamentais”. No entanto, a capacidade da ação estatal em promover o desenvolvimento social esbarrou em limites significativos, impulsionados pela onda de transformações produtivas e de imposições da ordem internacional globalizada. Na década de 1990, diz Barbosa da Silva, a agenda de reformas dos programas sociais, mesmo com os princípios redistributivistas e universalistas impressos em suas concepções, sofreram das restrições advindas das opções políticas feitas ao longo do período, tanto das opções de inserção na economia internacional, quanto nos alinhamentos políticos internos, feito com forças de centro e centro-direita, de perfil ideológico liberal. Estes alinhamentos desenham outra agenda de reforma, cujos contornos se redefinem em embates com as crises sucessivas no campo econômico, 16 com o liberalismo, no campo político e ideológico, e com a lógica própria e autônoma das políticas sociais e culturais (2000, p. 319). A imbricação da cultura com a economia para dar solução a problemas sociais, alerta Yúdice, constitui-se num fenômeno conjuntural e análogo à transação keynesiana entre o capital e o trabalho negociada pelos Estados – Nação. Em recente encontro internacional de especialistas em política cultural, ele comenta, uma funcionária da UNESCO lamentou o fato da cultura ser invocada para resolver problemas que anteriormente eram da competência das áreas econômicas e política. No entanto, ela argumentava que o único meio de convencer os líderes governamentais e empresarias de que vale a pena apoiar a atividade cultural é argumentando que ela reduz os conflitos sociais e promove o desenvolvimento econômico (YÚDICE, 2004, p. 13). Em outubro de 2006, no âmbito da 33º Conferência Geral da UNESCO e da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade de Expressões Culturais, o Brasil comprometeu-se com a UNESCO em atuar na redução do desequilíbrio entre países produtores e consumidores, e no combate, por meio da cultura, à discriminação geradora de desigualdade. Dessa forma, arte e cultura começam a ser pensadas como experiência social. No campo específico da gestão pública, essa experiência se dá pelo reconhecimento e/ou compartilhamento da sociedade civil na proteção e promoção da diversidade das expressões culturais. Foi dessa maneira, enlaçada ao social, que a Cultura tentou ocupar um lugar de destaque no desenvolvimento do Estado contemporâneo: como fator de identidade e elemento estratégico para alcançar um desenvolvimento integral e sustentável. Ao afirmar e reconhecer a legitimidade das políticas públicas culturais, a Convenção também convidava os países membros a integrar a cultura em suas políticas de desenvolvimento em todos os níveis, a fim de criar condições para o desenvolvimento sustentável. E o tratamento relativo à natureza específica das atividades, bens e serviços culturais enquanto portadores de valor mercadológico, mas também de identidades, valores e significados, tem um papel crucial para a elaboração de uma política cultural para o desenvolvimento (KAUARAK, 2010). É a partir dos anos 1990, que UNESCO assume de vez e passa a capitanear as discussões realizadas em âmbito mundial no que diz respeito a um conjunto de ações e 17 propostas de regulamentação, definição e normatização da categoria Cultura em face das profundas transformações ocorridas no final do século XX. Todos esses processos concorreram para engendrar a chamada globalização cultural, que levou alguns autores a falar em uma explosão da cultura ao se referir à sensação de que a cultura estaria em todos os lugares ao mesmo tempo (ALVES, 2011, pág. 234 e 235). Essa globalização cultural, no entanto, estaria potencializando as antigas e já profundas assimetrias da divisão internacional do trabalho cultural (YÚDICE, 2005). Na UNESCO, essas lutas e disputas se cristalizaram com maior clareza, diz Alves, por ocasião da votação da Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, em 2001, e posteriormente, em 2005, quando da realização da 33º Conferência Geral da UNESCO, quando foi aprovada por 148 países membros a Convenção sobre Proteção e Promoção sobre a Diversidade das Expressões Culturais, com votos contrários de apenas dois países, Estados Unidos e Israel. À época, seus representantes argumentaram que o texto em discussão, ao invés de diminuir, poderia incentivar formas de nacionalismos violentos e fundamentalismo ético-religiosos (ALVES, 2011, pág. 235). Em 18 março de 2007, após sua ratificação por mais de 50 países, sendo o Brasil o 40º, a Convenção entrou em vigor. Como signatário, o Brasil se comprometeu com a UNESCO em atuar na redução do desequilíbrio entre países produtores e consumidores, e no combate, por meio da cultura, à discriminação geradora de desigualdade. 1.3 Cultura Viva, políticas culturais como recurso social Como prova desse alinhamento ao termo da Convenção, reportamo-nos ao discurso proferido2 seis meses depois pelo então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 3 de outubro de 2007, no Teatro Nacional de Brasília, por ocasião do lançamento do Programa de Aceleração da Cultura, PAC, ou Programa Mais Cultura 3. 2 A íntegra do discurso do presidente Luiz Inácio da Silva está disponível no site http://www.info.planalto.gov.br/download/discursos/[email protected], acessado em 16 de abril de 2008 3 O Programa de Aceleração da Cultura (PAC) ou Mais Cultura dá sequência às políticas públicas para o setor em implantação desde 2004, por meio do Programa Cultura Viva, que conjuga ações de Cultura e Cidadania (fomento à cidadania, às identidades e à diversidade), Cidade Cultural (centrado na qualificação do ambiente social e no direito à cidade) e Cultura e Renda (que focaliza a ocupação, a renda e o financiamento da Cultura). 18 Disse ele: o Brasil, lamentavelmente, nunca teve política cultural. Tinha ações de ministros que atendiam determinados públicos, às vezes, muito seletivos. A política cultural do país não é mais apenas responsabilidade do Ministério da Cultura, é responsabilidade do presidente da República e dos 190 milhões de brasileiros que ajudaram a construí-la (sic). O tom do discurso e a mensagem nele contida nos induzem a pensar na existência de uma complexidade de relações intraministeriais na esfera pública do poder constituído, com o Ministério da Cultura buscando um maior protagonismo político pela incorporação de conteúdos sociais à sua agenda. Esses conteúdos, além de tematizarem a descentralização das políticas, a necessidade de parcerias com a sociedade civil e a auto-sustentabilidades econômica das políticas culturais, também passam a confrontar e a delimitar as políticas culturais entre um passado elitista (neoliberal) com um presente popular (democrático). E nessa confrontação não bastam causas justas e mensagens atrativas. Era uma disputa argumentativa, na qual era necessário marcos referenciais significativos. Em 2002, quando o Partido dos Trabalhadores apresentou seu conteúdo programático para as políticas federais da cultura, vazados nas experiências de gestão de governos municipais e estaduais – A imaginação a serviço do Brasil: programa de políticas de cultura– já estava pré-configurada essa proposta de demarcar um diferencial da orientação neoliberal existente - no período dos dois governos de FHC- por meio de convocação à participação das organizações não governamentais e de movimentos e/ou grupos configurados no âmbito da cultura popular e comunitária na futura gestão da cultura. Sob o aspecto do protagonismo, essa proclamação não se diferia das postas pelas gestões anteriores, que também clamavam por mais verbas, maior visibilidade e transversalidade dentro do próprio governo. A Cultura era um ministério com raso lastro econômico e político, que circulou e foi oferecido, muitas vezes, como moeda de baixo valor nas composições políticas e partidárias. O diferencial político estava numa interpretação quase demiúrgica do Brasil, justificada com argumentos incisivos para sua própria valorização e consolidação. 19 Nessa mesma cerimônia de lançamento do PAC ou Mais Cultura, as falas do então ministro da Cultura, Gilberto Gil, e de seu secretário-executivo, Juca Ferreira, também traziam afirmações paradigmáticas e corroboraram na conformação de uma nova moldura social para o Ministério da Cultura. Ao também criticar a omissão e a insensibilidade cultural e social das gestões passadas, o ministro Gil associa as novas ações de gestão à promoção de um estado de bem-estar social. Disse o ministro: Há muito ansiávamos por este dia: o momento em que o Estado brasileiro, pela primeira vez em sua história, incorpora a cultura como dimensão essencial ao ser humano e como uma política pública essencial ao desenvolvimento [...] o que representa hoje para o Brasil e para o mundo a palavra Cultura não é nada menos que a aspiração clara por um mundo de bem-estar e felicidade plenos [...] hoje também essa palavra evoca um novo sentido para o “bem-estar social”. [...] A omissão do Estado, por tantos anos, gerou um cenário [...] de separação entre a cultura e a rede de proteção social. Um cenário de separação entre cultura e cidadania. O Mais Cultura cristaliza o novo patamar de importância que a cultura passou a ter na agenda social do Governo brasileiro [...] Ao incorporar a dimensão cultural em sua plenitude, a política social deste governo reforça sua capacidade de contribuir para que nossa sociedade se reinvente. [A íntegra do discurso do ministro Gilberto Gil está disponível no site: http://www.cultura.gov.br/noticias/discursos/index.php?p=30210&mo re=1&c=1&pb=1, acessado em 16 de abril de 2008] Juca Ferreira, então secretário-executivo, confirmava que os compromissos assumidos por essa agenda social não se chocavam com a missão constitucional do Ministério da Cultura, ao contrário, dava-lhe nova dimensão e funções: Afirmou ele: O Programa Mais Cultura marca o início de uma nova etapa na relação do Estado com a cultura no Brasil. [...] O que fizemos: alargamos o conceito de cultura; introduzimos o conceito de política pública de cultura. [...] Este programa é parte da Agenda Social do Governo [...] consolidamos a incorporação da Cultura como um vetor do desenvolvimento do país e como uma necessidade básica e um direito de todos os brasileiros, como a alimentação, a saúde, a moradia, a educação e o voto. [...] A cultura contribui e agrega valor a outras dimensões da agenda social brasileira, qualifica os ambientes sociais e as relações humanas, reduzindo a violência, produzindo qualidade de vida, cidadania, enfim, capacitando a todos os brasileiros a realizarem plenamente sua condição humana e criando as condições para que a nossa sociedade possa enfrentar nossas mazelas históricas e os desafios do Século XXI. [...] O Programa Mais Cultura vem ampliar a ação do Ministério da Cultura, dar escala, e não se choca com as demais ações do MinC. Continuaremos em todas as frentes da cultura, do audiovisual ao teatro, do apoio às manifestações tradicionais, do apoio aos povos indígenas, a musica, aos direitos autorais e a toda a economia da cultura. O compromisso do Ministério da Cultura do governo Lula é com todas as dimensões da cultura brasileira. 20 [A íntegra do discurso do secretário-executivo Juca Ferreira está disponível no endereço http://www.cultura.gov.br/noticias/discursos/index.php?p=3029 acessado em 16 de abril de 2008]. 1.4 Políticas Culturais: avaliações contemporâneas Passado esse período de grandes enunciados e entusiasmos a partir da assunção e a permanência do Partido dos Trabalhadores à frente do Governo, algumas avaliações começam a ser postas no campo dos estudos culturais. Muitas delas, conforme afirmamos no inicial desse capítulo, apresentadas em artigos escritos por palestrantes dos seminários de políticas culturais organizados pelo Setor de Políticas Culturais da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). Dos vários artigos apresentados nos seminários que tratam de questões culturais contemporâneas, vamos destacar mais dois, cujas analises tem como recorte os mais recentes programas e projetos do Ministério da Cultura. Em Política cultural no Brasil contemporâneo: percursos e desafios, Bezerra e Weyne (2013) indagam sobre avanços e desafios e buscam uma reflexão crítica das políticas públicas que estão sendo construídas de forma plural e democráticas, mas submissas e conformadas aos protocolos internacionais. O ponto de partida da reflexão é a gestão de Gilberto Gil “inaugurando uma nova fase na política cultural do país”, com a ampliação do conceito de cultura pelo viés antropológico, para revelar os Brasis profundos e múltiplos, e a retomada do papel ativo do Estado na formulação das políticas. Nessa intenção, destacam as autoras, são criadas e ampliadas as secretarias do MINC; lançados os Programas Cultura Viva – o mais destacado da gestão Gil - e o PROCULTURA, que enfeixa várias ações, sendo a principal, um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, para alterar os mecanismos de incentivo e financiamento por meio da Lei Rouanet; e o lançamento de editais voltados para vários segmentos culturais, em acordo com os protocolos assinados com a UNESCO. 21 No entanto, indagam as autoras: como criar bases sólidas para a consolidação dessas políticas democráticas e pluralistas e enfrentar o desafio de um aprofundamento em suas dimensões políticas e criativas. A dimensão criativa defendem “não pode e não deve se enquadrar em projetos e ser submetida, em última instância, ao uso utilitário como recurso para inclusão e do desenvolvimento social”, se juntada às vozes e ao coro formado por vários autores, entre os quais, Miller e Yúdice (2004) e Alves (2011). É necessário argumentam retomar a proposta de Celso Furtado (2012): uma política cultural da criatividade – estímulo organizado a formas criativas que enriqueçam a vida dos membros da coletividade e ampliem as possibilidades dos seres humanos em seus múltiplos aspectos. O aprofundamento ou radicação da dimensão política, prosseguem, seria a “construção de espaços de participação políticos que possibilitem o embate político, os dissensos, os conflitos e os antagonismos”. E mais: que o consenso e a hegemonia obtidos pelo MINC na execução de programas como o Cultura Viva neutralizou as diferenças e resultou em ausência ou falta de política, que é uma característica das democracias liberais. As políticas plurais e democráticas só se potencializam quando há conflito e dissensos. Ao fim, citando Rancière (1996), Bezerra e Weyne, preconizam abertura de espaços para as forças criativas não conformadas com objetivos pré-definidos e mensuráveis de projetos e programas de políticas culturais. Uma política cultural “não engessada pelo aparato burocrático, que se move dinâmica, orgânica, que possibilite a ligação entre política e novas éticas, e estimule a cultura da diferença, nas possibilidades de criação e interação, e a convivência com as diferenças”. Em outro artigo recente, Regina Helena Alves da Silva e Roger Andrade Dutra abordam um tema recorrente nessa análise das políticas culturais. Em A agenda transnacional da UNESCO e as políticas públicas de cultura do MINC (2003-2010), os autores identificam traços de continuidade entre as gestões de FHC e Lula: a manutenção do mesmo modelo das Leis de Incentivo (LI); a condução de programas por meio de editais; e a adoção de políticas de cultura concebidas pela UNESCO, especialmente, seu perfilhamento à economia da cultura e ao mercado globalizado de produção de bens culturais. 22 Além de criticar a manutenção nos dois mandatos de Lula do mesmo modelo neoliberal das Leis de Incentivo (LI), os autores fazem restrições às chamadas políticas de editais que se tornaram permanentes em todas as ações do MINC criados sob o pretexto de expandir as políticas para além dos interesses das grandes empresas, por meio do fomento direto a pequenos e médios projetos. Lançando vários editais públicos, o MinC transferiu recursos públicos para o financiamento de centenas de projetos culturais e terceirizou as avaliações de mérito dos projetos, contratando avaliadores ad hoc, traço comum entre a política de editais e o modelo das LI. O papel do Estado foi praticamente confinado à seleção cartorial de projetos segundo critérios formais de proposição e à fiscalização frágil da execução dos planos de trabalho. É importante salientarmos que ambas as dimensões da atuação do Estado, nos dois mandatos de Lula, promoveram projetos estanques e descontínuos. Sintomaticamente, vários editais para pequenos e médios projetos exigiam o desenvolvimento de módulos de rede e outras formas de digitalização de produtos, esperando que algum vínculo orgânico espontâneo surgisse entre os diferentes grupos e propostas, algo como uma mão invisível digital complementando a mão invisível mercantil. (ALVES DA SILVA e ANDRADE DUTRA 2013). Para efeito de ilustração, um edital para microprojetos culturais para a região do semiárido destinou quantias entre R$ 10 mil a R$ 15 mil entre os agraciados. Segundo os autores, após a posse da presidenta Dilma Rousseff, o MINC modificou, em parte, a orientação das políticas públicas de cultura. No entanto, a política de editais não só foi mantida, como conformou um grupo político que desenhou as políticas públicas de cultura com uma mentalidade de corte neopatrimonialista, assim apontados no artigo: movimentos sociais beneficiados com transferência direta de recursos públicos, o mais das vezes a fundo perdido. Os nominados de neopatrimonialistas são instituições e movimentos criados de forma açodada para atender as demandas dos editais formatados em acordo com os protocolos internacionais ou aquelas organizações remanescentes do período do neoliberalismo, entre 1990 e 2000, sobre os quais a crítica de esquerda foi particularmente hostil quando denunciou a proliferação dos diversos mecanismos de privatização das políticas públicas por meio de ONGs, Oscip e contratos de gestão com instituições nacionais e internacionais para atividades ou projetos. “Por isso, hoje, causa maior estranheza que vários de seus membros, em nome de um pragmatismo militante ou em nome do progressismo, acomodem-se com tanta facilidade à mesma dinâmica, aderindo ao modelo neoliberal” (ALVES DA SILVA e ANDRADE DUTRA 2013) 23 Segundo eles, foi a partir desses modelos de gestão neoliberal que surgiu a economia da cultura, “produto da miséria da discussão conceitual sobre a cultura brasileira e afim ao caráter colonialista e etnocêntrico das políticas transnacionais de cultura elaboradas em organismos internacionais, como a UNESCO ou a OMC”. Assim, a economia da cultura tornou-se o eixo diretor das políticas públicas de cultura. “Empobrecida, reduzida a instância indutora da geração de produtos culturais voltados para o mercado cultural globalizado, a ação pública estatal brasileira na área da cultura praticamente inexistiu como tal. Este modelo implantou um pseudomercado de produtos “culturais” de qualidade duvidosa e atrelou inúmeros grupos aos editais de distribuição de pequenas verbas para uma espécie de cultura de subsistência” (ob. cit. pág. 3). Durante os oito anos do governo Lula prossegue a ideia de cultura-padrão, eixo sustentáculo da Convenção para a Diversidade Cultural, foi reproduzida no fomento à proliferação dos projetos de “identidade cultural” que pipocaram. A própria noção de visibilidade, tão presente nos discursos justificadores dos editais e projetos culturais, trai a intenção subjacente de “ser visto”, isto é, ser percebido para além das fronteiras “locais”; mas ser visto traduz uma existência política passiva, para não dizer nula. O jovem pobre residente em “áreas de elevado risco social”, não por acaso o alvo mais frequente dos projetos culturais, é encorajado a almejar uma visibilidade temporária no mercado dos produtos culturais exóticos, tal como a empregada doméstica ou o trabalhador manual de baixa qualificação, que almejavam um emprego seguro que legitimasse sua circulação pelas áreas urbanas privilegiadas das grandes cidades. Uma mentalidade do final do século XIX, que via na rápida qualificação profissionalizante um modo de atribuir ocupações aos jovens pobres (no duplo sentido de trabalho e atividade que lhes toma o tempo), foi reproduzida nas atuais políticas públicas de cultura de um governo orgulhoso de seu progressismo (ob. cit. p. 4) À UNESCO é atribuída a normatização do que vem a ser a cultura numa moldura integral, na qual são conjugados e abrangidos valores culturais pessoais, sociais, comunitários com os econômicos. A cultura passa a ser vista como um fator de enriquecimento. Por seu lado, o MINC passa a entender a economia da cultura como um vetor de desenvolvimento qualificado; os editais vinculam as atividades culturais à erradicação da pobreza; o Cultura Viva se faz para consolidar identidades e construir cidadania. É dessa maneira, dizem os autores, que o MINC deixa de ser um órgão 24 viabilizador de uma política cultural para o país, substituindo-a por uma política social, baseada na economia da cultura, politicamente apoiada por grupos que passaram a viver dos editais de capacitação e formação de práticas e manifestações tidas por populares. Sendo ainda enfáticos, pela política transnacional da UNESCO. 25 Capítulo 2 - VSA Brasil e as políticas públicas educacionais Súmula As atividades da Associação VSA Brasil no campo das políticas públicas educacionais; a arte como linguagem de inclusão expressão e emancipação de alunos e pessoas com deficiência. 2.1 . Arte e Educação Especial, os pioneiros Na trajetória de lutas pelos direitos civis, políticos, sociais e culturais das pessoas com deficiência é importante situar a Constituição de 1988 como um marco. Foi por meio dela que teve início uma nova forma de relação entre o Estado e a sociedade civil pela institucionalização de uma série de procedimentos que ampliaram as possibilidades de participação dos cidadãos e entidades representativas nos processos decisórios em distintas esferas de governo. Está gravado no Artigo 215 da Constituição, que o Estado garantirá, a todos, o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. No que diz respeito à sociedade civil, nos anos seguintes, ela caminhou e abriu novos caminhos. Observou-se, por exemplo, o surgimento de novos atores na esfera pública, com formas de mobilização menos institucionalizadas, exemplificados, entre outros, pelos grupos organizados por pessoas com deficiência, que até então viviam sob uma invisibilidade política e social, ou quando muito sob a penumbra do paternalismo e do assistencialismo. É seguro afirmar que a Arte na Educação Especial iniciou-se com as idéias da educadora russa Helena Antipoff, que chegou ao Brasil, em 1929, com o objetivo de reorganizar a Educação em Minas Gerais, proposta que se estendeu a outros estados, constituindo o Movimento Escola Nova. Psicóloga e pedagoga, Helena cursou universidade na própria Rússia, depois em Paris e Genebra. Pesquisadora e educadora da criança com deficiência, Helena Antipoff foi pioneira na introdução da educação especial no Brasil, onde fundou a primeira Sociedade Pestalozzi, iniciando o movimento pestalozziano brasileiro 26 A Sociedade Pestalozzi de MG foi pioneira no trabalho sistemático em Arte para pessoas com deficiência. A Fazenda do Rosário, criada por Helena Antipoff, em 1942, tornou-se um importante lugar para as criações artísticas, que mais tarde serviram de referências multiplicadoras a outras instituições. Esse trabalho hoje é continuado pela Fundação Helena Antipoff, situada na mesma Fazenda Rosário, na cidade de Ibirité, que integra a Região Metropolitana de Belo Horizonte. No final da década de 1940, surgiu o Movimento Escolinhas de Arte que incluía no seu projeto pedagógico o ensino de Arte para as pessoas com deficiência. A destacar os trabalhos de Augusto Rodrigues, Lúcia Valentin e, especialmente, de Noêmia de Araújo Varela. Em 1948, foi criada no Rio de Janeiro a primeira Escolinha de Arte do Brasil. Também no Rio de Janeiro, em 1954, decorrência do trabalho iniciado por Helena Antipoff, em Minas Gerais, foi fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) do Brasil. A nova instituição passa também a realizar um trabalho pedagógico sistemático com Arte, que culminou quatro décadas depois na criação de numa Coordenação de Arte no âmbito da Federação Nacional das APAEs e a realização, a partir de 1995, dos Festivais Nossa Arte, com a participação de alunos e usuários da entidade. Esse relato sumário cometeria uma grave omissão se não citasse a doutora Nise da Silveira, que implantou a partir de 1946, no Centro Psiquiátrico Pedro II, também do Rio de Janeiro, o Serviço de Terapêutica Ocupacional. Na ocasião, o Centro Psiquiátrico tinha aproximadamente 1500 internos, em sua maioria esquizofrênicos crônicos. Lá foram criados ateliês de pintura e modelagem, permitindo aos internos uma nova forma de expressão e tratamento psiquiátrico, ainda inédito no Brasil. No acervo do Museu contam 53 mil obras, entre as quais, Adelina Gomes, Carlos Pertuis, Emygdio de Barros, Fernando Diniz e Octávio Inácio, tombadas pelo IPHAN. Em 2002, celebrando o cinquentenário do Museu de Imagens do Inconsciente, parte significativa do acervo foi exibida pela primeira vez fora do Rio de Janeiro, na Galeria Genesco Murta, no Palácio das Artes, em Belo Horizonte, por ocasião do 1º Festival Internacional de Arte sem Barreiras. 27 2.2 Direitos sociais e pessoas com deficiência Se no campo da arte e da pessoa com deficiência temos essas importantes referências, no campo dos direitos, podemos afirmar, grosso modo, que até o final da década de 1980, as ações do Estado brasileiro em relação às pessoas com deficiência eram esporádicas, sem continuidade, desarticuladas e apenas centradas na educação. Não existiam políticas públicas amplas e abrangentes. Numa linha de tempo, em se tratando de legislação sobre e para pessoas com deficiência, nunca é desnecessário lembrar alguns fatos e documentos marcantes dessa trajetória, a começar por outra decisão histórica da ONU ao declarar 1981 como o Ano Internacional da Pessoa Deficiente. Como decorrência, ao longo da década 80, vários documentos foram produzidos pela ONU sobre o tema. Declarações sobre a deficiência mental, sobre a pessoa com deficiência física, culminando na década seguinte com um Plano de Ação Mundial (1993) prevendo equiparação de oportunidades. Tratava-se de uma proposta de política de equidade, que também inseria na sociedade políticas de ações afirmativas na área do trabalho e dos benefícios sociais. No plano nacional, a Declaração da ONU de 1981 ensejou o fortalecimento de várias entidades pioneiras no país como as Pestalozzi e APAEs, no segmento mental, e a criação de outras, especialmente, no segmento da mobilidade física, como o Centro de Valorização da Vida (CVI), e cultural, Very Special Arts do Brasil, sob inspiração de entidades congêneres norte-americanas. Conforme Maior (2009:51) depois do Ano Internacional, o movimento das pessoas com deficiência assumiu seu protagonismo e as próprias pessoas com deficiência ganharam voz e começaram a falar e a participar em espaços públicos. As primeiras mudanças sistêmicas ocorrem com a criação da Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE), em 1986, e da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, em 1989. A CORDE decorre dos trabalhos empreendidos pelo Comitê Nacional para a Educação Especial encerrados com a publicação do Plano Nacional de Ação Conjunta para a Integração da Pessoa com Deficiência, em 1° de julho de 1986. A criação da CORDE deu-se por meio do Decreto n° 93.481, de 29 de outubro de 1986, assinado pelo presidente José Sarney. 28 Sua efetivação, no entanto, ocorreu apenas em 1989, com a Lei n° 7.853, que dispunha sobre a integração social das pessoas com deficiência. A lei também estabeleceu as responsabilidades do Poder Público para o pleno exercício dos direitos básicos das pessoas com deficiência, inclusive definindo aspectos específicos dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade. A CORDE deveria elaborar seus planos, programas e projetos considerando a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, que, no entanto, somente foi instituída quatro anos depois, por meio do Decreto n° 914, de 06 de setembro de 1993, cujo princípio era a ação conjunta do Estado e da sociedade civil na criação de mecanismos que assegurassem a plena integração da pessoa com deficiência em todos os aspectos da vida em sociedade. A Lei n° 7.853 foi, posteriormente, regulamentada pelo Decreto n° 3.298, de 20 de dezembro de 1999, que também alterou a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Foram coordenadoras da CORDE: Teresa Costa d’Amaral (1986-1990); Maria de Lourdes Canziani (1990-1997); Tânia Maria Silva de Almeida (1997-2000); Ismaelita Maria Alves de Lima (2000-2002); Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior, a primeira pessoa com deficiência a assumir esse cargo, a partir de setembro de 2002. Em 1999, criou-se um Conselho Deliberativo, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência – CONADE (Decreto n° 3.076, de 1° de junho de 1999) com as seguintes atribuições: zelar pela implantação da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência; acompanhar o planejamento e avaliar a execução das políticas setoriais relativas à pessoa portadora de deficiência; zelar pela efetivação do sistema descentralizado e participativo de defesa dos direitos da pessoa portadora de deficiência; propor a elaboração de estudos e pesquisas; propor e incentivar a realização de campanhas visando à prevenção de deficiências e à promoção dos direitos da pessoa portadora de deficiência; aprovar o plano de ação anual da CORDE; entre outras. Em 2003, o CONADE deixou a estrutura administrativa do Ministério da Justiça e passou a ser órgão colegiado da Secretaria Especial dos Direitos Humanos Desde 2003, as políticas para as pessoas com deficiência estão vinculadas diretamente à Presidência da República, por meio da Secretaria de Direitos Humanos. Em outubro de 29 2009, a CORDE foi elevada a Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Mais recentemente, em agosto de 2010, alcançou o status de Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. 2.3. Educação, Arte e pessoas com deficiência Nossa narrativa agora se volta para as lutas e as conquistas das pessoas com deficiência no campo das políticas públicas da Educação. Vamos destacar algumas atividades da Associação VSA Brasil no campo das políticas educacionais e a introdução da arte como linguagem de inclusão, expressão e emancipação de alunos e pessoas com deficiência. No campo governamental da Educação Especial, aqui é importante destacar a criação, em 1973, do Centro Nacional de Educação Especial – CENESP, junto ao Ministério de Educação, com a finalidade de promover em todo território nacional a expansão e melhoria do atendimento aos excepcionais. Em 1985, o Decreto Presidencial n° 91.872, instituiu um Comitê Nacional [...] para traçar uma política de ação conjunta, destinada a aprimorar a educação especial e a integrar; na sociedade, as pessoas com deficiências, problemas de conduta e superdotadas. Foi esse Comitê que sugeriu a transformação do CENESP, em Secretaria de Educação Especial – SESP. Um ano depois, em 1986, durante o Governo Sarney, foi criada a Secretaria de Educação Especial – SESP e a já citada Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE. Em 1990, no Governo Collor, com a reforma no MEC, se extingue a SESP ficando a Secretaria Nacional de Educação Básica – SENEB responsável pela educação especial. Em 1992, no Governo Itamar Franco, com nova reforma do MEC, o órgão de educação especial foi reconduzido à categoria de secretaria, com a sigla SEESP. São essas duas instituições, SESP e CORDE, que vão promover em 1989 um encontro pioneiro da Educação Especial com a Arte. Foi o Ministério da Educação, por meio da Secretaria de Educação Especial, SESP, que patrocinou e organizou o Encontro Nacional entre Arte e Educação Especial, com dirigentes e educadores especiais, e ao que nos interessa, de representantes, à época, de uma comissão de trabalho para a implantação da representação do Very Special Arts no Brasil. Além de representações 30 das diversas instituições que trabalhavam com pessoas com deficiência, conforme veremos no capitulo terceiro. Em 1993, em Pernambuco, a Associação VSA Brasil estabeleceu parceria com a Federação de Arte-Educadores do Brasil (FAEB). Essa parceria foi retomada em maio 1998, no SESC Pompéia, em São Paulo, quando da realização I Congresso e Festival Latino-Americano de Arte Sem Barreiras. A FAEB não só colaborava na realização de congressos e festivais, mas na fundamentação de conceitos. Por meio de instrumental teórico e demonstrações artísticas, a proposta era ampliar o entendimento da sociedade brasileira sobre essas novas expressões para dissolver barreiras culturais e sociais, e inserir o fazer artístico da pessoa com deficiência à contemporaneidade estética do país. Em 1994, a Declaração de Salamanca – Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais proporcionou uma nova perspectiva e mudanças nas concepções do trabalho com pessoas com deficiência. No cenário nacional, as ações convergem em direção a uma Educação para todos, proposta adotada pelo Ministério da Educação. Tal orientação foi acolhida pelo VSA do Brasil que passou a agregar, a seus festivais de arte, os congressos de Educação e Arte, para promover o debate e a difusão de conhecimentos e de experiências com as linguagens da arte na educação especial. O primeiro Festival e Congresso já com esse novo formato foram realizados nesse mesmo ano de 1994, na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) iniciando uma parceria com departamentos de Educação e de Arte de universidades, secretarias de Educação estaduais e municipais, e entidades da sociedade civil que desenvolviam trabalhos com as linguagens da arte com e para pessoas com necessidades especiais. Os festivais e congressos nacionais de Arte Sem Barreiras realizados em 1995 (Natal/RN), em 1996 (Curitiba/PR), 1997 (Manaus/AM) e o Latino-Americano, em 1998 (São Paulo/SP), foram fundamentais para aproximar educadores especiais e arteeducadores das questões da arte realizada por e com pessoas com deficiência. Em 1999, ainda em decorrência dos postulados da Educação para todos ocorreu o Encontro de Pirenópolis, realizado pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação (SEESP/MEC). Além de abrir os horizontes para ações conjuntas com 31 entidades não governamentais atuantes no campo da arte, como o VSA Brasil, a reunião resultou como proposta, gravada na Carta de Pirenópolis, na garantia da inclusão da Arte no projeto político-pedagógico e nas políticas públicas de Educação. É um documento fundamental que selou a parceria entre Educação Especial e Arte. Em Pirenópolis (GO), no período de 14 a 18 de junho de 1999, a SEESP/MEC promoveu o Encontro de Educação Especial: Uma Escola de Qualidade para todos Respeita a Diversidade reunindo dirigentes da Educação Especial e Ensino Fundamental, ONGs, e cerca de 50 representantes dos comitês estaduais e municipais do VSA/ Arte Sem Barreiras. Um encontro inédito entre 250 especialistas em Artes e a Educação Especial. Durante uma semana de colóquios, grupos de estudos e plenárias- considerando os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Educação para Todos foi redigida a Carta de Pirenópolis, na qual ficaram gravadas proposições e compromissos e priorizadas ações no âmbito da SEESP e do Ministério da Educação. Entre elas, uma conquista importantíssima: no texto da carta, em razão das discussões e propostas levantadas pelo VSA/ Arte sem Barreiras no âmbito de um dos cinco principais grupos de estudo proposto pelos organizadores do Encontro- A arte viabilizando a educação para a inclusão social– foi inserida em seu item onze, a garantia de inclusão no projeto político e pedagógico do MEC da arte-educação e da atividade motora, como dimensões curriculares. Abaixo a íntegra da carta Carta de Pirenópolis 1999 "Nós, Dirigentes de Educação Especial e de Ensino Fundamental de Organizações Governamentais e não - Governamentais, membros do Fórum das Instituições de Ensino Superior e UNDIME, reunidos no Encontro de Educação Especial: "Uma Escola de Qualidade para todos Respeita a Diversidade ", em parceria com a UNESCO e o FUNDESCOLA, em Pirenópolis, no período de 14 a 18 de junho de 1999, considerando os princípios Universais dos Direitos Humanos; as análises e debates ocorridos neste Evento e as proposições e compromissos definidos pelos participantes, em nível Estadual, reafirmamos o princípio filosófico da "Educação para Todos", e priorizamos as seguintes ações: 1- Articular órgãos governamentais, organizações de defesa e de direito, órgãos não governamentais de e para pessoas com deficiência, e instituições de ensino superior, visando à implementação da prática de inclusão; 2- Acompanhar e orientar, de forma articulada, as ações dos municípios na política de educação especial; 3- Comprometer e responsabilizar todo o sistema educacional público e privado, na garantia do atendimento aos alunos com necessidades especiais a partir de uma política de inclusão social; 4- Dotar as unidades escolares de materiais, equipamentos e 32 mobiliários adaptados; 5- Construir e manter indicadores confiáveis que permitam análise da qualidade e planejamento das ações relativas à política de inclusão; 6Tornar públicas ações, informações e recursos como uma das dimensões de suporte às práticas da educação especial e ao exercício do direito do cidadão; 7- Garantir acessibilidade por meio da adequação dos espaços físicos nas unidades escolares onde os educandos com necessidades educacionais especiais estejam inseridos. Garantir também, que as novas construções obedeçam às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas(ABNT); 8- Implantar e/ou implementar suporte e atendimento escolar de forma a garantir o pleno desenvolvimento humano para todos; 9- Estabelecer parcerias, prioritariamente, entre a educação, assistência social e saúde, envolvendo as três esferas de governo; 10- Orientar e assessorar a construção e/ou reconstrução do projeto político pedagógico, fundamentado no princípio de uma escola para todos;. 11Garantir a inclusão, no projeto político pedagógico, da Arte- Educação e da Atividade Motora, como dimensões curriculares; 12- Garantir a formação inicial e continuada da comunidade escolar, com vistas à inclusão das pessoas com necessidades especiais e o efetivo atendimento à diversidade; 13- Definir uma política de educação profissional, de forma participativa, orientada pelos princípios da inclusão;14- Estabelecer estratégias de discussão do atual modelo de avaliação para definir a questão do diagnóstico, assim como a sua finalidade e efeitos. No cumprimento ao que determina a Constituição Federal, a LDB- Lei9394/96 e o Plano Nacional de Educação” (CARTA DE PIRENOPOLIS, 1999, acervo do autor). Sublinhamos a importância dessa conquista pelo seguinte: pela primeira vez a arteeducação foi oficialmente incorporada ao projeto pedagógico das políticas públicas de Educação de um Governo Federal. Uma proposta que o VSA/Arte Sem Barreiras defendia e divulgava há muito tempo. Em decorrência do Encontro, surgiram solicitações de consultorias e parcerias praticamente de todas as entidades lá presentes, como o Fórum das Faculdades de Educação das Universidades Federais, União de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), secretários e/ou representantes da área de educação especial de todos os estados, além de entidades não governamentais, como a Federação Pestalozzi e APAEs, entre tantas outras, além, é claro, da própria Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação. Ainda em 1999, o MEC iniciou o processo de distribuição da versão final das adaptações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para a Educação de alunos com necessidades especiais 4. A orientação geral era a mesma dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino fundamental: formar indivíduos para o exercício da cidadania. A proposta apontava para uma tendência irreversível: a da integração dos alunos com necessidades especiais à rede regular de ensino. A estratégia do MEC é “fazer com que 4 No texto sempre será reproduzida a nomenclatura da época. 33 não seja mais o portador de necessidades especiais que precise se adequar ao sistema educacional, e sim o contrário” – afirmava a então secretária de Educação Especial, Marilene Ribeiro dos Santos. Segundo ela, os serviços educacionais especiais, embora diferenciados, não podiam ser desenvolvidos isoladamente, mas deviam fazer parte de uma estratégia global de Educação e visar às suas finalidades gerais. Os PCN preconizavam a atenção à diversidade da comunidade escolar e baseiam-se no pressuposto de que as adaptações curriculares podem atender a necessidades particulares de aprendizagem dos alunos. E essa diversidade deve se concretizar em medidas que levem em conta não só a capacidade intelectual e os conhecimentos dos alunos, mas também, seus interesses e suas motivações. O que se pretendia com essa atenção à diversidade era a melhoria da qualidade de ensino e de aprendizagem para todos, irrestritamente, e novas perspectivas de desenvolvimento e socialização. A escola deveria buscar o respeito às diferenças, não ser um obstáculo para o cumprimento da ação educativa, mas um fator de seu enriquecimento. A Política Nacional de Educação Especial na virada do século XX para o XXI definia como aluno portador de necessidades especiais aquele que “por apresentar necessidades próprias e diferentes dos demais alunos de sua idade, requer recursos pedagógicos e metodologias educacionais específicas”. A classificação desses alunos englobava os portadores de deficiência mental, visual, auditiva, física e múltipla; os portadores de condutas típicas (problemas de conduta); e os portadores de altas habilidades. As classificações costumam ser adotadas para dar dinamismo aos procedimentos e facilitar o trabalho educacional, conquanto isso não atenue os efeitos negativos do seu uso. O importante era enfatizar, primeiramente, as necessidades de aprendizagem. Identificar as necessidades educacionais de um aluno como sendo especiais implicava em considerar que essas dificuldades são maiores que as do restante de seus colegas, depois de todos os esforços empreendidos para superá-las, por meio dos recursos e procedimentos usuais adotados na escola. A concepção especial está vinculada ao critério de diferença significativa do que se oferece normalmente para a maioria dos alunos da turma no cotidiano da escola. Em outubro de 1999, o informativo quinzenal Carta Sem Barreiras, do Programa Arte Sem Barreiras publicou o artigo Inclusão nas escolas brasileiras, de Maria Teresa Eglér 34 Mantoan, - professora da Faculdade de Educação da Unicamp, e diretora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Reabilitação de Pessoas com Deficiência (LEPED) -, no qual o tema da inclusão escolar foi posto da seguinte forma: (...) A escola para a maioria das crianças brasileiras é o único espaço de acesso aos conhecimentos universais e sistematizados, ou seja, é o lugar que vai lhes proporcionar condições de se desenvolver e se tornar cidadão, alguém com identidade social e cultural. Melhorar as condições da escola é formar gerações mais preparadas para viver a vida na sua plenitude, livremente, sem preconceitos, sem barreiras. A inclusão escolar remete a escola a questões de estrutura e de funcionamento que subvertem seus paradigmas e que implicam em um redimensionamento de seu papel, para um mundo que evolui a bites. O movimento inclusivo nas escolas, por mais que seja ainda muito contestado, pelo caráter ameaçador de toda e qualquer mudança, especialmente no meio educacional, é irreversível e convence a todos pela sua lógica, pela ética de seu posicionamento social. A inclusão está denunciando o abismo existente entre o velho e o novo na instituição escolar brasileira. (...) Assim sendo, o futuro da escola inclusiva está, a nosso ver, dependendo de uma expansão rápida dos projetos verdadeiramente embuídos do compromisso de transformar a escola, para se adequar aos novos tempos. Se hoje ainda são experiências locais, as que estão demonstrando viabilidade da inclusão, em escolas e redes de ensino brasileiras, estas experiências têm a força do óbvio e a clareza da simplicidade e só essas virtudes são suficientes para se antever o crescimento desse novo paradigma no sistema educacional. Não se muda a escola com um passe de mágica. A implementação da escola de qualidade, que é igualitária, justa e acolhedora para todos, é um sonho possível. A aparente fragilidade das pequenas iniciativas, ou seja, essas experiências locais que têm sido suficientes para enfrentar o poder da máquina educacional, velha e enferrujada, com segurança e tranqüilidade. Essas iniciativas têm demonstrado a viabilidade da inclusão escolar nas escolas brasileiras. As perspectivas do ensino inclusivo são, pois, animadoras e alentadoras para a nossa educação. A escola é do povo, de todas as crianças, de suas famílias, das comunidades, em que se inserem. Crianças, bem–vindas a uma nova escola! (Carta sem barreiras, Nº 6, 1º de outubro de 1999. Acervo do autor) 2.4 Brasília, 2000. V Congresso Nacional de Arte-Educação na Escola Para Todos e VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras Essa possibilidade integrar num mesmo evento educadores especiais, dirigentes de educação de municípios brasileiros e de universidades com artistas e arte-educadores, começou a ser estudada um ano antes, durante o encontro de Pirenópolis (GO). Entre 6 e 9 novembro de 2000, em Brasília, ocorreu o primeiro grande evento resultante da parceria entre a SEESP/MEC e o VSA/Brasil: o V Congresso Nacional de Arte- 35 Educação na Escola para Todos e o VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras, que ocupou simultaneamente o Centro de Convenções Ulysses Guimarães e Teatro Nacional Cláudio Santoro. A realização desse V Congresso Nacional de Arte-Educação na Escola Para Todos e do VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras, reunindo educadores especiais, arteeducadores e artistas, um ano e meio após o encontro de Pirenópolis, foi um assumir efetivo desse compromisso e um reconhecimento da Arte como linguagem de integração e superação de barreiras e de aproximação dos diversos grupos culturais visando uma sociedade inclusiva. O texto de convocação ao Congresso e Festival, divulgado a partir de setembro de 2000, foi escrito por mim e aprovado pela direção do VSA/Brasil. Em resumo, era o seguinte: O tema geral deste Congresso e Festival é a diversidade. Mas como falar em diversidade e multiculturalidade num mundo que hoje se apresenta globalizado? Uma globalização que pressupõe unicidade de idéias e de ações, derradeira tentativa de homogeneizar a tudo e a todos. Um mundo pós-moderno onde lidamos mais com signos do que com coisas. Um ambiente onde a imagem substitui ao objeto, o simulacro ao real. Onde o mundo que aparece na TV apaga a diferença entre o real e o imaginário, entre o ser e a aparência. Existem, porém, maneiras diferentes de se pensar e ver a globalização. O ambiente globalizado significa que entre nós e o mundo estão os meios de comunicação. São eles que refazem e ampliam o conhecimento do mundo, transformando-o num permanente espetáculo que, ao contrário de uma pressuposta homogeneidade, celebra e dá publicidade à diversidade. Nunca, em nenhuma outra época da humanidade, deu-se tanta publicidade à própria humanidade, à sua universalidade e diversidade e à heterogeneidade dos povos. Esse novo mundo repercutido na mídia se fez mais próximo de todos. Até bem pouco tempo, as questões envolvendo as pessoas portadoras de deficiência * (nota nomenclatura em uso na época) eram desconhecidas pela mídia. Portador de deficiência não era notícia. Seus direitos e reivindicações mais elementares passavam 36 despercebidos. Vivíamos constantemente enfrentando atitudes que juntavam num mesmo discurso a intolerância e o preconceito. Dizer, agora, nesses tempos de forte intervenção da mídia em nossas vidas, que tudo mudou pode parecer precipitado. Mas estamos convencidos de que o olhar da sociedade para o deficiente mudou. E mudou para melhor. Espelho dessa transformação são as inserções quase que diárias em TVs e jornais de reportagens abordando temas sobre e com portadores de deficiências. É como se o país houvesse descoberto intempestivamente - numa espécie de mea culpa tardia – a existência desses 16 milhões de outros brasileiros. A vasta cobertura pela mídia da recente Paraolimpíada, realizada em Sidney, repercutindo o êxito de nossos atletas, entre outras tantas considerações, é um reconhecimento de que a deficiência é fonte permanente para criação de novas possibilidades no esporte, na arte e na vida. Lembro aqui que na história da arte brasileira dois artistas com deficiência são fundamentais. O primeiro emulou os conceitos de arte e cultura brasileiras no século XVIII, exprimindo o auge e a síntese do Barroco. Falo da obra do mineiro Antônio Francisco Lisboa, dito Aleijadinho, nascido em 1738 e que passou a sofrer, a partir dos 40 anos, de atrofia, o que lhe causou a perda de pés e mãos. Com instrumentos atados aos braços criou até o fim de sua vida, em 1814, pobre, discriminado e totalmente cego. O segundo artista é Arthur Bispo do Rosário. Nascido em Sergipe, em 1911, com sofrimentos mentais * ( nomenclatura em uso na época). De sua vida, sabe-se que foi fuzileiro da marinha e pugilista, chegando a campeão latino-americano na categoria peso-leve. Foi detido várias vezes por insubordinação e acabou se desligando da Marinha de Guerra em 1933. Em 1938 foi preso e internado no Hospital Psiquiátrico Pedro II, no Rio de Janeiro, após delirar durante dois dias na rua. Em 1939, apresentava um quadro de vivências místicas – teria visto Jesus Cristo acompanhado de anjos azuis; dizia ser são José. Transferido para a Colônia Juliano Moreira, passou a desenvolver seu processo criativo utilizando-se dos materiais simples que dispunha em tais circunstâncias. Sua necessidade de expressão era tão intensa que desfiava roupas para executar seus bordados. Sua obra, inspirada por 37 “anjos e pela Virgem Maria”, seria apresentada ao Todo-Poderoso, “no dia do Juízo Final”. Ele nunca se considerou um artista. A viagem estética de Arthur Bispo do Rosário era uma missão ditada pelo além. Quando alguém perguntava sobre sua origem ele desviava o assunto: era um enviado dos Céus. Em 1989, após sua morte, aconteceu a primeira exposição de suas obras que, nos anos seguintes, transpôs as fronteiras do hospício, chegando à Europa, onde, em 1995, participou da Bienal de Veneza. Morreu aos 78 anos, de infarto do miocárdio e arteriosclerose, na enfermaria da Colônia Juliano Moreira. Em 2000, Arthur Bispo do Rosário foi um dos destaques na Bienal de São Paulo na mostra Redescobrimento. A peça central de seu imenso fazer artístico é o Manto da apresentação, confeccionado para o seu encontro com Deus no dia do Juízo Final. No interior do manto, os nomes de centenas de conhecidos estão bordados. Bispo se perfilaria diante do Criador como Procurador de muitos compatriotas. No seu exterior, luzindo no tecido vermelho, ardem fios amarelos capazes de ofuscar o tribunal divino. Hoje, Arthur Bispo é considerado o estilista maior da arte cristã do fim do milênio, e seu Manto da apresentação um ícone da arte contemporânea brasileira. Quando a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou este ano a sua Campanha da Fraternidade, o tema escolhido foi a inclusão - o direito de todos os brasileiros a uma cidadania plena e substantiva. E, pela primeira vez, a Campanha envolveu outros credos, expressando a imperiosa necessidade de atitudes ecumênicas, de união de todas as forças para alcançarmos nossos objetivos comuns. Esse súbito destaque dos deficientes na mídia não deve ser visto apenas como um ato de benevolência dos meios de comunicação. Antes, é consequência de atitudes e lutas conjuntas, de conquistas que emergiram de entidades públicas e privadas, para sensibilizar todo um coletivo. Assim foi nos primórdios da República, a luta das mulheres pelo direito ao voto. Assim foi nas últimas três décadas, a luta dos afrobrasileiros, dos homossexuais e dos idosos, contra a discriminação e odiosos preconceitos. A década que agora se apresenta, coincidindo com o novo milênio, coloca na cena nacional e de maneira definitiva a pessoa com deficiência. Abrem-se, assim - como 38 agora neste Congresso e Festival de Arte Sem Barreiras –, novos caminhos para que as sementes já lançadas desse diálogo estendam raízes profundas e frutifiquem na sociedade brasileira. E que essa luta seja estendida com grandeza cívica a 16 milhões de brasileiros, cidadãos que clamam por trabalho, por saúde, por transporte e - na parte em que estamos compromissados – por educação e cultura. Teremos nesses quatro dias, aqui em Brasília, cerca de duas mil pessoas, entre artistas e educadores, vindos das mais distintas regiões do país e que atenderam a esse chamamento para uma reflexão sobre e com a pessoa com deficiência. Que este Congresso e Festival nos inspire a perceber uma nova ordem de relações entre diferentes. O tema central do V Congresso e VI Festival foi Arte-Educação em diálogo com a diversidade, com os seguintes eixos temáticos: Arte na perspectiva da inclusão; globalização e multiculturalidade; arte, educação, saúde e qualidade de vida; acessibilidade aos espaços artísticos e culturais. As finalidades eram: discutir a heterogeneidade e a multiculturalidade da sociedade brasileira na perspectiva da inclusão do portador de necessidades especiais; inclusão de alunos e artistas às atividades regulares de suas áreas de interesse e atuação de acordo com suas habilidades e capacidades. Os objetivos do evento eram amplos, como aprofundar o diálogo entre a Arte e a Educação Especial; promover e estimular o conhecimento em Arte revelando novas linguagens comunicativas e expressivas; apresentar e discutir experiências bem sucedidas na articulação entre Arte e Educação Especial; fomentar a importância da Arte e da Educação para a Saúde enquanto melhoria da qualidade de vida; promoção e difusão de experiências estéticas em processo e de artistas e/ou grupos profissionais e a sua inserção no mercado de trabalho. Ao final do evento, os participantes distribuíram um documento com as seguintes considerações no sentido de dar prosseguimento a essa parceria e diálogo da Educação com a Arte, com a abertura de novos espaços ou eventos para aprofundamento das discussões ao longo do ano de 2001. Posteriormente esse documento foi publicado num CD-ROM com toda a programação educacional - conferências, palestras, posters, mesas-redondas e oficinas- e cultural do evento – shows musicais, apresentações de dança e teatro e exposições de artes visuais-, e recebeu o nome de Anais V Congresso 39 Nacional de Arte-Educação na Escola para Todos e o VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras distribuído a todos os participantes. Abaixo trechos do documento de avaliação: O tema abordado no V Congresso Nacional de Arte-Educação na Escola para Todos e no VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras - Arte-Educação em diálogo com a diversidade foi uma reflexão e busca de subsídios junto à sociedade para o processo de integração e superação de barreiras e de aproximação dos diversos grupos e /ou entidades socioculturais no contexto de uma sociedade inclusiva. O eixo norteador foi a comunicação, entendida como a melhor forma de manifestação cultural e representação do sujeito – seus sentimentos, anseios e buscas. Foi o desvelar do ser/estar no mundo. O sentimento existencial “estar presente”, significou a possibilidade de um novo paradigma ao diálogo, cujo movimento de explicitação foi a arte. Os ideais extrapolaram os símbolos e significados, reconstruindo um ser humano mais humano; Na temática Arte-Educação em diálogo com a diversidade ficou evidenciada as diferentes possibilidades de culturas em suas diferentes formas de manifestação. A arte também é fruto da diversidade; diante disso, o diálogo entre a arte e o ser humano constitui o segundo desafio: respeitar as diferentes condições humanas dos sujeitos presentes na sociedade. Os nossos propósitos avançaram em direção à superação de barreiras respeitando as diferenças; nesse sentido, a realização deste evento proporcionou o estreitamento de relações entre a arte e a sociedade para superação de barreiras; As conferências proferidas por especialistas das diversas linguagens tiveram como temas: Arte e Educação em diálogo com a diversidade; O reencontro do feminino com o masculino na arte de educar; A estética de uma ética sem barreiras, cujas abordagens contribuíram para localizar a arte nos seus diversos contextos; As mesas redondas apresentaram temas com a participação de especialistas onde foram enfocadas as temáticas: Refletindo sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais; Arte na Perspectiva da Inclusão; Teoria e Prática em Arte-Educação Inclusiva; A Arte: limites e possibilidades; A Mídia em diálogo com a diversidade; e Cultura Popular e Inclusão. As abordagens feitas permitiram momentos de reflexão entre o prático e o teórico possibilitando a troca de experiências; 40 O Painel com o tema Acessibilidade aos espaços artísticos e culturais levantou a reflexão em torno do acesso do deficiente aos espaços educacionais, artísticos e culturais, permitindo assim uma leitura crítica das políticas públicas adotadas para a inclusão do deficiente na sociedade; O Núcleo Interativo de Criação foi um espaço que permitiu o contato dos participantes com artistas portadores e não-portadores de deficiência, com arte-educadores e educadores especiais, todos envolvidos com ações de arte-educação. O Espaço Café com Arte, sediado no Teatro Nacional, permitiu nos finais de tarde outros momentos de reflexão sobre as temáticas debatidas no dia no Congresso. As apresentações de pôsteres e vídeos permitiram a visualização de experiências artística e pedagógicas desenvolvidas em diversas regiões do país. As comunicações orais permitiram aos seus autores a oportunidade do diálogo com seus interlocutores a partir das suas experiências pedagógicas. Durante o evento, ocorreram, ainda, duas outras importantes reuniões: das instituições que trabalham com arte e Educação Especial e o VII Fórum Nacional do Ensino de Arte, este última promovida pela Federação dos ArteEducadores do Brasil (FAEB); Sobre os resultados do VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras, foram postas as seguintes considerações pela direção do VSA Brasil: Foi um Festival diferente. Ao contrário dos anteriores, voltados para o que se convencionou chamar de “público geral”, este VI Festival foi estruturado como um evento-demonstração para educadores especiais e arte-educadores; Essa opção justificou-se: pela primeira vez na história dos festivais tivemos a presença significativa de educadores que atenderam ao chamamento para, no âmbito do Congresso de Arte-Educação, que ocorreu conjuntamente ao Festival, realizarem uma reflexão com e sobre o fazer artístico da pessoa com deficiência; Dessa maneira, o Festival foi um espaço para um amplo visionamento dos vários processos e experiências estéticas implantadas ou em desenvolvimento em dezenas de instituições do país, propiciando a educadores e artistas interação e diálogo com essa diversidade. Uma demonstração de que a arte independe e supera qualquer deficiência. Na organização desse VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras buscou-se na seleção 41 de grupos e de artistas uma representação plural e significativa em duas vertentes: processo e produto. Na vertente de experiências estéticas em processo, vale assinalar, entre tantas outras, as presenças do Projeto Luz do Sol, da cidade de Nossa Senhora da Glória, em Sergipe, com apresentações de música, dança, teatro e trabalhos em artes plásticas; do Centro de Criatividade de Goiânia, também com trabalhos nas várias linguagens artísticas; dos grupos de dança Helena Holanda, de João Pessoa, Esplendor, de Juiz de Fora, das APAE de Feira de Santana (BA) e de Olímpia (SP), do Hospital Sarah, de Brasília, perfazendo cerca de quarenta grupos. Uma grande coletiva de artes visuais, que ficou sediada no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, durante os três dias do Congresso. Sobre ela, podemos assegurar que foi a mais abrangente entre todas já realizadas no âmbito dos festivais. Nessa coletiva tivemos cerca de cinquenta artistas, num total aproximado de quatrocentos trabalhos, entre pinturas, cartuns, esculturas e outros objetos tridimensionais que envolvem expressões artísticas integradas. Aqui é importante que se diga que a linguagem visual foi a que apresentou maior número de inscrições ao Festival. Não foi uma surpresa. Historicamente, a pintura e a escultura preludiaram todas as demais linguagens no trabalho com portadores de deficiência. Hoje, mesmo levando em conta que essa primazia a fez constante, observamos o crescente interesse por outras expressões, como pela música e pelas linguagens cênicas, o teatro e, notadamente, a dança no gênero contemporâneo. Entre tantos expositores, destacamos os desenhos do cartunista capixaba Ricardo Ferraz, cujo tema geral é os portadores de deficiência e as barreiras que eles enfrentam na sociedade; as paisagens do carioca Marcelo Cunha, tetraplégico que pinta com a boca; os desenhos executados com os pés pelo jovem Averaldo Júnior, 11 anos, paralisado cerebral, indicado pelo Comitê do Very Special Arts do Sergipe; e, ainda, dezenas de trabalhos dos artistas usuários do Projeto Estação Especial da Lapa, ligado ao Centro de Convivência e Desenvolvimento Humano do Governo do Estado de São Paulo. Na vertente profissional, vale assinalar, as presenças do pianista Angelin Loro, de Porto Alegre, dos músicos Pedro Matheus, violonista, da cantora e compositora Cristina Gomes, os dois do Rio de Janeiro, do soprano Maria do Socorro e do Grupo Surdodum, ambos de Brasília, e do coral do Instituto de Cegos São Rafael, de Belo Horizonte. 42 Nas apresentações dos grupos de dança, tivemos o Corpo e Movimento, da ANDEF, de Niterói, Ekilibrio, de Juiz de Fora, as Cia Roda Viva e Anjori, de Natal, a Limites, de Curitiba e a estreia da Pulsar Cia de Dança, do Rio de Janeiro. Como convidados e atrações especiais desse VI Festival, tivemos as presenças das cantoras Zezé Gonzaga, Maria Lúcia Godoy e Leci Brandão, do compositor Nando Cordel e do dançarino Carlinhos de Jesus - artistas que trabalham na perspectiva da inclusão do portador de deficiência. Exposições individuais Para celebrar os dez anos de implantação do Programa no Brasil, foram selecionados dois artistas, com trajetórias existencial e artística exemplares na superação de barreiras. O primeiro foi o arquiteto e pintor cearense, radicado em Brasília, Assis Aragão, que teve uma retrospectiva abrangendo seus 25 anos de atividades. O segundo foi fotógrafo e cineasta esloveno, professor de Estética da Sorbonne, em Paris, Evgen Bavcar, cego desde os 11 anos. Em suas fotos, Bavcar expressa o olhar daqueles que perderam a visão convencional e uma aguda capacidade de percepção das coisas do mundo. As duas exposições ficaram em cartaz no período de 6 a 20 de novembro, no Saguão do Teatro Nacional Cláudio Santoro. (Anais, Brasília, SEESP/MEC, 2000. Acervo do autor). A publicação e difusão desses Anais representou um passo adiante na trajetória do VSA/Brasil. Pela primeira vez, um evento reunindo Congresso e Festival foi avaliado integralmente por todos os participantes, educadores e artistas 2.5. A conquista de legislações educacional Seguindo historiando essa trajetória da Educação Especial e os movimentos das pessoas com deficiência, cabe assinalar outra conquista muito significativa: o direito à educação de crianças e jovens com deficiência e seu convívio com os demais alunos nas escolas regulares legitimado pela da Resolução nº 2 CEB/CNE de setembro de 2001, que estabeleceu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Essa Resolução veio a ser um marco na história da Educação Especial no Brasil. Um avanço na perspectiva da universalização do ensino com atenção à diversidade na educação brasileira. 43 Segundo o Art. 2 da Resolução “os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para a educação de qualidade para todos”5. À época, segundo estimativas do Ministério da Educação, eram seis milhões os brasileiros em idade escolar com deficiência. Desses, menos de 10% - 404 mil/ censo escolar 2001- estava regularmente matriculado no ensino de primeiro grau. No segmento de segundo grau, eram cerca de três mil, sendo que no ensino superior, a quantidade de alunos não chegava a duas centenas. Tais números evidenciavam um modelo de exclusão no sistema de ensino brasileiro e colocam para toda a sociedade o desafio de construir coletivamente as condições para atender a essa diversidade. É seguro afirmar que esses números, ao longo dessa primeira década do século XXI, foram bastante alterados e de forma bastante positiva no sentido da inclusão. O livro Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001) trazia na capa um desenho com um detalhe de uma sala de aula. A professora de pé, sorridente, atrás de uma mesa com o quadro negro ao fundo, distribui material escolar para uma aluna. Sentados, em suas respectivas carteiras escolares, um aluno cego lê seu material em Braille. Ao seu lado, um colega cadeirante e uma aluna sem deficiência. O desenho, sendo óbvio, sugeria que a presença de alunos com deficiência nas salas de aula do ensino regular deveria ser encarada com um fato tranquilo e amoroso pela comunidade escolar. A partir de outubro de 2001, centenas de milhares desses livros contendo as Diretrizes foram distribuídos a todas as escolas do Brasil, no âmbito de uma proposta de que a partir do ano letivo de 2002, todas as escolas já iriam matricular e receber alunos com deficiência. As reações a essa proposta foram muitas e radicais. Professores e dirigentes da Educação de várias partes do país, representados por suas entidades e secretarias, argumentavam que as escolas careciam de adequações arquitetônicas, instrumental e material didático específico para os alunos com deficiência. E mais grave: os professores não estavam aptos para acolher esses alunos numa sala de ensino básico regular onde a grande maioria não era deficiente. 5 Diretrizes nacionais para Educação Especial na Educação Básica. Brasília, SEESP/MEC, 2001, 79 págs. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf nota sobre publicação. 44 Entre as entidades segmentadas, a APAE Nacional - com centenas de afiliados em estados e cidades do país - destacou-se pelas críticas ao MEC/SEESP e a CORDE. Criticava o governo por legislar e impor regras a um segmento sobre o qual “não tinha conhecimento e tradição”. No fundo, era um discurso e reação a uma iminente perda para as escolas públicas de uma fatia desse “mercado de ensino especial” onde as APAEs detinham grandes percentuais. Às críticas, o governo reagiu com várias medidas emergenciais e pontuais. Além do início de obras de readequações do espaço escolar, fez imprimir, pela primeira vez em grande escala, material didático em Braille. Também distribuiu regletes e punções para exercícios de escrita em Braille, realizou cursos de capacitação em LIBRAS, entre outras tantas providências. No início de 2002, foi estabelecida outra importante parceria entre VSA Brasil e SEESP/MEC. A proposta era capacitar milhares de professores da educação básica no uso das linguagens artísticas em sala de aulas com alunos com deficiência. Em agosto, foram realizados cursos nos estados polos de Santa Catarina (Sul), Sergipe ( Nordeste), Minas Gerais( Sudeste), Pará ( Norte) e Distrito Federal (Centro-Oeste), representando as cinco regiões do país. Nos meses seguintes, as regiões e os professores capacitados se tornaram outros polos e agentes multiplicadores. A publicação e a distribuição de cinco mil exemplares do livro Estratégias e orientações sobre artes – respondendo com Arte às necessidades especiais (VSA Brasil, 2002), representou uma síntese do conjunto dessas ações, resultado do intenso processo de discussão e de vivências, ocorrido durante as capacitações. Foi na ambiência dos cursos que se desenharam as linhas norteadoras para a elaboração final das estratégias. O documento constituído refletiu as contribuições diretas e indiretas de 600 profissionais da educação. “Um dos aspectos mais relevantes ocorridos nessas capacitações” diz Marilene Ribeiro dos Santos, então secretária de Educação Especial do MEC, “foi a utilização de novas metodologias experimentais, que possibilitaram aos professores cursistas sentirem, pensarem, refletirem e, sobretudo, vivenciarem o processo de inclusão escolar e social dos alunos com necessidades educacionais especiais. É importante salientar que este documento não é uma proposta fechada, e que a fundamentação conceitual, metodológica e legal para o ensino da Arte é aquela estabelecida nos Referenciais Curriculares para a Educação Infantil e nos Parâmetros Curriculares do Ensino Fundamental e Médio. (...) [Que] sirva como complemento do componente curricular Arte, seja indutor de novas discussões e experiências num contexto inclusivo em sala de aula e que subsidie o professor na promoção de 45 adequações necessárias as aulas de Arte, contribuindo assim para o desenvolvimento das potencialidades dos alunos...” (ob. cit. pág. 5). Além de atividades práticas, como cursos e oficinas, os professores e dirigentes educacionais cursistas demandavam por mais informações, especialmente, por estudos e pesquisas que pudessem suprir carências e aportar conhecimentos no campo da Arte e da Educação Especial. Em atendimento a esse público foi lançado em agosto de 2012, o primeiro volume dos Cadernos de Textos Educação Arte Inclusão reunindo artigos de arte-educadores como Alice Martins, Fernando Antônio G. Azevedo, Roberta Puccetti Bueno, Aída Ferrari e Elisa Campos, e artistas como o bailarino e coreógrafo Henrique Amoedo, entre outros. Entre os temas abordados nos sete ensaios estava a alfabetização estética; a prática da educação do olhar; conteúdos e linguagens de percepção; a consciência do mundo através da multiculturalidade e da inclusão. No texto de apresentação, assinado por Albertina Brasil, reitera que desde a edição das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, em setembro de 2001, sentimos a necessidade de estarmos colaborando no processo de implantação da Arte na educação inclusiva - em todas as etapas da educação básica-, sensibilizando e aproximando os educadores das questões da arte realizada por pessoas com necessidades especiais. Por essa razão, o convite da secretária de Educação Especial do Ministério da Educação, Marilene Ribeiro dos Santos, para participarmos desse processo- iniciando os primeiros Cursos de Capacitação em Educação, Arte, Inclusão para professores do ensino fundamental em cinco estados brasileiros-, foi recebido por nós como uma missão, que queremos compartilhar com todos os educadores e artistas comprometidos com a Declaração Mundial de Educação para Todos, firmada em Jomtien, Tailândia, em 1990, e com os postulados de Salamanca, em 1994, durante a Conferência Mundial Sobre Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade (Cadernos de textos nº1, Educação Arte Inclusão, setembro-agosto, 2002). Dois outros volumes dos Cadernos de Textos, sob a coordenação editorial do autor desta monografia, foram publicados, respectivamente, em dezembro de 2002 – reunindo as palestras, conferências e mesas redondas apresentadas no Congresso Internacional realizado na PUC Minas, e o terceiro, em dezembro de 2003. Na apresentação, Albertina Brasil, comenta as características da publicação, os autores e os ensaios. Chega às suas mãos, o terceiro número de Educação, Arte Inclusão, nosso Caderno de textos, mas que também poderia ser nomeado, sem nenhum demérito para os que nele colaboram de um trabalho em progresso. No cruzamento de conhecimentos que envolvem a Educação e Arte, e a questão principal, que é a inclusão, muito ainda é rascunho e arruídos, quando não, o silêncio. Ana Mae Barbosa, mais uma vez aqui 46 presente, com texto e carinhos, ao fazer um levantamento e analisar mais de cem dissertações e teses de doutorado realizadas em diversas universidades estaduais e federais no período de 1981 a 1993, e que tiveram como objeto da pesquisa a arteeducação e áreas afins - Arte-educação: leitura no subsolo-, notou que apenas duas tratavam da produção artística de pessoas com deficiência. Foi sobre essa escassez de trabalhos e a falta de difusão de conhecimentos sobre a Arte e as pessoas com deficiência que conversamos em Belém, em novembro de 2001, por ocasião da 1º Mostra Amazônica de Arte Sem Barreiras. Na ocasião, nosso argumento, com o qual Ana Mae concordava, era de que as universidades pouco haviam produzido nesse campo, apesar da inclusão ser tema de há muito colocado à discussão para a sociedade. Outra argumentação: se a Arte institucional brasileira teve na sua fase inaugural a presença de um Antônio Francisco Lisboa e no findar do século XX, um Artur Bispo do Rosário — cujo Manto da apresentação fez-se mais que um ícone da produção plástica contemporânea —, seria possível e permitido imaginar a existência de uma relação da deficiência com a produção estética? Por que não? – respondeu Ana, entusiasmada. E foi na mesma ocasião, em Belém, que o poeta e mestre da educação da sensibilidade pela arte, João de Jesus Paes Loureiro, lançou A Estética de uma Ética Sem Barreiras, iluminando e balizando essa e muitas outras questões que nos inquietava. O texto do professor Paes Loureiro, aqui reproduzido, sendo obra inaugural na abordagem do tema, fez-se clássico e deu-nos um norte e, por ventura amazônica, inspirou a criação e lançamento, no ano seguinte, dessa publicação. Diz João de Jesus: “Podem as pessoas, portadores de necessidades especiais ou não, agirem nos momentos decisivos do processo artístico como conhecer, fazer e experimentar. Na relação produtiva da arte com os portadores de necessidades especiais não há impedimentos, seja como processo criador ou de participação.” Sobre esse fazer e experimentar, sem impedimentos, publica-se nas páginas seguintes, ensaios, artigos e relatos de artistas, educadores especiais e arte-educadores, que vêm se dedicando e conjugando ações pioneiras no campo da Arte e da Inclusão. Que sua leitura e análise seja rica e proveitosa em suas vidas e atividades, como tem sido nas nossas. Dezembro de 2003. (Cadernos de textos nº3, Educação Arte Inclusão, dezembro de 2003) Por certo, foi este o terceiro e último número da publicação, e também o derradeiro texto assinado por Albertina Brasil, que veio a falecer, um mês depois, em janeiro de 2004, em circunstâncias que veremos no capítulo terceiro. Sobre as três edições dos Cadernos de Textos, resta acrescentar que foram publicados cerca de 80 artigos inéditos que, à época, tornaram-se uma referência para os estudos sobre a Arte e as pessoas com deficiência. A parceria entre VSA Brasil e SEESP/MEC, teve outra sequência, em novembro de 2002, na realização do 1º Festival e Congresso Internacional de Arte sem Barreiras, em 47 Belo Horizonte, que teve a participação direta de três mil pessoas, entre artistas, educadores e dirigentes educacionais, do Brasil e do exterior. Os inscritos no Congresso, realizado durante uma semana na PUC MG e o público presente nas dezenas de eventos artísticos somou oito mil pessoas. No material de divulgação enviado a imprensa se afirmava que o evento mineiro, a exemplo do Festival e Congresso Latino-Americano de Arte Sem Barreiras, realizado em 1998, em São Paulo - e que se tornou um paradigma para ações e projetos sobre inclusão sociocultural em todo o país – teria como principal eixo temático Arte, Educação e Inclusão. Além das várias atividades artísticas e discussões acadêmicas da programação, uma proposta inédita no âmbito dos eventos do VSA Brasil: uma avaliação das políticas públicas de Educação e Cultura desenvolvidas no decênio 19922002. Na documentação pesquisada para esta monografia não encontramos nenhuma outra informação sobre a ocorrência dessa avaliação. No entanto, no âmbito da programação de dança do Festival, teve lugar Teatro Luiz de Camões, no SESC Venda Nova, um Colóquio Internacional de Dança, com debates, oficinas e apresentação de espetáculos com a participação de bailarinos e coreógrafos das companhias presentes. Esse colóquio foi organizado pela então consultora e curadora de dança do VSA Brasil, Andrea Chiesorin Nunes. Em resumo, a programação do festival teve 60 espetáculos de música, teatro e dança, 12 exposições de artes plásticas individuais e coletivas em diversos espaços culturais de Belo Horizonte – teatro e galerias do SESIMINAS, teatros Marília, Francisco Nunes, Luiz de Camões, Serraria Souza Pinto, Palácio das Artes, Escola Guignard-, além de uma dezena de oficinas de arte em todas as linguagens artísticas, na PUC Minas e UFMG, lançamento de livros e mostras de filmes. A programação se estendeu às cidades Betim e de Ouro Preto, com debates e visita guiada a exposição no Museu do Aleijadinho e Museu da Inconfidência. A partir de 2003, com a posse do novo governo e a nomeação para SEESP da professora Cláudia Dutra - esposa do recém-eleito deputado federal, Paulo Pimenta (PT/RS) cessaram, repentinamente, as relações entre o VSA/BRASIL e o MEC. Apesar de inúmeras tentativas para agendar reuniões e a formalização de convites a participar dos 48 vários festivais e congressos realizados ao longo de 2003- por conta de parcerias com outros entes públicos e privados- nenhuma solicitação foi atendida. Estava desfeita sem explicações ou justificativas a mais importante parceria do VSA/ Brasil com o MEC. A única, aliás, que o MEC manteve durante 14 anos com uma instituição de Arte. Ao repassarmos por esse período e eventos, levantamos aqui a hipótese de que o VSA/Brasil, por conta dessa parceria histórica, tenha atuando com mais intensidade no campo das políticas públicas da Educação. As que tiveram lugar e foram desenvolvidas no campo da Cultura foi uma decorrência, tamanho o imbricamento entre um e outro no âmbito das atividades do Arte sem Barreiras. Essa questão, no entanto, será mais bem desenvolvida no capítulo seguinte, que se volta para narrar a trajetória da instituição VSA Brasil e o Programa Arte Sem Barreiras. Durante a feitura deste capítulo, fizemos uma pesquisa no site do MEC para se informar em que lugar de seu organograma estava colocada a Secretaria de Educação Especial e se atualizar sobre as políticas e atividades de sua competência. O que apuramos foi o seguinte: em maio de 2011, foi feita uma nova reestruturação do MEC. No organograma, de igual forma ao ocorrido no Ministério da Cultura, foram incorporados os postulados da Convenção sobre Proteção e Promoção sobre a Diversidade das Expressões Culturais, da UNESCO. Com as mudanças, o MEC passou a ter duas novas secretarias: Regulação e Supervisão da Educação Superior e Articulação com os Sistemas de Ensino. Na reforma, o MEC também extinguiu dois departamentos: a SEED, Secretaria de Educação a Distância e a SEESP, Secretaria de Educação Especial. Os programas da educação inclusiva foram incorporados à SECADI, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, que anteriormente se chamava SECAD, sem o I, pois não mais abarcava a Inclusão. A atual SECADI tem quatro diretorias: Políticas para a educação no campo e diversidade; Alfabetização e educação de jovens e adultos; Direitos humanos e cidadania; e, por fim, Educação especial. No site ela apresenta o seguinte enunciado: Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) em articulação com os sistemas de ensino implementa políticas educacionais nas 49 áreas de alfabetização e educação de jovens e adultos, educação ambiental, educação em direitos humanos, educação especial, do campo, escolar indígena, quilombola e educação para as relações étnico-raciais. O objetivo da SECADI é contribuir para o desenvolvimento inclusivo dos sistemas de ensino, voltado a valorização das diferenças e da diversidade, a promoção da educação inclusiva, dos direitos humanos e da sustentabilidade sócio-ambiental visando a efetivação de políticas públicas transversais e interssetoriais6. 6 consulta feita ao site mec.gov.br, acessado em janeiro de 2014 50 Capítulo 3 - A Trajetória da Associação Very Special Arts e Programa Arte sem Barreiras Súmula Criação da Associação VSA Brasil feito a partir de pesquisa de documentos primários e em arquivo; a intervenção nas instituições culturais durante o governo Collor de Melo; breve perfil da professora Albertina Brasil. Memorial com projetos e atividades realizadas entre 1990 e 2005; interpretação e análise de legislação e das políticas públicas para cultura e para os artistas com deficiência. 3.1 Primeiros atos, primeira Ata “Aos vinte e dois dias do mês de março do ano de mil novecentos e noventa, às vinte horas e trinta minutos, no salão de reuniões do Edifício Estrela do Leme, sito à Rua Roberto Dias Lopes, número cem, na cidade do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro, realizou-se uma sessão solene, sob a presidência da professora Albertina Brasil Santos, atual coordenadora do comitê Very Special Arts Brasil, para ratificar e homologar o Estatuto da referida Associação Brasileira Vida Sensibilidade e Arte(VSA), Very Special Arts/Brasil, bem como, para dar posse às pessoas que integrarão a sua diretora. Esteve presentes o bacharel Raimundo Furtado de Mendonça, representando o Dr. Tertuliano dos Passos, presidente do Instituto Municipal de Arte e Cultura, Rio Arte; Marcelo Ferreira Cavalcanti e Ritamaria Silva de Aguiar, ambos representando o Centro de Integração e Educação de Surdos; professora Dora Borges Ferreira, Glória Stefanini, Martha Fellows, presidente da APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais- Niterói; professora Marta Coelho, representando o Instituto de Ação Comunitária Tristão de Athayde; musicoterapeuta Marco Antônio dos Santos, coordenador do Curso de Musicoterapia do Conservatório Brasileiro de Música; Carlos Alberto Góes, presidente do CEIS, Centro de Educação e Integração dos Surdos e presidente do CISACEN, Centro de Integração dos Surdos nas Artes Cênicas; e outros participantes que constam na lista de presenças. Inicialmente, fazendo uso da palavra, a professora Albertina Brasil Santos traçou as linhas gerais da filosofia que norteia a proposta e os objetivos da Associação Very Special Arts Brasil (...) Ato contínuo (...) apresentou o organograma que traduz as diretrizes da associação, bem como a divisão da estrutura básica prevista no Estatuto da Associação, enfocando duas vertentes: arte- 51 processo e arte-produto (...) Em seguida, Marta Coelho levou a efeito a apresentação da chapa, citando nominalmente as pessoas que passariam a compor a primeira diretoria da Associação (....) aprovada por aclamação (...) Aberta a palavra, a Dra. Olivia Ferreira parabenizou a diretoria enfatizando a importância das diversas áreas. Em seguida, Ritamaria Silva Aguiar colocou para os presentes a mensagem enviada por Noêmia Varela7 na qual ela destacou a importância da iniciativa do comitê Very Special Arts/Brasil, colocando como dado relevante a troca, a nível intercontinental de experiências oriundas de diversos trabalhos realizados por profissionais e artistas, além da troca de materiais literários entre as demais associações, o que veio a respaldar os dispositivos previstos no Estatuto (...) sic. Essa primeira ata, aqui resumida, assinada durante e, posteriormente, à Assembléia por 55 pessoas, ocupa as primeiras três páginas do Livro de Atas da Associação Very Special Arts Brasil8. Ao longo de 14 anos, esse mesmo livro de capa escura, páginas amareladas, e, felizmente, infrequentes de traças e cupins, registra outras 20 atas, sendo que a última, com cinco páginas, refere-se a Assembleia Geral Extraordinária, no dia 31 de maio de 20049. Essa última assembléia, sendo tão importante quanto à primeira, marcou o rompimento da parceria que a Associação manteve com a FUNARTE durante quase uma quinzena de anos. Está composta por cinco páginas e assinala a lista dos 13 presentes na página 36. Alguns trechos serão citados e inseridos nos subcapítulos seguintes para alicerçar, numa linha de tempo, a trajetória e as atividades da Associação. É importante assinalar que essa reunião que resultou na criação oficial da Associação VSA Brasil não foi a primeira promovida entre aquele grupo de pessoas lá presentes. Pesquisa realizada pelo autor na documentação primária da entidade revela que ela foi precedida de outros encontros que remontam a 1988. 7 Noêmia Varela (1916) Pernambucana, pedagoga, arte-educadora, pioneira no trabalho com Arte na Educação Especial. No Rio de Janeiro, integrou o Grupo de Estudos Junguianos, coordenado pela Dra. Nise da Silveira. Fundou a Escolinha de Arte do Recife em 1953, juntamente com artistas como Aloísio Magalhães e Augusto Rodrigues. Foi diretora geral da Escolinha de Arte do Brasil de 1959 a 1982. Participou da formação de toda uma geração de arte-educadores no Brasil e na América Latina. 8 Livro de Atas, acervo da Associação Very Special Arts. Pesquisa do autor. Essa primeira Ata foi republicada, com ligeiras alterações no livro Subsídios para implantação de comitês estaduais e municipais. Brasília, Ed. Very Special Arts, Brasília, 1990, págs. 56 e 57. 9 As atas das assembléias 21º (2008), 22º (2012) e 23º (2014) não foram anotadas no livro. 52 Desses, o mais significativos, em razão dos desdobramentos posteriores, transcorreu em agosto, quando a professora Albertina Brasil, ao encerrar uma pós graduação em Maryland, sob os auspícios da entidade Companheiros da América - Partners of América - avistou-se em Washington, com Susan Flowers, então diretora-executiva do Programa Very Special Arts Internacional. O encontro ocorreu no Kennedy Center Performing Arts, complexo cultural que até hoje abriga a sede da entidade. Desse encontro resultou uma carta de 25 de outubro de 1988, assinada pela própria Susan, endereçada ao Ministério da Educação e à Secretaria de Educação Especial10, informando da reunião na capital norte-americana e do interesse do VSA Internacional em estabelecer um comitê no Brasil. Para tal, solicitava ao ministério apoio para que a iniciativa prosperasse. Um relatório de 10 de janeiro de 1989, cujo cabeçalho sublinhado o identifica como 1ª e 2ª reuniões do VSA/Brasil, endereçado “aos colegas” diz tratar-se de “uma síntese de nossas reuniões e alguns informes necessários à continuidade de nossos trabalhos sobre a Comissão do VSA Brasil” 11. Ou seja, antes da criação oficial da Associação e sua afiliação ao VSA Internacional, uma comissão de trabalho foi instalada e funcionou durante todo o ano de 1989 em encontros regulares e extraordinários, como, por exemplo, o ocorrido em outubro, quando da passagem pelo Rio de Janeiro de Trino Rojas, então coordenador para a América do Sul do VSA Internacional. Nesse encontro estiveram presentes representantes da CORDE/Ministério da Justiça, Ministério da Educação, Ministério da Cultura/Funarte e instituições de atendimento e representação na área das deficiências. Essa busca inicial de entendimentos e entrosamento entre entidades públicas e privadas para futuras parcerias vai estar gravada no Estatuto do VSA Brasil, como veremos abaixo. Sendo pertinente, vale destacar, que mesmo sendo uma entidade da sociedade civil, ela vai atuar com mais intensidade na área pública como se fosse um ente público, tamanho o volume de ações de políticas públicas desenvolvidas nas áreas da cultura, educação e direitos humanos. Além da constatação de que à época inexistiam políticas públicas culturais relacionadas a artistas e grupos com pessoas com deficiência, também adensa e facilita essa 10 11 Carta de Susan Flowers, acervo da Associação Very Special Arts. Pesquisa do Autor. Acervo da Associação Very Special Arts. Pesquisa do Autor. 53 proximidade, o fato da Associação funcionar “oficiosamente”, a partir 1991, numa sala do 5º andar do Palácio Gustavo Capanema, sede da Funarte. Sem se esquecer, do mais justificável para essa adjacência: a professora Albertina Brasil integrou a equipe de implantação da Funarte, durante a gestão de Roberto Parreiras12. A leitura de trechos da Ata de fundação revela algumas características e princípios que serão marcantes na trajetória da entidade. A arte e os artistas em suas “diversas áreas” é uma prerrogativa, acrescida de uma proposta de trocas de experiências “a nível intercontinental” de trabalhos literários realizados por profissionais, professores e pesquisadores, e também entre entidades similares ou congêneres. A presença nesse ato inaugural de representantes do Rio Arte, - à época, destacada fundação cultural da cidade do Rio de Janeiro e do Conservatório Brasileiro de Música (CBM-RJ) denotam que a arte é a principal vertente de atuação elegida pela Associação. É para também se notar a presença de entidades com um lastro histórico em atividades segmentadas com pessoas com deficiência, como APAE e FENEIS. Será marcante na trajetória da Associação essa diretriz de congregar em suas atividades, seja em festivais ou em seminários, entidades públicas e privadas atuantes em distintos segmentos das pessoas com e sem deficiência. O primeiro Estatuto da entidade teve seu registro a 18 de junho de 199013, era composto por 37 artigos, divididos em três capítulos, a saber: Capitulo I, Denominação, Foro e Finalidade; Capítulo II, Da Constituição; e Capítulo III, Das Disposições Gerais. Dos três, vamos nos fixar em alguns artigos do 1º e do 2º Capítulos que melhor traduzem as propostas e características da entidade naquele início dos anos de 1990. Esclarecemos que ao longo dos anos esse estatuto sofreu algumas alterações, ampliações ou reduções, seja por exigência legal ou exigências outras quando da assinatura de convênios com entes públicos e privados. O Artigo 2º do Capítulo 1º diz que a “a Associação tem por finalidade viabilizar a participação do artista portador de 12 Gestor público com passagens por outros importantes órgãos públicos federais, como Embrafilme e TV Educativa. Na década de 1990, foi assessor e, em seguida, chefe de gabinete do então vice- presidente da República, senador Marco Maciel. 13 Acervo Associação Very Special Arts/pesquisa do autor. Republicado no livro Subsídios para implantação de comitês estaduais e municipais. Brasília, Ed. Very Special Arts, Brasília, 1990, págs. 51 a 56. 54 deficiência14 nas atividades artísticas que ocorrem no País e no exterior, especificamente: I – Incentivando e promovendo pesquisas, levantamento, debates, cursos, seminários centrados na arte, sempre com a participação de pessoas portadoras de deficiência; II – promovendo festivais, mostras, debates e outros eventos que priorizem a arte da pessoa portadora de deficiência; III – Buscando a integração de entidades públicas e privadas vinculadas às áreas de artes e às pessoas portadoras de deficiência e bem dotados, sempre com o objetivo de viabilizar programações artísticas para e com pessoas portadoras de deficiência; IV – apoiando e incentivando programas de treinamento e profissionalização de artistas portadores de deficiência que lhes facilite novas opções no mercado de trabalho; V – integrando-se a programas da área da educação artística buscando novas formas de ação. No Capítulo 2ª, Da Constituição, a Seção VI, Da Divisão de Promoção Artística, e a Seção VII, Da Divisão de Educação Artística, os artigos 22 a 27 merecem transcrição pela já manifesta vontade da Associação em promover atividades associando Arte e Educação. Senão vejamos. Art. 22. A Divisão de Promoção Artística é integrada pelos seguintes setores artísticos: I - artes cênicas; II – artes Visuais; III – Música; IV - Literatura; V- Fotografia, cinema e vídeo; VI- Cultura popular; VII – Interartes. Parágrafo único: a Divisão de Promoção Artística será coordenada por pessoa escolhida pelos setores artísticos. 14 Nomenclatura usada na época para se referir a pessoa com deficiência. Evgen Bavcar, o fotógrafo cego e professor de História da Sorbonne e colaborador do VSA Brasil, ao cruzar os vários arquétipos do deficiente na história ocidental, afirmava: “a palavra deficiente, bem como a proliferação das expressões mais contemporâneas que a substituem, testemunham os esforços da humanidade para dissimular a verdadeira substância que estas palavras designam, isto é, o corpo. O corpo que possuímos está sempre em desnível em relação àquele que imaginamos ter”. Bavcar, Evgen. O corpo, espelho partido da história – in: O homem máquina. São Paulo, Cia das Letras, 2002. 55 Art. 23. Compete a Divisão de Promoção Artística o assessoramento dos programas artísticos, a colaboração na avaliação da Associação e o planejamento e execução de Festivais e Mostras de Arte. Art. 24. Compete a setores artísticos a execução de programa da Associação e da Divisão de Programação Artística Da divisão de Educação Artística Art. 25 A Divisão de Educação Artística será constituída pelos Setores de Cursos, Seminário e Simpósios, do Setor de Apoio ao Treinamento e do setor InterInstitucional. Art. 26. Compete à Divisão de Educação Artística coordenar as atividades ligadas a programas de arte educação. Art. 27. O setor de cursos, o setor de Apoio ao Treinamento, e o Setor Interinstitucional, serão executores de programas e projetos visando à realização de seminários, simpósios, treinamento de pessoas portadoras de deficiência na área artística e projetos que objetivam o incremento do ensino e a prática das artes voltadas também à profissionalização nas instituições de atendimento às pessoas portadoras de deficiência buscando apoiar aquelas dotadas de talento artístico, propondo a troca de experiências entre elas. A transcrição de vários trechos do Estatuto presta-se para informar, o quanto era abrangente as finalidades e propostas dessa entidade apenas enunciadas na cerimônia de fundação, três meses antes, num Salão de Festas de um edifício em Copacabana, no Rio de Janeiro. Prédio modesto para os padrões arquitetônicos e estético das construções circunvizinhas. Era lá que residia a madre, professora, assistente social por formação, mas gestora cultural por vocação e paixão, Albertina Brasil Santos. A leitura desse primeiro Estatuto da entidade confirma que sua publicação foi antecedida por muitos encontros e debates, pela constituição de um grupo predecessor que se transformou numa Comissão de Trabalho -, tantos são os temas e desafios postos como meta. O que salta aos olhos nas nove páginas do Estatuto são as imbricações desejadas e claramente manifestas nas atribuições da Divisão de Promoção Artística. Diz da promoção e da profissionalização do artista e de sua produção estética, por meio 56 de mostras e festivais. O objetivo é a inserção com regularidade dos artistas na programação cultural de entidades congêneres, públicas e privadas. De igual modo, nas atribuições da Divisão de Educação Artística, que vai se dedicar à pesquisa, à realização de cursos e seminários, a coordenar as atividades e programas na área de arte-educação, mas de forma interinstitucional. Ou seja, a proposta é promover no âmbito de tantas atividades listadas, o congraçamento de instituições de atuação até então segmentadas. No Estatuto da Associação, nos idos daquele março de 1990, a Arte é o argumento que prevalece e tenta enternecer e convencer a todos, associados e simpatizantes. No entanto, é um mês marcante e traumático para as entidades culturais brasileiras. 3.2 O desmonte collorido O que surpreende e causa espanto, quando nos detemos em outros fatos ocorridos nesse mesmo mês de março de 1990, é, que ao contrário das propostas e objetivos da recém criada entidade de arte e cultura da sociedade civil, a ambiência cultural, naquele momento, era uma das piores em toda a história do país. O ex-governador das Alagoas, Fernando Collor de Melo, fora eleito presidente da República, em segundo turno, em novembro de 1989. Era uma candidatura quase que avulsa, alheada dos partidos e dos movimentos que se consagraram na luta pela redemocratização do país. Voluntarioso, insolente e sagrado na mídia durante toda a campanha eleitoral como o caçador de marajás - alusão a funcionários públicos com salários imorais, como os existentes nas Alagoas-, raros foram os artistas que estiveram ao seu lado na jornada e, mais escassos ainda, ou quase inexistentes, o apoio ou a companhia de entidades representativas da classe artística e do movimento cultural do país. Uma das exceções era o cineasta paraibano Ipojuca Pontes, um dos poucos embarcados de primeira hora na nau capitânia da campanha. Se posicionando como um cruzado dessa nova era collorida, Ipojuca se manifestou durante quase todo o ano de 1989 nas páginas de O Estado de São Paulo, escrevendo dezenas artigos, em que atacava e denunciava pessoas e instituições culturais do país, especialmente, as que estavam afeitas às atividades cinematográficas. 57 Valia-se do fato que no final dessa década, eram visíveis a redução da capacidade de investimento do Estado diante da crise econômica dos anos 1980. No setor das atividades cinematográficas, para citar um exemplo, as produções estavam dolarizadas com custos muito aquém da capacidade de investimento dos produtores nacionais. Aliados e para agravar esse aspecto econômico, observava-se o progresso técnico do cinema estrangeiro, notadamente dos Estados Unidos, e sua maior agressividade na conquista de mercados na América Latina; o amplo desenvolvimento das tecnologias de comunicação de massa e, para remate dos males, a buliçosa campanha de denúncias na imprensa – como a perpetrada por Ipojuca- dirigida a Embrafilme, acusada de clientelismo, má administração, desperdício e corrupção. A repercussão na opinião pública contribuiu para a aceitação de que o cinema [e por extensão, outras atividades artísticas] não devia ser matéria de governo (REGADAS LUIZ, 2007, p. 2). Eram falas viperinas, não só contra a Embrafilme, mas contra o Ministério da Cultura como um todo, tornadas a cada vez mais altissonantes e graves à medida que a campanha avançava e Collor de Melo amealhava eleitores em grotões, cidades e em distintas classes sociais rumo à vitória que veio em segundo turno, em novembro de 1989. Uma vitória sem sobressaltos e atropelos, sem debates abertos, sem a participação do povo, ausência de passeatas e supressão de comícios de rua. Uma campanha eletrônica, ardilosamente engendrada por marqueteiros políticos – foi a estreia triunfal dessa nova profissão no país - e com o apoio decisivo e desavergonhado da Rede Globo de Televisão. Triunfaram os vitupérios lançados a todos e a tudo, o embuste, o gestual teatralmente ensaiado para cada palavra e movimento, os olhos rútilos e esbugalhados, o destempero e o destemor movido por doses de estimulantes químicos que criaram um Collor de Mello, parte Nosferatu, monstro atraente e ameaçador, parte super-herói, um enviado da Galáxia de Gutemberg para fundar uma nova era, um novo país. Em situação de palanque, presencial ou eletrônico, Collor de Melo encarnava outros tantos personagens, sem perder, no entanto, o estilo, a arrogância e a prepotência da capangagem alagoana que o embalou desde o berço. Era um exterminador de adversários e de instituições. Foi essa a sua primeira missão presidencial e ele soube cumpri-la à risca. 58 No dia seguinte à posse, a 16 março de 1990, Collor assinou e faz publicar no Diário Oficial da União, o Decreto Lei nº 8.028 extinguindo o Ministério da Cultura e todas as fundações e empresas a ele vinculadas, entre elas, a Fundação Nacional de Arte, Funarte, a Fundação Nacional de Artes Cênicas, Fundacen, a Fundação Cinema Brasileiro, FCB, e a famigerada EMBRAFILME. O poeta e tradutor Sebastião Uchôa Leite à época funcionário do Setor de Edições da Funarte é autor de um contundente e imprescindível artigo, Governo Collor: os dez meses que assolaram a cultura (Revista Piracema, 1993) sobre o que ocorreu nas instituições e nas políticas culturais durante esse período15. Assim ele abre o seu texto: O início do governo de Fernando Collor de Melo em 1990 desencadeou uma verdadeira fúria contra as instituições culturais federais do país. Como se não bastasse a desarticulação nunca vista da máquina administrativa, determinou-se, através de medida provisória, o fim das fundações culturais – Funarte, Fundacen e Fundação do Cinema Brasileiro (FCB), além da Embrafilme. Os dez meses entre essa medida e a instalação do Instituto Brasileiro de Arte e Cultura (IBAC) constituíram o campo para uma política de “terra arrasada” uma destruição até hoje inexplicável de entidades em pleno funcionamento. Cabe aos filósofos explicarem o porquê dessa fúria e aos pesquisadores detalharem um mapa dessa devastação (1993: 121). Tal como o Ministério da Cultura foi reduzido ao status de Secretaria, diz Uchôa Leite, as três fundações foram reduzidas ao status de um instituto único. (...) Para a devastação ser completa instalou-se na Secretaria de Cultura um ressentido, vindo da área de cinema com bagagem cultural ínfima [o acima citado, Ipojuca Pontes, observação do autor] o qual pareceu ter prazer pessoal com a liquidação total da Embrafilme e a redução drástica de ouras áreas (op. cit. Pág. 123). A etapa seguinte prossegue o poeta em tom desolado, foi a do desmantelo dos programas dos órgãos reunidos no IBAC pelo corte sistemático de verbas, programas que estavam praticamente suspensos no “terror” de nove meses, no qual o primeiro secretário da Cultura veio a público dizer que o governo estava fazendo “uma revolução sem fuzilamentos”. (Op.cit. pág. 123) 15 Sebastião Uchoa Leite (1935-2003), poeta, tradutor e ensaísta. Em 1980, ganhou os prêmios Jabuti de poesia (1980), e de tradução, em 1998 e 200. Traduziu obras de vários autores como Júlio Cortázar, Lewis Carroll, A. M. Krich, Ângelo M. Ripellino, Stendhal, Octavio Paz e François Villon. 59 Assim, com uma diferença de poucos dias, menos de uma semana, anotamos esse paradoxo no campo das políticas culturais do Brasil: o desmonte e a liquidação de uma dezena de instituições públicas, em contraponto com a criação de uma entidade cultural da sociedade civil com foco na arte e na produção artística a ser realizada por pessoas ou grupos integrados por pessoas com e sem deficiência. Aqui, é seguro afirmar, que no campo das políticas culturais do país, naquele mês de março de 1990, não ocorreu acontecimento tão contrastante. De um lado, a Funarte, às vésperas de completar o seu primeiro jubileu sob a intervenção de um liquidante; de outro, a Associação Very Special Arts Brasil, tramitando documentos para se legalizar e organizar um encontro para democratizar e compartilhar seu funcionamento por meio de comitês de voluntários. Não por coincidência, nos anos seguintes e por mais de uma década as duas entidades vão soerguer-se num caminhar em paralelo, mas juntas. Parceria só interrompida quando uma tenta incorporar a outra de forma abrupta e petulante, usurpando sua história e patrimônio, intervindo para liquidar, reproduzindo a lição apreendida com o jagunço das Alagoas. Parte desse lamentável desenlace será narrado nas conclusões finais. 3.3 Albertina Brasil Santos, breve perfil Nascida em Pouso Alegre, Minas Gerais, em 1925, Albertina graduou-se em Serviço Social na PUC Campinas. Realizou pós-graduação nos EUA em Administração de Programas Sociais e Lideranças Comunitárias nas Universidades de Chicago, Pittsburgh e Saint Louis. Madre na Congregação das Missionárias de Jesus Crucificado, ordem religiosa caracterizada por forte atuação no campo social, foi fundadora e diretora da Faculdade de Serviço Social de Sergipe (1954-1959), onde criou e dirigiu o Centro de Cultura e Arte e o Centro de Extensão Comunitária. Em 1960, transferiu-se para Minas Gerais, assumindo a direção da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora- UFJF, de 1960 até 1966, ano em que voltou a Sergipe, por determinação da Congregação - diante das pressões do general Mourão Filho, comandante da 4ª Região Militar e detonador do Golpe Militar de 1964- , que a acusava de abrigar e proteger professores e estudantes “comunistas” na Faculdade de Serviço Social. 60 De volta a Sergipe, idealizou e dirigiu os Festivais de Artes de São Cristóvão de 1968 a 1973, que se rivalizava em importância cultural e política ao de Ouro Preto - que se transformaram em pontos de contestação ao regime militar vigente, com mais ênfase após a edição do AI-5. Presidiu a Aliança Francesa de Sergipe e foi vice-presidente do Conselho Estadual de Cultura de Sergipe, de 1974 a 1978, ano em que deixou o hábito da Ordem das Missionárias. Recebeu o título de cidadã Honorária do Estado de Sergipe e da Capital, Aracaju. Em 1998, recebeu do Conselho Universitário da Universidade de Sergipe o título de Professora Emérita, pelos relevantes serviços prestados ao ensino universitário. Em 1979, integrou-se à equipe da Fundação Nacional de Arte, sendo diretora adjunta até 1981. Em 1989, com bolsa de estudos da Universidade de Maryland, conheceu Jean Kennedy Smith, irmã do presidente J.F. Kennedy, que fundara em 1975, o Programa Very Special Arts voltado para a promoção e a inserção sociocultural de artistas com necessidades especiais. Em 1990, obteve a afiliação e trouxe o VSA para o Brasil - adotando também o nome de Programa Arte Sem Barreiras, por ser uma entidade nacional-, ainda num contexto social e cultural de extrema rejeição e de incompreensão com as pessoas deficiência. Por sua orientação, e de forma pioneira em todos os 86 países onde, à época, o VSA se fazia presente, o Programa Arte Sem Barreiras passou a trabalhar de uma forma inclusiva, unindo e promovendo o diálogo estético entre deficientes e não deficientes, conjugando em seus eventos mostras de arte, Festivais, e Congressos, para fomento e divulgação de conhecimentos no campo da arte-educação e inclusão. Desde quando implantou e assumiu a direção da Associação VSA Brasil, Albertina convivia com uma retinose degenerativa, que ao longo dos anos progrediu e reduziu em apenas 10% seu campo da visão. Faleceu a quatro de janeiro de 2004, no Hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte, em decorrência de graves ferimentos em um acidente de trânsito, ocorrido três dias antes, quando estava no interior de um táxi abalroado por um outro veículo. Foi sepultada no dia seguinte em sua cidade natal, Pouso Alegre. 3.4 Ação nacional, criação dos comitês estaduais e municipais Ao pesquisarmos os documentos e procedimentos para a implantação da Associação VSA Brasil, nos deparamos com a necessidade de situar esse processo no campo das 61 políticas públicas de cultura. Mas por conta das especificidades e abrangência constantes em seu Estatuto e, especialmente, em razão dos fatos e eventos que originaram e impulsionou a trajetória da Associação, esse campo de estudo foi alargado para as áreas da educação especial e os direitos humanos, conforme está posto no Capítulo segundo. Foi esse tripé formado pela conjugação e o entrelaçamento de políticas públicas de Cultura, Educação e Direitos Humanos que nortearam os caminhos da entidade. Nos procedimentos iniciais, tanto o Ministério da Educação, por meio da então Coordenação de Educação Especial, COEE/MEC, como a Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, CORDE, à época, na estrutura do Ministério da Assistência Social, MAS, conjugaram esforços e recursos para os encontros da Comissão de trabalho que precedeu e, em seguida, implantou a entidade. São essas duas instituições, COEE/MEC e CORDE, que vão apoiaram, por exemplo, a realização nos dias 27, 28 e 29 de agosto de 1990, na Escola de Administração Fazendária, em Brasília, do 1º Encontro Nacional do Very Special Arts – Brasil para a criação dos Comitês Estaduais. A proposta do evento era reunir representantes das secretarias de Educação dos estados, instituições privadas e pessoas interessadas para apresentar as diretrizes e políticas da Associação Very Special Arts/Brasil, visando à criação de comitês estaduais. A meta desse encontro “era descentralizar as ações da Associação Very Special Arts disseminando os objetivos e filosofia do Comitê Nacional e internacional e valorizando o artista portador de deficiência”. A publicação sobre o evento16, não traz apenas a sua programação, cuja abertura, aliás, contou com a presença do então ministro da Educação, Carlos Chiarelli. No texto da apresentação, Albertina Brasil, diz que o Encontro teve como um dos seus principais objetivos o de preparar e orientar representantes do movimento na criação de Comitês Estaduais do Very Special Arts- Brasil. Os comitês, diz ela, sentinelas avançadas do VSA, têm a missão específica de executar as ações definidas pela Diretoria Nacional, adaptando-se às peculiaridades locais de cada estado e de todos os seus municípios. (...) 16 Subsídios para implantação de comitês estaduais e municipais. Brasília, Ed. Very Special Arts, Brasília, 1990. 62 Esses Comitês, irão prioritariamente, buscar os meios necessários ao desenvolvimento artístico das pessoas com necessidades especiais”17. O livro, com 62 páginas, foi editado após o evento18. Ele traz um perfil mais amplo da Entidade, com mais especificações daquelas postas na primeira Ata e no Estatuto. Faz também um retrospecto da entidade que “apesar de jovem, já dispõe de um número significativo de realizações” 19. Nesse perfil mais detalhado, consta a informação de que a Associação VSA Brasil, Very Special Arts, Vida Sensibilidade e Arte20 “criada oficialmente em 1990, vem funcionando através de um Comitê desde o final de 1988. Constitui-se como uma Associação não governamental, sem fins lucrativos, afiliada ao Very Special Arts Internacional, do Kennedy Center for the Performing Arts, em Washington. “Nasceu da consciência que têm seus associados de que a luta dos artistas portadores de deficiência é ainda mais difícil que a dos artistas em geral, devido não só a incompreensão que muitas vezes acompanha os artistas, como também ao preconceito dos muitos que veem apenas as limitações do corpo, dificultando-lhes assim a afirmação da sensibilidade e da arte, indiferentes aos exemplos de deficientes famosos como Goya, Toulouse-Lautrec, Beethoven, Ray Charles, o nosso Aleijadinho e muitos outros. Foram considerações como essas que definiram os objetivos da Associação de trabalhar para viabilizar a participação do artista portador de deficiência em atividades artísticas. O VSA Brasil vem, assim, suprir uma grande lacuna, pois até a sua criação existiam 17 ob. Cit. Pág.5. Na primeira folha de rosto da publicação está escrito; esse documento foi elaborado conforme as conclusões dos trabalhos realizados no Encontro Nacional para Criação dos Comitês Estaduais do Programa Very Special Arts Brasil, realizado em Brasília, em agosto de 90. 19 ob. Cit. Pág. 14. 20 Ob. Cit. Pág. 13. - É o primeiro documento em que o acróstico/acrograma Associação VSA Brasil aparece em sua tradução brasileira, Associação Vida, Sensibilidade e Arte. Suponho que tal iniciativa ocorreu para reiterar o caráter brasileiro da entidade, afastando a falsa idéia de que a Associação era uma filial (e não afiliada/ associada) de uma entidade norte-americana. Não foi poucas vezes, que Albertina ouviu insinuações que o VSA era uma cunha para consolidar o domínio ianque do Brasil. Eu mesmo ouvi, em certa ocasião, de um artista em uma excursão no exterior a expensas do Programa, que VSA “era parte de um complexo de espionagem da CIA”. No tópico dedicado à Avaliação Final do Encontro, está registrado dissensões nos debates: quanto às discussões, registraram-se algumas divergências em relação a certas posturas da Associação VSA, mas de um modo geral, houve reconhecimento das realizações administrativas, técnicas e plena aceitação da filosofia de ação que tem norteado o VSA Brasil. No entanto, sublinha o texto, tudo isso aconteceu num clima de harmonia intelectual e afetiva. 18 63 poucas iniciativas isoladas, na área das artes, para atender as necessidades e os direitos das pessoas portadoras de deficiências” 21. Afinal, quais os motivos das dissenções registradas na avaliação? Por certo, devido à presença e a um percentual maior de professores no Encontro. São eles, afinal, que serão eleitos e irão ocupar em maioria a coordenação dos comitês municipais e estaduais: “esclareceu-se, enfaticamente, que um artista pode e deve ocupar o cargo de coordenador desse movimento, desde que possua o sentido da liderança aliado à capacidade administrativa e habilidade de entender as diferenças22. Aqui é importante esclarecer que o trabalho do coordenador e de sua equipe era feito de forma voluntária, sem qualquer tipo de retribuição ou remuneração financeira. Em 2003, uma relação com os 32 comitês da Associação VSA Brasil, estaduais e municipais, contavam cerca de 600 voluntários. 3. 5 Memorial, 1990 a 2005 Em 1990, quando foram iniciadas as atividades do Programa Very Special Arts no Brasil, a expectativa e o compromisso - tomando como referência outros países onde o VSA Arts existia há mais tempo - era a realização de um Festival Nacional de Arte a cada dois anos. E assim foi nos primeiros anos. No entanto, com o avanço do Programa e a constituição de comitês em várias regiões do país, a demanda por festivais e congressos cresceu, e a opção por um evento anual se deu naturalmente. A partir de 1994, os festivais nacionais ganharam essa periodicidade anual, afora outras dezenas de mostras regionais e municipais, que se prestava para estimular e legitimar artistas e grupos locais com potência criativa e estética. Valiam também para dar visibilidade local e regional de forma que esses artistas fossem ser inseridos em programas e atividades culturais regulares de organismos municipais e estaduais de Cultura. Na primeira versão do Festival de Arte sem Barreiras, realizado em 1991, no Rio de Janeiro, ainda persistiam muitas dúvidas sobre como mostrar a arte do portador de 21 Ob. Cit. Pág. 13. Sobre os participantes, grande parte provinha da área de educação e da educação especial, embora, com uma representação menor, os arte-educadores, artistas e administradores da cultura, marcaram presença, ajudando a definir a especificidade artística do trabalho proposto. 22 Ob. Cit. Pág. 39 64 deficiência a uma plateia, às vezes leiga, não segmentada, e mais, como fazê-la diferenciar um trabalho em processo - arte bruta e virgem, usando aqui conceitos de Mário Pedrosa - de outros trabalhos realizados por artistas com (in)formação e pleno domínio de suas técnicas e de seu produto final. O postulado do Programa era mostrar a arte, e não a deficiência do artista. No festival seguinte, realizado em 1994, em Juiz de Fora, foi agregado no âmbito do Festival, um Congresso Nacional de Arte-Educação Especial, com a proposta de sensibilizar e de aproximar educadores especiais e, principalmente, arte-educadores, das questões da arte e produção estética realizada pelos artistas e grupos com deficientes. Essa conjunção de artistas com educadores, conforme foi descrito no capítulo 3, se mostrou bastante enriquecedora para o Programa Arte Sem Barreiras. Essa relação abriu diálogos e da troca de experiências que resultaram em renovação de diretrizes, especialmente, sobre como expor o fazer do artista deficiente. Desde então, os festivais passaram a ser realizados em conjunto com os congressos nos quais as atrações artísticas eram vistas sob duas vertentes: a que foi denominada processo, que eram experiências estéticas ainda em desenvolvimento sob a orientação de artistas e/ou arteeducadores; e a vertente profissional, que contemplava aqueles grupos de artistas cujos trabalhos mostravam-se em condições e com potência estética para circular por espaços culturais não-segmentados. A seguir, uma breve cronologia das atividades do Programa 1990 a 1993 Instalação, em março de 1990, do Programa Very Special Arts Brasil, com a presença de cinqüenta pessoas, eleição de sua diretoria e estabelecimento de metas, entre as quais realização anual de um festival ou mostra de arte. Instalação no Brasil, na cidade de Niterói, do primeiro tear especialmente adaptado para portadores de deficiência, através da instituição Saori, filiada ao VSA/ Japão. Criação dos primeiros comitês estaduais, com apoio da Secretaria de Ensino Especial e do Ministério da Ação Social. Em 1992, o Programa realizou seu I Festival Nacional de Arte Sem Barreiras, no Espaço Sérgio Porto, no Rio de Janeiro, e seus primeiros encontros estaduais, em Rondônia e Rio de Janeiro. 1994 65 Realização do II Festival Nacional de Arte Sem Barreiras e I Congresso Nacional de Arte-Educação Especial, no período de 4 a 6 de novembro, em Juiz de Fora, com apoio do Instituto de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora. Palestras, mesasredondas e shows musicais com delegações de dez estados da federação. 1995 Lançamento, em março, com apoio do Programa e parceria com a Universidade Federal do Espírito Santo, da revista de quadrinhos Gazoo, de autoria de Wellington Torres, a primeira publicação nacional cujo personagem central é um portador de deficiência. Realização em Natal (RN), no período de 3 a 6 de outubro, do III Festival Nacional de Arte Sem Barreiras e do II Congresso Nacional de Arte-Educação Especial, executado em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Escola Técnica Federal. Palestras, mesas-redondas, oficinas, com a participação de 550 congressistas representando 15 estados da federação. 1996 Realização do IV Festival Nacional de Arte Sem Barreiras e o III Congresso Nacional de Arte-Educação Especial, no período de 25 de novembro a 2 de dezembro, em Curitiba, com a participação de cerca de 1.200 pessoas entre educadores e artistas de várias regiões do país. Locais: Teatro Guaíra, Ópera do Arame e Universidade Federal do Paraná (UFPR) 1997 Julho - Participação brasileira no I Festival Internacional de Dança em Cadeiras de Rodas, que teve lugar em Boston, no período de 11 a 15 de julho. A delegação brasileira foi representada pelos grupos Limites Cia de Dança, de Curitiba, e Roda Viva Cia de Dança, de Natal. Agosto - I Festival Amazônico de Arte Sem Barreiras e de Arte-Educação Inclusiva que teve lugar em Manaus, no período de 29 a 30 de agosto. Participou do encontro cerca de 50 artistas e 230 professores de educação especial de vários estados da Região Norte. 1998 Nesse ano, todas as ações do Programa Arte Sem Barreiras foram concentradas no planejamento e execução do I Festival Latino-Americano de Arte Sem Barreiras e do I 66 Congresso Latino-Americano de Arte-Educação Inclusiva, que teve lugar no SESCPompéia, em São Paulo, no período de 27 a 30 de maio. Durante quatro dias, cerca de duas mil pessoas, entre artistas, arte-educadores e representantes de dezenas de entidades do Brasil e de 22 países, se fizeram presentes em São Paulo, participando dos dois eventos que estabeleceram um novo patamar educacional e artístico nas relações portadores de deficiência e sociedade. O presidente mundial do VSA, John Kemp, esteve presente nos dois eventos e coordenou reunião de avaliação do programa na América Latina com a presença de representantes do Very Special Arts de vinte países do continente. 1999 Março - I Encontro Regional de Arte Sem Barreiras do Estado de Goiás, em Goiânia. Palestras com arte-educadores de Goiás e de outros estados, oficinas de artes plásticas (com exposições dos trabalhos), de teatro, música e dança no auditório da Reitoria e na Faculdade de Arquitetura da Universidade Católica de Goiás (UCG), além de apresentações no Centro Livre de Arte de Goiânia. Apoio UCG, secretarias municipais de Educação e de Cultura e Goiânia Shopping. Maio - Art & Soul Festival 1999, em Los Angeles, Califórnia, celebrando os 25 anos de criação do VSA Internacional. Participaram do Festival cerca de mil pessoas representando os 86 países filiados, entre os quais o Brasil, com uma delegação artística composta por: violonista Nenéu Liberalquino (PE), Grupo Limites de Dança (PR) e artista plástico e arquiteto Assis Aragão, de Brasília. Junho - Encontro de Educação Especial, sob o lema “Uma escola de qualidade para todos respeita a diversidade”, organizado pela Secretaria de Educação Especial (SEESP), do Ministério da Educação, que teve lugar na cidade de Pirenópolis (GO) no período de 14 a 18 de junho. Presentes vinte representantes regionais e dois municipais do Programa, além da direção e equipe executiva nacional Funarte/VSA que atuaram ativamente em toda a programação do Encontro - plenárias, colóquios, grupos de estudos- que resultou na Carta de Pirenópolis – ver Capítulo 3 – na qual ficaram gravadas proposições e compromissos, e priorizadas ações no campo da Arte no âmbito da Secretaria e do Ministério da Educação. 67 Agosto - Encontro Nacional de Arte Sem Barreiras de Belo Horizonte, 25 a 28 de agosto, organizado pelo VSA/MG, sob patrocínio da Secretaria Municipal de Cultura, entre outras entidades, com ampla agenda de shows, exposições, oficinas e seminários. Outubro - V Festival Nacional de Arte Sem Barreiras e o IV Congresso Nacional de Arte-Educação Inclusiva, realizado em João Pessoa (PB), no período de 20 a 23 de outubro, com apoio das Secretarias de Estado e Municipal de Cultura e Educação, Secretaria de Turismo, SESC/PB e Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação. 2000 Abril - Apresentação de Brasil, 5oo anos de tradição, espetáculo da Companhia de Dança Inclusiva Anjori, no Teatro Alberto Maranhão, em Natal. Agosto -First International Disability Special Arts Festival Izmir – Turquia – de 14 a 22 de agosto de 2000. Realizado na cidade de Izmir, o First International Disability Arts Festival recebeu delegações de artistas da Alemanha, Brasil, Bélgica, Bulgária, Cuba, Espanha, Egito, Holanda e Itália, além de representantes de comunidades do país anfitrião. Apresentações do pianista gaúcho Angelin Loro, do violonista pernambucano Nenéu Liberalquino e da Companhia Limites de Dança, de Curitiba. Setembro - Mostra de Arte Sem Barreiras, no âmbito da V Semana Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência, em Juiz de Fora, de 17 a 23 de setembro, organizada pelo Comitê Municipal do VSA Arts Apoio: da Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage, da Prefeitura da Cidade de Juiz de Fora. Outubro - Lançamento do CD De mãos dadas, com músicas compostas e interpretadas por Leci Brandão e Pedrinho Sem Braço. Apoio: Comitê Paraolímpico Brasileiro Novembro - Realização do V Congresso Nacional de Arte-Educação na Escola Para Todos e do VI Festival Nacional de Arte Sem Barreiras. Período: 6 a 9 de novembro de 2000 Local: Centro de Convenções Ulysses Guimarães e Teatro Nacional Cláudio Santoro Brasília/Distrito Federal 68 Tema central do Congresso e Festival: Arte-Educação em diálogo com a diversidade Eixos temáticos: Arte na perspectiva da inclusão; globalização e multiculturalidade; arte, educação, saúde e qualidade de vida; acessibilidade aos espaços artísticos e culturais. Parcerias: Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação; Funarte, do Ministério da Cultura; CETEFE; UNESCO; Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE; Caixa Econômica Federal; Federação Nacional das APAEs – FENAPAEs; Federação dos Arte-Educadores do Brasil – FAEB; Governo do Distrito Federal através da Agência de Desenvolvimento do Turismo do Distrito Federal – ADETUR; da Secretaria de Estado de Cultura do Distrito Federal; da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal; e da Secretaria de Esporte e Lazer (DEFER) do Distrito Federal; Coordenadoria Nacional para a Integração das Pessoas Portadoras de Deficiência (CORDE) da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, do Ministério da Justiça e Comitê Paraolímpico Brasileiro. Dezembro - Concerto Natalino com 80 vozes com a participação da Sociedade Filarmônica de Sergipe (SOFISE), na Igreja de São Salvador, em Aracaju, reunindo alunos de três instituições que trabalham com reabilitação: Projeto Luz do Sol, Clínica Escola de Reabilitação Rosa Azul e CAP. Promoção: Vsa Arts de Sergipe. 2001 Março/julho - Exposição das obras do fotógrafo Evgen Bavcar Local: Centro Cultural Nansen de Araújo/SesiMinas, Belo Horizonte (março/abril), Ouro Preto (maio), Mariana (junho) e Congonhas do Campo (julho). Apoio: SESIMINAS e Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte. Julho - Oficina de Férias de Técnicas Circenses Local: Escola Nacional de Circo Rio de Janeiro. Grupos participantes: Pulsar Cia de Dança (RJ) e Corpo e Movimento ANDEF (Niterói) sob a supervisão dos coreógrafos Teresa Taquechel e Carlinhos de Jesus. Apoio: Funarte/ Escola Nacional de Circo. Agosto- Encontro Nacional de Dança para Portadores de Deficiência, em Macaé, RJ. Período: 05 a 08/7. Participação de 10 Companhias. Coordenação: Comitê Estadual VSA/Rio de Janeiro e Comitê Municipal do VSA/Macaé. Apoio: Funarte, Petrobrás, 69 Prefeitura de Macaé (Sec. Municipais de Educação e de Cultura) e Centro de Vida Independente (CVI –Macaé) Projeto musical/ Arte Sem Barreiras - Local: Rio de Janeiro Sala Funarte/ um show mensal Período: junho a dezembro. Apoio: Coordenação de Música/ Sala Funarte. Itinerância da exposição do fotógrafo Evgen Bavcar. Locais: Porto Alegre, Pelotas e Caxias do Sul (RS). Período: 01/07 a 30/09. Abertura da itinerância: dia 5 de julho na Casa de Cultura Mario Quintana. Coordenação: Comitê Estadual do VSA RS. Apoio: Funarte, UFRS/Memorial do Rio Grande do Sul, Casa de Cultura Mário Quintana (Sec. de Estado da Cultura/RS) e Prefeituras Locais Pesquisa de linguagem: Grupos de teatro e dança. Local: Teatro Cacilda Becker (RJ) Grupos: Pulsar Cia de Dança (RJ), Teatro do Sol (Niterói). Período: julho a dezembro, sempre às sextas feiras. Coordenação: comitê VSA/RJ. Apoio: Coordenação de Dança/Deacen/Funarte e Faculdade Angel Viana Apresentação do Projeto–Piloto Prevenção, Escola e Comunidade. Lançamento do Projeto-Piloto (com realização de oficinas) Local: Aracaju e Nossa Senhora da Glória (SE) Período: 28/07 a 03/08 Local: Nossa Senhora da Glória (SE). O Projeto envolveu cerca de 8.800 alunos de várias escolas dos municípios de Sergipe. Coordenação: Comitês Estadual do VSA/Brasil de Sergipe e Municipal de Nossa Senhora da Glória (SE). Apoio: Funarte, Secretaria de Educação Especial/FNDE/MEC I Congresso/Festival Nordestino de Arte Sem Barreiras (SE). Local: Aracaju e N. S. da Glória. Período: 25 a 28/07 Coordenação: Comitês Estadual do VSA/Brasil de Sergipe e Municipal de Nossa Senhora da Glória (SE). Apoio: Funarte, Secretaria de Educação Especial/MEC, Universidade Federal de Sergipe, Prefeituras de Aracaju, Nossa Senhora da Glória, Areia Branca, Estância, Capela, Nossa Senhora das Dores, Rosário do Catete, através de suas secretarias de Educação, Saúde e Cultura, Associação de Pais e Amigos do Banco do Brasil (APABB/ SE), Café Maratá, entre outras entidades e empresas. Agosto - II Anual Turkey International Special Arts Festival Local: Istambul – Turquia Período: 14 a 19/08 Patrocínio: Governer of Istanbul, Association Of Phisically Disability; Turkish Confederation of the Disability, Its Federations and Associations; Ministério das Relações Exteriores, Assembléia 70 Legislativa do RJ; Governo do Estado do RN, Governo do Estado de MS. O Brasil foi representado por 17 artistas/grupos (músicos e grupos de dança) Setembro - II Mostra de Arte Sem Barreiras de Juiz de Fora (MG) e Seminário de Arte, Educação, Cultura e Diversidade Local: Juiz de Fora. Período: 14 a 16/9. Coordenação: Comitê Municipal VSA de Juiz de Fora. Apoio: Funarte, UFJF, Funalfa, Sec. Municipal de Educação de Juiz de Fora Outubro - Itinerância da exposição do fotógrafo Evgen Bavcar Local: Goiânia – GO Período: 01 a 31/10. Coordenação: Comitês Estadual do VSA/Brasil de Goiás. Apoio: Funarte, Secretarias de Estado de Educação e de Cultura, Universidade Federal de Goiás e Instituições locais; 7ª Mostra de Artes Sem Barreiras de Bauru (SP) Local: Bauru. Período: 11 a 13/10. Coordenação: Comitê Municipal VSA/Brasil de Bauru Apoio: Funarte: Secretaria M. de Cultura de Bauru e Universidade do Sagrado Coração; I Congresso/Festival Centro–Oeste de Arte Sem Barreiras. Local: Goiânia – GO. Período: 22 a 26/10. Coordenação: Comitês Estadual do V.S.A/Brasil de Goiás e do Distrito Federal. Apoio: Funarte, Sec. Est. Cultura, Sec. Est. Educação e empresas locais. Novembro - XIII Congresso Nacional da Federação de Artes Educadores do Brasil e I Festival Sul e Sudeste de Artes Sem Barreiras. Local: Campinas – SP. Período: 05 a 07/11 Coordenação: Federação de Arte–Educadores do Brasil, Comitê Municipal do V.S.A/Brasil de Campinas, Estadual de São Paulo e Municipal de Bauru. Apoio: Secretaria de Educação Especial/MEC, PUC Campinas, FAEB, Prefeitura Municipal. Itinerância da exposição do fotógrafo Evgen Bavcar. Local: Belém – PA. Período: 24/11 a 30/12. Coordenação: Comitês Estadual do V.S.A/Brasil do Pará. Apoio: Funarte, Instituto de Artes do Pará e Governo do Estado do Pará I Congresso/Festival Amazônico de Arte Sem Barreiras Local: Belém – PA. Período: 26 a 30/11. Coordenação: Coordenação: Comitês Estadual do V.S.A/Brasil do Pará. Apoio: Funarte, Instituto de Arte do Pará e Governo do Estado 2002 Novembro - 1º Congresso Internacional de Arte Sem Barreiras e 1º Festival Internacional de Arte Sem Barreiras Educação, Arte, Inclusão. 17 a 23 de novembro de 2002. Belo Horizonte/ Minas Gerais Locais: Pontifícia Universidade Católica de Minas 71 Gerais (PUC Minas); Centro Cultural Nansen de Araújo/SESIMINAS; Teatro Francisco Nunes; Teatro Marília; Teatro do Instituto São Rafael; Galerias de Arte do Palácio das Artes, SesiMinas, Sec. Municipal de Cultura. Patrocínio: Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, FNDE, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e Centro Cultural Nansen de Araújo/CIRA/SESI-DR-MG/FIEMG, Prefeitura de Belo Horizonte, através das secretarias municipal de Cultura, Educação e Belotur Setembro e outubro - Cursos de capacitação em Educação, Arte, Inclusão para professores do ensino fundamental realizados pela Associação, Vida, Sensibilidade e Arte/ Very Special Arts do Brasil nos estados de Minas Gerais, Pará, Santa Catarina, Sergipe e Distrito Federal. Lançamento dos Cadernos de Textos nº1, reunindo artigos sobre o tema Educação, Arte, Inclusão e lançamento do documentário Possibilidades Estéticas na Diferença. Apoio: Secretaria de Educação Especial/MEC Abril a dezembro 2002 - Projeto musical/ Arte Sem Barreiras. Local: Rio de Janeiro Sala Funarte/ dois shows mensais. Apoio: Coordenação de Música/ Sala Funarte Pesquisa de linguagem: Grupos de teatro e dança. Local: Teatro Cacilda Becker (RJ). Grupos: Pulsar Cia de Dança (RJ), sob a supervisão Teresa Taquechel e Teatro do Sol (Niterói), sob a supervisão de Rubem Gripp. Apoio: Coordenação de Dança/Deacen/Funarte e Faculdade Angel Viana Junho - Estreia do espetáculo da Ekilibrio Cia de Dança Inclusiva Local: Teatro SESIMINAS/ Juiz de Fora.1 a 23 de junho de 2002 .Patrocínio: Belgo Mineira/ ABC – Atacado Brasileiro da Construção. Apoio: Fiemg/SESI, Prog. Arte Sem Barreiras/Funarte, Sec.Cultura de Minas Gerais/ Lei de Incentivo a Cultura/ MINC. Cantares de Minas, lançamento do CD de Maria Lúcia Godoy. Local: Rio Scenarium ( RJ). Dia 4 de junho de 2002, no âmbito das comemorações do centenário de Juscelino Kubitscheck. Apoio: Funarte/Rio Scenarium/ TVE; Arte de ver com as mãos Exposição da ceramista Jussara Cedro. Local: Beira-Mar Shopping, Florianópolis (SC), 10 a 16 de junho. Apoio: Comitê VSA Arts de Santa Catarina. Pulsar - Estréia do novo espetáculo da Pulsar Cia de Dança Inclusiva. Local: Teatro Nelson Rodrigues/ Conjunto Cultural da Caixa Econômica (RJ). Temporada de 28 de junho a 7 de julho. Patrocínio: Caixa Econômica Federal. Apoio: Governo do Estado do RJ/ Prog. Arte Sem Bareiras/CASACA 72 2003 Janeiro – Exposição de artes plásticas - Museu Chácara Dona Catarina – Cataguases/MG. Obras de Eliane de Oliveira, Jorge Botelho, Marcelo Cunha e Virgínia Vendramini. De 10 de janeiro a 9 de março. Fevereiro – 1º Encontro de Arte Sem Barreiras de Cataguases. Centro Cultural Humberto Mauro. De 13 a 15 de fevereiro. Maio/Junho – Mostra de Arte Sem Barreiras de Muriaé (MG). De 29 de maio a 1º de junho Sara Bentes vence concurso Rosemary Kennedy. Selecionada pelo VSA Brasil, a cantora Sara Bentes, de Volta Redonda (RJ), concorrendo com representantes de 86 países filiados ao VSA Internacional, foi a vencedora da versão 2003 do certame. Agosto – Mostra e seminário de Artes Sem Barreiras de Niteroi. Outubro – IX Mostra de Artes Sem Barreiras de Bauru; International Arts Festival South Africa, 15 a 19 de outubro, Cape Town, com apresentação da Cia Arte de Viver, Santos. Novembro – Curso de Musicografia em Braille, de 12 a 13 de novembro, Conservatório Brasileiro de Música, RJ; 1ª Jornada Catarinense de Inclusão, de 26 a 29 de novembro, Blumenau, SC; VII º Festival Nacional, IIº Congresso e Festival Nordestino de Arte sem Barreiras e Iº Seminário Nacional de Gestão Cultural e Inclusão, de 23 a 30 de novembro, em Aracaju, Itabaiana e Nossa Senhora da Glória. 2004 Março – Abertura do Ano Ibero-americano da Pessoa com Deficiência. Teatro Plínio Marcos, Brasília, de 24 a 25 de março. Apresentações de música, teatro, dança e artes plásticas. Público presente: 1.800 pessoas. Durante o evento, destacaram as presenças do então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva; ministro da Cultura, Gilberto Gil; ministro Direitos Humanos, Nilmário Miranda; embaixadores dos países 73 ibero-americanos; parlamentares e dirigentes de instituições que executam políticas para as pessoas com deficiência. Junho – VSA ARTS Festival 2004. De 9 a 12 de junho, em Washington. Participação dos grupos Pulsar Cia de dança (RJ) e Forró no Escuro (BH). Setembro – 1º Mostra mineira de artes sem barreiras. Juiz de Fora, de 15 a 30 de setembro. 3.6 – 2005, Celebração 15 anos de atividades Mostra Arte, Diversidade e Inclusão Sociocultural Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro. Ao longo de 15 anos de atividades, o VSA Brasil atuou formulando e propondo novos conceitos no campo dos direitos humanos e da pessoa com deficiência, transformando o que poderia ser mais uma entidade com características paternalista e assistencialista, num projeto com sólida fundamentação teórica e uma práxis renovadora. Fundamentação teórica, aportada por educadores, críticos e historiadores da Arte, artistas e gestores culturais, por meio de dezenas de congressos realizados nesse período em todo o Brasil, e que resultaram em igual número de artigos, ensaios, teses e relatos de experiências, sempre inéditas. Posteriormente, publicadas, disseminaram propostas sobre as possibilidades estéticas e o direito do fruir artístico das pessoas com deficiência. Praxis renovadora, pela proposta de experimentação em fazeres estéticos singulares, demonstrada e ampliada em centenas de festivais e mostras de arte sobre todas as expressões artísticas. O Arte Sem Barreiras e uma marca que passou a identificar nacionalmente todas as ações da Associação Very Special Arts Brasil Arte Sem Barreiras significava: promover e levar a plateias não segmentadas a expressão de artistas com pleno domínio técnico da sua linguagem; a inserção de artistas no campo das discussões da arte contemporânea, indo muito além de recepções simpáticas e de atitudes solidárias; estabelecimento de alianças, formação de consciências e compromissos para uma necessária e urgente desconstrução de 74 preconceitos entranhados na sociedade brasileira; e, por fim, sinônimo de um fazer artístico e teórico com qualidade. A culminância dessas idéias e práticas deu-se, exatamente, no ano em que a Associação Vida, Sensibilidade e Arte- Very Special Arts Brasil completou 15 anos de existência com a Mostra Arte, Diversidade e Inclusão Sociocultural, realizada durante todo o mês de maio de 2005, no mais importante e dinâmico espaço cultural do país, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro. Nesse evento, formulado e desenvolvido com um ano de antecedência, o VSA Brasil, objetivou uma realização cidadã com a inclusão de todos, artistas e público, um marco na produção de eventos para pessoas com e sem deficiência. Inicialmente realizando um treinamento com dois meses de antecedência de todos os 400 funcionários do CCBB para atendimento a artistas e ao público com e sem deficiência; obras de adequação e acessibilidade nos espaços internos do CCBB e em todas as ruas e avenidas próximas; treinamento de monitores e inserção de toda a programação da Mostra no Programa Educativo do CCBB, que recebe diariamente centenas de crianças e jovens de escolas públicas e privadas da cidade; capacitação de 16 monitores para atendimento preferencial à comunidade surda, cega e com dificuldades de locomoção; obras de adequação e acessibilidade para artistas e público no teatro, e nas salas de exposição, de seminários, cursos e fórum; tradução em libras, em tempo real, de todos os espetáculos cênicos, de palestras e cursos; edição em tinta e em Braille de todas as peças de divulgação - convites, folders e catálogos. Pagamento de cachês e pró-labores a todos participantes, em valores superiores aos praticados no mercado, para a valorização e incentivo à profissionalização de artistas e grupos; debates com de 45 entidades atuantes na área da arte e da defesa dos direitos da pessoa com deficiência; realização de 18 oficinas de dança para bailarinos e coreógrafos contemplando distintas técnicas; lançamento de publicações e livros sobre temas afins entre dezenas outras atividades. Como resultado, no mês do evento, a presença auditada de 70 mil pessoas, parte considerável de pessoas com deficiência que nunca havia freqüentado o CCBB/RJ. Em termos de divulgação, uma mídia espontânea e gratuita em jornais, revistas e TVs de todo o país, valorada por técnicos do CCBB em R$ 8 milhões, uma das maiores 75 obtidas nos eventos realizados pela instituição durante o ano. O valor recebido em mídia correspondeu a exatos 4% do investimento realizado pelo Banco do Brasil na Mostra. Ainda sobre a divulgação, vale destacar, que no período da Mostra, além de três inserções noticiosas no Jornal Nacional da TV Globo, diversas apresentações e entrevistas de artistas com deficiência na novela América, de Glória Perez, que foi ao ar durante o período do evento, e cujo entrecho abordava questões sobre pessoas com deficiência. As avaliações positivas feitas por artistas, grupos, conferencistas e demais pessoas envolvidas na produção e realização da Mostra, deu-nos a certeza de que esse algo novo e radical foi realizado com pleno sucesso. Foi um avanço e um marco e espelho traduz e reflete, com exatidão, nossos ideais e compromissos nessa jornada de 15 anos pelos direitos e a inserção sociocultural das pessoas com deficiência. Mas o ano que celebrava os 15 anos de atividades do VSA Brasil não se encerrou em maio, no CCBB-RJ. Teve seqüência no período de agosto e outubro, quando foi realizada a III Mostra em Niterói, também com uma ampla programação. No final de dezembro, auspiciosa notícia. A cantora e instrumentista paulista, Giovanna Maira foi vencedora do Concurso Rosemary Kennedy 2006, realizado nos Estados Unidos. O concurso organizado anualmente pelo Very Special Arts Internacional seleciona jovens músicos e instrumentistas com deficiência e idade até 25 anos, entre os países filiados, para apresentações durante a primavera norte-americana. Selecionada na fase nacional pelo VSA Brasil para representar o Brasil, a artista de 19 anos, que concorreu com representantes de 86 países, foi aclamada pelo júri internacional, que se reuniu no final do ano em Washington. Além da passagem aérea e a estadia, Giovanna recebeu prêmio no valor de U$ 5 mil, para custear a continuidade de seus estudos. Sua apresentação se deu no dia 23 de maio de 2006, no John F. Kennedy Center for the Perfoming Arts, em Washington. Foi a segunda vez que o VSA Brasil indicou candidaturas ao prêmio e nas duas ocasiões saiu vencedor. Em 2003, a premiada foi a cantora Sara Bentes, da cidade de Volta Redonda. 3. 7 Um período de recesso para um balanço e reflexões Ao encerrar o ano de 2005 e as celebrações dos 15 anos de atividades do VSA Brasil, um período de recesso se impôs naturalmente ao coletivo de artistas que haviam 76 assumido a direção do VSA Brasil. Eram muitas as questões que precisavam ser debatidas, desde a organização e administração da entidade até estratégias de inserção nos novos modelos de políticas culturais públicas praticados pelo Ministério da Cultura. Fazendo uma digressão sobre a trajetória de lutas pelos direitos civis, políticos, sociais e culturais das pessoas com deficiência é importante situar a Constituição de 1988 como um marco. Foi por meio dela que teve início uma nova forma de relação entre o Estado e a sociedade civil pela institucionalização de uma série de normas que ampliaram as possibilidades de participação dos cidadãos e entidades representativas nos processos decisórios em distintas esferas de governo. Ao pleitearem o reconhecimento e uma melhor qualidade vida, esses grupos se uniram a outras frentes que se organizavam contra os preconceitos sociais, étnicos e de gênero. E foi sob esses novos horizontes e caminhos, que surgiu em março de 1990, o Programa Arte Sem Barreiras, que desde o seu início- e de forma pioneira no mundo- decidiu realizar ações e projetos de forma não-segmentada. Inclusão era a palavra- chave que abriu portas para a realização de um diálogo cultural e estético entre pessoas com e sem deficiência. Entre as propostas iniciais que nortearam as ações do Arte sem Barreiras, destacamos a difusão de conhecimentos e a troca de experiências para assegurar os direitos e o exercício pleno da cidadania e a inclusão sociocultural das pessoas com deficiência; a promoção e o entrelaçamento da produção artística de pessoas com e sem deficiência, por meio festivais, mostras e exposições de arte resultando em intercâmbios e diálogos estéticos; estimulo a artistas, educadores e investigadores da sensibilidade para se lançarem em pesquisas e à produção de conhecimentos no campo da arte e da pessoa com deficiência. A intenção do VSA Brasil, gravado em seu Estatuto, era ampliar o entendimento da sociedade brasileira sobre essas novas expressões para dissolver barreiras estéticas e sociais. E, como consequência, inserir o fazer artístico da pessoa com deficiência à contemporaneidade estética do Brasil. A partir de 1990 - com o início do processo de eleições diretas e a assunção de novos partidos, isolados ou coligados ao governo-, representantes de movimentos reivindicantes alçados à esfera pública governamental, criam e desenvolvem programas direcionados às instituições e aos movimentos reivindicantes de sua origem. 77 O Very Special Arts do Brasil/ Programa Arte Sem Barreiras, por exemplo, associou-se à oficiosamente à Fundação Nacional de Arte, Ministério da Cultura, no período de 1992 a 2004, formulando e implementando políticas públicas culturais educacionais para as pessoas com deficiência. Em junho de 2004, essa parceria com a Funarte foi interrompida que forma traumática para os destinos da entidade. A trajetória do Very Special Arts do Brasil está associada a muitas conquistas no campo das legislações sobre direitos culturais e educacionais das pessoas com deficiência, entre as quais cabe assinalar uma muito significativa, conforme descrita no Capítulo 3: o direito à educação de crianças e jovens com deficiência e seu convívio com os demais alunos nas escolas regulares legitimado pela da Resolução nº 2 CEB/CNE de 2001, que estabeleceu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Essa Resolução veio a ser um marco na história da Educação Especial no Brasil. Um avanço na perspectiva da universalização do ensino com atenção à diversidade na educação brasileira. 3.8 Cidadania cultural das pessoas e artistas com deficiência No campo da legislação cultural, vale assinalar que, em março de 2004, o Programa Arte Sem Barreiras, então representante do Ministério da Cultura no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, CONADE, enviou uma série de sugestões ao MINC, que dois anos depois foram incorporadas ao Decreto Lei 5. 761, de 27 de abril de 2006 - que fez adendos e deu nova redação à Lei 8.313/91, conhecida como Lei Rouanet-, especialmente no artigo 27, que passou a ter a seguinte redação: Art. 27. Dos programas, projetos e ações realizados com recursos incentivados, total ou parcialmente, deverá constar formas para a democratização do acesso aos bens e serviços resultantes, com vistas a: I - tornar os preços de comercialização de obras ou de ingressos mais acessíveis à população em geral; II - proporcionar condições de acessibilidade a pessoas idosas, nos termos do art. 23 da Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, e portadoras de deficiência, conforme o disposto no art. 46 do Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999; 78 III - promover distribuição gratuita de obras ou de ingressos a beneficiários previamente identificados que atendam às condições estabelecidas pelo Ministério da Cultura; e IV - desenvolver estratégias de difusão que ampliem o acesso. Parágrafo único. O Ministério da Cultura poderá autorizar outras formas de ampliação do acesso para atender a finalidades não previstas nos incisos I a IV, desde que devidamente justificadas pelo proponente nos programas, projetos e ações culturais apresentados. A partir desse Decreto, todos os projetos analisados pelo Programa Nacional de Cultura, PRONAC/MINC, passaram a ter essa exigência. Os produtores sejam pessoas físicas ou jurídicas, são obrigados a assinalar e a especificar que medidas serão adotadas para cumprimento do Art. 27. Caso contrário, o projeto não é aprovado. Verificou-se, no entanto, uma confusão de conceitos na execução desse Decreto. O que se chamava de democratização cultural e acesso, na verdade, tratava-se da popularização dos projetos, por exemplo, preços e locais mais acessíveis para o público, quando o correto seria associar democratização a controle social - accountability por parte da sociedade civil. Acesso ou acessibilidade é um conceito historicamente adstrito à área da pessoa com deficiência, e diz respeito à mobilidade física, à fruição estética e direitos às tecnologias assistivas. Essa controvérsia conceitual sobre democratização e acessibilidade só foi resolvida em 2012 com a edição pelo Ministério da Cultura da Instrução Normativa Nº 1/2012 que no seu Artigo 3º diz que na aplicação desta Instrução Normativa, serão consideradas as seguintes definições: Inciso XI - medidas de acessibilidade: intervenções que objetivem priorizar ou facilitar o livre acesso de idosos e pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, assim definidos em legislação específica, de modo a possibilitar-lhes o pleno exercício de seus direitos culturais, por meio da disponibilização ou adaptação de espaços, equipamentos, transporte, comunicação e quaisquer bens ou serviços às suas limitações físicas, sensoriais ou cognitivas de forma segura, de forma autônoma ou acompanhada, de acordo com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. 79 Em acordo com essa mesma IN Nº1/2012, Art. 71, Inciso VII, na etapa de prestação de contas “comprovação das medidas pelo proponente para garantir a acessibilidade e democratização do acesso, nos termos aprovados pelo Ministério da Cultura. De igual forma, proporcionar condições de acessibilidade nos termos do Art. 23 da Lei 10. 741/2003; Art. 46, Decreto 3.298/1999”. E o conceito de democratização? No Inciso XII, da citada IN assim está posto. Democratização do acesso: medidas que promovam acesso e fruição de bens, produtos e serviços culturais, bem como ao exercício de atividades profissionais, visando à atenção às camadas da população menos assistidas ou excluídas do exercício de seus direitos culturais por sua condição socioeconômica, etnia, deficiência, gênero, faixa etária, domicílio, ocupação, para cumprimento do disposto no Art. 215 da Constituição Federal. É importante assinalar que essa mudança e reorientação conceitual sobre acessibilidade e democratização no âmbito da lei de incentivo federal foi sugerida em 2008 durante a realização da Oficina Nacional para Indicação de Políticas Públicas Culturais para Inclusão de Pessoas com Deficiência, organizada pela então Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural/MINC. Em 2 dezembro de 2004, foi assinado o Decreto Lei 5.296, regulamentando as Leis Federais (Leis 10.048 e 10.098/2000) que tratam da acessibilidade de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida no Brasil; A regulamentação dessas leis foi um passo decisivo para a cidadania de crianças, jovens, adultos e idosos com deficiência ou mobilidade reduzida, fazendo com que a escola, a saúde, o trabalho, o lazer, o turismo e o acesso à cultura sejam elementos presentes na vida destas pessoas. O decreto de regulamentação representou uma demanda histórica dos movimentos sociais ligados à área e era aguardado desde o ano 2.000 pelas entidades de e para pessoas com deficiência. Legislações anteriores, como a Lei nº 10.048, de 08 de novembro de 2000, determinava o atendimento prioritário às pessoas com deficiência e a acessibilidade em sistemas de transporte. Já a Lei nº 10.098 tratava da acessibilidade ao meio físico - edifícios, vias públicas, mobiliário e equipamentos urbanos etc. -, aos sistemas de transporte, de comunicação e informação e de ajudas técnicas. 80 A elaboração desse Decreto ocorreu um processo de diálogo com a sociedade civil sendo fruto de um trabalho intersetorial. Com sua edição, tornou-se possível às associações de defesa dos direitos das pessoas com deficiência, públicas e privadas, implementar, fiscalizar e/ou aplicar sanções pelo descumprimento das determinações legais. Apesar de sua importância e abrangência, e perto de completar 10 anos, é lamentável constatar sua baixa aplicabilidade e uma prorrogação excessiva dos prazos estabelecidos, notadamente, no diz respeito a tecnologia assistiva. Entre tantos artigos, parágrafos e incisos que estabeleceram normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, aqui vamos destacar apenas o Artigo 23. Art. 23. Os teatros, cinemas, auditórios, estádios, ginásios de esporte, casas de espetáculos, salas de conferências e similares reservarão, pelo menos, dois por cento da lotação do estabelecimento para pessoas em cadeira de rodas, distribuídos pelo recinto em locais diversos, de boa visibilidade, próximos aos corredores, devidamente sinalizados, evitando-se áreas segregadas de público e a obstrução das saídas, em conformidade com as normas técnicas de acessibilidade da ABNT. § 1º Nas edificações previstas no caput, é obrigatória, ainda, a destinação de dois por cento dos assentos para acomodação de pessoas portadoras de deficiência visual e de pessoas com mobilidade reduzida, incluindo obesos, em locais de boa recepção de mensagens sonoras, devendo todos ser devidamente sinalizados e estar de acordo com os padrões das normas técnicas de acessibilidade da ABNT; § 2º No caso de não haver comprovada procura pelos assentos reservados, estes poderão excepcionalmente ser ocupados por pessoas que não sejam portadoras de deficiência ou que não tenham mobilidade reduzida; § 3º Os espaços e assentos a que se refere este artigo deverão situar-se em locais que garantam a acomodação de, no mínimo, um acompanhante da pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida; § 4º Nos locais referidos no caput, haverá, obrigatoriamente, rotas de fuga e saídas de emergência acessíveis, conforme padrões das normas técnicas de acessibilidade da ABNT, a fim de permitir a saída segura de pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, em caso de emergência; 81 § 5º As áreas de acesso aos artistas, tais como coxias e camarins, também devem ser acessíveis a pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida § 6º Para obtenção do financiamento de que trata o inciso III do art. 2o, as salas de espetáculo deverão dispor de sistema de sonorização assistida para pessoas portadoras de deficiência auditiva, de meios eletrônicos que permitam o acompanhamento por meio de legendas em tempo real ou de disposições especiais para a presença física de intérprete de LIBRAS e de guias-intérpretes, com a projeção em tela da imagem do intérprete de LIBRAS sempre que a distância não permitir sua visualização direta. § 7º O sistema de sonorização assistida a que se refere o § 6o será sinalizado por meio do pictograma aprovado pela Lei no 8.160, de 8 de janeiro de 1991. § 8º As edificações de uso público e de uso coletivo referidas no caput, já existentes, têm, respectivamente, prazo de trinta e quarenta e oito meses, a contar da data de publicação deste Decreto, para garantir a acessibilidade de que trata o caput e os §§ 1º a 5º. Em outubro 2008, por meio da Secretaria da Diversidade Cultura do Ministério da Cultura, SID, o VSA Brasil, foi convidado a participar da Oficina Nacional de Indicação de Políticas Públicas Culturais para Inclusão de Pessoas com Deficiência, realizada nos dia 16 a 18 de outubro de 2008, no Rio de Janeiro. Desse encontro, do qual participaram mais de 100 artistas de todas as partes do Brasil ligados ao Very Special Arts, resultou a seguinte carta-documento, que transcrevemos na íntegra: Carta do Rio de Janeiro Os participantes da Oficina Nacional de Indicação de Políticas Públicas Culturais para a Inclusão de Pessoas com Deficiência debruçaram-se sobre a tarefa de formular propostas de diretrizes e ações para que possam ser incorporadas à Política Nacional de Cultura, que se encontra em fase de elaboração/revisão. E nesta tarefa, estiveram orientados por alguns princípios e pressupostos: Em primeiro lugar, tratou-se de insistir na necessidade de que as políticas, ações e comportamentos devem pautar-se pela compreensão e pelo acolhimento das pessoas em suas identidades múltiplas e diversificadas, partindo-se do princípio de focar os olhar na pessoa, e não na deficiência. 82 Em segundo lugar, houve consenso geral da existência de um marco legal bastante avançado, tanto no âmbito nacional quanto internacional, que afirma e visa promover e garantir os direitos das pessoas com deficiência. Fazem parte dele a Declaração de Salamanca (1994), a Carta de Pirenópolis (1999), a Convenção de Guatemala(2001), a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006) e o Plano Nacional de Cultura. Entretanto, os participantes da oficina reiteraram que o grande desafio é o de fazer cumprir essa legislação, seja por parte do Estado brasileiro, seja pelas organizações privadas e pelas sociedade civil em geral. Por fim, reafirmando o sentido do lema "nada sobre nós sem nós", os participantes estiveram orientados pela perspectiva de promover o controle social, através do fomento e da ampliação da participação das pessoas com deficiência, como sujeitos de direitos, na formulação, execução e avaliação das políticas públicas de cultura. DELIBERAÇÕES E RECOMENDAÇÕES DA OFICINA A partir das várias diretrizes e ações propostas nos quatro temas, os integrantes da oficina deliberaram a indicação de prioridades para o Ministério da Cultura, de modo a sinalizar as urgências na sua implementação. No tema Fomento, o debate esteve orientado para propostas que estimulassem a criação, a promoção e o desenvolvimento de propostas criativas, estéticas, artísticas e culturais por parte das pessoas com deficiência. A prioridade apontada foi a de garantir incentivos e recursos orçamentários para formação de profissionais com ou sem deficiência na área da cultura e para implantação e/ou implementação de manutenção de grupos, companhias, projetos artísticos e culturais com pessoas com deficiência. No tema da Acessibilidade, o enfoque foi o da promoção e o da garantia do direito das pessoas com deficiência a fruírem, contemplarem e vivenciarem as diferentes manifestações artísticas e culturais e experiências estéticas. As prioridades definidas foram duas: i) Garantir que todas as políticas, programas, projetos, eventos e espaços públicos no campo artístico e cultural sejam concebidos e executados de acordo com a legislação nacional já existente que garante acessibilidade e conforme disposto na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU); ii) Promover o reconhecimento profissional das pessoas com deficiência e o seu acesso à formação artística e profissional. 83 No tema Patrimônio, o desafio foi o de formular propostas de diretrizes e ações que promovessem: i) a acessibilidade de todos os setores da população às instituições materiais relacionadas às pessoas com deficiência que tenham uma representação política e simbólica; ii) o reconhecimento e preservação do saber, da produção imaterial, da subjetividade, da cultura, das identidades e da produção artística e cultural das pessoas com deficiência. A prioridade definida foi a de localizar, conservar, pesquisar, editar e difundir o patrimônio material, imaterial, intelectual e cultural dos artistas e das pessoas com deficiência, de modo a promover o seu reconhecimento como patrimônio brasileiro. Em relação ao tema da Difusão, os debates tiveram por foco a socialização e a divulgação da produção artística e cultural das pessoas com deficiência: i) Recriação/criação de instância para difusão da produção artístico-cultural de pessoas com deficiência nos 03 níveis de governo, sendo que no nível federal propõe-se que seja na FUNARTE; ii) Garantir a participação das pessoas com deficiência na formulação e implementação das políticas de difusão. Ao longo de 2009 a 2013, o VSA Brasil e o Programa Arte Sem Barreiras participou e divulgou os vários eventos, em especial, os editais de apoio e patrocínio a grupos de teatro e dança patrocinados pela Funarte e Caixa Econômica Federal. Entre os grupos premiados, grupos que contam com atores e bailarinos com deficiência, como os Grupos de Dança Gira de Natal, RN e Pulsar Cia de Dança, RJ. Por meio da professora Dolores Tomé, voluntária do VSA Brasil, em Brasília, teve início em 2007 – e de forma pioneira na América do Sul-, experiências de áudio descrição em cinema no âmbito do 38º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, o mais antigo evento cinematográfico do país. No ano seguinte, a experiência foi expandida com treinamento e formação de equipe, consagrando-se em 2009 com o lançamento do livro Cinema para Cegos durante a 40º edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O livro resume uma década de luta da professora Dolores Tomé pelo direito de fruição audiovisual e musical da pessoa cega. São mais de 15 milhões de brasileiros cegos ou com deficiência visual no país, por causas múltiplas. A presença da pessoa cega nas salas de cinema [filmes e salas dotadas com aparelhos de áudio descrição] representa não só o resgate de direitos culturais da cidadania, mas uma segura iniciativa para ampliação de público. 84 Em julho de 2009, então secretária de Inclusão Social do GDF, Dolores Tomé abriu cursos para formação de jovens especialistas em áudio descrição para que atuarem - por meio de gravações prévias e/ou ao vivo e a cores - em cinemas e teatros. Nesse mesmo ano, sob patrocínio da Petrobrás, lançou com o professor Antônio Borges (COPPE/UFRJ) o software Musibraille [intervox.ufrj.br/musibraille], uma iniciativa que ampliava as possibilidades para deficientes visuais terem acesso ao estudo da música e capacitação de profissionais para desenvolvimento de ações nessa área. O Musibraille é o primeiro software da língua portuguesa para a transcrição de partituras em Braille. O Musibraille visa melhorar e ampliar as possibilidades do músico cego no mercado de trabalho, inclusive lecionando, e permitir a troca de conhecimento. As obras poderão ainda ser divulgadas por meio da biblioteca musical Braille, na página da Internet onde o programa ficará disponível para cópia gratuita (http://intervox.nce.ufrj.br/musibraille/). O compositor ou arranjador cego também será beneficiado na medida em que suas obras poderão ser geradas na forma bi-modal (em Braille e em tinta) sendo consumidas também por músicos que não dominam a técnica Braille. A inclusão cultural é uma das principais resultantes do projeto. 85 4. Considerações finais Foram muitos – e ainda persistem - os entraves para a aplicação da legislação cultural para pessoas com deficiência, no caso, o inteiro teor do Decreto Lei 5.296/ 2004. De igual modo, as Resoluções da Oficina Nacional de Indicação de Políticas Públicas Culturais para a Inclusão de Pessoas com Deficiência, ocorrida em outubro de 2008 na cidade do Rio de Janeiro, gravadas na Nota Técnica nº 001/209, da SID/MINC. É seguro afirmar que as Resoluções ainda permanecem desconhecidas pelos próprios gestores culturais do ministério que as editou. A exceção fica por conta nas mudanças obtidas na Lei Rouanet. Em 2009, após três anos de intensas tratativas entre governo e representantes da sociedade civil, o Estado brasileiro por meio do Decreto-Lei 6.949 publicado Diário Oficial da União, a 26 de agosto de 2009, tornou-se signatário da Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência, realizada em 2006 pela Organização das Nações Unidas, ONU. É o documento legal mais recente que reafirmou direitos gravados no Decreto- Lei 5.296/2004, ainda hoje a mais abrangente legislação do país por ter incorporado as Leis Federais nº 10.048/2000 e 10.098/2000 que tratavam sobre a acessibilidade de pessoas como deficiência ou mobilidade reduzida. Sob o aspecto da legislação, é seguro afirmar que o Brasil encontra-se entre os países que lograram maiores avanços nos últimos vinte anos no campo dos direitos das pessoas com deficiência. O inverso ocorre no campo das políticas públicas culturais para as pessoas com deficiência, onde há oito anos inexistem propostas ou projetos. Desde 2004, com o rompimento da parceria entre o Programa Arte Sem Barreiras e a Funarte, poucas ações de políticas públicas são notadas. A Secretaria da Identidade Cultural (SID), criada em 2003, incorporou em 2007 o segmento da pessoa com deficiência entre suas ações adotando com referência a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais. Entre os 18 segmentos socioculturais formadores da identidade e diversidade cultural brasileira lá representados estavam grupos e mestres das culturas populares, indígenas, ciganos, movimento LGBT, idosos, pessoas com deficiência, comunidades tradicionais 86 de terreiro, imigrantes, produtores da cultura da infância, jovens do movimento hip hop, pessoas com transtorno mental, mulheres e trabalhadores formais e informais da cidade e do campo. A SID foi a organizadora da já citada Oficina Nacional de Indicação de Políticas Públicas Culturais. Foi a SID, agora em parceria com a Oscip Escola de Gente, que também lançou em março de 2010, durante a II Conferência Nacional de Cultura o Edital Arte e Cultura Inclusiva em Brasília. O edital, em resumo, assim foi alardeado no site da OSCIP: “Com patrocínio da Petrobras e apoio da Lei de Incentivo Fiscal do Ministério da Cultura, o Edital Arte e Cultura Inclusivas oferecerá um total de R$ 375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil reais) a 30 iniciativas vencedoras, que receberão o prêmio Albertina Brasil nas categorias: teatro, dança, música, literatura, artes visuais e outras formas de expressão artística; também serão premiados produtos ou ações culturais com acessibilidade. O edital é uma realização da SID/Minc e da Escola de Gente em parceria com a Subsecretaria para a Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria Especial de Direitos Humanos (Corde) e a Fundação Nacional de Arte – Funarte”. Seis meses depois, a Escola de Gente, desistiu de gerenciar o edital e o devolveu a SID que o repassou a outra ONG. Depois de muitas atribulações, o resultado do Edital foi publicado em janeiro de 2012. Do total projetos inscritos, 213 foram habilitados pela comissão, que selecionou ao final os 30 projetos vencedores, cada qual premiado com a quantia R$ 12,5 mil. Em cinco anos, compreendidos entre 2007 e 2012, foi a única ação direta do MINC para artistas ou pessoas com deficiência. Em 31 de maio de 2012, por meio do Decreto 7.743/2013, a SID foi substituída pela Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural (SCDC) com as seguintes atribuições postas no Art. 13. À Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural compete: I - planejar, coordenar, monitorar e avaliar políticas, programas, projetos e ações para a promoção da cidadania e da diversidade cultural brasileira; II - promover e fomentar programas, projetos e ações que ampliem a capacidade de reconhecimento, proteção, valorização e difusão do patrimônio, da memória, das identidades, e das expressões, práticas e manifestações artísticas e culturais; 87 III - reconhecer e valorizar a diversidade das expressões culturais e a criação artística, individual ou coletiva, de grupos étnicos e suas derivações sociais; IV - promover e fomentar o acesso aos meios de produção, formação, fruição e difusão cultural, e o reconhecimento dos direitos culturais; V - promover ações que estimulam a convivência e o diálogo entre diferentes, a prática da interculturalidade, o respeito aos direitos individuais e coletivos, a proteção e o reconhecimento da diversidade simbólica e étnica; VI - fortalecer a integração e a complementaridade de ações no Ministério e suas entidades vinculadas para fomento, articulação e pactuações em prol da cidadania e da diversidade cultural; VII - cooperar com órgãos e entidades públicas e privadas na efetivação de políticas, programas e ações em prol dos direitos humanos, da ética, da cidadania, da diversidade cultural, da qualidade de vida e do desenvolvimento sustentável; VIII - disponibilizar informações sobre os programas, projetos e ações, e fomentar o registro, o intercâmbio e o acesso ao conhecimento sobre expressões culturais, cidadania e diversidade cultural; IX - instituir programas de fomento às atividades de incentivo à diversidade e ao intercâmbio cultural como meio de promoção da cidadania; X - fomentar o intercâmbio, a participação e o controle social, e a gestão participativa de programas, projetos e ações; XI - valorizar a diversidade e promover o exercício da cidadania cultural no fortalecimento das relações federativas e na implementação da Política e do Plano Nacional de Cultura; XII - zelar pela consecução das convenções, acordos e ações de cooperação nacional e internacional, com destaque para a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO, em conjunto com a Diretoria de Relações Internacionais e com o Sistema Federal de Cultura; XIII - planejar, coordenar, acompanhar e avaliar a implementação dos instrumentos necessários à execução dos programas, projetos e ações da Secretaria; 88 XIV - planejar, coordenar e implementar ações para receber, analisar, monitorar e avaliar projetos culturais de incentivo, no âmbito de sua área de atuação; XV - subsidiar a Secretaria de Políticas Culturais no processo de formulação das políticas públicas da área cultural relacionadas à sua área de atuação; e XVI - planejar ações relativas a celebração e a prestação de contas dos convênios, acordos e instrumentos congêneres, que envolvam a transferência de recursos do Orçamento Geral da União, no âmbito de sua área de atuação. (8) A leitura de todo o Artigo 13 nos permite afirmar que as expressões Arte e Pessoa com Deficiência desapareceram no campo oficial das competências da SCDC, embora a titular da Secretaria venha participando e apoiando algumas ações, algumas remanescentes do Programa Arte Sem Barreiras como a Mostra de Albertina Brasil de Arte Sem Barreiras, em Sergipe, que em 2013 chegou a sétima edição, e a Mostra de Arte Sem Barreiras de Bauru, em sua 19º edição. No entanto, há que se destacar, que embora a SCDC tenha voluntaria ou involuntariamente excluído expressões Arte e Pessoa com Deficiência do campo oficial suas competências, é ela a parceira principal da UFRJ na realização em 2013 deste curso de Especialização em Acessibilidade Cultural, com carga horária de 360 horas. Essa Especialização, conforme termos do edital, objetiva formar especialistas em acessibilidade cultural para atuar no campo das políticas culturais, orientando e implementando conteúdos, ferramentas, e tecnologias de acessibilidade que proporcionem fruição estética, artística e cultural para todas as condições humanas a partir do enfoque da deficiência. Uma primeira decorrência desse curso no campo das políticas públicas foi a publicação da Portaria interministerial nº 3, de 19 de setembro de 2013, que dispõe sobre a constituição de Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) com o objetivo de elaborar estudos e propostas de ações de promoção de acessibilidade em projetos culturais financiados com recursos públicos. O GTI terá as seguintes competências: I - identificar as ações de promoção da acessibilidade já desenvolvidas pelo Ministério da Cultura (MinC) e suas entidades vinculadas, recomendando eventuais aprimoramentos; II - propor novas medidas para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência, no que concerne aos projetos 89 culturais financiados pelo MinC e suas entidades vinculadas; III - articular políticas de acessibilidade e inclusão social com o Grupo Interministerial de Articulação e Monitoramento do Plano Viver sem Limite, instituído pelo Decreto nº 7.612, de 2011, visando à integração das ações de governo. Os membros do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) serão indicados pelos titulares dos respectivos órgãos e entidades, no prazo máximo de 10 (dez) dias a contar da publicação desta Portaria e designados por ato da Ministra de Estado da Cultura. Em acordo com o Artigo 4º, o GTI deverá apresentar relatório de suas atividades no prazo de 90 (noventa) dias, podendo ser prorrogado pelo mesmo período, que deverá conter: I - estudo das ações de acessibilidade já desenvolvidas no âmbito do Ministério da Cultura e de suas entidades vinculadas, acompanhado de análise comparativa a partir de experiências internacionais sobre o tema novas ações a serem implementadas; III - metas a serem fixadas, relacionadas ao Plano Nacional de Cultura (PNC) e ao Plano Viver sem Limite; IV análise de impacto sobre os agentes econômicos, com respectiva ponderação dos ônus e benefícios; e V - estimativas de impacto orçamentário, de cronogramas de execução e de mecanismos de acompanhamento e avaliação das ações propostas. Em 2014, ano de redação desta monografia, é pertinente admitir a intenção governamental de se reconstruir políticas públicas culturais para o fazer e fruir estético de artistas, grupos e pessoas com deficiência, seja pelo viés acadêmico, ou pela intenção da SEDH e do MINC em articular políticas de acessibilidade e inclusão social, revivendo uma parceria histórica, No ensaio A estética de uma arte sem barreiras (2003), Paes Loureiro lembra que na relação produtiva da arte e as pessoas com deficiência não há impedimentos seja como processo criador ou de participação como personagem. A questão, portanto, é menos no campo da estética e mais no da ética. Porque é uma decisão de caráter ético que permite a um grupo social usufruir as possibilidades do estético. Uma sociedade vista esteticamente, possibilita que a inclusão se estenda como simetria e garanta condições para que os excluídos tenham oportunidades sociais de exercer o seu talento pessoal. A igualdade de oportunidades, a diferença entendida como valor próprio, a inclusão como o equilíbrio diante do desequilíbrio dissimétrico da exclusão. Uma arte sem barreiras não pode existir como apenas sonho, refém das utopias pessoais. Precisa concretizar-se no chão das relações sociais, no que a quebra da exclusão é um 90 gigantesco passo. A produção artística, ainda que pessoal é parte do processo social e, por isso, a inclusão artística é intercorrente com a inclusão social (Paes Loureiro, 2001) Esse relato sumário dos anos iniciais de funcionamento e sobre a trajetória de uma entidade cultural da sociedade civil se prestou a nos colocar diante da principal proposta desse estudo que era o de situar a atuação da Associação VSA Brasil no período de 1990 a 2004 no âmbito das políticas públicas de cultura desenvolvidas no Brasil. Como observamos, o início das atividades da Associação ocorreu num período de extinção e desmonte dos órgãos culturais do país, situação que gerou um paradoxo: o atordoamento pela suspensão e a redução abrupta das ações culturais, especialmente, aquelas que se faziam com financiamento estatal, não impediu que pesquisadores, artistas e as entidades que os representavam se lançassem em discussões para analisar e repensar as políticas públicas de cultura para o artista com deficiência. Ou seja, apesar de uma ambiência cultural improdutiva, a Associação VSA Brasil logrou avançar em seus propósitos por conta e valendo-se de proposituras que foram alargadas e estendidas ao campo dos Direitos Humanos e das políticas públicas de Educação. Foram entidades com esse perfil que alicerçaram e mantiveram o Programa por 14 anos. As contribuições das entidades culturais, desde o Minc/Funarte, passando por secretarias de Estado e municipais de Cultura foram residuais. Nesta conclusão ressalvo e alerto para o fato, de que há 10 anos, portanto, desde 2005, mantive uma distância, digamos, obsequiosa da história do Arte sem Barreiras. Nesse tempo, mesmo quando indagado - seja por colabores e colegas de jornada na Associação ou por pesquisadores acadêmicos -,a responder sobre alguns “comos” e “por quês” da trajetória de 1990 a 2005 do Arte sem Barreiras e, especialmente, sobre as causas do rompimento de sua parceria com a Funarte, respondia sucinto ou sumariamente, já que para as muitas indagações não existiam respostas, e quando as havia, eram incompreensíveis para a audição de quem as solicitava, notadamente, para os que foram alçados à condição de diretores e gestores de instituições públicas de cultura, interessados que estavam em “retomar” o Arte Sem Barreiras. Essa expressão retomar, que ouvi várias vezes ao longo desses 10 anos, no entanto, não mais soava como estímulo, uma proposta de reconstrução, ou mesmo de reparar um 91 “mal feito”, mas como uma ameaça de reocupação de um território já arrasado. Não se retoma vazios, da mesma forma que não se tece com fios invisíveis. Quem o intenta, como na fábula de Andersen, se sujeita ao ridículo.Na História, aquilo que foi encerrado de forma trágica, só se repete como farsa, observou Marx na apresentação do 18 Brumário de Luiz Bonaparte. O Prêmio Albertina Brasil Santos, por exemplo, única ação concreta realizada em oito anos pelo Ministério da Cultura voltada para o artista com deficiência foi a expressão máxima de uma farsa, um escárnio à memória da homenageada e aos grupos e artistas que se habilitaram a láurea. No processo de intervenção e de ocupação do Programa Arte Sem Barreiras pela então direção da Funarte, a partir de junho de 2004, vivenciamos, com igual intensidade, a violência administrativa e institucional promovida por Collor de Mello, em março de 1990. Foram acontecimentos indizíveis, incompreensíveis e inacreditáveis para diretores, associados e voluntários da Associação. Igual perplexidade e desconforto manifestaram também alguns militantes do partido governante, próximos que estavam da entidade, colaboradores e conhecedores de sua história. Após dois anos de intervenção, o saldo foi um redundante fracasso, um irresponsável desmonte e a destruição de uma proposta sem precedentes no Brasil. E o mais grave: ao se intrometer no presente e tentar apagar um passado, comprometeram o futuro não apenas de uma entidade, mas a trajetória profissional de centenas de artistas e grupos que tinham no Arte Sem Barreiras uma importante referência. Foi uma intromissão administrativa e política obscena, inominável, que não se prestou para nada. Uma reflexão derradeira sobre esse ato político obsceno nos levou a uma busca sobre o étimo dessa palavra. O que descobrimos nesse percurso, é surpreendente e desafiador, um chamado ao enfrentamento de novas ações, agora e para sempre ações ob-cenas. Beldades entram na passarela. Misse Brasil 2001 declara que se submeteu a oito cirurgias plásticas antes de abiscoitar o cetro. O gênero da atual misse França é colocado sob investigação. Serão mesmo mulheres ou androides? Na TV, uma reportagem sobre a fome no Nordeste brasileiro é mostrada de maneira espetacular, seduzindo e fascinando, para ao final, quem sabe, nos indignar. É esse o ambiente da pós-modernidade, um mundo de simulacros, de pastiches, com as tecnologias de comunicação mediando a relação entre nós e o mundo. 92 A pós-modernidade não se situa aqui nem lá, mas na fronteira, num território de passagens, dissolvendo antigas barreiras e prolongando-se em redes virtuais que desconhecem rios e montanhas, obstáculos naturais e históricos. É o fluxo do imperfeito, do procedimento nômade, que escapa do instituído para criar novas possibilidades de expressão. Na pós-modernidade lidamos mais com os signos do que com as coisas, com imagens ao invés de objetos, pois já não há diferenças entre o real e o imaginário, entre o ser e a aparência. Somos pós-modernos sem querer ou saber. Mas afinal, quando é que começou essa época? O pós-modernismo surge com as sociedades pós-industriais baseadas na informação. Difícil estabelecer datas e fatos que a precisem. Verdades e mentiras (F for fake, 1974), de Orson Welles, sobre um falsificador de quadros, capaz de iludir e de nos convencer de que afinal todos os Pablos Picassos são falsos, ainda permanece como um dos paradigmas da época pós-moderna. Na pós-modernidade, segundo Lyotard (1990), a ob-cena vem à cena. A ob-cena era aquilo que não podia ser visto no espetáculo. Eram as trocas de roupa, as roldanas, as cordas, os artifícios e mecanismos - não por acaso a contra-regra - que criavam a ilusão da cena. É essa ob-cena que agora interessa mostrar, o que se fez oculto, saber onde o mistério do oculto se escondeu como cantou Caetano Veloso Durante, 15 anos o Programa Arte Sem Barreiras da Funarte, por meio de ações obcenas, realizou procedimentos com Arte para pessoas com deficiência, artistas ocultos, hóspedes das fronteiras – os que saem do chão e sobem nos telhados e se expressam contra as regras. O programa foi uma terceira margem de um rio, trabalhando com o imperfeito, com o corpo enquanto fluxo contínuo da expressão estética, com o desequilíbrio enquanto movimento e dança, com o inacabado, pois outra não é a destinação dos homens. Precisamente por ser imperfeito, o ser humano tem uma grande vantagem sobre os anjos que são perfeitos: poder aperfeiçoar-se sempre, infinitamente. 93 Bibliografia ADORNO, Theodor W. A indústria cultural. São Paulo: Ática, 1986. ALVES, Elder Patrick Maia. A Economia simbólica da cultura popular sertanejonordestina. Maceió, EDUFAL, 2011. AMÂNCIO, Tonico. Artes e manhas da Embrafilme: Cinema estatal brasileiro em sua época de ouro (1977-1981). Niterói: EdUFF, 2000. ANDRADE, Carlos Drummond. Rosa do povo. SP, Cia das Letras, 2011 ANDRIES, André. O cinema de Humberto Mauro. Funarte, Rio de Janeiro, 2001. ______________Democracia pragmática, crítica ou de interesse público. Programa Cultura Viva - Análises e observações. 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