MEMÓRIA, CRENÇAS, EXPERIÊNCIAS E ESTRATÉGIAS DE
APRENDIZAGEM DE VOCABULÁRIO EM LÍNGUA
ESTRANGEIRA (INGLÊS) POR ADULTOS LONGEVOS
Mariney Pereira CONCEIÇÃO
UnB – Universidade de Brasília
Mailce Borges MOTA
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
RESUMO
Este estudo de natureza qualitativa investiga a cognição de adultos longevos,
revelando importantes relações entre a memória, experiências, crenças e estratégias
de aprendizagem utilizadas por alunos da Terceira Idade para lidar com a tarefa de
aprender vocabulário em língua estrangeira (inglês).
Palavras-chave:
aprendizagem.
cognição
de
adultos
longevos;
crenças;
estratégias
de
ABSTRACT
This qualitative study investigates the cognition of elderly students, revealing
significant relationships between memory, experiences, beliefs and learning
strategies used to handle the task of learning vocabulary in a foreign language
(English).
Key-words: elderly citizens; beliefs; language learning strategies.
Introdução
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Nos últimos anos, alguns estudiosos (CARTER, 1998; SCHMITT,
2000) têm procurado analisar a aprendizagem de vocabulário de forma mais
abrangente, buscando investigar, através de uma perspectiva integrada de
pesquisa, aspectos cognitivos e afetivos que poderiam influenciar a
aprendizagem de itens lexicais, dentre os quais a motivação, estilos
individuais de aprendizagem e as estratégias utilizadas pelos alunos. Dentre
essas estratégias, a consulta ao dicionário tem sido especialmente apontada
como uma estratégia eficaz no que se refere à aprendizagem de vocabulário
(HULSTIJN, HOLLANDER & GREIDANUS, 1996).
Os estudos na área de aprendizagem de vocabulário através do
dicionário (BENSOUSSAN, SIM, & WEISS, 1984), entretanto, têm se
limitado a investigar o produto, a retenção de itens lexicais na memória,
deixando de considerar o processo na aprendizagem. Além disso, uma outra
deficiência em relação a essas pesquisas residiria no fato de que a grande
maioria dos estudos na área apontam os benefícios da utilização do
dicionário para a retenção de palavras na memória de curto prazo, gerando
uma lacuna no que se refere às contribuições do uso dessa estratégia para a
retenção por um período maior de tempo.
Neste estudo, propomos uma discussão acerca da importância do
vocabulário na aprendizagem de língua estrangeira (LE). Numa perspectiva
abrangente de investigação desse importante aspecto na aprendizagem de
uma língua, abordamos questões como o papel da memória na aprendizagem
de vocabulário, crenças e experiências de aprendizagem de vocabulário e
estratégias utilizadas para a aprendizagem de itens lexicais. Um aspecto de
grande relevância, entretanto, torna a discussão a respeito do vocabulário
aqui proposta especial: o contexto das reflexões apresentadas envolvem a
aprendizagem de vocabulário por adultos longevos.
Segundo Schmitt (2000), o processo de aprendizagem de
vocabulário no processo de aprendizagem de LE é ainda uma espécie de
mistério. No entanto, segundo o autor, uma coisa a respeito da qual
podemos estar certos é que as palavras não são instantaneamente adquiridas,
pelo menos não por adultos aprendendo uma segunda língua.
Conforme dados da United Nations Statistics Division1, o número de
pessoas com idade acima de sessenta anos no mundo passará de 590 milhões
no ano 2000, para 1.100 milhões no ano 2025. Esses dados apontam para a
necessidade cada vez mais urgente do estabelecimento de bases sociais que
se adaptem a este novo perfil demográfico mundial. A Organização das
Nações Unidas, através do International Plan of Action on Ageing2,
conclama os países ao desenvolvimento de ações no sentido de educar e
1
Cf. página oficial da Organização das Nações Unidas na Internet, url : www.un.org
2
Resolução 47/05 da Assembléia Geral das Nações Unidas, 1999, url : www.un.org
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informar o público, desmistificando o estereótipos da velhice e promovendo
a participação ativa das pessoas de mais idade na sociedade. O plano
recomenda, entre diversas medidas a serem tomadas frente a esta nova
realidade mundial, o estabelecimento de políticas e programas educacionais
de cooperação internacional que incentivem o desenvolvimento de
pesquisas na área.
Apresentamos, neste artigo, os resultados de uma investigação
acerca da cognição de adultos longevos, envolvendo aspectos como
memória, experiências, crenças e estratégias de aprendizagem de
vocabulário em LE (inglês). O estudo, que se circunscreve em uma
perspectiva integrada de investigação da aprendizagem de vocabulário que
leva em consideração os aspectos cognitivos e sociais na aprendizagem.
Compreendendo a aprendizagem como um processo social, que ocorre
dentro de um contexto social (WILLIAMS & BURDEN, 1999), propomos,
neste trabalho, uma investigação da aprendizagem de vocabulário por
adultos longevos, na qual as experiências de aprendizagem de LE dos
participantes, suas crenças a respeito do papel da memória e as estratégias
para a aprendizagem de vocabulário são consideradas. Os seguintes
objetivos foram estabelecidos neste estudo: 1)levantar relatos das
experiências de aprendizagem de LE (inglês) de adultos longevos;
2)identificar as crenças de aprendizagem dos alunos nessa faixa etária;
3)investigar as estratégias de aprendizagem por eles utilizadas na
aprendizagem de vocabulário;4)analisar a retenção de itens lexicais na
memória dos participantes.
Este artigo está organizado em quatro seções. Na seção inicial,
apresentamos a fundamentação do estudo, discorrendo acerca do papel da
memória, experiências, crenças e estratégias na aprendizagem de
vocabulário em LE. Discutimos, também,
nessa seção, questões
relacionadas à aprendizagem de adultos longevos. Nas seções seguintes,
apresentamos a metodologia da pesquisa, a discussão e análise dos dados, e,
finalmente, as conclusões do estudo.
Fundamentação Teórica
Para Nation (1990), o vocabulário de uma língua diz respeito
às palavras daquela língua. Alguns autores, entretanto, fazem diferença entre
léxico e vocabulário, entendendo léxico como o conjunto das palavras de
uma língua e vocabulário como uma parte do léxico que representaria uma
área de conhecimento (LEFFA, 2000). Várias questões dificultam essa
definição, como, por exemplo, as várias nuances de significado que uma
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palavra pode possuir ou a fusão de duas ou mais palavras para expressar um
único significado (DUBOIS et al, 1993). Neste trabalho, consideramos
palavra como uma unidade de língua independente, que possui significado
(NATION, 1990). Os termos item lexical e palavra são usados com o mesmo
sentido, já que, de acordo com Lewis (1993), um item lexical é definido
como uma palavra – uma unidade independente, utilizada como uma unidade
mínima para determinados propósitos sintáticos – ou, como define Nation
(op. Cit.), qualquer item que funcione como uma unidade no vocabulário de
uma língua. Nessa mesma perspectiva, léxico e vocabulário são utilizados
aqui com o mesmo sentido, referindo-se ao conjunto de palavras de uma
língua.
Segundo Zimmerman (1997:17), o ensino e a aprendizagem de
vocabulário têm sido desvalorizados na área de aquisição de segunda língua.
Nas palavras do autor,
Até recentemente [...] pouca ênfase tem sido conferida à
aquisição de vocabulário; apesar de o léxico constituir
um aspecto central na aquisição e uso de uma língua, o
ensino de vocabulário não tem constituído uma
prioridade na pesquisa em aquisição de segunda língua 3.
A partir da década de 70, no entanto, um interesse crescente pelo
léxico passa a delinear importantes mudanças teóricas e práticas em se
tratando do ensino e aprendizagem de vocabulário (CARTER, 1998). A
importância do vocabulário no processo de aquisição de uma língua torna-se
consenso entre os pesquisadores de SLA (HUCKIN & COADY, 1999;
SCHMITT, 1999, 2000) e o vocabulário, antes negligenciado, é hoje visto
como um aspecto central na pesquisa em aquisição de segunda língua.
No Brasil, vários autores têm também se dedicado ao tema,
abordando questões como o papel do léxico na compreensão em leitura em
LE (SCARAMUCCI, 1995b), aspectos externos e internos da aquisição
lexical (LEFFA, 2000), o papel do dicionário na aprendizagem de línguas
(COURA SOBRINHO, 2000), entre outros. Segundo Leffa (op. cit.), por
exemplo, os recursos da informática, cada vez mais presentes no ensino de
3
“Until recently, however, there has been little emphasis placed on the acquisition
of vocabulary; although the lexicon is arguably central to language acquisition and
use, vocabulary instruction has not been a priority in second language acquisition
research or methodology.”
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línguas, transformaram o vocabulário em um dos aspectos mais importantes
na aprendizagem de LE, revertendo a hierarquia dos componentes
linguísticos na aprendizagem e subordinando aspectos como a sintaxe, a
fonologia, a morfologia e a pragmática ao léxico.
Pesquisas na área de ensino-aprendizagem de LE têm hoje apontado
o aprendiz como sujeito ativo no processo de aprender, tornando imperativa
a investigação dos processos cognitivos, psicológicos, afetivos e sociais que
envolvem o processo de aprendizagem (EHRMAN, 1996; RILEY, 1997).
Segundo O’Malley e Chamot (1990:01), as estratégias de aprendizagem
seriam processos cognitivos complexos ou “maneiras especiais de processar
a informação que otimizam a compreensão, aprendizagem ou retenção
da informação”4. Oxford (1990:08) define estratégias de aprendizagem
como “ações específicas do aprendiz para tornar a aprendizagem mais fácil,
mais rápida, mais prazerosa, mais auto-direcionada, mais efetiva e mais
facilmente aplicável a situações novas”5.
Aprendizes que gerenciam a maneira como aprendem vocabulário,
assumindo a responsabilidade pela sua aprendizagem, apresentam melhores
resultados na aprendizagem de novos itens lexicais (SANAOUI, 1995).
Alguns autores se dedicaram a identificar as estratégias utilizadas pelos
alunos na compreensão e retenção do vocabulário em LE (SANAOUI, op.
cit.; SCHMITT, 1997). Oxford (1990) descreve várias estratégias que
ajudam a consolidar forma e significado na memória. Essas estratégias
dividem-se em quatro categorias: criação de elos mentais, aplicação de
imagens e sons, revisão e emprego de ação. Muitas das estratégias nessas
categorias relacionam-se ou podem ser aplicadas ao vocabulário. O’Malley
& Chamot (1990) também identificaram estratégias para a aprendizagem de
vocabulário como memorizar listas de palavras, aprender as palavras em
contexto, repetir, utilizar imagens mentais, utilizar o dicionário e revisar
palavras aprendidas.
Em um estudo voltado especificamente para as estratégias utilizadas
na aprendizagem de vocabulário em LE, Schmitt (1997) constatou, através
de um levantamento junto a 687 alunos de diversas nacionalidades, que,
entre um total de 49 estratégias apontadas, a consulta ao dicionário bilíngue
ficou em primeiro lugar, sendo apontada por 93,0% dos alunos. O dicionário
monolíngue foi também apontado por 73,0% dos alunos. A estratégia de
inferência na aprendizagem de vocabulário em LE tem recebido também a
4
“[...]special ways of processing information that enhance comprehension, learning,
or retention of the information.”
5
“[ ...]specific actions taken by the learner to make learning easier, faster, more
enjoyable, more self directed, more effective, and more transferrable to new
situations.”
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atenção de alguns autores (GRACE, 1998; NATION & COADY, 1988).
Segundo Nation & Coady (op. cit.), essa estratégia envolveria o uso de
conhecimento e experiência anterior para chegar a conclusões a respeito do
significado da palavra, seguindo alguns passos que incluiriam: identificar a
palavra desconhecida, utilizar o contexto, dividir a palavra em partes e
checar o significado da palavra no dicionário (NATION & COADY, 1988).
Grace (op. cit.) ressalta a importância da estratégia de inferência, destacando
que o processo de elaboração envolvido no uso da estratégia contribui para a
retenção das palavras. Conforme a autora, “A inferência do significado das
palavras leva a uma maior retenção e parece requerer um processamento
mais elaborado” (GRACE, 1998:535)6. A autora reitera, entretanto, que, para
que haja uma maior retenção através do uso da estratégia de inferência, seria
necessário que o aprendiz checasse o significado da palavra inferida,
combinando as duas estratégias, inferência e consulta ao dicionário.
Meireles (2003) investigou as estratégias utilizadas na aprendizagem
de vocabulário entre alunos do ensino médio e superior no Brasil. O autor
observou, em seu estudo, que as estratégias mais utilizadas eram tomar nota
e repetir as palavras. Ainda, entre as estratégias mais utilizadas, destacou-se
o uso do dicionário bilíngue, com uma média de 96,0% de uso entre alunos
do ensino médio e superior. De fato, o uso da estratégia de consulta ao
dicionário tem sido apontada por vários autores (GONZALEZ, 1999;
KNIGHT, 1994) como uma importante estratégia para a aprendizagem de
vocabulário.
Segundo Riley (1997), o processo de seleção e uso de estratégias
seria influenciado pelas crenças de aprendizagem de línguas. É importante
salientar, entretanto, que o uso de estratégias poderia, também, determinar a
formação de determinadas crenças (BARCELOS, 2000). Alguns autores
(BARCELOS, 2001) ressaltam, inclusive, que as crenças não apenas
influenciam as ações, mas as reflexões dos aprendizes em relação às suas
experiências podem mudar e criar outras crenças.
Barcelos (2000) apresenta um resumo dos diferentes termos e
definições de crenças por diversos estudiosos da área de aprendizagem de
LE, sendo estas compreendidas, por exemplo, como (a) crenças a respeito da
maneira como a língua funciona e como é aprendida (ABRAHAM &
VANN, 1987), (b) ideias que os alunos têm a respeito da língua e da
aprendizagem de línguas (MILLER & GINSBERG, 1995) ou (c) um
conjunto de representações, crenças e valores relacionados à aprendizagem
que influenciam diretamente o comportamento dos alunos (RILEY, op. Cit.).
Destacando que as crenças de aprendizes de línguas devem ser
compreendidas dentro do contexto em que estão inseridas, Barcelos (2000)
“Inferred word meanings lead to greater retention and seem to require deeper processing.”
6
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lembra que quaisquer investigações a respeito das crenças devem envolver
as experiências dos aprendizes, suas interpretações dessas experiências, o
contexto social e a maneira como os aprendizes utilizam suas crenças nas
situações de aprendizagem. Miccoli (1997) utiliza o termo experiência para
se referir a todas as experiências possíveis pelas quais o aprendiz passa no
processo de aprender uma língua estrangeira. A autora classifica as
experiências de aprendizagem em experiências diretas, que se referem às
experiências vividas em sala de aula e indiretas, relativas às experiências
externas à sala de aula, incluindo as experiências que os alunos tiveram no
passado.
A aprendizagem de língua estrangeira por adultos longevos
Segundo Ellis (1994), a idade figura entre as variáveis mais
discutidas em se tratando das diferenças individuais na aquisição de uma LE.
Conforme destaca o autor, tais discussões concentram-se na forma como a
idade influenciaria o sucesso e o ritmo na aquisição de línguas. Stern (1991:
301) também coloca a questão da idade em relação à aprendizagem de
línguas como um dos assuntos mais discutidos na teoria de ensino de
línguas. Na verdade, estudos na área demonstram, não a superioridade da
criança, mas sim diferenças de ritmo e formas de aprendizagem entre adultos
e crianças (SNOW & HOEFNAGEL-HOLE, 1978; STERN, 1991). O
problema é que tais estudos, muitas vezes, apresentam um caráter empírico e
reforçam a necessidade da realização de pesquisas no que se refere à
construção do processo de aprendizagem de uma língua estrangeira por
adultos e crianças mais especificamente.
Em um estudo de caso de natureza qualitativo-interpretativista,
Oliveira (2011) investigou as crenças e experiências de aprendizagem de
língua estrangeira (inglês) de aprendizes da terceira idade no contexto de um
programa de Educação de Jovens e Adultos de uma escola pública do
interior do estado de Goiás. Para a coleta de dados, o autor utilizou um
questionário, narrativas orais, narrativas visuais, observação de aulas com
registro de notas de campo, diários do pesquisador e entrevistas
semiestruturadas. Os resultados apontaram que existe uma inter-relação entre
experiências e crenças formadas ao longo dos anos de vida escolar dos
participantes. Destacam-se, ainda, atitudes passivas diante da aprendizagem,
por parte dos alunos, segundo o autor, ancoradas em experiências de
aprendizagem com métodos tradicionais de ensino.
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Neste estudo, os termos adulto da terceira idade e adulto longevo
serão usados de forma intercambiável ao nos referirmos a pessoas com idade
acima de 60 anos de idade, conforme a Organização Mundial de Saúde.
Metodologia da pesquisa
Neste estudo, as abordagens qualitativa e quantitativa foram
utilizadas, não como conceitos dicotômicos, mas complementares
(SCARAMUCCI, 1995). A pesquisa qualitativa, segundo Larsen-Freeman &
Long (1991), caracteriza-se por uma preocupação com o comportamento
humano, a partir da referência do próprio indivíduo, através da utilização de
questionários e entrevistas orais. Esse tipo de pesquisa, conhecida como
naturalista ou interpretativa, considera a aquisição não como um fenômeno
isolado, mas inserido nos contextos socioculturais em que ela ocorre
(DAVIS, 1995).
O cenário de realização e coleta de dados para a pesquisa foi um
curso de língua inglesa oferecido por um programa permanente de extensão
de um departamento de Letras de uma universidade federal do Distrito
Federal. O Programa oferece cursos abertos de línguas destinados à
formação continuada para alunos de diferentes áreas de conhecimento da
comunidade universitária e da região do Distrito Federal, atendendo a uma
demanda em torno de 14.000 alunos. O curso de inglês destinado ao público
da terceira idade é destinado a pessoas com idade mínima de 60 anos que
possuam pouco ou nenhum domínio da língua. Esse núcleo permite a
matrícula de alunos que possuam mais de 55 anos, caso solicitem matrícula.
Os conteúdos programáticos são os mesmos dos cursos sequenciais
regulares, diferenciando-se apenas em relação ao público atendido. O curso
de inglês é composto de quinze módulos (níveis), assim distribuídos:
Iniciante 1 e 2, Básico 1, 2 e 3, Pré-Intermediário 1, 2 e 3, Intermediário 1, 2
e 3, Avançado 1, 2 e 3 e Conversação. Cada módulo (ou nível) compreende
45 horas-aula. Os participantes do estudo foram 05 adultos com idade média
de 60 anos, alunos do Curso de Língua Inglesa para a Terceira Idade da
Escola de Idiomas de uma universidade pública do Distrito Federal,
cursando o nível pré-intermediário. Os seguintes instrumentos de coleta de
dados foram utilizados na pesquisa: narrativa escrita, pré-teste de
vocabulário, tarefa de leitura em língua inglesa, questionário retrospectivo,
questionário escrito, inventário de depressão de Beck, questionário de
informações clínicas e teste de retenção. Descrevemos, na sequência, cada
um dos instrumentos utilizados.
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A Narrativa Escrita
Segundo Clandinin & Connelly (2000) e Johnson & Golombek
(2000), as narrativas têm sido amplamente utilizadas na pesquisa qualitativa,
como forma de acessar experiências de aprendizes e professores de línguas.
Nesse sentido, o ato de narrar contribuiria para a estruturação da experiência
humana, uma vez que pessoas organizam suas experiências e memórias
principalmente através da narrativa. Para Barcelos (2001), o uso da narrativa
possibilita a inferência das crenças através dos significados que o indivíduo
atribui às suas experiências. Na coleta, foi explicitado aos participantes,
oralmente e por escrito, que deveriam escrever um texto relatando sua
experiência de aprendizagem de língua inglesa. A Narrativa Escrita (NE) foi
o primeiro instrumento de coleta aplicado, pois desejávamos que a redação
fosse livre e os alunos se sentissem à vontade para relatar aspectos que
julgavam realmente importantes em sua história de aprendizagem, sem que
fossem induzidos por quaisquer outros procedimentos ou questões que
pudessem ser abordadas na aplicação dos demais instrumentos.
O pré-teste de vocabulário
Ainda na primeira semana da coleta de dados foi aplicado, no
horário normal da aula, um pré-teste de vocabulário. A aplicação do teste
teve o objetivo de verificar se os participantes conheciam itens lexicais
contidos em um texto em língua inglesa a ser utilizado em uma tarefa de
leitura que seria posteriormente aplicada como parte da coleta de dados.
Para o pré-teste, foram selecionados itens de frequência menor de ocorrência
na língua inglesa os quais poderiam, por ventura, ser consultados no
dicionário pelos alunos, para uma posterior verificação da retenção desses
itens lexicais na memória dos participantes após um período de três semanas.
A tarefa de leitura em língua inglesa
Na aula que se seguiu, foi aplicada uma tarefa de leitura (TL) em
língua inglesa. Solicitou-se aos alunos que lessem um texto de
aproximadamente 500 palavras em inglês e respondessem a questões de
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compreensão relativas ao texto. A tarefa foi aplicada pelas pesquisadoras e,
durante os momentos que antecederam a realização da tarefa, não foram
feitas quaisquer observações a respeito do uso de estratégias ou consulta de
itens lexicais desconhecidos no dicionário. Foi esclarecido aos participantes
que a tarefa não seria avaliada para fins de promoção ou aprovação no curso
e que os alunos poderiam trabalhar em seu próprio ritmo e que poderiam
utilizar o dicionário, caso desejassem. Não foi estabelecido um limite de
tempo para a realização da tarefa. Os participantes levaram, em média, 50
minutos para realizá-la. O texto utilizado na tarefa foi de nível de dificuldade
compatível com o nível de dificuldade dos textos a serem lidos nas aulas do
curso, contidos no livro didático adotado, sendo a adequação do texto
julgada em relação a uma aula regular do curso. O texto continha, em sua
maioria, palavras de alta frequência na língua inglesa, bem como algumas
palavras de uma frequência menor, cujo significado poderia ser inferido ou
consultado no dicionário pelos alunos. O assunto era de interesse ou
conhecimento geral, tendo sido evitado tópico que pudesse constituir motivo
de controvérsias como aqueles envolvendo política ou religião. O texto
utilizado foi “I survived nine days alone in plane of death”, do livro Life
Lines, da Editora Oxford, página 19.
O Relato Retrospectivo
Logo após a tarefa de leitura, os alunos realizaram um relato
retrospectivo (RR) por escrito, no qual deveriam procurar descrever a forma
como haviam realizado a tarefa de leitura, descrevendo sentimentos e
dificuldades encontradas e procurando descrever, ainda, o que haviam feito
ao se depararem com palavras desconhecidas no texto e se haviam utilizado
alguma estratégia para aprenderem palavras através da realização da tarefa.
O Questionário Retrospectivo
Após a redação do Relato Retrospectivo, foi solicitado aos alunos
que preenchessem um questionário por escrito (QR), incluindo questões
relacionadas à realização da tarefa de leitura. O alunos deveriam registrar os
procedimentos utilizados na leitura do texto, se haviam utilizado o dicionário
durante a tarefa de leitura, o tipo de dicionário utilizado, o processo de
utilização ou forma como haviam utilizado o dicionário e se teriam utilizado
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estratégias antes e após a consulta ao dicionário. O alunos deveriam, ainda,
apontar as palavras consultadas no dicionário bem como avaliar o seu
desempenho na realização da tarefa de leitura. Na tabulação dos resultados
do QR, as respostas foram agrupadas em categorias, tabulando-se o número
de alunos que as responderam ou o número de vezes que cada tipo de
resposta foi mencionada.
O Questionário Escrito
Na terceira semana da coleta, foi aplicado um questionário escrito
(QE), com o objetivo de levantar as experiências de aprendizagem dos
alunos e crenças em relação à aprendizagem de língua inglesa como um
todo e em relação ao vocabulário e uso de estratégias. Foram levantados,
ainda, através deste questionário, dados biográficos dos alunos, com o
objetivo de traçar um perfil dos participantes, o que julgávamos ser de
grande relevância, considerando-se o caráter da pesquisa a ser conduzida. O
questionário foi elaborado pelas pesquisadoras e incluiu questões abertas e
fechadas, sendo dividido em duas partes. A primeira parte do questionário
incluiu o levantamento de dados que permitissem uma caracterização
detalhada do perfil dos participantes, sua experiência anterior com a língua,
incluindo questões abertas a respeito da aprendizagem, para o mapeamento
das crenças. A segunda parte do questionário foi constituída de 11
afirmações envolvendo a aprendizagem da língua e estratégias para a
aprendizagem de vocabulário. Os alunos deveriam indicar seu grau de
concordância com as afirmações, utilizando uma escala do tipo Likert, como
descrito a seguir: 1 indicaria concordância plena, 2) concordância, 3)
neutralidade, 4) discordância e 5) discordância plena. É importante
destacarmos, aqui, que temos consciência das várias questões envolvidas na
coleta de dados sobre crenças por meio de questionários com escala Likert,
considerando-se, como tem destacado Barcelos (2000, 2001) que os
participantes podem ser induzidos em suas respostas ao se depararem com
assertivas pré-determinadas. Soma-se a essa crítica, ainda, o fato de que tal
tipo de instrumento não permita que o participante se expresse com
liberdade, anulando-se, de certa forma, o caráter êmico da pesquisa. No
entanto, é preciso ressaltar que esse foi apenas mais um dos instrumentos
utilizados para a triangulação dos dados. O estudo primou pela utilização de
diversos outros meios de coleta de dados, objetivando-se dar voz aos
participantes, como narrativas, questionários e relatos retrospectivos.
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O Inventário de Depressão de Beck e o Questinário de Informações
Clínicas
Como já dissemos, considerando-se a natureza qualitativa do estudo
e por se tratar de uma pesquisa envolvendo participantes de uma faixa etária
com idade mais avançada, ainda carente de estudos acerca do ensino e
aprendizagem de uma língua estrangeira, especialmente em se tratando de
um aspecto específico, a aprendizagem de vocabulário, julgamos que seria
essencial que se traçasse um perfil detalhado dos participantes. Dessa forma,
decidimos incluir, entre os instrumentos de coleta de dados, um inventário de
depressão. O inventário (ID), criado por Aaron Beck, consiste em um
questionário de autorrelato com 21 itens de múltipla escolha, constituindose, atualmente, em um dos instrumentos mais utilizados para medir a
severidade de episódios depressivos. Na versão aplicada neste estudo, o
questionário é desenhado para pacientes acima de 13 anos de idade e é
composto de diversos itens relacionados aos sintomas depressivos como
desesperança, irritabilidade e cognições como culpa ou sentimentos de estar
sendo punido, assim como sintomas físicos como fadiga, perda de peso e
diminuição da libido. Neste inventário, para a avaliação do resultado, um
valor de 0 a 3 é determinado para cada resposta e o resultado final é
comparado a uma chave para determinar a severidade do quadro depressivo.
Os valores básicos são: 0-9 indicam que o indivíduo não está deprimido, 1018 indicam depressão leve a moderada, 19-29 indicam depressão moderada a
severa e 30-63 indicam depressão severa. Valores maiores indicam maior
severidade dos sintomas depressivos. Nesse mesmo sentido, em busca de um
maior detalhamento do perfil dos participantes envolvidos no estudo,
acrescentamos, ainda, à coleta dos dados, um questionário de avaliação
clínica (QAC), cujo objetivo foi mapear questões como a utilização de
medicamentos antidepressivos, situações médicas graves ou diagnóstico de
distúrbios. Os dois instrumentos foram aplicados no mesmo dia da aplicação
do QE.
O Teste de Retenção de Itens Lexicais
Foi elaborado um teste com o objetivo de verificar a retenção de
itens de vocabulário na memória dos participantes. O Teste de Retenção
(TR) foi aplicado após 03 (três) semanas decorridas da realização da tarefa,
procurando-se avaliar a retenção das palavras dentro de um período maior de
tempo. Com base em Read (2000), segundo o qual conhecer uma palavra
significa conhecer o seu valor semântico, e, como o objetivo do teste foi
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verificar não o uso, mas sim o reconhecimento dos itens lexicais dentro do
mesmo contexto em que estes apareceram no texto utilizado na tarefa de
leitura, foi feita uma opção por um tipo de teste em que foi solicitado aos
alunos que apontassem um sinônimo, tradução ou definição que pudesse
explicitar o significado dos itens de vocabulário. No teste, foram incluídos os
mesmos itens lexicais que os alunos apontaram haver consultado no
dicionário quando do preenchimento do QR. As palavras, como mencionado
anteriormente, estavam contidas no texto da tarefa de leitura e constituem
palavras de menor frequência na língua inglesa. Os alunos consultaram um
total de 22 palavras no dicionário, tendo sido as 12 palavras apontadas com
maior frequência sido selecionadas para o TR. Os participantes deveriam
demonstrar seu nível de conhecimento das palavras circulando as opções de
1 a 4, sendo 1) não me lembro de ter visto esta palavra antes, 2) já vi esta
palavra antes mas não sei o que ela significa, 3) já vi esta palavra antes e
acho que ela significa __________ e 4) eu conheço esta palavra e ela
significa _______________. Para os itens 3 e 4 os participantes deveriam
apresentar um sinônimo, definição ou tradução do item lexical.
A Coleta de Dados
A coleta de dados foi realizada no período de um semestre de curso,
durante o primeiro semestre de 2012. Foi aplicado, inicialmente, a NE, e, na
sequência, o pré-teste de vocabulário. Na semana seguinte à aplicação do
pré-teste de vocabulário, foi aplicada a tarefa de leitura em língua inglesa.
Imediatamente após a realização da tarefa, os alunos redigiram o RR e
responderam ao QR, registrando dados relacionados à realização da tarefa
de leitura. Na sequência, foi aplicado o QE, por meio do qual foram
levantados dados biográficos dos participantes, suas experiências, assim
como crenças e dados envolvendo o uso de estratégias de aprendizagem. Na
sequência, foram aplicados o Questionário de Depressão de Beck e o
Questionário de Avaliação Clínica. Os instrumentos de coleta foram
aplicados no horário das aulas, inseridos dentro das atividades normais do
curso. Foi aplicado, ainda, , um teste de retenção, com o objetivo de verificar
a aprendizagem dos itens de vocabulário consultados no dicionário pelos
participantes. O teste foi aplicado após três semanas da realização da tarefa
de leitura , uma vez que os estudos relacionados à aprendizagem de
vocabulário em LE apresentam uma lacuna no que se refere à investigação
da retenção de itens consultados na memória a longo prazo, priorizando a
aplicação de testes de retenção imediatamente após a leitura do texto.
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Procedimentos para a análise dos dados
A tarefa inicial de análise em uma pesquisa qualitativa foi a
organização, classificação e codificação dos dados. Essa categorização dos
dados ocorreu a partir da classificação dos dados selecionados, delineandose unidades-base de análise. Os pesquisadores privilegiaram os itens que
contemplavam o referencial base da pesquisa. As narrativas foram analisadas
qualitativamente, buscando-se investigar as experiências, crenças e
estratégias utilizadas pelos participantes. Os dados foram catalogados,
inferindo-se as crenças dos alunos a partir de suas afirmações. As categorias
levantadas a partir das narrativas e questões abertas nos questionários foram
agrupadas e revistas, sendo a literatura a respeito do assunto observada, com
o intuito de focalizar a análise, identificando-se e catalogando-se as
experiências, as crenças e as estratégias utilizadas pelos alunos. Os
resultados do TR foram tabulados quantitativamente, buscando-se verificar a
retenção dos itens lexicais na memória dos aprendizes após consulta ao
dicionário, considerando-se o prazo de três semanas. O TR foi corrigido,
atribuindo-se um ponto para cada reposta correta, verificando-se a retenção
dos itens consultados no dicionário, procurando-se estabelecer uma relação
entre o uso da estratégia de consulta ao dicionário e a retenção desses itens.
Discussão e análise dos dados
Nesta seção, apresentamos os resultados do estudo. Iniciamos com o
detalhamento do perfil dos participantes da pesquisa. Os cinco participantes
deste estudo são brasileiros, sendo 04 do sexo feminino e 01 do sexo
masculino, todos aposentados. Com exceção de um dos participantes que é
divorciado, todos os demais são casados, tendo todos já viajado ao exterior e
realizado no mínimo 02 anos de curso de inglês em outros cursos de idiomas
anteriormente. Todos possuem nível superior, sendo um mestre. Os alunos
relataram dedicar, em média, três horas à aprendizagem da língua, em
atividades fora da sala de aula.
Resultados do Inventário de Depressão de Beck e do Questionário de
Avaliação Clínica
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Os resultados apontaram uma média de 8,0 pontos no Inventário de
Depressão de Beck, demonstrando que os participantes do estudo não
apresentam um quadro depressivo. Como mencionado anteriormente, para a
avaliação do resultado, um valor de 0 a 3 foi determinado para cada resposta
dos participantes ao inventário e o resultado final foi comparado a uma
chave para determinar a severidade de possíveis quadros depressivos. Os
valores encontrados, dentro da escala de 0-9 indicam que os indivíduos não
estão deprimidos. De fato, como destacaram no Questionário de Avaliação
Clínica, os participantes não estão tomando medicamento para depressão.
Ainda conforme os dados registrados no QAC, nenhum dos participantes do
estudo foi diagnosticado como portador de algum distúrbio ou situação
médica grave ou passou por cirurgia no cérebro, terapia eletroconvulsiva ou
qualquer tipo de procedimento cerebral invasivo. Nenhum dos participantes
relatou estar tomando medicamento para depressão.
As experiências de aprendizagem
Segundo Míccoli (2007), uma análise da experiência de
aprendizagem dos alunos permite uma compreensão mais clara dos eventos
no complexo processo de aprender uma língua estrangeira. Para a autora, a
aprendizagem de uma língua deve ser compreendida como uma construção e
interpretação das experiências de aprendizagem. A autora ressalta, ainda,
que, conhecendo as experiências de aprendizagem de seus alunos, o
professor pode desenvolver uma compreensão das questões com as quais
estes se defrontam na aprendizagem, podendo assim, adaptar o ensino
conforme as necessidades de seus alunos.
Os dados coletados neste estudo demonstraram que a experiência de
aprendizagem de língua inglesa dos participantes teve início nos tempos do
colégio, como destacam os excertos a seguir, retirados das NEs.
[1]“Comecei a estudar no antigo ginásio. Nesse período eu
não gostava de estudar a língua.” Anne-NE
[2]“ Naquela época, era difícil para mim lidar com a
obrigatoriedade da matéria” Nina-NE
[3]“Comecei a estudar a língua como a grande maioria,
ainda na época do colégio.” Melvio-NE
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[4]“A língua inglesa nem sempre me traz boas recordações;
quando me lembro tenho calafrios!” Lucy-NE
Como se pode observar, os excertos parecem sugerir um certo
desconforto com a experiência de aprendizagem da língua. Há referências à
obrigatoriedade do estudo e a recordações ruins em relação à experiência. A
análise dos dados permitiu uma caracterização dessas experiências anteriores
de aprendizagem, revelando as principais atividades realizadas em sala de
aula à época, como demonstramos no quadro a seguir:
Quadro 1 – Atividades em Sala de Aula na Experiência Anterior
Atividades
Exercícios gramaticais
Memorização de listas de palavras
Interpretação de textos
Tradução de textos
Repetição de frases
Número de menções
5
2
2
1
1
A partir do quadro, podemos observar que as atividades relatadas
com maior frequência pelos alunos coincidem com uma prática de ensino
tradicional, possivelmente ligada ao Método Gramática e Tradução, vigente
nos tempos em que os participantes do estudo frequentaram o colégio.
Destacam-se, assim, atividades como exercícios gramaticais, memorização
de listas de palavras, interpretação e tradução de textos. Em suas narrativas,
os participantes destacaram, ainda, que, depois de anos dedicados ao
trabalho e à criação de filhos, voltaram a estudar a língua após a
aposentadoria, e, em especial, devido às viagens ao exterior, as quais se
tornaram então possíveis, segundo eles, nesse momento de suas vidas.
[5]“Desde o ano passado, então com 61 anos e aposentada,
retornei o estudo e estou empenhada em aprender,
principalmente para viajar.” Nina-NE
[6]“Agora, após minha aposentadoria, resolvi recomeçar.”
Melvio-NE
[7]“Após me aposentar, comecei a assistir mais TV a cabo
e, sem perceber, meu listening foi melhorando.” Lucy-NE
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Em relação à aprendizagem da língua e às viagens para o exterior,
alguns dos alunos destacaram:
[8]“Viajei para o exterior e verifiquei a necessidade de
conhecer mais a língua inglesa para ter mais habilidade e
comunicação, além de mais liberdade para usufruir os
lugares visitados” Nina-NE
[9]“Eu quero viajar por todo o mundo e tenho visto que a
língua inglesa é essencial.” Anne-NE
Pudemos observar, ainda, um caso em que a interação com a família
constituiu-se na grande motivação para o retorno ao estudo da língua:
[10]“Um dia, uma de minhas filhas me disse que ela e o
namorado dinamarquês passariam as festas de fim de ano
conosco no Brasil. Voltei a procurar novamente por um
curso de inglês com o objetivo de falar e entender muito bem
e “a jato” [sic] afim de estabelecer um bom diálogo com
meu futuro genro.” Lucy-NE
Conceição (1999) registra também em seu estudo, o mesmo desejo
dos alunos de buscar contato social por meio da aprendizagem da língua.
Segundo a autora, isolados dentro do próprio ambiente familiar, os alunos
procuravam se aproximar de outras pessoas. A família, os filhos e os netos,
especialmente, pareciam ocupar um lugar de muita importância afetiva para
os idosos. Justamente com estas pessoas que lhes eram caras é que os
participantes da pesquisa, como demonstra a autora, procuravam encontrar,
através da língua inglesa, uma oportunidade de contato social. A experiência
de aprender juntamente com alunos da mesma faixa etária, de forma
prazerosa e a aprendizagem como busca de contato social revelado em
Conceição (1999), parece ser também uma realidade para Lucy, participante
deste estudo:
[11]“Preferi ficar com esta turma, pois ela tem um perfil de
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interesses e vivências mais comuns aos meus; e afinal, meu
objetivo não é o diploma, quero continuar tendo o contato
com a língua, mas de uma forma gostosa, divertida, sem
estresse, e enquanto isso, estou recordando coisas já
estudadas, aprendendo coisas novas e me relacionando com
pessoas interessantes.” Lucy-NE
Os participantes parecem relacionar a volta aos estudos da língua
com o cumprimento de um velho sonho. O desejo e a motivação para dar
continuidade aos estudos se revelam nos excertos que apresentamos a seguir.
Uma das alunas registra, inclusive que, mesmo tendo sido obrigada a
interromper os estudos devido a dificuldades com a conciliação entre o
trabalho e a criação de filhos, sabia que retornaria um dia.
[12]“Tive dificuldades para conciliar os estudos, o
trabalho e os três filhos adolescentes. Parei consciente de
que retornaria.” Nina-NE
[13]“Encontrei a oportunidade de realizar o velho sonho de
aprender a língua inglesa.” Melvio-NE
Destaca-se, assim, uma atitude positiva em relação à aprendizagem
da língua e uma alegria em poder voltar à sala de aula:
[14] “A alegria é poder voltar à sala de aula depois de
tanto tempo e ver que ainda existe a possibilidade de
aprender a língua inglesa, o que me deixa bastante
motivado.” Melvio- NE
Observa-se, ainda, um registro de motivação para a aprendizagem da
língua relacionado ao mercado de trabalho para falantes de inglês durante a
realização da Copa do Mundo no Brasil no ano de 2014:
[15]“Pretendo voltar ao mercado de trabalho até a Copa do
mundo de 2014, falando fluentemente o idioma.” Melvio-NE
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É interessante também notar que os participantes da pesquisa
demonstraram uma atitude positiva em relação à aprendizagem da língua,
mesmo em face às limitações enfrentadas devido às degenerescências
inerentes à idade:
[16]“Eu gostaria de falar inglês fluentemente no futuro.
Apesar de todas as minhas limitações, sou uma pessoa
teimosa. Talvez algum dia eu possa falar a língua melhor do
que agora.” Anne-NE
Nem mesmo as limitações relacionadas à qualidade ruim dos
equipamentos, dificultando a compreensão dos textos orais, já que a perda da
audição é também um problema para os alunos nessa faixa de idade, parece
desanimar os participantes:
[17]“O equipamento de som é da pior qualidade, o que
dificulta o entendimento dos diálogos. Mas ainda assim
pretendo continuar no próximo semestre.” Isabel-QE
O participante Mélvio faz menção à frustração que seria não
conseguir acompanhar o curso, mas, ainda assim, sua fala revela a crença de
que será capaz de aprender e o aluno toma para si mesmo essa
responsabilidade.
[18]“A frustração será se eu não conseguir acompanhar o
desenvolvimento do curso, mas como depende só de mim,
creio que conseguirei.” Melvio-NE
Conceição (1999) destacou ter observado, nos dados obtidos em seu
estudo, uma atitude à primeira vista, de certa forma negativa em relação à
aprendizagem da língua, expressa na dúvida quanto à possibilidade de os
alunos aprenderem a língua, em relatos como “Não sei se vou aprender” ou
“Talvez eu não consiga ter um bom aproveitamento.” No entanto, como
destaca a autora, ao mesmo tempo em que os alunos demonstravam, muitas
vezes, um medo do insucesso, estes tomavam a aprendizagem como um
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grande desafio, o qual, apesar das dificuldades, acreditavam capazes de
vencer.
Em relação às experiências de aprendizagem dos participantes deste
estudo, pudemos notar, assim, que os alunos tomavam a aprendizagem
como um desafio e é possível que, como registra Conceição (op. Cit), haja,
entre alunos nesta faixa etária, uma preocupação com a imagem o que, como
entendemos, pode estar ligado ao fato de que os adultos da terceira idade se
vejam como exemplos para os mais jovens. Ainda, as cobranças que a
sociedade impõe a esses indivíduos pode fazer com que se sintam na
obrigação de mostrar que são capazes e devem ser aceitos por essa
sociedade. É interessante notar, aqui, que estudos (Conceição, 2004)
relativos a crenças em relação à responsabilidade da aprendizagem com
participantes jovens demonstram que esses participantes imputam ao
professor, e não a eles mesmos, essa responsabilidade, ao contrário do que
faz Mélvio, participante deste estudo, como discutimos anteriormente.
As crenças de aprendizagem de línguas
Como destaca Barcelos (2001), as crenças devem ser inferidas a
partir das falas dos participantes. Sendo assim, segundo a autora, é
importante que estudos nessa área busquem cada vez mais priorizar o uso de
instrumentos de coleta que deem voz aos alunos, permitindo que as crenças
sejam mapeadas por meio dos registros coletados. Neste estudo, os dados
relativos às crenças foram coletados a partir das narrativas e respostas a
questões abertas no questionário escrito, assim como por meio de
questionário fechado. Os dados que emergiram da coleta revelaram as
crenças dos participantes, as quais foram agrupadas nas seguintes categorias:
Crenças a respeito da importância da língua inglesa
Em relação à importância da língua inglesa, os participantes
destacaram:
[19] “A língua inglesa é a língua mais importante do
planeta.” Melvio-QE
[20] “É essencial para todos”. Anne-QE
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Emergiram também dos dados, crenças relativas aos aspectos mais
difíceis na aprendizagem da língua inglesa. Alguns dos aspectos
considerados mais difíceis pelos alunos foram:
[21] “Entender o que os nativos falam.” Isabel-QE
[22] “Ouvir e falar”. Anne-QE
[23] “Memorização e audição”. Mélvio-QE
[24] “Me expressar”. Lucy-QE
[25] “Gramática – sempre tive dificuldade com ela. Erro
principalmente quando escrevo. Acho que o fato de pensar
em português, traduzir para escrever em inglês um texto,
este acaba ficando bem “aportuguesado”. Lucy-QE
Lucy aponta também essa mesma dificuldade com a gramática em
sua narrativa escrita:
[26] “Não me lembrava do quanto eu era deficiente com a
gramática.” Lucy-QE
A triangulação dos dados, considerando-se o questionário escrito e
as narrativas é também possível com referência aos aspectos acima
mencionados, como dificuldades em se expressar e pronunciar as palavras:
[27] “No início da minha aprendizagem eu me sentia
insegura, pois eu não pronunciava bem as palavras.” Anne
– NE
[28] “Gosto muito, embora os sons sejam difíceis de
reproduzir”. Isabel-NE
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Foram também registradas crenças em relação às dificuldades em
aprender o idioma na terceira idade. Crenças relativas às dificuldades
oriundas das degenerescências físicas comuns nessa idade, como a
deficiência auditiva foram mencionadas:
[29] “Uma das dificuldades encontradas na terceira idade
é a capacidade auditiva.” Melvio-NE
Crenças em relação às dificuldades nas relações e interações entre os
alunos emergiram também dos dados, como podemos observar no relato
escrito de Isabel:
[30] “Demora-se um pouco mais para fazer amizades, pois
as pessoas em geral são mais fechadas. Mas agora estamos
mais próximos.” Isabel-NE
O registro dessa crença pode, inicialmente, nos parecer prejudicial
ao processo de aprendizagem de línguas nesse contexto, já que consideramos
a aprendizagem como um processo não apenas cognitivo, mas também
social, já que aprendemos na presença de outros. Há que se notar, no entanto,
aqui, a mesma atitude positiva dos alunos frente ao desafio de aprender a
língua, na afirmação da aluna Isabel: “Mas agora estamos mais próximos”.
Observa-se, assim, que a dificuldade nas interações, inerentes à idade,
segundo a aluna, não parece constituir um empecilho para a aprendizagem.
Ao contrário, possivelmente, o desejo de aprender e até mesmo a
possibilidade de contato social que a sala de aula representa para alunos já há
algum tempo afastados do ensino formal, parecem ser fundamentais para a
solução do impasse.
Crenças em relação ao papel da memória na aprendizagem
As crenças em relação ao papel da memória na aprendizagem da
língua nos interessavam de forma especial neste estudo. Para Stevick (1976)
e Smith (1982), o sistema de memória humano seria um processo complexo
em que um grande número de estruturas cognitivas diferentes seriam
responsáveis por diferentes formas de processamento e armazenamento de
informações. Segundo esses autores, vários fatores podem atrasar ou impedir
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o armazenamento de informações na memória e, ainda, as diferenças
individuais no que se refere às habilidades relacionadas à memória devem
ser consideradas.
Para Thompson (1987), a questão da memória é central em se
tratando da aprendizagem de LE. Contudo, segundo a autora, a maior parte
das pesquisas relacionadas ao papel da memória na aprendizagem restringese à língua materna. Um dos estudos envolvendo a memória e a
aprendizagem de LE é o trabalho de Oxford (1990), que menciona várias
estratégias de memória utilizadas por aprendizes, sendo que a maioria dessas
estratégias relaciona-se à consolidação de itens lexicais. A autora destaca a
importância da memória na aprendizagem de LE, destacando que as
estratégias de memória podem ser utilizadas na aprendizagem de
vocabulário, um aspecto que, conforme reitera a autora, constituiria uma das
grandes dificuldades para os aprendizes na aprendizagem de línguas. No
contexto de ensino e aprendizagem de línguas por adultos longevos, o tema
assume especial atenção. Como educadores, precisamos conhecer as crenças
a respeito da memória que os alunos nessa faixa etária trazem para a sala de
aula, buscando analisar a forma como essas crenças podem influenciar a
aprendizagem desses alunos. Nesse sentido, apresentamos a seguir, alguns
excertos retirados do questionário escrito, os quais revelam a importância
que os participantes imputam à memória. Os alunos compararam sua
memória à de alunos mais jovens:
[31]“Temos uma memorização um tanto quanto reduzida, se
comparada com a condição de um jovem aluno.” Melvio-QE
Destacam, ainda, dificuldades em relação ao acompanhamento do
curso, registrando que a memória não acompanha a rapidez com o que o
curso é ministrado:
[32] “A dificuldade maior é com a rapidez do curso e a
constante mudança de páginas durante a aula. A gente
acaba se perdendo. A matéria é dada muito depressa.
Embora a professora seja boa é difícil acompanhar pois
nossa memória não é boa.” Isabel-QE
Os participantes registram, assim, que precisam se dedicar mais do
que se dedicavam ao estudo da língua quando eram jovens, por considerarem
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que sua memória não é mais tão boa, como demonstram as palavras da
participante Isabel a seguir:
[33] “Percebo que a minha memória não é tão boa como
era e que tenho que estudar o dobro do que estudava
quando era mais jovem. Mas sinto-me feliz em poder estudar
inglês.” Isabel-QE
Observa-se, no entanto, no excerto acima, a mesma atitude positiva
em relação à aprendizagem, mesmo em face das dificuldades imputadas à
memória com as quais os alunos parecem se deparar. Outros estudos
(Conceição 1999), como já mencionamos aqui, reportam essa mesma
dificuldade em relação à memória e, em reposta a essa dificuldade, uma
atitude positiva em relação à capacidade de aprender, apesar das
degenerescências impostas pela idade.
O Questionário Escrito
Como já destacamos, neste estudo, as crenças foram mapeadas por
meio de instrumentos que dessem voz aos participantes, permitindo a eles
que pudessem falar de suas crenças, expressando-se livremente durante a
coleta dos dados. Foi também utilizado, para a triangulação dos dados, um
questionário. O questionário fechado constituiu-se de questões abertas e
fechadas, sendo o seu objetivo o levantamento de um perfil dos
participantes, assim como um mapeamento de suas experiências de
aprendizagem de língua inglesa e suas crenças. A última parte do
questionário escrito, como já destacamos, apresentou 11 afirmações a
respeito da aprendizagem da língua inglesa, incluindo questões relativas às
crenças e estratégias de aprendizagem. Os alunos deveriam indicar seu grau
de concordância com as afirmações, utilizando uma escala do tipo Likert. O
primeiro passo na análise dos dados obtidos por meio do questionário foi a
elaboração de uma lista com todas as respostas de todos os informantes. As
respostas a cada uma das afirmações foram tabuladas e organizadas em
categorias, conforme suas especificidades, registrando-se o grau de
concordância do grupo como um todo, no caso das respostas às afirmações à
escala Likert. Destacamos, na sequência, os resultados em relação a cada
uma das assertivas:
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A língua inglesa é uma língua difícil de aprender
Entre os cinco participantes, dois destacaram concordar, dois se
mostraram neutros e um destacou discordar, o que demonstra que o grupo
não acredita, necessariamente, que a língua inglesa seja uma língua difícil
de aprender. Talvez possa se observar aqui, mais uma vez, a atitude positiva
dos participantes em relação à aprendizagem e sua capacidade de enfrentar
esse desafio, mesmo na idade em que se encontram como já discutido aqui,
corroborando o estudo de Conceição (1999), no qual os alunos também se
mostraram bastante otimistas em relação à aprendizagem da língua, não
apresentando a crença de que esta seria difícil de aprender.
O aspecto mais difícil na aprendizagem de LE (inglês)
O segundo grupo de afirmações referia-se a possíveis dificuldades na
aprendizagem de uma língua, apontando dois aspectos principais, a
gramática e o vocabulário. É interessante destacar que, tanto o aspecto
vocabulário, quanto a gramática concentraram o maior número de respostas
no nível 2. Os resultados mostram que os alunos acreditam que tanto o
vocabulário, quanto a gramática constituem aspectos
difíceis na
aprendizagem de língua, como se pode observar nos relatos obtidos por meio
das narrativas, nas quais alguns dos participantes apresentaram crenças de
que a gramática seria realmente um aspecto difícil.
A melhor maneira de aprender vocabulário
Foram também incluídas no questionário questões relativas à melhor
maneira de aprender vocabulário, incluindo afirmações contendo estratégias
como: ler vários textos em inglês, utilizar um dicionário, repetir as palavras,
pronunciar as palavras várias vezes, escrever frases com palavras novas, usar
rimas para lembrar as palavras, traduzir e repetir e escrever palavras novas
várias vezes.
Em grupo de 11 afirmações incluindo diferentes estratégias para a
aprendizagem de vocabulário em língua inglesa, apenas uma, a estratégia
“usar rimas para lembrar as palavras” concentra respostas em três diferentes
níveis (neutralidade, discordância e discordância plena), revelando a crença
de que esta não seria uma estratégia eficaz para os participantes. As demais
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estratégias, talvez por envolverem práticas comuns durante a experiência
anterior de aprendizagem dos participantes, concentram as respostas nos
níveis 1 e 2 (concordo e concordo plenamente).
Os resultados relativos às crenças dos alunos longevos participantes
deste estudo nos parecem bastante encorajadores. Os alunos apresentam uma
percepção em relação à importância da aprendizagem da língua inglesa e não
consideram que esta seja uma língua difícil de aprender. Há importantes
registros em relação às dificuldades impostas pela memória, destacando-se
dificuldades com o processo de audição e memorização e ainda com a
gramática. As crenças relativas à melhor forma de se aprender vocabulário
remontam as práticas de ensino do Método Gramática e Tradução vigente à
época em que os participantes estudavam a língua. No entanto, uma atitude
bastante positiva diante da aprendizagem se revela entre os participantes,
presentes em relatos de dificuldades já sanadas, ou em relatos de que os
alunos acreditam, de fato, que as dificuldades podem vir a ser vencidas. A
análise dos dados aqui apresentada reforça nossa grande responsabilidade
como linguistas aplicados e educadores interessados em possibilitar a
experiência de aprendizagem de uma língua estrangeira e a inserção social,
independente de idade ou faixa etária. Os avanços na medicina e melhoria na
qualidade de vida dos brasileiros atestam sua volta aos bancos escolares o
que nos desperta para a necessidade de que estejamos preparados para
receber esses alunos nos diferentes âmbitos do ensino formal. Nesse sentido,
o estudo das crenças de ensino e aprendizagem de línguas desses alunos
trazem à tona suas expectativas, dificuldades e necessidades, contribuindo
para a preparação de um currículo e um quadro de procedimentos de ensino
que venham ao encontro das especificidades do processo de aprendizagem
de uma língua nessa faixa etária.
As estratégias utilizadas para a aprendizagem de vocabulário
Para o mapeamento das estratégias utilizadas pelos participantes
para aprender vocabulário foram utilizados os dados dos seguintes
instrumentos: a narrativa escrita, o relato retrospectivo e os questionários
escrito e retrospectivo. Em resposta à pergunta “O que você faz para
aprender vocabulário?” os alunos apontaram, entre outras, as seguintes
estratégias: assistir televisão, memorizar através de listas de palavras,
associar a palavra com a imagem. Em relação ao uso dessa estratégia, Lucy
destacou:
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[34]“Só tem que ter cuidado para que a imagem
corresponda à palavra, para não incorrer em erros.” Lucy
QE
A aluna Anne destacou agrupar as palavras em ordem
alfabética, buscando formar palavras com as iniciais das palavras:
[35]“Agrupo em ordem alfabética, formando uma palavra
com as iniciais das mesmas”. Anne QE
A aluna Isabel relatou utilizar o dicionário:
[36] “Vou lendo um texto e quando não sei alguma palavra,
olho o significado no dicionário.” Isabel –QE
De fato, através dos dados coletados por meio do QR observamos
que esta aluna relata haver consultado as palavras desconhecidas no
dicionário e anotado seu significado. Dados revelam também que os alunos
utilizam recursos tecnológicos para a aprendizagem, recorrendo à internet
para a aprendizagem de vocabulário:
[37] “Pesquiso na Internet”. Melvio- QE
A utilização do dicionário bilíngue é também apontada pelos
participantes:
[38] “Tento entender as palavras no contexto. Quando não
consigo, recorro ao dicionário bilíngue.” Nina- QE
Embora se possa registrar o uso de estratégias mais tradicionais para
a aprendizagem, o que possivelmente evoca práticas do ensino tradicional o
qual permeou a experiência de aprendizagem dos alunos, como memorizar
listas de palavras, observa-se, por outro lado, o uso de diferentes estratégias
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como a associação da palavra com a imagem, agrupamento de palavras
conforme suas iniciais e formação de palavras, assistir TV e mesmo recorrer
à internet. Os alunos demonstram criatividade na aplicação das estratégias,
revelando alguma inserção em práticas mais atuais em se tratando do uso de
estratégias e o constante avanço das tecnologias de informação. Os
resultados quanto à utilização de estratégias revelam também o desejo de
aprender dos participantes e a busca da instrumentalização para esse desafio.
Observa-se o esforço de alunos que tomam para si a responsabilidade pela
sua própria aprendizagem, revelando um certo grau de gerenciamento do
próprio processo de aprender uma língua nessa faixa etária, a despeito das
dificuldades impostas pela idade. Nota-se, no entanto, que o uso de
estratégias por parte dos participantes é ainda limitado, não tendo sido
reportado um grande número de estratégias, o que demonstra a necessidade
de estudos envolvendo participantes dessa faixa etária, focando o
desenvolvimento do uso de estratégias para uma maior autonomia no
processo de aprendizagem de alunos longevos.
Ainda em relação às estratégias utilizadas pelos participantes, tendo
em vista uma maior confiabilidade do estudo, foram também aplicados na
pesquisa, logo após a realização da tarefa de leitura, um relato retrospectivo
e um questionário retrospectivo. Apresentamos, na sequencia, os resultados
do RR e QR.
O Relato Retrospectivo
Logo após a tarefa de leitura, os alunos realizaram um relato
retrospectivo (RR) por escrito, no qual descreveram a forma como haviam
realizado a tarefa de leitura, apontando o que haviam feito ao se depararem
com palavras desconhecidas no texto e se haviam utilizado alguma estratégia
para aprenderem palavras através da realização da tarefa.
Os alunos destacaram haver realizado uma primeira leitura para
compreensão geral do texto:
[39] “Li o texto todo para tentar entendê-lo.” Nina- RR
[40] “Eu li todo o texto e procurei entender sua essência.”
Isabel- RR
Destacaram, ainda, durante uma segunda leitura, haver assinalado,
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no texto, as palavras por eles desconhecidas:
[41] “Reli e marquei as palavras que não sabia.” Nina- RR
As palavras foram então, segundo apontam os relatos, consultadas
em um dicionário bilíngue.
[42] “Consultei o dicionário para traduzir as palavras que
não conhecia.” Isabel RR
Observe-se que a participante utiliza o termo “traduzir”, evocando,
mais uma vez, uma prática comum na metodologia provavelmente vigente
quando ela estudava formalmente a língua.
Colocar-se na situação do personagem principal do texto foi também
uma estratégia apontada pelos participantes:
[43] “Imaginei a cena e me senti profundamente tocada com
o sofrimento de Monica. Fiquei impressionada com sua
coragem e força para sobreviver.” Isabel – RR
[44] “Procurei me colocar na situação em que encontrava
Monica e como eu faria para sobreviver.” Melvio – RR
[45] “Achei interessante o aprendizado e fiquei pensativa
com relação ao fato ocorrido com Monica. Achei a minha
vida boa.” Nina- RR
A utilização desse tipo de estratégia nos parece uma especificidade
no processo de aprendizagem dos participantes desta pesquisa,
possivelmente devido à sua faixa etária, considerando que a identificação
com a personagem principal de um texto em busca de uma melhor
compreensão do mesmo não parece ser comumente reportada em estudos
com aprendizes de uma faixa etária mais jovem.
Ainda se referindo à sua dificuldade com a memória, os participantes
destacaram que tinham que ler o texto várias vezes para compreendê-lo, o
que foi citado por eles como uma dificuldade relativa à idade.
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[46]“Li o texto várias vezes”. Melvio- RR
[47]“É preciso fazer o exercício com tempo porque preciso
fazer a leitura pelo menos 3 vezes.” Lucy-RR
Foram ainda registrados relatos de busca das palavras desconhecidas
na internet, destacando-se, inclusive, a busca de frases contendo as palavras
desconhecidas para entender o texto.
[48]“Busquei na Internet frases contendo as palavras
desconhecidas para entender o texto.” Melvio-RR
Outra estratégia mencionada foi a formação de frases com as
palavras novas do texto:
[49]“Usei a construção de frases utilizando palavras
desconhecidas” Melvio- RR
Uma análise dos dados coletados por meio do QR nos sugere que os
participantes utilizaram um número limitado de estratégias para a
aprendizagem de vocabulário, conforme sugere o estudo de Conceição
(1999), que destaca o uso de poucas estratégias de aprendizagem pelos
participantes. Foram reportadas pelos participantes deste estudo a leitura
para compreensão geral do texto, assinalar palavras desconhecidas, busca da
compreensão pelo contexto, utilização do dicionário, anotação das palavras
desconhecidas, redação de frases com as novas palavras e colocar-se na
posição do personagem principal do texto.
O Questionário Retrospectivo
Após a redação do Relato Retrospectivo, foi solicitado aos alunos
que preenchessem um questionário escrito (QR), no qual os alunos
registraram novamente, para triangulação dos dados, os procedimentos
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utilizados na leitura do texto, se haviam utilizado o dicionário durante a
tarefa de leitura, o tipo de dicionário utilizado, o processo de utilização ou
forma como haviam utilizado o dicionário e se teriam utilizado estratégias
antes e após a consulta ao dicionário. Os alunos apontaram, ainda, nesse
questionário, as palavras consultadas no dicionário. Na tabulação dos
resultados do QR, as respostas foram agrupadas em categorias, tabulando-se
o número de alunos que as responderam ou o número de vezes que cada tipo
de resposta foi mencionada. O quadro abaixo apresenta as estratégias
utilizadas pelos participantes na realização da tarefa de leitura, conforme os
resultados do QR.
Quadro 2 - Estratégias utilizadas durante a realização da tarefa de
leitura
Estratégia
Leitura para compreensão geral do texto
Realizar várias leituras do texto
Buscar o significado das palavras
desconhecidas no dicionário
Assinalar palavras desconhecidas
Inferir o significado das palavras
utilizando o contexto
Anotar o significado das palavras
consultadas
Menções
5
5
5
4
2
1
Como se pode observar, os resultados do QR corroboram os
resultados do RR, apontando um uso limitado de estratégias, destacando-se,
inclusive, a necessidade de realização de várias leituras do texto, conforme já
haviam destacado os participantes, ao se referirem, no RR, às dificuldades
em relação à memória, inerentes à sua faixa etária.
Tendo apresentado os dados relativos às crenças e estratégias de
aprendizagem utilizadas pelos participantes, passamos aos dados referentes à
retenção dos itens lexicais na memória.
A retenção dos itens lexicais na memória
Como foi explicitado
estudo, na primeira semana da
vocabulário. A aplicação do
participantes conheciam itens
na seção da metodologia adotada para o
coleta de dados foi aplicado um pré-teste de
teste teve o objetivo de verificar se os
lexicais contidos em um texto em língua
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inglesa o qual seria utilizado em uma tarefa de leitura a ser aplicada como
parte da coleta de dados. Para o pré-teste, foram selecionados itens de
menor frequência de ocorrência na língua inglesa os quais poderiam,
porventura, vir a ser consultados no dicionário pelos alunos. Essas mesmas
palavras foram utilizadas posteriormente para verificação da retenção dos
itens lexicais na memória após um período de três semanas. As seguintes
palavras foram selecionadas para o pré-teste: soggy, squeeze, lung, jaw,
survive, aisle, fuselage, swamp, wreckage, tore, scoop, spare. A tabulação
dos dados do pré-teste demonstrou que os alunos não tinham conhecimento
de grande parte das palavras. Entre os doze itens de vocabulário, apenas três
foram marcados pelos alunos. Os participantes apresentaram respostas
corretas apenas para os seguintes itens lexicais, conforme quadro a seguir:
Quadro 3 – Resultados do Pré-teste
Itens lexicais
Survive
Fuselage
Lung
Número de respostas corretas
5
3
2
O teste de retenção
No teste de retenção, os informantes deveriam marcar as respostas
de 01 (um) a 04 (quatro), conforme a Tabela 3 a seguir, de acordo com seu
conhecimento de cada uma das palavras testadas. O TR foi corrigido
conforme proposto pelos autores (PARIBAKHT & WESCHE, 1993).
Apresentamos, a seguir, as categorias do teste de retenção:1 – Não me
lembro de ter visto esta palavra antes; 2 – Já vi esta palavra antes, mas não
sei o que ela significa; 3 – Já vi esta palavra antes e acho que ela significa...;
4 – Eu conheço esta palavra. Ela significa...
Foi atribuída a cada questão do teste (palavra testada), uma
pontuação que variava de 01 (um) a 03 (três). Os pontos foram atribuídos
conforme os seguintes critérios, determinados pelos autores (op. Cit.):
1 ponto - 1 ponto para a categoria 1(nunca vi esta palavra antes);
2 pontos - 2 pontos para a categoria 2 (já vi esta palavra antes, mas não sei o
que ela significa) e para a categoria 3 (já vi esta palavra antes e acho que ela
significa), quando os informantes declaravam que já haviam visto a palavra
antes e achavam que conheciam seu significado, mas, no entanto, apontavam
um significado incorreto;
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3 pontos - 3 pontos para a categoria 3 (já vi esta palavra antes e acho que ela
significa), quando os informantes realmente apontavam o significado correto
da palavra e para a categoria 4 (eu conheço esta palavra e ela significa),
quando o significado apontado era correto. Quando os informantes
marcavam a categoria 4 (afirmando conhecer o significado da palavra, mas,
contudo, apontavam um significado incorreto, a pontuação 2 era dada).
Observa-se, nessa pontuação, que o teste avalia diferentes níveis de
familiaridade com a palavra: o nível 1 indica nenhuma familiaridade,
enquanto o nível 2 indica que há uma certa familiaridade com a palavra, mas
o aluno não é capaz de indicar seu significado correto e o nível 3, indica que
o aluno conhece a palavra.
Todos os participantes desta pesquisa utilizaram a estratégia de
consulta a um dicionário bilíngue durante a realização da tarefa de leitura,
estratégia essa considerada por muitos estudiosos (GONZALEZ, 1999;
KNIGHT, 1994; LUPPESCU & DAY, 1993), um instrumento eficaz para a
retenção de itens lexicais na memória. Na tabulação dos resultados do TR –
elaborado a partir das palavras apontadas no QR como consultadas no
dicionário pelos participantes – o maior número de respostas concentrou-se
no nível 2, o que significa que, apesar de os alunos não serem capazes de
apontar o significado correto das palavras consultadas, existe uma certa
familiaridade com essas palavras. Esses resultados poderiam ser explicados
por estudos (HATCH & BROWN, 1995; MCCARTHY, 1984; NATION,
1990) que consideram a aprendizagem de vocabulário como um continuum
de conhecimento ou um processo dinâmico, constituído de diferentes
estágios (DALE, 1965; NIST & OLEJNIK, 1995) em que cada encontro
com a palavra proporcionaria um conhecimento mais profundo daquela
palavra (FISCHER, 1994).
Esses estudos apontam a importância do dicionário nesse processo
de pequenos avanços, uma vez que este contribuiria para o processo de
construção de uma representação mental da palavra e seu significado, sendo
que os alunos aprenderiam mais palavras em um nível mais profundo ao se
depararem com a definição das palavras no dicionário (NIST & OLEJNIK,
op. cit.; MCKEOWN’S, 1993). Nessa perspectiva, a consulta ao dicionário
seria um passo inicial na aprendizagem de uma palavra (GONZALEZ, 1999;
MCKEOWN, op. cit.).
A partir dessa análise, poderíamos afirmar que a estratégia de
consulta ao dicionário durante a tarefa de leitura proposta no estudo não teria
contribuído de maneira significativa para a retenção dos itens lexicais na
memória de longo prazo. Tais resultados apontam a necessidade de uma
reflexão acerca da importância das experiências anteriores de aprendizagem
e sua relação com as crenças e estratégias na aprendizagem de vocabulário
por adultos longevos. Os dados coletados por meio do RR e QR não
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apontam uma utilização efetiva de estratégias combinadas ao uso do
dicionário. Destacamos, assim, a necessidade, quando da estruturação de
cursos voltados para esta faixa etária, de uma maior atenção a aspectos que
focalizem o desenvolvimento no uso de estratégias por parte desses alunos, o
que, certamente, redundaria em uma melhor retenção de itens lexicais na
memória dos aprendizes.
Conclusões
A proposta deste trabalho, inserido em uma perspectiva integrada de
investigação da aprendizagem de vocabulário buscou levar em consideração,
não apenas aspectos cognitivos mas também aspectos sociais na
aprendizagem de LE. Os objetivos do estudo foram levantar relatos das
experiências de aprendizagem de LE (inglês) de adultos longevos e, então,
identificar as crenças de aprendizagem, em especial a respeito do papel da
memória na aprendizagem, investigar as estratégias de aprendizagem
utilizadas pelos alunos na aprendizagem de vocabulário e, por fim, analisar a
retenção de itens lexicais na memória de longo prazo dos participantes.
Muitos estudos têm sido realizados no sentido de mapear os passos
necessários para a consolidação de um item lexical na memória. Hatch &
Brown (1995) apresentam cinco passos essenciais para a aprendizagem de
vocabulário, incluindo a consolidação de forma e significado na memória.
Conforme os autores, várias estratégias podem ser utilizadas para a
consolidação entre forma e significado na memória, entre estas, a consulta ao
dicionário. Os resultados deste estudo sugerem que, embora os aprendizes da
terceira idade, participantes da pesquisa, tenham utilizado o dicionário na
realização da tarefa de leitura proposta, poucas estratégias foram por eles
utilizadas, as quais pudessem garantir uma maior consolidação entre forma e
significado na memória de longo prazo.
Uma análise dos resultados do teste de retenção demonstrou que o
maior número de respostas concentrou-se no nível 2, apontando uma
familiaridade dos alunos com as palavras, embora não pudessem ser capazes
de apontar o significado correto das palavras consultadas. Vários estudiosos
(HATCH & BROWN, 1995; MCCARTHY, 1984; NATION, 1990)
consideram a aprendizagem de vocabulário como um continuum de
conhecimento ou um processo dinâmico, constituído de diferentes estágios
(DALE, 1965; NIST & OLEJNIK, 1995) e, nesse sentido, poderíamos
considerar que o uso do dicionário proporcionou um primeiro encontro com
as palavras, constituindo-se em um passo inicial na aprendizagem de uma
palavra (GONZALEZ, 1999; MCKEOWN,1993).
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Quanto às experiências anteriores de aprendizagem dos
participantes, as atividades relatadas com maior frequência pelos alunos
coincidem com uma prática de ensino tradicional, certamente ligada ao
Método Gramática e Tradução, destacando-se atividades como exercícios
gramaticais, memorização de listas de palavras, interpretação e tradução de
textos. A interação com a família e com pessoas da mesma faixa etária
parece constituir a grande motivação para o retorno ao estudo da língua,
corroborando o estudo de Conceição (1999), que registra também o mesmo
desejo dos alunos de buscar contato social por meio da aprendizagem da
língua. Destaca-se, ainda, uma atitude muito positiva em relação à
aprendizagem, mesmo em face das dificuldades encontradas, como aquelas
relativas à memória e a rapidez com que o curso é ministrado, perda da
audição e mesmo questões relacionadas à qualidade dos equipamentos de
som utilizados nas aulas. É interessante notar que também Conceição (1999)
registrou, em seu estudo, por meio dos diários dos alunos, uma certa
dificuldade em acompanhar o ritmo das aulas, apontando essa dificuldade
como proveniente de alguns fatores, como o longo tempo afastado do ensino
formal, o raciocínio mais lento e deficiências visuais e auditivas.
No que se refere às crenças de aprendizagem de línguas, conforme
Barcelos (2001), neste estudo, foram utilizados instrumentos que dessem voz
aos participantes, sendo as crenças inferidas a partir de suas falas nas
narrativas, relatos retrospectivos e questionários. Os alunos apresentam uma
percepção em relação à importância da aprendizagem da língua inglesa e não
consideram que esta seja uma língua difícil de aprender. Há importantes
registros em relação às dificuldades impostas pela memória, destacando-se
dificuldades com o processo de audição e memorização e com a gramática.
Como se pode observar, as crenças relativas à melhor forma de se aprender
vocabulário remontam as práticas de ensino do Método Gramática e
Tradução vigente à época em que os participantes estudavam a língua. No
entanto, uma atitude bastante positiva diante da aprendizagem se revela entre
os participantes, em relatos de dificuldades já sanadas. A análise dos dados
reforça nossa grande responsabilidade em possibilitar a inserção social,
independente da idade ou faixa etária dos aprendizes. Os estudos das crenças
de ensino e aprendizagem de línguas desses alunos trazem à tona suas
expectativas, dificuldades e necessidades, trazendo importantes reflexões
quanto à preparação do currículo e procedimentos de ensino que venham ao
encontro das especificidades do processo de aprendizagem de língua inglesa
nessa faixa etária.
O mapeamento das estratégias utilizadas pelos participantes aponta a
utilização das seguintes estratégias: assistir televisão, memorizar através de
listas de palavras, associar a palavra com a imagem, agrupar as palavras em
ordem alfabética, buscando formar palavras com as iniciais das palavras,
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utilizar o dicionário e pesquisar na Internet. Embora se possa registrar o uso
de estratégias mais tradicionais para a aprendizagem, como memorizar listas
de palavras, observa-se, por outro lado, o uso de estratégias como a
associação da palavra com a imagem, agrupamento de palavras conforme
suas iniciais e formação de palavras, assistir TV e mesmo recorrer à internet.
Os alunos demonstram alguma criatividade na aplicação das estratégias,
revelando inserção em práticas mais atuais em se tratando do uso de
estratégias e o constante avanço das tecnologias de informação.
Os resultados quanto à utilização de estratégias revelam também o
desejo de aprender dos participantes e a busca da instrumentalização para
esse desafio. No entanto, o uso de estratégias por parte dos participantes é
ainda limitado, não tendo sido reportado um grande número de estratégias.
Observa-se, dessa forma, a necessidade de estudos envolvendo participantes
dessa faixa etária, focando o desenvolvimento do uso de estratégias para
uma maior autonomia no processo de aprendizagem. Foram também
registrados relatos de busca das palavras desconhecidas na internet, assim
como a busca de frases contendo as palavras desconhecidas para entender o
texto. Ainda assim os dados sugerem que os participantes utilizaram um
número limitado de estratégias para a aprendizagem de vocabulário,
conforme aponta o estudo de Conceição (1999), em que se detectou também
o uso de poucas estratégias de aprendizagem pelos participantes na mesma
faixa etária.
Como se pôde observar, embora afastados do ensino formal, muitas
vezes rotulados sob o estigma que a velhice representa para nossa sociedade,
as pessoas nessa faixa etária apresentam, tanto quanto outras em outras
faixas de idade, condições e, principalmente, o direito a um espaço na
comunidade social, onde possam se expressar e se desenvolver como
pessoas. Ao contrário do que muitos acreditam, apesar das degenerescências
físicas próprias da idade, os aprendizes longevos são capazes, como vimos,
de desenvolverem estratégias que os auxiliem na aprendizagem de uma
língua estrangeira. O momento é, pois, de reflexão. Tornam-se imperativas
propostas de ações que possam dirimir a obsolência a que estão legados os
“de idade” em nossa sociedade, já que, em tempo próximo, grande parcela
da população brasileira será composta por indivíduos acima de sessenta
anos.
Esperamos, com este trabalho, trazer contribuições para os estudos
na área de aprendizagem de vocabulário, buscando oferecer uma melhor
compreensão da forma como fatores individuais como a memória,
experiências, crenças e
estratégias se relacionam no processo de
aprendizagem de vocabulário em LE por adultos longevos. Nosso desejo é
poder auxiliar educadores na tarefa de conduzir aprendizes adultos longevos
a uma maior autonomia e independência no processo de aprendizagem de
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vocabulário em LE, contribuindo para o estabelecimento de bases sociais
que se adaptem ao novo perfil demográfico da população brasileira no
século XXI.
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