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O Estatuto da Cidade e a constitucionalização do Direito Urbanístico
Vinicius Marins*
1.0. Introdução: Função social da propriedade
O Estatuto da Cidade, Lei 10.257 de 10 de julho de 2001, é o tema
do presente estudo. A matéria, pertinente à seara do direito urbanístico,
assume relevância ímpar no cenário jurídico moderno; basta observar que,
inobstante restar recentemente inserido em nosso ordenamento jurídico, já
conclama o novel diploma acesos debates, principalmente no que atine à
constitucionalidade de alguns de seus inovadores institutos. Outrossim, não
se deve perder de vista o seu papel delineador de relevante questão
constitucional: a propriedade e sua conformação social.
Fundamental, portanto, uma vez que permeia todo o trabalho
hermenêutico deste texto legal, trazer algumas considerações preambulares
sobre esta nova perspectiva, fundamental à escorreita compreensão da
hodierna temática urbanística.
É incontestável a afirmação de que no século que há pouco findou
modificou-se de forma decisiva a ótica analítica do secular direito de
propriedade. Uma visão estritamente absoluta, cerrada e dogmática, cede
diante de uma perspectiva sociológica e constitucional. A propriedade, neste
passo, destina-se a atender sua função social (art. 5º, XXIII e arts. 182 e 183
da Constituição de 1988).
Nesta vertente analisa-se o processo de socialização do domínio,
isto é, a retirada do indivíduo enquanto eixo da noção de propriedade,
excluindo-a de sua "sacralidade" e lançando-a no mundo profano das coisas,
sujeita aos fatos naturais e econômicos. Outrora instrumento de manutenção
de desigualdades sociais e dominação do homem sobre o homem, assume a
dimensão teleológica protetiva de valores constitucionais.
No Código Civil Brasileiro de 1916 a propriedade ainda é tratada sob
o prisma da doutrina individualista consagrada no século XIX e densificada
no Code de Napoleon. Sob os influxos do liberalismo, a propriedade no
texto codificado de 1916 é conceituada por seu aspecto estrutural, ou seja,
enquanto estrutura do direito subjetivo proprietário. O artigo 524, caput, do
CC não definiu a propriedade; apenas dispôs sobre os poderes do titular do
domínio:
"Art. 524. A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e
dispor de seus bens, e de reavê-los de quem quer que injustamente os
possua".
Tais poderes, expressão do elemento interno ou econômico da
propriedade (faculdade de usar, gozar e dispor) e do elemento externo ou
jurídico (as ações de tutela da propriedade), constituem o já mencionado
aspecto estrutural, sem nenhuma referência ao conteúdo funcional do direito
de propriedade. É o que nos ensina o Prof. Gustavo Tepedino, verbis:
"A propriedade pode ser estudada em dois aspectos, o estrutural e o
funcional. A dogmática tradicional, e, na sua esteira, o Código Civil
brasileiro, preocupa-se somente com a estrutura do direito subjetivo
proprietário. O art. 524 do C. Cív., com efeito, evitando defini-la, dispõe
sobre os poderes do titular do domínio, fixando o aspecto interno ou
econômico, caracterizador do senhorio, e outro externo, o aspecto
propriamente jurídico da estrutura da propriedade. O primeiro aspecto,
interno ou econômico, é composto pelas faculdades de usar, fruir e dispor.
O segundo, o jurídico, traduz-sena faculdade de exclusão de ingerências
alheias. Estes dois aspectos, o interno e o externo, compõem a estrutura da
propriedade, o seu aspecto estético. Já o segundo aspecto, mais polêmico é
alvo de disputa ideológica, refere-se ao aspecto dinâmico da propriedade, a
função que desempenha no mundo jurídico e econômico, a chamada função
social da propriedade". (1)
Como nota o Prof. Tepedino, não apenas o Código Civil, que traz
outras normas que densificam o caráter absoluto do direito de propriedade,
mas a dogmática tradicional e sua lógica formal contribuíram para manter a
interpretação do Código ao largo dos mais contundentes reclames sociais e
culturais. (2)
Com a promulgação da Carta Magna de 1988, reforça-se com nunca
esta perspectiva publicística do domínio. Diz-se, neste passo, que as
prerrogativas dominiais estão cada vez mais restringidas, em benefício da
coletividade. Acentua-se, no direito moderno, essa contenção ao direito de
usar e dispor, seja pela repressão ao mau uso da propriedade, como pelas
restrições impostas em benefício do bem comum. O direito de abusar
fornece a noção de um poder amplo, mas não seguido de implicações antisociais, incompatíveis com a ordem jurídica.
O que temos, em verdade, é uma modificação do direito de
propriedade em sua essência, conteúdo. A sua inserção no rol das garantias
constitucionais cria a convicção de que o direito de propriedade possui, além
dos poderes que lhe são inerentes, deveres comuns aos direitos patrimoniais,
em proveito da sociedade. O proprietário, absoluto, não é mais o
protagonista do processo urbanístico. Neste diapasão, relevante a afirmação
do eminente professor Eduardo Garcia de Enterría, da Universidade de
Madrid:
"As decisões básicas sobre urbanismo ficaram dissociadas do direito
de propriedade privada do solo, atribuídas a um centro que já não se
legitima como proprietário, senão como titular do poder público e
responsável pela ordem coletiva, a Administração". (3)
E exatamente neste contexto, destacados os atores do atual processo
urbanístico, que emerge a importância do Estatuto da Cidade como diploma
conformador e estrutural desta nova conotação na qual se insere o direito de
propriedade e que demanda a ordenação racional do solo urbano.
No curso deste trabalho trataremos de, analiticamente, os aspectos
sociais e jurídicos que balizam a inserção do Estatuto no ordenamento
normativo. Também proceder-se-á a uma análise apurada de cada instituto
jurídico trazido pela recente lei, sem descurar das controvérsias doutrinárias
e jurisprudenciais mais relevantes.
2.0. Contingências sócio-culturais. Função social da cidade
Como restou exposto no tópico anterior, a Lei 10.257/2001 veio
aconselhar uma nova concepção do uso do solo urbano, em que a
propriedade apareça redefinida em seu conteúdo, em função da necessidade
premente de disciplinar, ordenar o assentamento humano nas cidades.
Reputam alguns estudiosos, neste passo, que a edição do Estatuto
somente treze anos após a edição da Carta Magna de 1988 é fato a ser
lamentado, mormente tendo-se em vista recentes dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, que apontam um avassalador processo
de urbanização, que exsurge sem o adequado aparato técnico e humano.
Segundo últimos levantamentos do IBGE - dados de 2000- 81,2% da
população brasileira vive em áreas urbanas, enquanto que há poucos 40 anos
atrás este percentual era de 40%. Esta migração do campo para a cidade se
deu em busca de melhores oportunidades de vida. Porém, o que realmente
gerou em volta das cidades cosmopolitas atuais foi um cinturão de pobreza e
miséria, sem as mínimas condições de habitabilidade, vivendo pessoas em
condições
sub-humanas
sem
qualquer
dignidade.
De acordo com o IBGE, em 56,5% dos municípios com população entre 50
mil e 100 mil habitantes existem favelas, o mesmo acontecendo em 79,9%
daqueles com população entre 100 mil e 500 mil habitantes. A migração
gerou em volta dos grandes centros urbanos a favelização. De tal sorte que,
em todos os municípios com mais de 500 mil habitantes encontramos
favelas. E por último um dado estatístico que marca definitivamente a subhabitação em nosso país: as favelas são encontradas em 27,6% dos
municípios brasileiros, ou seja, em mais de 1.300 municípios.
Seria fastidioso enumerar mais dados estatísticos, sobrelevando a
circunstância de que os fatos acima arrolados são públicos e notórios nas
principais aglomerações urbanas de nosso país. Temos, em síntese, a
seguinte a sucessão de acontecimentos demandantes de atenção pelo direito
urbanístico:
a) excessivo crescimento da população urbana, como decorrência da
industrialização;
b) assentamento dessa população na Cidade de maneira inteiramente
desordenada, sem qualquer planejamento e racionalidade;
c) assentamento da população na cidade não apenas de forma
desordenada, mas iníqua, realizando-se esse assentamento sob o domínio da
chamada segregação residencial, por força da qual às chamadas populações
carentes e de baixa renda são destinadas as periferias do espaço urbano, em
condições de vida as mais dilacerantes, recebendo as áreas de rendimento
mais alto a concentração de maiores benefícios líquidos das ações do
Estado;
d) considerável atividade especulativa, em que o dono do solo
urbano, utilizando a sua faculdade de não-uso, institui um banco de terras
em seu benefício, aguardando o momento de, pela alienação das glebas
estocadas, locupletar-se com as mais-valias resultantes dos investimentos de
toda a comunidade.
Todo este contexto sócio-cultural nos indica a urgente expectativa de
implementação de políticas públicas no bojo das quais se ordene a adequada
utilização do solo urbano, concretizando as diretrizes constitucionais.
E isto porque hodiernamente já não de fala apenas em função social
da propriedade, mas, muito mais do que isso, em função social da cidade,
como garantia do bem-estar de seus habitantes. Claro que as tais funções
sociais decorrem da função de cada de propriedade, por isso que será obtida
através de uma política de desenvolvimento urbano adequada, que garanta o
bem-estar de cada um dos habitantes e de todos, conjuntamente.
Justamente neste contexto que se insere o tardio Estatuto da Cidade,
como principal diretriz normativa no intuito de adequar a concreta
ordenação urbanística aos parâmetros constitucionalmente dispostos.
3.0. Estatuto da Cidade: visão geral da lei
A Lei 10.257/01 originou-se de projeto de lei que tomou o nº 2.191,
de 1989, do Sr. Raul Ferraz; ao depois, tomou o nº181/89 no Senado
Federal, e, finalmente, na Câmara dos Deputados, o nº 5.788 de 1990.
De modo geral, a Lei contém cinco capítulos: I – Diretrizes Gerais; II
– Dos instrumentos da Política Urbana, com as seções I a XII; III – Do
Plano Diretor; IV – Da Gestão Democrática da Cidade e V – Disposições
Gerais.
Os pontos mais relevantes da lei, a nosso ver, são a efetiva
concretização do Plano Diretor nos Municípios, tornando eficaz a
obrigatoriedade constitucional de sua existência em cidades com mais de
vinte mil habitantes; a fixação das diretrizes gerais previstas no art. 182, da
CRFB, para que o município possa executar sua Política de
Desenvolvimento Urbano; a criação de novos institutos jurídicos, ao lado da
regulamentação do § 4º, do art. 182 da Carta Magna (parcelamento e
edificações compulsórios, IPTU progressivo no tempo e a desapropriação
com pagamento em títulos); a fixação de sanções para o Prefeito e agentes
públicos que não tomarem providências de sua alçada, inclusive, para o
Prefeito, a sanção de improbidade administrativa; a instituição de gestão
democrática e participativa, da cidade, e, finalmente, as alterações na Lei de
Ação Civil Pública para possibilitar que o Judiciário torne concretas as
obrigações de ordem urbanística, determinadas pela Lei, inclusive em
relação à elaboração e aprovação do Plano Diretor.
Em apertada síntese, destacamos os principais pontos do diploma
legal:
c.Diretrizes Gerais.
Como são em número de 16 (dezesseis) as diretrizes gerais indicadas
pelo art. 2º da Lei iremos aqui destacar apenas as que julgamos as mais
importantes para o desenvolvimento urbano.
Assim, (I) a garantia do direito a cidades sustentáveis, direito à terra
urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao
transporte e aos serviços urbanos, ao trabalho e ao lazer; (II) gestão
democrática da cidade; (III) cooperação entre os governos, a iniciativa
privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização; (IV)
planejamento do desenvolvimento da cidade; (VI) ordenação e controle do
uso do solo; (VII) integração e complementaridade entre as atividades
urbanas e rurais, (IX) justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do
processo de urbanização; (X) adequação dos instrumentos de política
econômica, tributária e financeira e dos gastos públicos aos objetivos do
desenvolvimento urbano; (XII) proteção, preservação e recuperação do meio
ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico,
paisagístico e arqueológico; (XV) simplificação da legislação de
parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a
permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades
habitacionais.
b) Os Instrumentos da Política Urbana
Neste passo, faz-se remissão ao capítulo 04 do presente trabalho.
c)Plano Diretor
O capítulo III é dedicado inteiramente ao referido instituto, previsto
como sendo obrigatório pelo art. 182, da CF, para as cidades com mais de
vinte mil habitantes e somente agora tornada concreta tal obrigatoriedade,
por duas disposições:
- a que faz incidir sobre o Prefeito a sanção de improbidade
administrativa, se este não tomar as providências para que o Plano Diretor
esteja aprovado em até cinco anos após a entrada em vigor da Lei (art. 52 e
inciso VII);
- a que acresce como objeto da Ação Civil Pública e como motivo da
ação cautelar respectiva a "ordenação urbanística", propiciando ao
Ministério Público ou a entidade com mais de um ano de existência, a
possibilidade de, em liminar ou no mérito, obrigar (com fulcro no art. 3º, da
Lei 7.347/85) a Câmara Municipal e aprovar o Plano Diretor, se decorridos
os cinco anos.
Dir-se-ia que esta conclusão e essa possibilidade seria
inconstitucional, posto que não poderia o Poder Judiciário obrigar a Câmara
Municipal a legislar, pois isto violaria o princípio da separação de poderes.
Entretanto, a conclusão se lastreia em outro princípio fundamental, ou seja,
no da função social da propriedade, que somente se concretiza quando a
propriedade urbana cumpre as exigências do Plano Diretor (§ 2º art. 182
CRFB) e, se este é obrigatório pra as cidades com mais de vinte mil
habitantes, tal obrigatoriedade impõe e acaba por completar a estrutura
jurídico-constitucional do princípio da função social da propriedade. Daí a
conclusão retirar do texto constitucional o seu fundamento de validade. Esta
conclusão é a mesma de Régis Fernandes de Oliveira. (4)
Entrementes, coloco-me ao lado do mesmo professor para concluir
que o art. 40, § 2º, da lei, dispondo que o plano diretor deverá englobar o
território do município como um todo é inconstitucional, haja vista que: a) o
art. 182 da CF somente prevê e disciplina a "política de desenvolvimento
urbano"; b) o § 1º do art. 182 diz que o plano diretor é obrigatório para
cidades com mais de vinte mil habitantes (5); c) o § 2º, diz que a propriedade
urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais
de ordenação da cidade expressas no plano diretor. Portanto, o âmbito de
abrangência do plano diretor não alcança o meio rural, o campo, que é
regido pelo art. 186 da CRFB. (6)
É mister aqui lembrar que, segundo José Afonso da Silva, em seu
ótimo Direito Urbanístico Brasileiro, os planos urbanísticos deverão
observar os seguintes princípio estruturais:
"o princípio da legalidade, composto pelos subprincípios da
homogeneidade da planificação, da tipicidade dos planos urbanísticos, o do
desenvolvimento urbanístico em conformidade com o plano e o da
obrigatoriedade da planificação; o da definição pela lei, do procedimento de
elaboração dos planos urbanísticos; o da diferenciação pela lei de um regime
particular para certos tipos de bens; o princípio da hierarquia; o da
proporcionalidade em sentido amplo ou da ‘proibição do excesso’ e o
princípio da igualdade". (7)
Todos esses princípios estão, de certa forma, contemplados em
disposições variadas do Estatuto.
Vê-se, pois, que o Plano Diretor deve ser elaborado atreves de um
procedimento determinado pelo Poder Executivo e/ou também pelo
Legislativo, em especial, em face do Estatuto, que obriga a participação
popular na elaboração do plano.
Outro aspecto e novidade no direito positivo brasileiro está no § 1º,
do art. 40, que dispõe que o plano diretor é parte integrante do processo de
planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes
orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e prioridades nele
contidas.
d)Gestão Democrática da Cidade
O Capítulo IV prevê, através dos arts. 43 a 45, que, na gestão da
cidade deverá imperar a democracia direta, com a utilização de diversos
instrumentos para esse fim, tais como órgãos colegiados de política urbana,
debates, audiências, consultas públicas, conferências de assuntos de
interesse urbano, iniciativa de popular de projetos de lei e de planos,
programas e projetos de desenvolvimento urbano, referendo popular.
Prevê ainda, o art. 43, a institucionalização da gestão orçamentária
participativa, com a realização de debates, audiências e consultas públicas
sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e
do orçamento anual, como condição obrigatória para sua aprovação pela
Câmara Municipal.
e)Disposições Gerais
Ponto polêmico das disposições gerais está fixado no art. 49 da Lei.
Dispõe que os Estados e os Municípios terão o prazo de noventa dias, a
partir da entrada em vigor da Lei, para fixar prazos, por lei, para a expedição
de diretrizes de empreendimentos urbanísticos, aprovação de projetos de
parcelamento e edificação, realização de vistorias e expedição de termo de
verificação e conclusão de obras.
Embora a disposição seja meritória, o fato de uma lei federal fixar
um prazo para Estados e Municípios tomarem as providências que indica,
parece ofender as autonomias estaduais e municipais. O assunto ainda não
despertou a devida atenção pela doutrina.
4.0. Lei 10.257/01 e os novos instrumentos jurídicos
4.1. Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios (8)
Esses instrumentos já vinham previstos no § 4º do art. 182 da CRFB.
Como destacado acima, o não-uso, faculdade adredemente conferida ao
dominus soli, constitui um dos fatores que ensejam a prática especulativa
nos grandes centos urbanos. O que destacou o Texto Magno foi a
possibilidade de, em áreas previamente definidas em lei municipal, baseada
em plano de uso do solo, o não-uso pode deixar de ser uma faculdade desse
dominus.
O Estatuto da Cidade conferiu status de concreção a este
instrumento, dispondo, em seu art. 5º, que lei específica para a área incluída
no plano diretor poderá determinar o parcelamento, a edificação ou a
utilização compulsória do solo urbano não edificado, subutilizado ou nãoutilizado, devendo fixar as condições e os prazos para implementação da
referida obrigação.
O imóvel será considerado subutilizado cujo aproveitamento seja
inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em legislação dele
decorrente. Problema surge na fixação deste mínimo, discutindo os doutos
se em termos quantitativos, qualitativos ou em forma de tempo de utilização.
Após a notificação do Poder Executivo Municipal para o
cumprimento da obrigação, com averbação no cartório de registro de
imóveis, e, decorridos os prazos para cumprimento da obrigação (incisos I e
II, do § 4º, do art. 5º), virá a aplicação de IPTU progressivo no tempo
mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.
Decorridos cinco anos de cobrança do imposto progressivo sem que o
proprietário cumpra a obrigação, o Município poderá proceder à
desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública.
Esses títulos terão a prévia aprovação do Senado Federal e serão
resgatados no prazo de até dez anos em prestações anuais, iguais e
sucessivas, assegurado o valor real da indenização e os juros legais de 6% ao
ano, diz o §1º do art. 8º. No entanto, o § 2º dispõe que o valor real da
indenização será refletido pelo valor de base de cálculo do IPTU, ou seja,
pelo valor venal, que, conforme é cediço, é sempre muito inferior ao valor
venal de mercado do imóvel. Relevante, portanto, a dúvida quanto à
constitucionalidade do § 2º por afrontar a regra da justa indenização nas
desapropriações (art. 5º, inc. XXIV, da CRFB).
4.2. IPTU progressivo no tempo
Desde a matriz constitucional (art. 182, § 4º, II) surge, em relação ao
imóvel subutilizado ou não utilizado a possibilidade de progressão do
imposto sobre a propriedade predial e terriotorial urbana, quando forem
infrutíferas as notificações para o parcelamento, edificação e utilização
compulsórios.
A exação de forma sancionatória deste tributo municipal,
eminentemente fiscal, passará a abrigar uma função extrafiscal com a
progressividade, uma vez que servirá como instrumento de intervenção
estatal no domínio social, não se restringindo apenas a um meio de formação
do erário municipal.
O Estatuto da Cidade, em seu art. 7º, estabeleceu que o valor da
alíquota não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior,
respeitada a alíquota máxima de quinze por cento, sendo defesa a concessão
de isenções ou de anistia.
A cobrança deste imposto, nestas condições, comportaria, segundo
parcela da doutrina nacional, como uma exceção ao princípio do nãoconfisco, haja vista que se trata de uma "constitucionalidade
inconstitucional", cujo controle, diferentemente do Verfassungswidrige
verfassungsnormen da Carta Germânica, não contaria com o amparo da
pátria Constituição por ter sido legitimada pelo constituinte originário,
autorizando, destarte, a contradição entre o direito de propriedade,
agasalhado por cláusula pétrea, e o confisco pelo Poder Público.
Entendo, todavia, que a progressividade do IPTU resvala,
primeiramente, no princípio da legalidade, uma vez que o art. 150, I, da
Constituição estabelece que é defeso aos Municípios exigir ou aumentar
tributo sem lei que o estabeleça. Embora neste dispositivo haja a permissão
para lei ordinária, o artigo 146, II, da Carta Política disciplina que cabe a lei
complementar regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, o
que implica a afirmação de que, como o princípio da legalidade se encontra
inserido na seção II, das limitações do poder de tributar, o Estatuto da
Cidade, como lei ordinária, não teria força para instituir um tributo, mesmo
na superveniência de lei municipal específica.
Cabe ainda menção ao princípio da anterioridade, elementar em
direito tributário, e que restaria violado, haja vista que o prazo de noventa
dias inserido no art. 58 seria aplicável unicamente às contribuições sociais.
Conclui-se, desta feita, a presença de dupla inconstitucionalidade na
provisão do IPTU progressivo: formal (espécie legislativa inadequada) e
material (violação ao princípio da anterioridade). Ressalte-se, todavia, que a
jurisprudência do Pretório Excelso parece, prima facie, pender no sentido
contrário. (9)
4.3. Usucapião especial de imóvel urbano
O art. 9º do Estatuto veio regulamentar o instituto, previsto no art.
183 da CF, até 250 m² e com cinco anos de posse ininterrupta e sem
oposição. O art. 50 veio entender tal figura a imóveis com mais de 250 m²
instituindo a usucapião em condomínio especialíssimo (usucapião coletiva).
(10)
4.4. Direito de superfície
Sob a égide do Código Civil de 1916, quem construísse em solo
alheio necessariamente perderia para o dominus soli a construção nele
realizada. Veja-se, a respeito, o seu art. 547, peremptório ao dispor sobre a
perda para o proprietário da acessão (construção ou plantação) construída
em terreno alheio.
Através do direito de superfície, é possível negocialmente separar o
direito de construir do direito de propriedade do solo, afastando a incidência
da acessão, abrindo alternativas de utilização do solo por quem não seja
proprietário dele, sob a forma de um direito real, com a conseqüência de que
o resultado concreto da atividade de edificar ingresse no patrimônio de quem
construiu, constituindo propriedade separada (superficiária) distinta da
propriedade do solo.
A instituição do direito de superfície consuma o acalentado sonho
dos urbanistas, que é a separação do direito de construir do direito de
propriedade, realizada aqui pela via negocial, com as galas de um direito real
sobre a coisa alheia. Sua valia ganha em resultado quando, partindo de terras
públicas, pode apresentar-se como instrumento valioso em uma política de
regularização fundiária, sobretudo quando articulado com outros
instrumentos, como a usucapião especial urbana, que poderiam ser utilizados
na titulação de áreas faveladas, mocambos, palafitas, loteamentos irregulares
promovidos a non domino etc.
O art. 21 veio instituir o direito de superfície, direito que poderá ser
concedido a outrem, por tempo determinado ou indeterminado, mediante
escritura pública registrada em cartório.
O Novo Código Civil (2002), no seu título IV, trata do direito de
superfície e no art. 1369 define-o semelhantemente ao que faz o art. 21 do
Estatuto da Cidade. É interessante observar que o Código Civil, sendo lei
posterior, revoga o Estatuto naquilo que o contrariar, se incompatível com
algumas de suas disposições.
O parágrafo único do art. 1.369 do CC/2002 dispõe que o direito de
superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao objeto da
concessão. Revoga, em parte, portanto, o § 1º do art. 21 do Estatuto ("O
direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o
espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato
respectivo").
O art. 1.377 tem a seguinte disposição que o Estatuto não traz: "O
direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de direito público
interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente disciplinado
em lei especial".
O direito de superfície pode ser transferido a terceiros, obedecidos os
termos do contrato respectivo (§ 4º, do art. 21) e, por morte do superficiário,
seus direitos transmitem-se aos herdeiros (§ 5º).
O superficiário responde integralmente pelos encargos e tributos que
incidirem sobre a propriedade superficiária, arcando, ainda,
proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e
tributos sobre a área objeto de concessão do direito de superfície, salvo
disposição em contrário ao contrato respectivo.
4.5. Direito de preempção
O direito de preempção é o direito de preferência que o Poder
Público Municipal terá para a aquisição de imóvel urbano objeto de
alienação oneroso entre particulares. Depende de lei municipal baseada no
plano diretor, que delimitará as áreas em que incidirá o direito e fixará um
prazo de vigência não superior a cinco anos, renovável a partir de um ano
após o decurso do prazo inicial de vigência.
O art. 26 aponta as hipóteses em que poderá o Poder Público
Municipal exercer o direito de preferência. A lei municipal prevista no § 1º
do art. 25 deverá enquadrar cada área em que incidirá o direito de
preempção em uma ou mais das finalidades enumeradas no art. 26.
O art. 27 dá um prazo de trinta dias para que o Município, após a
notificação que lhe for feita pelo proprietário da sua intenção de alienar o
imóvel, para manifestar por escrito a sua intenção de comprá-lo. O § 3º do
art. 27 diz que transcorrido esse prazo o proprietário estará autorizado a
realizar a alienação para terceiros nas condições da proposta apresentada. O
§ 5º dispõe que a alienação processada em condições diversas da proposta
apresentada é nula de pleno direito e o § 6º diz que se ocorrer tal hipótese, o
Município poderá adquirir o imóvel pelo valor da base de cálculo do IPTU
ou pelo valor indicado na proposta apresentada, se este for inferior àquele.
4.6. Outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso
(Solo criado)
Cria-se solo quando se gera área adicional de piso artificial não
apoiada diretamente sobre o solo natural. Cria solo quem cria piso artificial.
O instituto da outorga onerosa apresenta-se como instrumento útil,
sendo forma de controle do adensamento urbano, da utilização desordenada
dos lotes sem atenção aos equipamentos urbanos existentes, e, finalmente,
pode constituir-se em meio razoável de volta de áreas ao Poder Público, sem
a necessidade de vultosas expropriações, inclusive para o estabelecimento de
áreas verdes e a implantação de equipamentos comunitários.
Urbanisticamente, a idéia de solo criado pressupõe a adoção de um
coeficiente único de aproveitamento do solo em determinada
municipalidade. Partindo-se dessa premissa, pode alcançar-se a concepção
stricto sensu de solo criado, quando se terá que solo criado é o excesso de
construção (piso utilizável) superior ao limite estabelecido pela aplicação do
coeficiente único de aproveitamento.
Todo aproveitamento de terreno, no subsolo, no solo e no espaçoaéreo, implicando criação de solo (piso artificial, além do limite), desde que
consentido pelas condições peculiares do solo municipal, consubstanciará
para o beneficiário a obrigação de dar à comunidade uma contraprestação
pelo excesso de construção, que geralmente determina uma sobrecarga sobre
o equipamento urbano, implantado e operado a expensas de todos.
O art. 28 do EC diz que o plano diretor fixará áreas nas quais o
direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente de
aproveitamento básico adotado, mediante contrapartida e prestação pelo
beneficiário. O § 1º define coeficiente de aproveitamento como a relação
entre a área edificável e a área do terreno.
È o plano diretor que, se for o caso, deverá fixar coeficiente de
aproveitamento básico único para toda a zona urbana ou diferenciado para as
áreas específicas dentro da zona urbana (art. 28, § 2º).
4.7. Outros instrumentos urbanísticos
Se estiver previsto em lei municipal, baseada no plano diretor, o
proprietário de imóvel urbano, privado ou público, poderá também exercer o
direito de construir em outro local ou aliená-lo (art. 35), quando o bem de
raiz for considerado necessário para fins de preservação e encerrar interesse
histórico, ambiental, paisagístico, social ou cultural.
Agora, segundo a Lei 10.257/01, proprietários de terrenos insertos
em áreas de proteção ambiental, assim como os titulares do domínio de bens
tombados, ao invés de se desinteressarem pela sorte desse precioso
patrimônio natural ou cultural, ou promoverem desmatamentos, qualquer
outro tipo de degradação ou destruição, poderão tirar proveito econômico do
seu bem se o mantiverem com as características ambientais originárias, pois
a preservação de áreas ou imóveis dessa natureza é uma das razões de ser do
instituto da transferência do direito de construir.
O Estatuto da Cidade, a nosso ver, pretendeu premiar o proprietário
que respeitar a função social e ambiental da propriedade, não podendo ser
beneficiado, por evidente contra-senso, aquele que negligenciou sua guarda,
que permitiu, por omissão, a ação predatória de terceiros, ou aquele que agiu
conscientemente com espírito destruidor, para, ao depois, ainda usufruir os
benefícios da Lei 10.257/01.
É razoável admitir, todavia, a utilização desse instituto para a
hipótese de imóvel já degradado, que não atendeu à função socioambiental,
quando o proprietário efetivamente restaurar a área, promovendo a reparação
integral (nos casos em que isso for possível), desde que a recomposição do
patrimônio natural, cultural ou artificial seja concretizada, e não só quando
consignada, por exemplo, em termo de compromisso de ajustamento
firmado com o Ministério Público, que poderá servir, naturalmente, como
instrumento condicionante para o futuro exercício da transferência do direito
de construir, desde que o bem esteja totalmente recomposto.
Acresça-se que se o proprietário doar seu imóvel ou parte dele ao
município, para os fins previstos no art. 35, incisos I a III, poderá também se
beneficiar do direito de construir noutro local, consoante preceitua seu § 1º.
Já as operações urbanas consorciadas (art. 32) constituem
mecanismo de intervenção em determinadas áreas, destinadas a operar
transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização
ambiental, podendo ser utilizadas por proprietários, moradores, usuários
permanentes e investidores privados, mas sempre sob a coordenação do
Poder Público municipal, a justificar, assim, a figura do consórcio.
Para essas operações exige-se uma lei municipal, também baseada no
plano diretor, que poderá prever a modificação de índices e características de
parcelamento, uso e ocupação do solo e subsolo, assim como alterações de
normas edilícias, sempre considerando o impacto ambiental decorrente (art.
32, § 1º, I).
Tais operações podem contemplar, outrossim, uma anistia, pois
facultam a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas
em desacordo com a legislação vigente (art. 32, § 2º, II). Mas essa anistia
não pode, à evidência, ser extensiva a ponto de perdoar infrações a normas
que tutelam o meio ambiente cultural ou natural, como edificações feitas em
bens tombados ou em áreas de preservação permanente, por exemplo, posto
que o instituto das operações urbanas consorciadas visa, nesse ponto, a
valorização ambiental (art. 32, § 1º), não o inverso.
Exige-se a elaboração de um plano que contenha, no mínimo, a
delimitação da área a ser atingida, com um programa básico de sua ocupação
e outro para o atendimento socioeconômico da população diretamente
afetada pela operação urbana consorciada. Além disso, esse plano deve
conter as finalidades da operação e a contrapartida a ser prestada ao
município, cujos recursos devem ser aplicados exclusivamente na própria
área.
Podem ser emitidos certificados de potencial adicional de
construção, que admitem livre negociação em leilão ou utilização para o
custeio das obras necessárias à própria operação, mas a sua conversão em
direito de construir só será permitida unicamente na área do plano.
Como um de seus elementos indispensáveis, a Lei 10.257/01 exige
também a elaboração do estudo de impacto de vizinhança (EIV - arts. 36 a
38). Importante instrumento de controle social e democrático, o EIV deve
ser utilizado também para referendar empreendimentos e atividades públicos
ou privados em área urbana, como condicionante para a expedição de
licenças e autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo
do município.
Criado por lei municipal que definirá as hipóteses em que será
necessário, na elaboração do EIV – a que se deverá dar ampla publicidade e
garantia de acesso aos seus documentos a qualquer interessado –, será
obrigatório considerar os efeitos positivos e negativos sobre a qualidade de
vida da população residente na área e proximidades.
Além disso, o estudo deverá aferir o impacto sobre o adensamento
populacional e os equipamentos urbanos e comunitários, o uso e a ocupação
do solo, aquilatar a valorização imobiliária, a geração de tráfego e demanda
de transporte público, aspectos de ventilação e aeração, assim como as
influências sobre a paisagem urbana e os patrimônios natural e cultural (art.
37). A lei ressalva que o EIV não substitui a elaboração nem a aprovação do
estudo de impacto ambiental (EIA) previsto na legislação respectiva (art.
38).
Estes e outros instrumentos do Estatuto da Cidade dão ênfase ao
planejamento como indutor do desenvolvimento e da expansão urbanos,
para alcançar o equilíbrio social e ambiental. O plano diretor é seu
representante máximo.
5.0. Conclusão
Longe de ser uma panacéia, a Lei nº 10.257/01, que contém normas
de ordem pública e interesse social, credencia-se a auxiliar na tutela do meio
físico natural, cultural e artificial, ao dispor que o uso da propriedade urbana
deve ser exercido em prol do bem coletivo e do equilíbrio ambiental
(parágrafo único do art. 1º).
Ela prestigia a participação popular, na medida em que propõe: a
gestão democrática na formulação, execução e acompanhamento de planos,
programas e projetos de desenvolvimento urbano (art. 2º, "II"); o controle
social na utilização dos instrumentos que implicarem dispêndio de recursos
públicos municipais (art. 4º, § 3º); o monitoramento de operações urbanas
(art. 33, VII); a participação na discussão do plano diretor (art. 40, § 4º, I),
na gestão da cidade, no que respeita à formulação do orçamento
participativo, do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias, do
orçamento anual e nas atividades dos organismos gestores das regiões
metropolitanas e aglomerações urbanas (arts. 43 a 45).
O Estatuto da Cidade incorpora o que a doutrina de Hely Lopes
Meirelles pregava há muito, de que "não se realiza urbanismo particular".
(11)
Sobrepondo o interesse público ao privado, "o urbanismo tem uma
missão social a cumprir na ordenação dos espaços habitáveis", para
assegurar à população as melhores condições de vida. Portanto, não se
concebe, hoje, que a sorte das cidades fique a reboque da conveniência (ou
negligência) do administrador público, nem que o planejamento urbano seja
definido entre quatro paredes, por técnicos, políticos e investidores do
mercado imobiliário.
Para garantir a implementação de suas diretrizes, institutos e
mecanismos de ordenação das cidades, a Lei nº 10.257/01 agregou a ordem
urbanística ao rol dos interesses difusos tutelados pela Lei da Ação Civil
Pública (arts. 53 e 54), elegendo o Ministério Público como guardião do
Estatuto da Cidade, que tem, assim, mais um desafio na defesa da ordem
jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e individuais
indisponíveis, assim como do patrimônio público e social (arts. 127, caput, e
129, II e III, CF; Lei 7.347/85; art. 25, IV, "a", da Lei nº 8.625/93).
Referências Bibliográficas
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LIRA, Ricardo Pereira. Elementos de Direito Urbanístico. Rio de
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[Internet]
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[Capturado
21.Fev.2002]
SILVA. José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. São Paulo:
Malheiros. 2000.
TEPEDINO, Gustavo. Contornos constitucionais da propriedade
privada in Carlos Alberto Menezes Direito (Org.), Estudos em
homenagem ao professor Caio Tácito. Rio de Janeiro: Renovar, 1997.
Notas
01. Gustavo Tepedino. Contornos constitucionais da propriedade
privada in Carlos Alberto Menezes Direito (Org.), Estudos em homenagem
ao professor Caio Tácito. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 310/311.
02. Ao menos preliminarmente já podemos destacar que a Comissão
elaboradora do novel Codex não cercou o fenômeno destacado com a devida
atenção, fazendo a ele mera menção. É o que se dessume de uma primeira
leitura do art. 1228, §1º, in verbis:
Art. 1228. (...)
§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com
as sua finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados,
de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico,
bem como evitada a poluição do ar e das águas.
03. Eduardo Garcia de Enterría. Derecho Urbanistico e Ciencias de
la Administración. UCV, Vol. V, 1983, p. 197.
04. Regis Fernandes de Oliveira. Estatuto da Cidade – Comentários à
Lei 10.257/01. São Paulo, RT, 2002, p. 67.
05 Pertinente questão é levantada no excelente livro Direito da
Cidade (Renovar, 1996), de Joaquim Castro Aguiar, Des. Federal do TRF da
2ª Região: "Se os destinatários da regra que impõe a adoção de plano diretor
são somente aqueles Municípios com mais de vinte mil habitantes e se a
verificação de que uma determinada propriedade está ou não cumprindo
função social, segundo os critérios adotados pelo constituinte, é dada pelo
atendimento de exigências constantes do plano diretor, como proceder a uma
verificação nos Municípios como menos de vinte mil habitantes, i. e,
naqueles Municípios não abrangidos pela obrigação de instituir o referido
plano? Como aferir, nestes casos, a adequação dos poderes inerentes à
situação jurídica de proprietário às exigências fundamentais de ordenação da
cidade, que deveriam estar expressas no plano diretor? Estaria, nesta
hipótese, destituída de eficácia a norma do art. 5º, XXIII, da CF? Como
verificar, então o cumprimento da função social imposta pela Constituição?
Entendemos que o princípio da função social sempre prevalecerá e dele
decorrerão obrigações e deveres por parte do particular proprietário, ainda
que aquelas regras de ordenação urbana não estejam expressas,
especificamente, no plano diretor. Em tal caso, entendemos que fica criado
para o Município o dever de instituir regras (leis) que, expressando as
peculiaridades locais, fixem as diretrizes da ordenação urbana municipal,
mesmo que tais regras não se constituam, formalmente, em plano diretor.
Em outras palavras, o dever de instituir regramento desta natureza se impõe,
não obstante tenha um dado Município sido excluído da abrangência do
preceito contido no art. 182, § 1º, da CF. Para o poder público, tal dever
decorre de um outro dever, também de índole constitucional: o de fazer
cumprir os princípios consagrados pelo ordenamento jurídico, em nome do
interesse social".
06. op. cit. p. 81.
07. José Afonso da Silva. Direito Urbanístico Brasileiro. Malheiros,
1998, p. 256.
08. Interessante a observação de Ricardo Pereira Lira em seu
Elementos de Direito Urbanístico (Renovar, 1998): "Trata-se da
possibilidade da criação da propriedade urbanística acompanhada de uma
obrigação propter rem, consistente na obrigação de fazer (parcelar, edificar,
utilizar) sobre o solo, nos termos da lei municipal, baseada em plano de uso
do solo".
09. Veja-se, a propósito, o Ag. Rg. em RE nº 197676, Rel. Min.
Maurício Correa:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
TRIBUTÁRIO. IPTU PROGRESSIVO E TAXA DE CONSERVAÇÃO E
LIMPEZA DE RUA. MATÉRIAS JÁ DIRIMIDAS PELO PLENÁRIO
DESTA CORTE. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a
progressividade do IPTU, que é imposto de natureza real em que não se
pode levar em consideração a capacidade econômica do contribuinte, só é
admissível, em face da Constituição, para o fim extra-fiscal de assegurar
o cumprimento da função social da propriedade. 2. Lei Municipal nº
10.921/90. Taxa de limpeza e conservação de rua. Inconstitucionalidade.
Ofensa ao art. 145, § 2º da Constituição Federal, pelo fato de não serem
divisíveis os serviços públicos a custear. Agravo regimental não provido.
10. A respeito do tema, por sua pertinência e latente atualidade,
transcrevo o texto de matéria veiculada no Jornal Nacional de 07/01/03,
noticiando iminente aplicação do novel instituto:
Governo planeja conceder títulos de posse a moradores de
favelas
07/01/03
O novo governo federal planeja conceder títulos de posse a
moradores de favelas. E o primeiro passo será o mapeamento de terrenos
invadidos nas cidades brasileiras. Seis milhões e meio de cidadãos vivem em
barracos.
Sessenta mil barracos numa das maiores favelas do Brasil. E
ninguém é dono de nada.
"Sem escritura não tem confiança porque de uma hora pra outra vem
um despejo, aí eles podem tirar mesmo", teme Adalberto da Silva.
Desde que foi morar na favela, há quatro anos, Adalberto e a mulher,
Maria Auxiliadora da Silva, sonham em ampliar o barraco. São dez pessoas
espremidas em dois cômodos.
"Se eu tivesse escritura, como eu tenho um trabalho fixo e ele
também, a gente podia ir ao banco e fazer um empréstimo pra construir mais
rápido", diz Maria Auxiliadora.
Antônio Moura, outro morador da favela, comprou à vista geladeira e
fogão. Mas teve que cancelar o negócio. Pesou a condição de morador em
situação irregular.
"Eles simplesmente falaram que nesse endereço não podiam entregar
porque o caminhão não entrava aqui", conta Antônio.
Líderes comunitários esperam que os títulos de propriedade tragam
melhorias e dignidade para os brasileiros de favelas.
"Na hora que ele pagar impostos ele pode cobrar muito mais e sentirse mais cidadão", explica José Rolim, da União dos Moradores.
A base jurídica para a concessão de escrituras chama-se Estatuto da
Cidade, aprovado pelo Congresso Nacional há um ano e meio. A lei limita o
tamanho do imóvel e diz que o candidato não pode ter outra propriedade.
Além disso, ele tem de ser morador ha mais de cinco anos, sem contestação
do verdadeiro dono, e a casa não pode estar em área de risco nem de
proteção ambiental.
"É alguma coisa pra regularizar situações que já se encontram
consolidadas, calcificadas, é que não é justo que essas pessoas tenham uma
posse e não tenham a propriedade", defende o ministro da Justiça Márcio
Thomaz Bastos.
O urbanista Roberto Saruê teme que a concessão de escrituras em
favelas acabe incentivando o êxodo rural.
"Temos que levar de volta o homem do campo, descentralizar as
grandes cidades e, na realidade, a concessão de uma escritura dessa forma
pode incentivar nova vinda das pessoas às cidades", avalia.
Já a urbanista Maria Lucia Refinetti acha que o projeto só dará certo
se houver a participação de quem conhece de perto cada favela: "Se os
municípios e a comunidade não se envolverem, o projeto-pacote não dará
certo".
Sem conta em banco, sem a chance de fazer um crediário no
comércio, dona Lourdes espera ansiosa pela ação do governo. "Você tendo a
escritura, um papel traria tudo pra você. Agora, você sem um papel, sem um
comprovante, não é ninguém", diz ela.
Direito Municipal Brasileiro, 9ª ed., Malheiros, p. 370.
* Acadêmico de Direito na Universidade Federal do Espírito Santo
MARINS, Vinicius. O Estatuto da Cidade e a constitucionalização do
Direito Urbanístico . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 223, 16 fev. 2004.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4806>. Acesso
em: 16 fev. 2007.
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O Estatuto da Cidade e a constitucionalização do Direito Urbanístico