DISTORÇÕES NA COBRANÇA DE CUSTAS JUDICIAIS
E LI A S F A R A H
Existem dúvidas sobre o valor das custas judiciais no caso de recursos de mais
de um recorrente: se elas devem ser rateadas entre os recorrentes ou se cada um
deve pagá-la integralmente, ou, mais, se o Juízo recorrido deveria fixá-la com
equidade. Os doutrinadores se omitem sobre o tema, e a escassa jurisprudência não é
pacífica. Nossa moção sobre o assunto no Instituto dos Advogados de São Paulo
provocou ampla discussão e elaboração de anteprojeto de alteração da Lei n.
4.476/84, que dispõe sobre o Regimento de Custas e Emolumentos e da Lei n.
4.952/85, que amplia o acesso à justiça e dispõe sobre a taxa judiciária.
Uma primeira dúvida, na Lei n. 4.476, está no art. 17, que determina os
recolhimentos (observado o valor da causa) da metade das custas na distribuição de
qualquer processo, e da outra metade no prazo para a subida do recurso, sob pena de
deserção. Ficou ressalvado, pelo § 2o do art. 18, que, no caso de mais de um
recorrente, o primeiro recorrente deve pagar o total das custas, acertando os demais,
entre si, proporcionalmente, o rateio das respectivas quotas-partes. A Lei n. 4.952-85
não revogou a Lei anterior n. 4.476-84, e prevê, no art. 4o, que as custas são devidas:
1% na distribuição; 1% no recurso ou nos processos da competência do Tribunal e 1%
na execução.
A Lei. n. 4.952/85 introduziu uma novidade: o que exceder a 1.500 salários
mínimos no valor das causas pagará custas pela metade. A Lei n. 4.476/84 prevê, no
art. 18, o rateio das custas nos casos de mais de um recorrente. A conclusão, pois, é a
de que o critério do rateio continuou aplicável. E a Lei n. 4.952/85 não prevê que as
custas sejam devidas por inteiro em cada recurso. Aliás, Lei n. 4.952/85 não poderia
revogar ou derrogar a Lei n. 4.476/84, sob pena de contradição, pois ela tem por
objetivo facilitar o acesso à Justiça, barateando-lhe o custo.
A Resolução n. 151, de 27-2-1998, do Conselho de Administração do TRF da
3a Região, v.g., limita o valor das custas ao máximo de 1.800 UFIR´s, mas não prevê
o rateio. Diz, apenas, que "a outra metade será exigível àquele que recorrer...". As
decisões dos Tribunais acirram a perplexidade quando concluem: "Recurso. Preparo.
Duas apelações. Necessidade de recolhimento do valor devido por cada recorrente.
Deserção mantida" (in LEX 164-223). Ou "Duas apelações exigem do Tribunal ad
quem dois serviços distintos. É evidente então que dois devem ser os recolhimentos
da taxa de 1%." (in JTACSP 120-298).
Urge uma definição legal mais explícita sobre o assunto. As partes correm
graves riscos de ruinosos efeitos na deserção recursal. Custas há que superam a
disponibilidade do recorrente. Frustram-se os objetivos da lei em facilitar o acesso à
Justiça. A perplexidade sobre as normas atinge os próprios serventuários.
Propusemos, por isso, uma reformulação dos critérios, sobretudo: a) envolvendo o
estabelecimento de um valor limite para custas; b)- fixação de um valor único de
custas em cada processo; c)- o rateio das custas, quando vários sejam os recorrentes
e c)- fixação de custas proporcionais nas procedências parciais dos pleitos etc.
Theotônio Negrão noticia, na nota 5b, do art. 511 do CPC, que estaria a
prevalecer o critério do ex-Corregedor Geral, Bruno Affonso de André, (in "O Novo
Sistema de Custas Judiciais", que preconiza o preparo por inteiro de cada recurso. O
Prov. 44-99 da CGJ de São Paulo prevê a aplicação do critério do rateio extra-autos
do preparo único. O Comunicado n. 329 da CGJ (in RT 695-105) determinou que nos
casos de mais de um recurso, inclusive adesivo, deve ser seguida a orientação do
Juízo do feito: se deve cada recorrente recolher por inteiro ou se o preparo de um
recurso aproveita aos demais. A jurisprudência, quase uniforme, entende que as
custas devem ser recolhidas por inteiro em cada apelação, quantas forem.
Inaceitável a tese de que a Lei n. 4.952/95 teria operado a chamada
"derrogação tácita" dos critérios anteriores da Lei n. 4.476/84, porque o efeito
derrogatório não poderia ocorrer entre duas leis objetivamente incompatibilizadas. Há,
pois, uma dúvida legislativa, pela disposição distorcida de duas leis, que a todos juízes, serventuários e advogados - deixa perplexos, e que muito aflige os advogados,
com as surpresas ou ciladas da deserção involuntária dos seus recursos, de que dão
notícias muitas decisões. Há um danoso sentimento de acomodação sobre o tema.
A proposta de ante-projeto modificativo da Lei n. 4.952/85, elaborado pelo
Instituto dos Advogados de São Paulo, relatado pelo atual Presidente dr. Nelson
Kojranski, visando à correção destas distorções, merece especial e urgente atenção
do legislativo paulista. O Judiciário, credor das custas, deve cobrá-la de forma
definida, equânime, correta e segura. São clamorosas para os advogados, pessoal,
moral e eticamente, as responsabilizações que sofrem com a deserção recursal. Em
duas fases poder-se-ia cobrar as custas: após o prazo recursal, e havendo recursos
interpostos, as partes seriam intimadas para pagamento, num prazo, das quotaspartes, fixadas pela serventia por rateio. A Lei n. 4.476/85, já diz, no art. 21, parágrafo
único, no caso de recurso, que as partes devem ser intimadas do valor das custas a
serem recolhidas.
O art. 22 da Lei n. 4.476/84 assegura que o recurso não terá o andamento
obstado em razão de irregularidade no recolhimento das custas, "devendo o
recolhimento da diferença, acaso existente, ser efetuado depois de baixados os autos
de Juízo de origem." Seria mais justo, por outro lado, que um recurso interposto contra
apenas parte da decisão recorrida, devesse recolher custas apenas na proporção do
percentual da parte objeto do recurso. Para exigir o preparo por inteiro de todos
recorrentes, o Juízo invoca o maior trabalho para examinar vários recursos. No mesmo
peso e medida, menor haverá de ser o trabalho do Tribunal se o recurso versar
apenas questão parcial discutida na ação.
O Instituto dos Advogados de São Paulo enviou cópia do seu ante-projeto ao
Presidente do Tribunal de Justiça. Ofício da Assessoria da Corregedoria, n. G1597/DEMA 1.1, de 7-6-02, informa "o arquivamento dos autos do processo em
epígrafe, vez que a proposta alí apresentada é de alteração da Lei Estadual n. 4.952,
de 27.12.1985, para o que já existe expediente em tramitação." Analisado pelo
Instituto o projeto mencionado, assim como outros em tramitação na Assembléia
legislativa, ficou constatado que ele "não contempla qualquer das modificações
sugeridas pelo Instituto, nem mesmo aquelas de natureza mais formal, a fim de
conferir melhor técnica aos dispositivos legais". Isto é, os projetos seriam até
conflitantes, como concluiu o Instituo, "na medida em que o projeto encaminhado pelo
Tribunal de Justiça, se aprovado, certamente trará ônus às partes, tanto do ponto de
vista financeiro como nos aspectos jurisdicionais". O assunto merece atenção pela sua
relevância. Esperamos que o Instituto, ao tentar buscar lã, não saia tosquiado !
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