124
Assim, percebemos que nossa ação estava provocando algumas reflexões
por parte dos professores.
Para a terceira oficina, entregamos para leitura prévia:
SOLÉ, I. Estratégias de leitura. Trad. Cláudia Schilling. 6. ed. Porto Alegre: Artmed,
1998, cap. 5, 6 e 7.
3.1.1.3 3ª oficina - Estratégias, etapas e objetivos de leitura
Para desenvolver o trabalho proposto nessa terceira oficina, reportamo-nos
aos estudos de Solé (1998), Kleiman (2008) e Koch e Elias (2011).
Como os
capítulos 5, 6 e 7 do livro de Solé (1998) haviam sido propostos para leitura prévia,
eles foram utilizados como referência maior para as discussões. Embora
considerássemos que a autora seja bem didática na apresentação de sua obra,
alguns professores acharam difícil a leitura dos capítulos propostos.
Consideramos que é importante apresentar aos professores que a leitura é
realizada por nós no dia a dia para atender a diferentes objetivos. Dessa forma, Solé
(1998) apresenta os seguintes objetivos de leitura:
Ler para obter uma informação precisa; Ler para seguir instruções;
Ler para obter uma informação de caráter geral; Ler para aprender;
Ler para revisar um escrito próprio; Ler por prazer; Ler para
comunicar um texto a um auditório; Ler para praticar a leitura em voz
alta; Ler para verificar o que se compreendeu (SOLÉ, 1998, p. 9399).
Julgamos necessário apresentar aos docentes os objetivos destacados por
Solé, pois dependendo do objetivo que se tem, o modo de encarar a leitura vai sofrer
alterações. A atenção dispensada à leitura de um romance, por exemplo, é diferente
da que dispensamos a um texto que cairá em uma prova.
Ao abordarmos os objetivos de leitura, comentamos com os professores que
um dos objetivos que precisa ser enfatizado com os alunos, pois parece que está um
pouco esquecido, é o de ler para revisar o próprio escrito, contudo, sabemos que
além de ler o texto, após terminá-lo, é importante criar um afastamento, haja vista
125
que quando o aluno termina de produzir o conteúdo que ele pretendia escrever, está
recente em sua memória e, devido a isso, nem sempre percebe onde há erro. E um
participante disse:
Esses dias eu fiz uma produção na sexta-feira e na segunda-feira eu
entreguei novamente para eles e pedi para eles revisarem, porque eu
só iria corrigir depois que eles revisassem. Daí eles pediam pode
apagar? Eu falei esse é o objetivo. Mas foi a primeira vez que eu fiz,
mas gostei (Docente E, 21/03/2013).
Enfatizamos que essa atividade é interessante de ser feita. É claro que ao
terminar de produzir um texto, vamos continuar solicitando aos alunos que leiam o
que produziram, no entanto, podemos retomar essa produção em outro momento.
É relevante que se tenha consciência de que, dependendo do objetivo que se
tem, a estratégia de leitura que será empregada no processamento da leitura será
diferente, pois podem auxiliar os alunos a controlarem sua própria leitura e assim
proporcionar uma compreensão leitora mais eficiente. Nesse sentido, apresentamos
as atividades de pré-leitura, leitura e pós-leitura. Koch e Elias (2011) tratam de
quatro estratégias de leitura: antecipação, seleção, inferência e verificação. Na
oficina detalhamos cada uma delas e ao fazer esse detalhamento, fizemos a ponte
com o que Solé (2011) apresenta como atividades pertinentes para antes, durante e
depois da leitura, haja vista que elas se complementam.
Ao abordarmos a pré-leitura, explicamos que a sua função é a de ativar
conhecimentos prévios, estabelecer previsões e formular hipóteses sobre o texto e
essas atividades devem ser realizadas antes da leitura do texto. Assim, utilizamos as
ilustrações e o título para fazer previsões a respeito do que será tratado no texto.
Nesse caso, são interessantes as questões descendentes. Inclusive as atividades de
pré-leitura são previstas no currículo de Cascavel.
A partir do texto ―Dentes limpinhos‖, que foi utilizado na oficina anterior,
elaboramos atividades de pré-leitura: A partir do título ―Dentes limpinhos‖, de que
você acha que esse texto vai tratar? Você escova seus dentes todos os dias?
Quantas vezes? Você costuma ir ao dentista? Por que é importante escovar os
dentes? Você conhece a Revista Recreio? Quem escreve para essa revista? Com
que finalidade os autores escrevem? Quem é o público leitor dessa revista? Por que
você acha que no título e usado o diminutivo ―limpinhos‖? Com esses
126
questionamentos é possível levantar dados sobre o contexto de produção do
gênero, bem como sobre o próprio texto.
Explicamos, na sequência, que leitura é o momento em que de fato é lido o
texto. Nesse processo também podem ocorrer estratégias como estabelecimento de
coesão e coerência, inferência de palavras a partir do contexto, entre outras. Assim,
podemos dizer que ―a leitura é um processo de emissão e verificação de previsões
que levam à construção da compreensão do texto‖ (SOLÉ,1998, p. 115).
Solé (1998) destaca que, durante a leitura, é importante que o professor
conduza os alunos na elaboração de resumos daquilo que foi lido e nós
apresentamos isso aos professores para mostrar que o resumo é uma atividade que
precisa ser ensinada, assim, primeiro elaboram-se resumos com mediação para que
depois os alunos possam fazê-lo com autonomia. Além do resumo, outras
estratégias podem ser ensinadas como sublinhar as palavras importantes ou que
não se conhece o significado. Um participante relatou:
Durante esse trabalho de fazer resumo, eles podem também ir
anotando as palavras chaves. Eu faço isso, também vai lendo e
grifando (Docente M, 21/03/2013).
Enfatizamos que ao atuar como mediador da leitura é fundamental que o
professor realize a leitura compartilhada. Segundo Solé (1998), nessa atividade o
docente seleciona o texto a ser trabalhado e executa a leitura junto com os alunos e
durante essa leitura são estabelecidas estratégias, sendo essas definidas pela
autora:
Depois da leitura, o professor conduz os alunos através das quatro
estratégias básicas. Primeiro se encarrega de fazer um resumo do
que foi lido para o grupo e solicita sua concordância. Depois pode
pedir explicações ou esclarecimentos sobre determinadas dúvidas do
texto. Mais tarde formula uma ou algumas perguntas às crianças,
cuja resposta torna a leitura necessária. Depois dessa atividade,
estabelece suas previsões sobre o que ainda não foi lido, reiniciandose deste modo o ciclo (ler, resumir, solicitar esclarecimentos, prever),
desta vez a cargo de outro ―responsável‖ ou moderador (SOLÉ,
1998, p. 119, grifos nossos).
Conforme Solé (1998), o importante é entender que, para dominar as
estratégias
responsáveis
pela
compreensão
-
antecipação,
verificação,
127
autoquestionamento - não é suficiente explicá-las; é preciso colocá-las em prática,
compreendendo sua utilidade.
Na sequência, abordamos a atividade de pós-leitura, assim, após realizar a
leitura de um texto, é importante que o aluno continue utilizando algumas estratégias
que possam facilitar a sua compreensão a respeito do que leu.
Uma dessas estratégias de pós-leitura é a de identificar a ideia principal,
neste caso o aluno tem que distinguir entre as informações acessórias que
aparecem no texto, o que é mais relevante. Outra estratégia a ser utilizada após a
leitura é a atividade de resumo. Conforme Solé, ―a elaboração de resumos está
estritamente ligada às estratégias necessárias para estabelecer o tema de um texto,
para gerar ou identificar sua ideia principal e secundária‖ (SOLÉ, 1998, p. 143).
Nesse sentido, chamamos a atenção dos professores, pois não basta solicitar
aos alunos que localizem a ideia principal de um texto ou façam o resumo. Antes
disso devem ter sido realizadas essas atividades coletivamente, pois sabemos que
essas são atividades extremamente importantes. Um professor relatou:
É como quando a gente trabalha um filme e pede para os alunos
resumirem, daí eles querem escrever tudo, eles escrevem páginas e
páginas (Docente P, 21/03/2013).
A partir desse relato, reforçamos o que estávamos dizendo, ou seja, se os
alunos estão fazendo isso é porque eles ainda não conseguem perceber o que é
principal, por isso, a necessidade de ensinar como se faz o resumo, como afirma
Solé, ―a ler se aprende lendo, e a resumir se aprende resumindo‖ (SOLÉ, 1998, p.
144).
Ainda abordamos os tipos de perguntas. Neste caso nos pautamos em Solé
para exemplificar que temos, segundo a autora ―perguntas de resposta literal[...];
perguntas para pensar e buscar [...]; perguntas de elaboração pessoal [...]‖ (SOLÉ,
(1998, p. 155).
Nós trabalhamos as atividades de antecipação, seleção, inferenciação e
verificação a partir do miniconto ―O retorno do patinho feio‖, que consta no livro: Ler
e compreender os sentidos do texto, de Koch e Elias (2011). Nós realizamos essa
atividade da forma como ela estava prevista no livro das autoras e fomos fazendo as
previsões com os professores e eles se envolveram bastante na atividade.
128
Depois, apresentamos outro exemplo produzido por nós, a partir da crônica
Vida Fácil, de Alexandre Azevedo.
Figura 21 – Atividade de pré-leitura
Olhando para o título que
previsões podemos fazer
sobre o texto?
A ilustração favorece o
estabelecimento de alguma
relação com o título?
Autor do texto: Alexandre Azevedo
O que é para você uma vida
fácil?
Quem tem vida ‘fácil?
A partir da ilustração e do
título sobre o que você acha
que o texto vai tratar?
Você tem vida fácil?
Gênero textual: Crônica
Ilda de F. de L. Oliveira
Fonte: Organizado pela pesquisadora.
A partir do título e da ilustração presente na crônica, organizamos perguntas
para que os professores procurassem antecipar o que seria tratado no texto.
Elaboramos também outros questionamentos, como: ―O que é para você vida fácil?,
para que os participantes fizessem previsões simulando como deveria ocorrer isso
na sala de aula.
129
Figura 22 – Etapa da leitura
Após fazer as previsões
a partir do título e da
ilustração iniciamos a leitura e para incentivar os
alunos a elaborarem hipóteses para o que irão ler e
assim ativar seus conhecimentos prévios.
Iniciando a leitura:
Ilda de F. de L. Oliveira
Fonte: Organizado pela pesquisadora.
Após os professores fazerem as suas previsões iniciamos a leitura do texto. O
interessante foi que os professores se envolveram com o texto e ficaram curiosos
para saber o que aconteceria.
Figura 23 – Etapa da leitura.
Neste
trecho
são
apresentados
dois
personagens uma senhora e um rapaz. Como a
senhora é descrita? E o rapaz?
Qual seria o motivo da urgência do rapaz para
usar o telefone?
Será que a senhora permitiu que o rapaz
usasse o telefone ante que ela?
Ilda de F. de L. Oliveira
Fonte: Organizado pela pesquisadora.
130
Como é possível perceber no slide, nós organizamos a leitura do texto como
se fosse para uma aula com crianças, por isso, fazíamos as antecipações, em
seguida após a leitura e confirmávamos ou não as previsões e na sequência
elaborávamos novas antecipações para o que seria lido (apêndice 2).
No trabalho proposto na oficina tínhamos outros slides. Apresentamos esses
três para ilustrar como foi organizada a atividade. A aplicação dela foi muito
produtiva, pois os professores se envolveram como se fosse uma turma de crianças,
fazendo as previsões e confirmando-as ou não na sequência.
Visando incentivar a leitura, os professores buscam formas de fazer isso e um
professor relatou que:
Na minha sala cada semana tem um responsável para colocar na
parede, próximo ao lixeiro que é um lugar movimentado, uma leitura
para as crianças lerem, a princípio eu colocava e ninguém olhava
agora eles estão se interessando em ler. Tem vezes que eu coloco
texto imagético. Às vezes eu esquecia propositalmente de colocar o
texto e daí eles já cobravam (Docente O, 21/03/2013).
Nessa oficina propusemos aos professores que elaborassem atividades de
pré-leitura, leitura e pós-leitura,
a partir da crônica a bola de Fernando Verríssimo
(anexo C). Nessa atividade elaborada pelos professores percebemos que a maioria
conseguiu planejar atividades pensando nas etapas de leitura. É claro que vários
professores na atividade de pós-leitura elaboram questões que focavam mais no
leitor. Acreditamos que isso se deve ao fato de que o conteúdo do texto aborda a
relação das crianças de hoje com os brinquedos eletrônicos, em decorrência disso o
menino não demonstrou interesse pela bola que ganhou de seu pai. No momento de
preparar as atividades, os docentes pensaram em fazer com que seus alunos
refletissem sobre essa situação. Desse modo, priorizaram questões descendentes.
O texto sugerido para leitura prévia para o próximo encontro foi:
HILA, Cláudia Valéria Doná. Ressignificando a aula de leitura a partir dos gêneros
Textuais. In: NASCIMENTO, E. L.. Gêneros textuais: da didática das línguas aos
objetos de ensino. 1. ed. São Carlos: Editora Claraluz, 2009. p. 151-194.
131
3.1.1.4 4ª oficina - Gêneros discursivos e leitura
Retomamos a concepção de letramento apresentada na 2ª oficina, que
preconiza que o trabalho com a língua deve ocorrer a partir de textos que circulem
socialmente. Ao fazer esse resgate, apresentamos a necessidade que se impõe de
trabalharmos com os mais diversos gêneros discursivos, já que o trabalho com os
diversos gêneros está previsto nos três documentos analisados. Mesmo os PCN de
Língua Portuguesa sendo
o mais antigo dentre os documentos analisados, já
apresentava os gêneros como objeto de ensino da Língua Portuguesa.
Apresentamos o seguinte trecho do currículo de Cascavel para reforçar a
importância do trabalho com o gênero: ―O texto será o material verbal mais
importante no trabalho do professor com o aluno, não apenas um tipo de texto, mas
todos os que concretizam um determinado discurso‖ (CASCAVEL, 2008, p. 330).
A partir desse trecho, enfatizamos que hoje não podemos pensar o trabalho
com a língua/linguagem que não seja por meio dos gêneros discursivos/textuais.
Nessa oficina, revisitamos os estudos de Bakhtin (2003) para caracterizar os
gêneros como tipos relativamente estáveis de enunciados por meio dos quais nos
comunicamos nas mais diversas situações de interação.
De acordo com Bakhtin (2010), a língua não é um ato individual, mas sim uma
forma de interação entre sujeitos, é um ato social que se realiza e se modifica nas
relações sociais. Nesse contexto, situa-se o trabalho com os gêneros que irão
materializar e ampliar as interações entre os homens. Para Bakhtin,
Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam,
estão sempre relacionadas com a utilização da língua, a qual efetuase por meio de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que
emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana
(BAKHTIN, 2003, p. 279).
Para esse autor, o ser humano, em quaisquer de suas atividades, vai servirse da língua, a partir do interesse, da intencionalidade e da finalidade específicos de
cada atividade e, a essas diferentes formas de incidência dos enunciados, o autor
denomina gêneros do discurso. A língua vive e evolui por meio da interação entre
sujeitos e das situações concretas de produção. Assim, o trabalho com os gêneros é
fundamental, uma vez que eles se constituem como ações sócio-discursivas para
132
agir sobre o mundo e dizer o mundo, constituindo-o de algum modo, ou seja, para
conhecer um gênero discursivo é imprescindível conhecer suas condições de uso,
adequá-lo ao contexto social e contextualizá-lo, provocando situações nas quais o
sujeito possa agir criticamente sobre o texto.
É necessário ter a compreensão de que não é mais possível trabalhar a
Língua Portuguesa por meio de textos artificiais que existem apenas nas paredes da
escola, como diz Soares (2010), mas que os educadores visualizem os textos que
têm circulação no meio social em que o aluno está inserido, mostrando a eles que o
texto pode ir muito além de um amontoado de palavras, frases e parágrafos, mas
que em uma figura pode haver uma mensagem implícita que equivale, muitas vezes,
a uma reflexão maior e mais qualitativa no que concerne ao conteúdo. É importante
que se compreenda que, desde a Educação Infantil, os alunos precisam estar em
contato com gêneros textuais diversificados, para a formação de um leitor/escritor
competente.
Fiorin faz a seguinte consideração sobre gêneros:
Os gêneros são meios de aprender a realidade. Novos modos de ver
e de conceptualizar a realidade implicam o aparecimento de novos
gêneros e a alteração dos já existentes. Ao mesmo tempo, novos
gêneros ocasionam novas maneiras de ver a realidade. A
aprendizagem dos modos sociais de fazer leva, concomitantemente,
ao aprendizado dos modos sociais de dizer, os gêneros (FIORIN,
2008, p. 69).
Assim, defendemos que quanto maior for a diversidade de gêneros
apresentados aos alunos, maiores serão suas possibilidades de compreender a
realidade, haja vista que socialmente é por meio deles que nos comunicamos.
Entender, portanto, as especificidades de cada gênero e os motivos de sua
produção (função social) faz com que os educandos ampliem suas capacidades de
realizar inferências com os conhecimentos prévios que já possuem a respeito de
determinado assunto. É importante destacar que o trabalho com os gêneros deve
iniciar desde a alfabetização, como afirma Fiorin: ―Fala-se e escreve-se sempre por
gêneros e, portanto, aprender a falar e a escrever é, antes de tudo, aprender
gêneros‖ (FIORIN, 2008, p. 69). Portanto, não podemos ter o medo de abordar os
gêneros em sala de aula, subestimando, assim, a capacidade dos alunos e
negando-lhes o direito de conviver com situações reais de fala, leitura e escrita.
133
Nessa oficina, procuramos convencer os professores de que a utilização do
gênero em sala de aula se justifica por seu caráter social de uso e, quando se trata
da leitura, temos que ter o cuidado com a didatização do texto, pois é isso que os
livros didáticos muitas vezes propõem. Tanto é que na maioria das vezes não fazem
nem sequer referência ao autor do texto, ou é produzido pelo próprio autor do livro,
ou seja, são produzidos apenas com o fim escolar.
Apresentamos o cartum seguinte para fazermos uma reflexão com os
professores.
Figura 24 – Cartum para reflexão sobre a intencionalidade do gênero
Fonte: http://www.ccs.saude.gov.br/visa/humordown.html
Questionamos o grupo sobre qual seria a intenção desse cartum. E as
respostas foram:
Conscientizar sobre os problemas de poluição (Docente A,
11/04/2013).
Para pensar sobre a situação do planeta (Docente E, 11/04/2013).
Para termos enunciação a partir desse cartum, não basta saber decodificar o
que está escrito e observar as imagens, é preciso que haja a relação da imagem e
da escrita com o que temos acompanhado socialmente, ou seja, temos que resgatar
o contexto de produção, pois há aqui uma crítica a um problema ambiental muito
sério que envolve o lixo hospitalar.
134
Ler, de acordo com Hila (2009), envolve uma série de capacidades de
compreensão que nem sempre estão dadas no texto. É preciso mobilizar os
conhecimentos prévios de mundo para conseguir chegar a uma enunciação. Nesse
sentido, utilizamos uma charge para ilustrar que nem sempre podemos fazer a
leitura literal de um texto.
Figura 25 – Charge para refletir sobre a leitura literal.
Fonte: http://omelhordolivro.wordpress.com/charges-e-tirinhas/
A partir dessa charge foi possível refletir com os professores sobre os
problemas de compreender a leitura em seu sentido literal e de não ter domínio dos
gêneros que circulam socialmente. Pois, no caso das duas senhoras representadas
no slide (figura 25), o desconhecimento do gênero prejudicou totalmente a leitura,
tendo em vista que nesse caso a leitura literal não tem sentido.
Hila (2009) também chama a atenção para a significação do enunciado que
se dará de acordo com o seu contexto de produção. Assim, o enunciado: ―A porta
está aberta‖, terá sentido distintos dependendo do seu contexto de uso, portanto, se
for utilizado pela esposa em uma discussão com o marido, pode querer dizer para
ele, ―vá embora‖. Agora se o mesmo enunciado for utilizado por amigos, quer dizer
volte sempre, a porta estará sempre aberta para você. E chamamos a atenção dos
docentes para o fato de a estrutura do enunciado ser exatamente a mesma, contudo
135
a forma como ele é dito e o contexto em que é produzido proporciona a alteração em
sua enunciação. Isso justifica o fato de que não basta ler o texto, tem-se que saber
em que contexto ele foi produzido.
Considerando a leitura, podemos afirmar ainda que o mesmo enunciado
(escrito) poderá ter significados diferentes, dependendo de quem ler, pois a
ideologia, os conhecimentos linguísticos, enciclopédicos e interacional variam de
sujeito para sujeito, mas é claro que haverá momentos em que as leituras serão
diferentes, mesmo se tratando de um mesmo texto. Quando isso acontecer é preciso
voltar a ele e verificar se as marcas linguísticas deixadas possibilitam aquela leitura.
Temos que considerar que as leituras são plurais.
Para enfatizar a importância da esfera de circulação do gênero, utilizamos o
exemplo apresentado por Hila (2009):
Figura 26 – Esfera de circulação do gênero
Fonte: Hila (2009, p. 162).
Na
sequência
apresentamos
outro
slide
que
dá
continuidade
questionamentos quanto a esfera de circulação e a produção de sentido.
aos
136
Figura 27 – Esfera de circulação do gênero.
3. Agora vamos imaginar que você foi ao dentista e
pegou uma revista dirigida à saúde bucal na qual havia
essa foto seguida de uma reportagem. Nesse caso a foto
significaria um apelo para que você consumisse balas?
Justifique.
4. Observando o que você respondeu na questão 2 e 3, a
que conclusão você diria que um texto, mesmo sendo
uma foto como essa, sempre vai significar a mesma
coisa? Justifique.
Fonte: Hila (2009, p. 162).
A autora reforça que a enunciação também dependerá do suporte de
circulação do gênero. E quando apresentamos os slides acima, os professores
conseguiram visualizar essa questão, até porque eles comentaram que gostaram do
texto de leitura prévia, pois Hila consegue explicar de forma acessível as questões
referentes ao gênero, além, é claro, de apresentar sugestões práticas, como foi o
caso desse exemplo.
Para realização do trabalho com os gêneros, enfatizamos a relevância de
considerar os três elementos apresentados por Bakhtin,
Todos esses três elementos – o conteúdo temático, o estilo, a
construção composicional – estão indissoluvelmente ligados no todo
do enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de
um determinado campo da comunicação (BAKHTIN, 2003, p. 261262).
Com base nesses três elementos, fizemos coletivamente a análise de três
textos: um cartum, uma charge e um artigo de opinião. Para essa análise, nós
137
buscamos o contexto de produção e os dados dos autores. Os textos trabalhados
foram os seguintes:
Figura 28 – Charge para análise
Charge
Conteúdo temático
Estilo
Construção composicional
Fonte: http://borocoxo.blogspot.com.br/2011/11/se-santa-ceia-fosse-hoje.html
Para analisar esse texto, trouxemos para os professores as seguintes
informações sobre o autor: quem produziu essa charge foi o cartunista e chargista
Ernani Diniz Lucas, mais conhecido como Nani. Esse cartunista brasileiro é o criador
da tira Vereda Tropical, que é publicada em vários jornais brasileiros. Essa tira tem
como objetivo satirizar a situação sócio-político-econômica cotidiana do mundo e
principalmente do Brasil. Se analisarmos a charge acima perceberemos que o autor
faz uma sátira à Lei Seca. A utilização do quadro da Santa Ceia nos remete à esfera
religiosa, pois os padres durante a celebração da missa bebem vinho, que
representa o sangue de Cristo, mas, com essa lei, surge à polêmica de que, se
fossem parados por uma blitz e tivessem que fazer o teste do bafômetro, os padres
seriam apreendidos. Cogitou-se, então, entre os religiosos a substituição do vinho
tradicional pela bebida sem álcool, o que gerou muita polêmica dentro da igreja, haja
vista que a maioria dos padres defendem a ideia de que não é possível fazer a
substituição, pois o vinho que é utilizado nas celebrações é preparado
138
especialmente para esse fim, tendo em vista que faz parte da tradição católica.
Assim, diante de todas essas discussões Nani procura satirizá-la com a publicação
da charge.
Chamamos a atenção dos professores para o fato de que para compreender
o conteúdo da charge é necessário ter conhecimentos dos fatos que estão
acontecendo naquele momento histórico, ou seja, é preciso saber que está havendo
discussões sobre a Lei Seca e que esta tem abalado a tradição católica.
Quanto à estrutura composicional, retomamos a fala de Bakhtin de que ―cada
campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de
enunciados, os quais denominamos de gêneros do discurso (BAKHTIN, 2003, p.
262, grifos do autor). Portanto, cada gênero produzido socialmente mantém algumas
características que são comuns àquele tipo de enunciado. No caso da charge, por
exemplo, embora se altere o conteúdo temático proposto, todas conservam
elementos que são característicos daquele texto. Assim, podemos afirmar que toda
charge apresenta o recurso não verbal e a maioria utiliza-se do recurso verbal para
dar ênfase ao argumento apresentado.
Em relação ao estilo presente no gênero, Bakhtin afirma que, ―O estilo integra
a unidade de gênero do enunciado como seu elemento. Isso não significa,
evidentemente, que o estilo de linguagem não possa se tornar objeto de um estudo
especial independente‖ (BAKHTIN, 2003, p. 266). Aproveitamos o momento de
análise do estilo do gênero para reafirmar aos professores que pensar o ensino da
língua a partir dos gêneros discursivos não é sinônimo de abandono do estudo
gramatical, pois, conforme Bakhtin, o estilo é constituinte do enunciado, portanto, ele
precisa ser estudado e ensinado. Pensando no estilo presente na charge, nos
remetemos à integração dos recursos não verbais e verbais para a produção de
sentido. Desse modo, é necessário analisar as expressões dos 12 apóstolos e do
próprio Jesus que não condizem com o quadro verdadeiro, isso porque há o conflito
entre beber o vinho e adequar-se às normas previstas pela Lei Seca.
Enfatizamos, ainda, que os alunos de 5º ano podem não ter a autonomia de
buscar toda essa contextualização da situação de produção de gênero, por isso é
importante o papel do docente de resgatar isso para apresentar aos discentes. Esse
é, portanto, o papel de mediador do professor.
139
Na sequência apresentamos um cartum de Moa e juntamente com os
docentes fizemos a análise do conteúdo temático, do estilo e da construção
composicional.
Figura 29 – Cartum para análise
Fonte: http://viverparacontar.wordpress.com/category/meio-ambiente/
Com a apresentação desse cartum (figura 29), realizamos o mesmo trabalho
de contextualização. Enquanto apresentávamos dados sobre o autor e fazíamos
referência aos elementos presentes no cartum, os professores chamaram a nossa
atenção para a cor da latinha que o menino tem na mão, que nos remete a um
refrigerante muito conhecido. Então, constatamos que os participantes envolveramse com a atividade e começaram a buscar dados para chegar ao conteúdo temático
do cartum, percebendo a diferença entre este e o tema trazido pelos livros didáticos.
140
Figura 30 – Artigo de opinião para análise.
INDIO GALDINO
O homícidio, por queimaduras, do índio Galdino, em Brasília,
constituiu-se num episódio desumano e estarrecedor. Os autores, jovens
nascidos em famílias de grande prestígio social e econômico, foram
localizados, presos e indiciados. Pela maneira cruel, como cometeram o delito,
usando grande quantidade de álcool, que derramaram sobre a vítima, ateando
fogo em seguida, houve o enquadramento deles no chamado crime hediondo e
que os levaria ao julgamento por jurados. Todavia, ao analisar o processo, a
juíza desclassificou, de homícidio doloso para lesões corporais seguidas de
morte. Seu entendimento foi de que os réus não queriam o resultado letal. Foi
a sua convicção.
Mas, pelas particularidades do evento, como é que ela pôde chegar a
tal conclusão? Como pôde afirmar, categoricamente, que os delinquentes não
tinham a intenção de matar? Ora, se quem provocou combustão numa pessoa,
transformando-a em tocha humana, não tinha a intenção de matá-la, quem
teria? Parece que a ilustre magistrada baseou a sua decisão em informações
fornecidas por uma bola de cristal ou perscrutou o íntimo de cada um dos
criminosos, como se fosse vidente. O sensato seria que os rapazes fossem a
julgamento pelo júri popular. Só assim haveria a verdadeira justiça.
DARIO LIVINO TORRES, Magistrado em Curitiba.
Folha de Londrina, 21-08-97
Fonte: Dario Livino Torres, Magistrado em Curitiba. Folha de Londrina, 21-08-97
Ao fazer a análise do artigo de opinião ―Índio Galdino‖, devido à construção
composicional desse gênero foi possível pensar em mais atividades de análise do
estilo, como dos verbos presentes no texto. Percebemos que no primeiro parágrafo,
quando o autor situa o leitor a respeito do tema tratado, são utilizados verbos no
pretérito perfeito, já no segundo, à medida que apresenta sua opinião sobre o
episódio ocorrido, os verbos passam a ser utilizados no futuro do pretérito.
Coletivamente foi sendo avaliado que a partir desse texto poderia ser explorada a
linguagem padrão e a utilização de referentes.
141
Esse trabalho foi produtivo, porque tivemos a oportunidade de retomar com os
professores a questão do trabalho gramatical que eles tanto cobram, pois ao falar do
estilo, relacionamos ao trabalho com a análise linguística. Evidenciamos, portanto,
que o trabalho com o gênero não abandona o estudo da língua.
Essa quarta oficina teve como leitura prévia o texto de Hila (2009),
Ressignificando a aula de leitura a partir dos gêneros. Os professores gostaram do
texto, pois consideraram que a autora, além de apresentar a fundamentação teórica
sobre o trabalho com os gêneros discursivos/textuais, também apresenta atividades
práticas que podem ser trabalhadas para abordar os três elementos citados por
Bakhtin.
Para a última oficina entregamos aos participantes para leitura prévia o texto:
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Exercícios de compreensão leitora ou copiação nos
manuais de ensino de língua? Em aberto, Brasilia, ano 16, n. 69, jan./mar.,1996.
3.1.1.5 5ª oficina - A leitura no livro didático
No início dessa oficina, começamos dizendo que esse seria nosso último
encontro e que nele faríamos uma análise do material didático que é utilizado pelas
escolas municipais de Cascavel. E, como sabemos, o livro didático é um material
que, devido as suas limitações, nem sempre pode ser utilizado do início ao fim em
uma sequência, sendo muitas vezes preciso adaptá-lo. Concordando com isso, um
professor disse:
Eu sempre falo que a gente tem que adaptar o livro (Docente P,
18/04/2013).
Outro professor fez o seguinte apontamento:
Ilda, assim, a minha preocupação depois que comecei a ver essas
questões, mas meu Deus eu tenho conhecimento pra saber formular
questões que os livros estão formulando de uma forma que não está
correta? Eu uma simples professora, vou ter condições de fazer
isso? (Docente B, 18/04/2013).
142
Respondendo ao professor, relatamos que é claro que essa atividade vai
demandar bastante treino e prática, mas acreditamos que seja possível sim.
Inclusive os outros professores disseram que eles têm condições sim, às vezes,
mais do que muitos autores de materiais didáticos. Abordando a importância da
formação continuada para a atuação do docente, Verdinelli, assim se posiciona:
Defendemos a escola como locus privilegiado de formação, já que
uma dimensão importante do processo de formação é a prática do
professor. Além disso, é nesse espaço, por meio de um trabalho
coletivo, construído de forma gradativa, que a prática pedagógica
torna-se objeto de análise crítica. O trabalho coletivo favorece
reflexões, análise das práticas e uma postura de intervenção,
possibilitando a articulação prática-teoria-prática (VERDINELLI,
2007, p. 27).
Concordamos com a autora, pois para que o professor tenha autonomia para
alterar as atividades propostas no livro didático e repense a sua prática, é
imprescindível a participação em formações continuada que acontecem fora da
escola, ou seja, cursos ofertados pela secretaria municipal de educação, ou pela
universidade. No entanto, também é importante que a equipe pedagógica e
administrativa escolar
tenha a prática de realizar grupos de estudo na própria
escola, envolvendo os docentes de todos os anos, a fim de que esses momentos
sirvam para refletir sobre a prática a partir de estudos teóricos e possam intervir na
ação docente num sistema de cooperação entre os envolvidos no processo de
ensino.
O texto que propusemos para leitura prévia era de Marcushi (1996), e esse
autor apresenta reflexões significativas a respeito do trabalho com a leitura no livro
didático e, nesse texto, ele retoma algumas questões que foram exploradas por nós
durante as oficinas. Um exemplo disso são os tipos de questões. Assim, o livro, na
maioria das vezes, prioriza apenas a copiação, que são as questões de mera
localização.
Quando pensamos em trabalhar com os professores a análise do livro
didático
Projeto
Buriti:
Português,
da
editora
Moderna
(Sanchez,
2011),
pretendíamos localizar nesse material os elementos que foram trabalhados nas
oficinas anteriores. Assim, o primeiro passo seria constatar: se as atividades de
leitura contemplam questões mais de ordem ascendente, descendente ou
143
interacional? Que gêneros são apresentados nas unidades? O livro foca em cada
unidade um gênero apenas ou apresenta mais? São contempladas as etapas de
leitura? Como é organizado o manual de orientações aos professores? Que
concepção de leitura é possível constatar nessas orientações?
Assim, a partir dos questionamentos acima, começamos a garimpar o livro e,
para esse trabalho, selecionamos a unidade 2 (anexo D). Analisando com os
professores essa unidade, percebemos que nela não se contempla o trabalho com a
pré-leitura, pois isso é algo apresentado nas orientações ao professor que constam
no final do livro, no entanto, ao longo da unidade é interessante que não há
atividades pré-leitura. Nessa unidade, é apresentada uma imagem de crianças
brincando, traz-se, em seguida, alguns questionamentos, no entanto, não há
nenhuma relação entre a imagem, os questionamentos e o primeiro texto proposto.
Quando olhamos para as questões apresentadas para o texto, percebemos
que aparecem as três concepções de leitura: algumas são apenas de localização,
outras exigem apenas a opinião do leitor, tornando o texto apenas pretexto e há
também as interacionais, que fazem pensar para buscar e responder.
Em relação ao gênero, constatamos que o livro não trabalha com um gênero
por unidade, dessa forma ele apresenta diversos textos na unidade e cada um
pertencente a um gênero e, quando cobra a produção, ele retoma o primeiro texto
da unidade que, no caso da unidade em questão, era a crônica.
Comentamos que para o aluno conseguir produzir um texto pertencente a
determinado gênero, é importante que ele tenha acesso a diversos textos
pertencentes àquele gênero. Portanto, se o professor for trabalhar com a produção
proposta no livro, ele terá que levar outras crônicas para o aluno. Até porque a
crônica não é um gênero fácil de produzir. Nesse sentido, o livro propõe a produção
de uma paródia da crônica presente no livro. Sobre a apresentação de outros
gêneros, um professor relatou sobre a prática que tem tido em sala:
Eu faço assim, professora, começou lá com a crônica eu vou buscar
no livro outras unidades onde tenha crônica. Para não confundir a
criança, pois ela não consegue pular de uma coisa para outra
(Docente P, 18/04/2013).
144
Percebemos, então, que alguns professores estão tendo a preocupação com
o gênero e buscam adaptar o material didático para contemplar esse trabalho e isso
consideramos um avanço para o ensino.
Nesta última oficina, também solicitamos aos professores que fizessem
análise do plano de aula que elaboraram no primeiro encontro e verificassem se a
partir daquilo que discutimos nos cinco encontros, eles pretendiam alterar alguma
coisa, fosse suprimindo, fosse acrescentando algo. No momento em que o plano foi
entregue aos docentes alguns comentaram que consideravam que não havia nada
para alterar, pois acreditavam que a aula estava adequada, outros disseram que
poderiam complementar o que haviam feito pensando nas etapas da leitura e na
concepção interacional de leitura.
Antes
de deixar que eles olhassem para o plano de aula, solicitamos a
atenção para o seguinte cartum que circulou nas redes sociais:
Figura 31 – Cartum para refletir sobre a importância da leitura
Fonte: http://perguntasparvas.blogs.sapo.pt/tag/educa%C3%A7%C3%A3o
Apresentamos esse texto para enfatizar a importância da leitura em nossa
vida, pois, por meio dela, adquirimos conhecimentos, relaxamos, nos localizamos,
145
enfim ela nos auxilia em muitas atividades. Portanto, a leitura é o conteúdo essencial
para se ensinar aos alunos.
Ao final da oficina, questionamos os professores se as oficinas auxiliaram na
compreensão do que é leitura. E os docentes disseram que com certeza contribuiu.
O docente F fez o seguinte comentário:
Relembrei, esclareci algumas coisas, então, foi ótimo! (Docente F,
18/04/2013).
Questionamos se a formação contribuiu para a reflexão das questões que são
apresentadas pelos materiais didáticos e por eles mesmos, ou seja, se estão atentos
ao que cada questão avalia. Tivemos, então, o seguinte apontamento:
Eu fui preparar uma atividade para os meus alunos e comecei a
analisar quais atividades eu poderia apresentar. Eu peguei algumas
sugestões suas e preparei atividades para os meus alunos no
reforço, porque daí são menos alunos e é mais fácil para trabalhar a
leitura, então eu acho que ajudou bastante. Porque essa questão de
leitura eu sempre gostei muito e os alunos precisam (Docente O,
18/04/2013).
Retomamos a questão: então vocês acham que o curso contribuiu?
O docente K disse:
Eu acho que contribuiu, mas a formação não deveria ser só para o 5º
ano, teria que ser para os demais também (Docente K, 18/04/2013).
Concordamos com o docente que esse trabalho com as concepções de leitura
deveria ser realizado com todos os anos, mas, para a pesquisa, propussemos a
formação apenas para o 5º ano, contudo, podemos pensar em trabalhar com os
demais também.
O docente M fez o seguinte apontamento:
As oficinas foram ótimas, apesar de não poder estar presente em
algumas. Compartilhei as sugestões com o pessoal da escola,
principalmente com a nossa bibliotecária. As atividades sobre como
trabalhar com a leitura estão ajudando muito. Meu olhar mudou ao
fazer análise de textos e formular perguntas. Claro que esse trabalho
146
eu já venho fazendo, porém, agora, de uma forma diferente. Tudo o
que foi abordado pode e deve ser aplicado em sala de aula a partir
dos conteúdos das oficinas. Você é uma ótima professora (Docente
M, 18/04/2013).
Ao chegarmos ao final das oficinas sentimo-nos com o sentimento de pesa,
por estarmos concluindo o trabalho, pois, durante a formação, acabamos nos
envolvendo afetivamente com os participantes. Como eles traziam suas angústias
para a formação, sentimo-nos responsáveis por tentar ajudá-los a superar suas
dificuldades. Ao mesmo tempo, sentimo-nos felizes por ter cumprido aquilo a que
nos propusemos realizar. É claro que, muitas vezes, diante de alguns
questionamentos percebíamos nossas limitações como formadores, haja vista que
nem sempre conseguimos respostas para todas as questões, haja vista a
complexidade desse processo de ensino e aprendizagem da leitura.
Na próxima seção apresentamos a análise dos dados coletados por meio da
aplicação do questionário.
3.2 ANÁLISE DOS DADOS GERADOS PELO QUESTIONÁRIO
O objetivo desta seção é apresentar a análise dos dados gerados por meio de
questionário (anexo 3), aplicado aos dezesseis professores participantes da
formação continuada ofertada aos docentes do 5º ano do Ensino Fundamental, o
qual era composto de vinte e duas questões, sendo 13 objetivas e 9 discursivas.
No primeiro encontro de formação compareceram dezesseis professores,
assim todos responderam o questionário, contudo, destes, treze obtiveram carga
horária para certificação. Visando à melhor visualização das informações atribuímos
uma letra para cada participante, sendo estas de A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M,
N, O e P.
Para facilitar a sistematização da apresentação dos dados, as questões foram
reagrupadas a fim de facilitar a visualização do perfil do grupo.
Na primeira questão, indagamos sobre o sexo dos participantes. Tivemos na
formação quinze pessoas do sexo feminino e uma do sexo masculino. Isso se
evidencia pelo número muito superior de mulheres atuando na educação em
147
detrimento de um número restrito de homens atuando no quadro do magistério da
rede pública municipal de ensino de Cascavel.
Outra questão solicitava dos participantes que marcassem a faixa etária na
qual se enquadram. Constatamos que tivemos a participação de professores de
diversas faixas etárias, conforme apresentado no quadro abaixo:
Quadro 4 – Idade dos participantes da formação
Idade
Número de participantes
De 25 a 29 anos
2 (L, M)
De 30 a 39 anos
4 (D, E, J, K)
De 40 a 49 anos
6 (A, B, G, N, O, P)
De 50 a 54 anos
3 (C, H, I)
55 anos ou mais
1 (F)
Fonte: correspondente à questão n. 3 do questionário (apêndice 1).
Observando o quadro, percebemos que os professores que participaram
dessa formação, em sua grande maioria, têm mais de quarenta anos, o que poderia
indicar um tempo maior de atuação na docência.
Para verificar o tempo de atuação dos professores, questionamos qual era o
tempo de atuação na rede municipal de ensino, como mostra o quadro a seguir:
Quadro 5 – Tempo de atuação dos professores na rede municipal de ensino
Tempo de atuação
Número de professores
10 meses
1 (D)
1 ano
1 (L)
3 anos
2 (B, N)
5 anos
2 (G, M)
7 anos
1 (J)
9 anos
1( K)
10 anos
2 (F, O)
12 anos
1 (A)
13 anos
1 (P)
14 anos
2 (C, I)
15 anos
1 (E)
23 anos
1 (H)
Fonte: correspondente à questão n. 8 do questionário (apêndice 1).
148
Percebe-se que o tempo de atuação desses professores varia bastante. Há
aqueles que estão recém-adentrando na rede enquanto alguns já têm uma
caminhada maior de atuação em sala de aula. Considerando o período de estágio
probatório que é de três anos, percebemos que apenas dois professores ainda não
concluíram essa etapa. Os demais já concluíram, tanto é que dez professores atuam
há mais de cinco anos.
Outra questão que consideramos importante para fazermos a caracterização
dos sujeitos envolvidos na pesquisa é a que indaga sobre o tempo de experiência no
5º ano/4ª série. Em relação a esse item, constatamos que o tempo de experiência
varia bastante. Vejamos o quadro abaixo.
Quadro 6 – Tempo de atuação no 5º ano/4ª série
Tempo de experiência no 5º ano
Número de professores
1 mês
3 (O, K, L)
10 meses
2 (D, E)
1 ano
2 (A, B)
2 anos
2 (M, N)
3 anos
1 (G)
4 anos
1 (F)
5 anos
2 (I, J)
8 anos
1 (C)
10 anos
1(P)
15 anos
1 (H)
Fonte: correspondente à questão n. 9 do questionário (apêndice 1).
Observamos que, dos professores que se propuseram a participar da
formação, a maioria possui menos de cinco anos de experiência em turmas de 5º
ano, portanto podemos supor que seja um grupo que demonstra interesse pela
formação.
De acordo com Larsen-Freeman (1983) e Bailey et al (1997), citados por
Castro e Romero,
A formação de professores propriamente dita tem início muito antes
do ensino formal nos cursos de graduação. Isto é, o futuro
profissional docente já começa a se constituir discursivamente a
partir de suas vivências como aluno muitos anos antes de exercer
sua prática pedagógica (CASTRO; ROMERO, 2006, p. 126-127).
149
Nesse sentido, a formação em nível Médio constitui uma etapa importante
para a formação do futuro professor e, portanto, é relevante para nossa pesquisa
sabermos qual foi o curso feito por esses profissionais. Assim, uma das indagações
é sobre qual foi a formação em nível Médio desses professores.
Quadro 7 – Formação em nível médio
Curso de nível Médio
Número de professores
Magistério
6 (B, C, E, F, H, I)
Educação Geral
7 (A, D, G, J, L, M, N)
Contabilidade
3 (O, K, P)
Fonte: correspondente à questão n. 4 do questionário (apêndice 1).
Por se tratar de professores que estão atuando com o Ensino Fundamental
Anos Iniciais, esperávamos que houvesse mais professores com formação em
Magistério, o que não foi confirmado pelos dados.
Em relação à formação, questionamos ainda se os professores possuem
formação em nível Superior e, em caso positivo, qual era o curso. Todos eles
possuem formação superior e os cursos são os seguintes:
Quadro 8 – Formação em nível superior
Curso
Número de profissionais
Pedagogia
13 (A, B, C, D, G, H, J, K, L, M, N, O, P)
História
2 (E, I)
Letras
1 (F)
Fonte: correspondente à questão n. 5 do questionário (apêndice 1).
Para atuar na Rede Pública Municipal de Ensino, o professor precisa ter
graduação em Pedagogia ou formação em Magistério, hoje denominado Formação
Docente, e graduação na área da educação. E isso justifica os resultados, pois
conforme constatado na formação em nível Médio, dez professores não têm
formação em Magistério e, portanto, para poder atuar com turmas do Ensino
Fundamental – anos iniciais, tiveram a necessidade de cursar Pedagogia. Nesse
150
sentido, somos levados a refletir que os professores licenciados em Letras e História
fizeram o Magistério como curso de Ensino Médio.
Também questionamos sobre a forma como fizeram a graduação, se foi
presencial, semipresencial ou a distância. Os resultados foram:
Quadro 9 – Forma como os professores cursaram o ensino superior
Forma de curso
Quantidade de docentes
Presencial
14 (A, B, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, P)
Semipresencial
1 (C)
A distância
1 (O)
Fonte: correspondente à questão n. 6 do questionário (apêndice 1).
A partir da década de 90, o município de Cascavel recebeu várias instituições
privadas de Ensino Superior, o que ampliou o número de vagas para a formação em
licenciatura, haja vista que até então apenas a UNIOESTE ofertava cursos de
licenciatura. Nos últimos anos, têm-se instalado em nossa cidade cursos na área da
educação a distância. Contudo, dos participantes dessa formação, a maioria dos
docentes cursaram a graduação de forma presencial.
Interpelamos os professores se eles possuem curso de pós-graduação e em
caso negativo, se pretendem ou não cursar. Como em Cascavel há diversas
instituições de ensino superior, isso reflete também no aumento da oferta de cursos
de pós-graduação lato sensu, e por isso, verificamos que grande parte dos
professores que estão atuando na rede municipal de Ensino possui especialização.
Tanto é que, dos professores que participaram da formação, muitos já fizeram duas
especializações. Há inclusive professor com pós-graduação stricto sensu. Apenas
dois participantes não possuem pós-graduação, contudo relatam que pretendem
fazer.
No quadro abaixo listamos os cursos de pós-graduação que esses
professores cursaram:
Quadro 10 – Cursos de pós-graduação cursados pelos docentes
Cursos Lato Sensu
Quantidade de profissionais
História do Brasil
2 (E, G)
Fundamentos da educação
4 (A, E, F, P)
151
Literatura
1( F)
Educação Especial
1( I)
Geografia
1 (G, I)
Estratégias didáticas e ensino
1 (M)
Psicopedagogia clínica e institucional
3 (B, D, L)
Educação Inclusiva
2 (C, J)
Alfabetização
1 (K)
Docência do Ensino Superior
2 (B, H)
MBA estratégias empresariais
1 (H)
Ensino de Ciências e Matemática
1 (N)
Curso Stricto Sensu
Quantidade de profissionais
Mestrado em Educação
1 (E)
Fonte: correspondente à questão n. 7 do questionário (apêndice 1).
A partir dos cursos apresentados acima, constatamos que, com exceção de
um curso, que é o de MBA, os demais estão relacionados à educação. Assim,
percebemos que os professores buscam os cursos de pós-graduação para contribuir
com a sua prática docente e é claro que não podemos deixar de mencionar que
esse curso contribui com a elevação de nível na carreira do professor. Contudo,
percebemos que nesse grupo em especial há a preocupação com a formação,
porque na rede municipal é possível protocolar para avanço apenas um curso de
especialização. Os demais realizados pelos professores servem apenas para
elevação como carga horária de curso, o que não representa grande avanço na
carreira e como já citado vários professores possuem dois cursos desse nível.
Perguntamos em quantos turnos os professores atuam e nenhum dos que
respondeu ao questionário afirmou trabalhar em três turnos.
Quadro 11 – Turnos trabalhados
Turnos trabalhados
Quantidade de profissionais
Um turno
6
Dois turnos
10
Três turnos
0
Fonte: correspondente à questão n. 10 do questionário (apêndice 1).
152
Percebemos que a maioria dos docentes trabalha em dois turnos e podemos
inferir que eles atuam no período da manhã e da tarde, haja vista que se dispuseram
a participar de uma formação no período noturno. Contudo, um número significativo
de profissionais (6), trabalham em apenas um turno. A partir dessa constatação
podemos afirmar que os docentes que se propuseram a participar da formação não
apresentam acúmulo de cargos.
Ao serem questionados se costumam participar de cursos de formação
continuada e a frequência desses cursos as respostas foram às seguintes:
Quadro 12 – Frequência da participação em cursos de formação continuada
Opções de respostas
Número de pessoas
Não
1 (C)
Sim, 2 vezes por ano
8 (P, M, N, I, J, L, D, A)
Sim, 3 vezes por ano
2 (O, B)
Sim, mais de 3 vezes por ano
6 (K, F, G, H, E)
Fonte: correspondente à questão n. 11 do questionário (apêndice 1).
Analisando e contextualizando os
dados, percebemos que os oito
profissionais que responderam duas vezes por ano, participam apenas dos
seminários ofertados pela Secretaria Municipal de Educação, pois a secretaria oferta
o seminário no início do ano letivo, no mês de fevereiro e no final do primeiro
semestre, antes das férias de julho. Os demais professores que dizem participar três
vezes ou mais ao ano demonstram que, além de participarem dos seminários
ofertados pela Secretaria Municipal de Educação, também buscam fazer outras
formações ofertadas tanto pela própria secretaria quanto por outras instituições.
Também há escolas que ofertam grupo de estudos no período noturno.
Como nosso objetivo era o de propor uma formação que tivesse como foco a
leitura, questionamos se os docentes já participaram de algum curso de formação
continuada específico de leitura e qual a duração em horas desse curso. E o
resultado obtido apresentamos na sequência:
Quadro 13 – Participação em cursos de formação continuada sobre leitura
Respostas
Número de horas
Participantes
153
Não
0
11 (B, C, D, G, I, J, L, M, N, O,
P)
Sim
8 a 20 h
1 (A, E, F)
Sim
40 h
2 (H, K)
Fonte: correspondente à questão n. 12 do questionário (apêndice 1).
Conforme justificativa apresentada na introdução deste trabalho, propusemonos a ofertar uma formação com foco na leitura, haja vista que na rede municipal,
ao menos nos últimos cinco anos, não foram ofercidos trabalhos específicos de
leitura, pois as formações centraram-se mais na escrita, na análise linguística e na
reestruturação textual.
Perguntamos aos professores se eles consideram que a formação inicial os
preparou para desenvolver o trabalho pedagógico com a leitura em sala de aula e o
porquê dessa resposta. Nessa questão, dez professores consideraram que não, pois
a ênfase era dada à escrita e a outros conteúdos e porque havia poucos materiais
relacionados à leitura.
Três professores consideram que sim. O professor G relatou que teve uma
professora de literatura muito boa, que desenvolveu diversos projetos de leitura e
escrita de livros infantis. O professor K disse que, na faculdade que cursou, o último
ano foi dedicado à disciplina de técnica de ensino. O professor I considera que o
magistério a preparou e o curso Superior incentivou a diversidade de leitura e o
questionamento.
O professor E considerou que o magistério preparou um pouco, pois na
disciplina de didática da Língua Portuguesa foi trabalhada a leitura. Já na graduação
não foram abordadas questões pedagógicas relacionadas à leitura.
O professor J apontou que, em sua formação, não se focou na leitura como
deveria e o professor L relata que houve muita teoria e pouca prática e complementa
dizendo que a prática que possui se deve ao seu interesse de aprender mais e mais.
Considerando as respostas e levando em conta que do grupo treze
professores possuem graduação em Pedagogia, um em Letras e dois em História,
percebemos que podem ter ocorrido falhas na formação, haja vista que o curso de
Pedagogia deveria preparar o profissional para atuar em sala de aula. Assim, supõese que os elementos básicos para garantir o ensino e a aprendizagem da leitura, por
exemplo, teriam que ser bem explorados na graduação. E acreditamos, ainda, que
154
a universidade deveria fazer a ponte com as escolas, a fim de contribuir com a
melhoria da qualidade de ensino. Portanto, poderia ofertar cursos de formação
continuada aos professores da rede municipal e estadual. Nesse sentido,
concordamos com Flores, ao afirmar que ―[...] existe uma tendência para simplificar
demasiado o debate sobre teoria e prática na formação de professores ao identificar
a ―prática‖ com o que acontece na escola e ―teoria‖ com o que acontece na
universidade‖ (FLORES, 2010, p. 183-184).
De acordo com a autora, a universidade não está conseguindo trabalhar a
teoria associada à prática e complementa sua tese dizendo,
Muitas práticas existentes contradizem os princípios e os
pressupostos da integração teoria/prática e da articulação entre os
contextos de formação, na formação inicial de professores, sobretudo
no que se refere à ausência de uma abordagem interdisciplinar do
currículo e ao divórcio entre universidade e escolas no que diz
respeito à filosofia de formação (FLORES, 2010, p. 184).
Com base nos estudos da autora, e com a realidade constatada, por meio das
respostas dadas à questão, percebemos que realmente tem ocorrido o
distanciamento da universidade em relação à escola e as lacunas deixadas pela
formação inicial deverão ser preenchidas pela formação continuada.
Indagamos aos professores se eles costumam ler frequentemente e que tipo
de textos costumam ler. Dos professores participantes apenas ―C, B e A‖ disseram
que não costumam ler frequentemente, os demais dizem ler e, de acordo com as
respostas, percebemos que eles costumam ler textos e materiais diversificados, tais
como: romances, poemas, textos didáticos relacionados às áreas do conhecimento,
revistas, notícias, panfletos, leis referentes à educação, livros sobre religião, gibis,
crônicas, entre outros.
Em outra questão apresentada, inquirimos os docentes sobre o que eles
entendem por leitura. Há professores que consideram a leitura do ponto de vista
ascendente, pois a compreendem como decodificação. Professor N: ―Decodificar e
compreender as intenções do texto.‖
Professor
P:
―É
apropriar-se
de
conhecimento da linguagem, ampliar vocabulário é instrumentalizar-se.‖ Professor A:
―A compreensão da mensagem do locutor/autor.‖ Professor C: ―Tudo o que se vê é
necessário uma leitura para entendimento e entender o seu significado. Em qualquer
código ou símbolo é preciso ter uma leitura‖. Percebemos que esses docentes
155
atribuem mais valor à estrutura da língua e à ampliação vocabular do que à
compreensão. Menegassi, ao abordar a leitura sob perspectiva do texto, faz o
seguinte apontamento:
Os estudos de leitura sob a perspectiva do texto centralizam-se no
sistema lingüístico, correspondendo às teorias de decodificação – de
base estruturalista (corrente teórica que propunha o estudo da língua
a partir da sua estrutura, isto é, tudo deveria ser estudado e
produzido a partir de uma estrutura certa, já marcada na língua),
portanto uma visão imanentista da língua , com uma finalidade
específica que reduz o estudo da língua a um fim único – que
concebe o ato de ler como um processo de decodificação de letras
em sons, e a relação destes com o significado (MENEGASSI, 2005,
p. 18).
Conforme exposto pelo autor, a língua ainda é trabalhada nas escolas sob a
perspectiva do estruturalismo, haja vista que se concebe que ao ensinar aos alunos
a decodificação por meio do acesso ao significado e ao significante eles serão bons
leitores, no entanto não é isso que se percebe na prática.
Há professores que não relacionam a leitura diretamente à decodificação,
mas eles ainda conservam uma visão de que a leitura é uma pista de mão única, na
qual o leitor se apropria de conhecimentos a partir do que lê. Contudo, fica a
impressão de que essa seria na, concepção dos professores, uma ação que caberia
apenas ao aluno realizar, não se atribui o devido valor ao autor do texto e não há
resquícios de mediação nas atividades de leitura.
Professor I: ―Proporciona conhecimento do que foi construído pela
humanidade. Diversão.‖
Professor L: ―Busca por conhecimento de mundo, melhoria para o trabalho e
entretenimento.‖
Professor O: ―É o meio informativo onde as expressões podem ser discutidas
em grupo ou avaliadas individualmente, de acordo com o meu pensamento,
podendo ser positiva ou negativa. Ela incentiva as mudanças na vida do sujeito e
seu modo de ver as coisas.‖
Na sequência, apresentamos as considerações dos demais professores.
Nesses discursos percebemos que aparece uma concepção de leitura voltada para
o seu papel social e de interação. Embora alguns ainda façam referência à
decodificação eles não ficam apenas nela:
156
Para o professor E, ―É o ato de ler, decodificar, interpretar/analisar textos e
imagens, estabelecendo relações com outros textos, proporcionando a apropriação
de conhecimentos produzidos pela humanidade.‖
Professor K: ―Tudo o que se visualiza e se pode entender o significado
(textos impressos, imagens, placas de trânsito, sinais luminosos, etc.) Também o
que se sente, percepções do corpo (toque, afago, soco), linguagem braile‖.
Professor M: ―Processo no qual o indivíduo se apropria dos códigos escritos
e a partir desse processo realiza a compreensão do que leu e compreende as
relações sociais em que vive.‖
Professor B: ―Leitura não significa apenas passar o olhar e falar em voz alta o
que está escrito. Para mim, ler é entrar no que se lê, viver, procurar entender o que
está posto, porque foi colocado dessa forma, qual é o objetivo...‖
Professor D: ―Entendo que seja qualquer tipo de leitura de vários gêneros,
tipologias. E que a leitura é de extrema importância na vida de qualquer pessoa, pois
é através dela que o homem se apropria de conhecimentos, contribuindo para que
os sujeitos entendam sua realidade.‖
Professor G: ―É essencial para a minha vida, e também um meio de
conhecimento tanto científico, como conhecimento geral e também por divertimento.
Há uma interação entre o leitor e o livro.‖
Professor F: ―Uma interação entre um texto e o leitor, capaz de informá-lo,
propiciar lazer, trazer informações sobre o cotidiano, bem como instruir.‖
Professor H: ―Ler é compreender além dos símbolos, reconhecer o contexto, a
intencionalidade dos sujeitos do discurso e as variações linguísticas.‖
Professor J: ―Saber entender o que se vê e além do que se vê, a leitura abre
as portas para o conhecimento.‖
De acordo com as considerações dos professores, percebemos que eles já
concebem a leitura como uma ação para além da mera decodificação, pois conforme
Solé, ―[...] ler não é decodificar, mas para saber ler é preciso saber decodificar‖
(SOLÉ, 1998, p. 52). Portanto, a leitura envolve muito mais do que textos escritos,
haja vista que, conforme Martins, ao tratar da valorização que a escola atribui ao
escrito, relata que, ―[...] o ato de ler se refere tanto a algo escrito quanto a outros
tipos
de
expressão
do
fazer
humano,
caracterizando-se
também
como
acontecimento histórico e estabelecendo uma relação igualmente histórica entre o
157
leitor e o que é lido‖ (MARTINS, 2012, p.30). Ainda para a mesma autora ―a leitura
vai, portanto, além do texto‖ (MARTINS, 2012, p. 33).
Inferindo sobre as palavras da autora, podemos dizer que ler envolve muito
mais do que apenas decodificar e compreender textos escritos; a leitura é muito
mais abrangente, pois envolve diversas situações da nossa vida. Assim,
cotidianamente realizamos diversas leituras de tudo o que acontece a nossa volta.
Nesse
sentido,
Dell‘Isola
acrescenta,
que:
―Sendo sujeito leitor, simultaneamente, lê palavras, formas, cores, sons, volumes,
texturas, gestos, movimentos, aromas, atitudes, fatos. Este sujeito interage com
diversas formas de
linguagem, através da sua leitura do mundo‖ (DELL‘ISOLA,
1996, p.70).
Questionamos aos professores se eles consideram importante o trabalho com
a leitura em sala de aula e o porquê disso. Todos os professores consideram
importante esse trabalho, e em suas justificativas apresentaram as seguintes
opiniões:
Quadro 14 – Considerações sobre a importância do trabalho com a leitura
Considerações sobre a importância do trabalho com a leitura
Professores
Proporciona ao leitor uma visão de mundo, compreensão e
1 (P)
conhecimento do que acontece ao seu redor e fora dele,
possibilitando argumentar sobre os temas abordados.
Muito importante, pois sem leitura não consegue desenvolver
2 ( H, C)
nenhuma das disciplinas.
Contribui
para
o
desenvolvimento
da
aprendizagem
e
1 (D)
conhecimento do aluno, dando condições para que os mesmos
sejam sujeitos ativos praticando a cidadania.
É importante a leitura silenciosa, coletiva e apontada.
1 (K)
Possibilita
1 (A)
a
compreensão
do
conteúdo,
mensagem,
desenvolvimento das cognitivo e das funções psicológicas
superiores.
Desenvolve a interpretação, a criticidade em temas variados e
1 (B)
proporciona o desenvolvimento da atenção entre outros.
Melhora a escrita.
1 (N)
Desenvolve a compreensão textual.
1 (L)
Proporciona a interação e o conhecimento, melhora a escrita e
a fala.
4 (M, O, I, G)
158
Importante para que o aluno não fique à margem da sociedade.
1 (F)
Desenvolve a atenção, a curiosidade, amplia o vocabulário e o
2 (J, E)
conhecimento.
Fonte: correspondente à questão n. 16 do questionário (apêndice 1).
O trabalho com a leitura, de acordo com os apontamentos dos professores,
proporciona o conhecimento e amplia a capacidade de interpretação. Consideramos,
portanto, que o trabalho com a leitura é fundamental. Nesse sentido, pactuamos com
Cagliari ao dizer que
A atividade fundamental desenvolvida pela escola para a formação
dos alunos é a leitura. É muito mais importante saber ler do que
saber escrever. O melhor que a escola pode oferecer aos alunos
deve estar voltado para a leitura. Se um aluno não se sai bem nas
outras atividades, mas for um bom leitor, penso que a escola cumpriu
em grande parte a sua tarefa (CAGLIARI, 2008, p. 148).
Nessa perspectiva, a leitura deve ocupar um lugar de destaque na escola. Ela
não pode ser vista como uma atividade secundária, que exige apenas alguns
minutos da aula, mas, pelo contrário, a leitura deve ser uma atividade bem
preparada e planejada pelos professores.
Indagamos os participantes sobre quais
gêneros discursivos/textuais eles
costumam utilizar. Ao responder a essa questão, os professores relataram que
trabalham com gêneros diversificados, e ao citar quais eram os gêneros, houve uma
variação muito grande nas respostas. Isso nos leva a refletir que, mesmo o
município tendo um currículo que preestabeleça os gêneros que devem ser
trabalhados, ainda não há uma unidade no trabalho.
Dentre os gêneros destacados, os que mais tiveram ocorrência nas respostas
dos professores foram os seguintes: poema, quadrinhos (história em quadrinhos,
tira), reportagem, letra de música, conto, propaganda e crônica. É importante
destacar que a tira é um gênero a ser trabalhado no 5º ano, por isso que, ao
selecionar o gênero para que os professores elaborassem a atividade, escolhemos a
tira.
Também indagamos aos professores como costumam trabalhar a leitura em
sala de aula. Essa questão nos proporcionaria analisar se a concepção que o
professor diz ter de leitura corresponde a sua prática.
159
Em resposta a essa questão, verificamos que todos os docentes
que
apresentaram uma concepção ascendente de leitura relataram os seguintes
encaminhamentos para ela:
Professor A: ―Professor leitor, leitura apontada, leitura prazerosa, leitura
individual silenciosa e em voz alta pelo aluno, exercícios de interpretação,
apresentação de diferentes gêneros, levantamento de hipótese.‖
Professor P: ―Livros de literatura: fichamento e resumo. Panfletos, revistas,
jornais, gibis, livro didático, etc.‖
Professor N: ―Escolher o gênero e entregar aos alunos para que leiam e
depois comentem o que entenderam ou contem sobre o que leram para os colegas.‖
Professor C: ―De várias formas: silenciosa, oral, declamativa, com jogral,
cantada, etc.‖
Professor E: ―Leitura silenciosa, coletiva, dividindo o texto para leitura
individual e em voz alta, leitura do professor com pausas e explicações, leitura em
duplas.‖
Professor J: ―Diariamente com textos dos livros dos alunos (coletivo ou
individualmente), com textos deixados no cantinho da leitura, bem como gibis, livros
infantis.‖
Professor I: ―Leitura do livro didático, dirigida – alguns alunos que se propõem
a ler. Após produção de textos coletivos ou individuais.‖
Professor D: ―Eles têm toda semana 45 minutos de aula na biblioteca com
outra professora. Em sala de aula, solicito leitura individual de textos do livro
didático, conforme disciplina trabalhada no momento. Em relação aos gêneros,
sempre trabalho interpretação. Qual é a função social de determinado texto?‖
Professor M: ―A partir de objetivos e encaminhamentos traçados. Exemplo: 15
minutos diários de leitura em diferentes ambientes da escola, momento da leitura (30
minutos 1 vez por semana) pesquisas, oratória, sarau, leitura de um livro por mês
(leitura do professor aos alunos).‖
Professor L: ―Coletiva, individual, silenciosa.‖
Professor O: ―Uso multimídia para leitura de imagens, documentário, livros
para leitura individual, experiências em Ciências para relatos de dados obtidos e
resultados na oralidade, jogos educativos, material do aluno (livros das disciplinas).‖
Professor B: ―Diariamente dedicamos 10 a 15 minutos iniciais da aula para
leitura. Algumas vezes o aluno escolhe o que irá ler na caixa da leitura, após
160
escreve um breve resumo do que leu no caderno de anotações. Outras vezes,
distribuo vários textos, após a leitura sorteio três alunos para falar aos demais sobre
o que leu. Em seguida escolhemos um dos textos lidos e o reescrevemos em
conjunto.‖
Professor H: ―Há uma variação: leitura pela professora, aluno individualizado,
coletivo, diálogo, sequenciado, com toda forma de recurso bibliográfico e midiático.‖
Professor K: ―Leitura silenciosa. Leitura coletiva. Leitura apontada. Leitura
competitiva.‖
Professor F: ―Gosto muito de fazer com que leiam, depois peço para me falar
o que entenderam do que leram, e com todos os tipos de questionamento sobre a
compreensão, a parte estrutural do texto e inclusive os questionamentos nas áreas
específicas, como ciências, matemática, etc.‖
Professor G: ―Uma vez por semana distribuo livros na sala, cada um tem um
espaço para contar o que entendeu da história lida e como dever de casa fazer o
resumo dela.‖
Pelos encaminhamentos apresentados por esses quatro professores,
percebemos que não há foco na compreensão leitora e realmente a preocupação
deles ao trabalhar a leitura concentra-se na apropriação do código e com a
decodificação. De acordo com Solé, ―[...] não se intervém no processo que conduz a
esse resultado, não se incide na evolução da leitura para proporcionar guias e
diretrizes que permitam compreendê-la; em suma – e mesmo que possa parecer
exagerado -, não se ensina a compreender‖ (SOLÉ, 1998, p. 35).
Percebemos que os docentes P, B e G fizeram referência à atividade de
resumo. Na quarta seção do primeiro capítulo, abordamos sobre as estratégias de
leitura e pontuamos sobre a importância do resumo, como atividade que auxilia na
compreensão, contudo, como afirma Solé (1998), essa é uma atividade que tem que
ser ensinada. Desse modo, o professor precisa prever momentos para realizá-la
coletivamente. Observando os relatos, percebemos que nenhum dos três docentes
prevê momentos para realizar a atividade coletivamente, tanto é que G propõe que o
resumo seja feito em casa.
As respostas apresentadas pelos professores nos levam a refletir que não há
ainda a compreensão de que a leitura deve ser trabalhada em diversos momentos,
haja vista que ela tende a atender aos mais diversos objetivos:
161
A partir das respostas dos professores fica a impressão de que a leitura é um
conteúdo à parte dos demais, não se pensa em leitura de uma forma interdisciplinar.
Analisando algumas respostas, percebemos que prevalece ainda no planejamento
dos professores a preocupação de como avaliar a leitura e de quais conteúdos
podem ser explorados a partir dela. Ainda não há o consenso de que o gosto pela
leitura pode ser desenvolvido e que essa é uma atividade que tem que ser mediada
pelo professor. Nesse sentido, Geraldi, ao abordar os problemas do trabalho com a
leitura em sala de aula, assim se posiciona,
Somando-se a isto tudo alguns outros enganos metodológicos
comuns ao ensino de Língua Portuguesa em nossas escolas (entre
outros, exemplifico com o que chamo de imediatez de resultados –
leu não escreveu o pau comeu: leu, responda às perguntas; leu,
escreva um texto no mesmo gênero; leu, pesquise sobre o tema etc.
– que revelam a expectativa de um resultado desejado como
imediato após a leitura); a leitura deve ter se tornado uma coisa
muito chata, a se dar ouvidos aos "aliciamentos" que tentamos todos
fazer para "conquistar" leitores (GERALDI, 1988, p. 83).
Conforme diz Geraldi, a leitura tem servido para avaliar a escrita ou a
oralização do que é lido. Infelizmente, não temos pensado no trabalho da leitura
como meio para desenvolver o gosto e o hábito pela leitura.
Percebemos, ainda, nas respostas dos professores que não há a
preocupação com a mediação nos momentos em que eles relatam trabalhar a
leitura. Falta, algumas vezes, por parte do professor a estimulação do aluno para a
leitura. Azambuja assim se posiciona, a esse respeito:
Papel importante desempenha nesse processo o professor-incitador
e mediador. É necessário, pois, que o professor tenha em mente que
fundamental é conhecer e detectar as dificuldades de compreensão,
assim como resolvê-las. Na memória, estão armazenados todos os
nossos conhecimentos lingüísticos e extratextuais: conceitos,
ideologia e aspectos sociais, entre outros. Quando o professor ativa
esses conhecimentos em seus alunos, desperta neles o interesse
pelo texto a ser lido, predispondo-os à leitura (AZAMBUJA, 1996, p.
156-157).
Conforme o que é destacado pela autora, o professor precisa ter a clareza do
seu papel de mediador durante as atividades de leitura, pois, muitas vezes, são
162
perdidas grandes oportunidades de incentivar a leitura, e isso com medidas simples
como a ativação do conhecimento prévio.
Nas respostas dos professores C, E, H, K e M, há a valorização da leitura em
voz alta. De acordo com Kleiman (2004), é um ótimo exercício para avaliar se a
criança aprendeu pontuação, a correspondência letra/som, contudo ela não serve
para avaliar a compreensão. Nesse caso, percebemos que esses professores
valorizam aspectos da concepção ascendente de leitura.
Indagamos os professores se eles sabem o que os documentos norteadores
para o ensino (Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN e o Currículo do município
de Cascavel) dizem sobre o trabalho com a leitura.
Quadro 15 – Conhecimento sobre os documentos norteadores do ensino
Você sabe o que os documentos norteadores para o ensino (Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN) e Currículo do Município de Cascavel) dizem sobre o trabalho com a leitura?
Número de professores
Não.
1 (N)
Sim, mas só sei o que dizem os PCN.
-
Sim, mas só sei o que diz o Currículo do
7 (M, D, L, G, E, P, A)
Município de Cascavel.
Sim,
sei
o
que
dizem
esses
dois
7 (K, B, O, J, H, F, C)
documentos.
Não respondeu.
1 (I)
Fonte: correspondente à questão n. 16 do questionário (apêndice 1).
Para compreender essa indagação e os números que aparecem no quadro é
importante esclarecer algumas questões referentes aos documentos que norteiam o
trabalho com a leitura.
No ano de 1990, o estado do Paraná publicou o Currículo Básico para
educação pública do estado. Esse documento regia a educação em nível
Fundamental Anos Iniciais e Finais e Ensino Médio, sendo que, na época,
denominavam-se Séries do Primeiro Grau e Segundo Grau. Durante quase duas
décadas, o município de Cascavel utilizou esse documento enquanto referência para
o trabalho educativo. Contudo, no ano de 1997 o governo federal lançou
os
Parâmetros Curriculares Nacionais, sendo que este documento tinha por objetivo
traçar os conteúdos mínimos que deveriam ser trabalhados em cada Série/Ano.
163
Desse modo, esse documento não foi imposto aos estados e municípios, mas
deveriam servir de referência para que cada rede elaborasse a sua proposta ou
currículo.
Em Cascavel, no ano de 2005, iniciaram-se as discussões juntamente com a
Associação dos Municípios da Região Oeste do Paraná (AMOP) para construção de
um currículo que atendesse às necessidades dessa região. No entanto, devido às
próprias mudanças de governo e de equipe pedagógica da Secretaria Municipal de
Educação, em 2007, Cascavel, decidiu desvincular-se da AMOP para elaborar o seu
currículo próprio.
Assim, Cascavel tem hoje um documento próprio que rege a educação do
município, que é o seu currículo, o qual apresenta as concepções filosóficas e
teóricas para a educação e os conteúdos a serem trabalhados em cada ano do
Ensino Fundamental Anos Iniciais. Dessa forma, muitos professores e mesmo as
escolas não levam em consideração os demais documentos da esfera nacional e
estadual.
Também inquirimos os professores se eles sabem o que o Projeto
Pedagógico (PPP) da escola em que cada um atua diz sobre a leitura. E quanto ao
conhecimento desse documento obtivemos os seguintes dados:
Quadro 16 – Conhecimento sobre o projeto político pedagógico da escola
Você sabe o que o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola em que você trabalha diz
sobre a leitura?
Não.
2 (L, D)
Sim.
14 (C, A, P, E, G, F, H, I, J, O, B, K, M, N)
Fonte: correspondente à questão n. 20 do questionário (apêndice 1).
Como percebemos, quase a totalidade dos professores afirmam ter
conhecimento do PPP da escola. O professor D, que marcou não saber o que o
documento dizia, acrescentou à sua resposta que naquela semana pegou-o para
fazer a leitura.
De acordo com Silva,
Na dimensão organizacional ou institucional, podemos dizer que as
atividades do professores voltam à construção coletiva do projeto
político-pedagógico da escola e a sua execução através das
164
atividades curriculares. Esse projeto aponta a direção comum a ser
perseguida e as ações didáticas para chegar às metas da instituição
(SILVA, 2009, p. 27).
Conforme citação do autor, percebemos que as escolas têm buscado fazer
um trabalho coletivo com o PPP, tornando-o um documento de produção coletiva e
de acesso a todos os professores. Assim, torna-se muito mais fácil ao professor
conhecer o documento e colocá-lo em prática.
Para favorecer o trabalho com a leitura é importante que a escola possa
oferecer estrutura para esse trabalho. Para delinear como estão organizadas as
escolas, solicitamos aos professores que respondessem a seguinte pergunta: a
escola em que você trabalha possui estrutura adequada para o trabalho com a
leitura?
Justifique a sua resposta.
As respostas e as justificativas apresentadas foram às seguintes:
Quadro 17 – Considerações sobre a estrutura oferecida pela escola para o trabalho
com a leitura
Sim
7
(L, H, F, G, P, O, M, K)
Não
4
(D, E, N, B)
Poderia ser melhor
1(I)
Parcialmente
3
(J, A, C)
Biblioteca com horários exclusivos;
Bom acervo;
Contador de história, declamação de poesia, oratória;
As dependências da escola são apropriadas e adequadas a
todos os alunos;
Temos livros pedagógicos, biblioteca, informática, momentos
para leitura diversificada e inclusive reforço para recuperação
das defasagens de leitura e Língua Portuguesa;
Há diversos tipos de literatura, a biblioteca é bem equipada e
disponibiliza empréstimo e eu como professora empresto
quando o aluno solicita;
Biblioteca arejada, iluminada, limpa, bons livros, a monitora da
biblioteca é dinâmica e atenciosa.
A escola está em reforma;
Existem todos os recursos que podem ser utilizados pelo professor,
mas a biblioteca está fechada pela falta de profissional e o espaço
nas salas são obstáculos para a leitura de forma mais dinâmica e
interativa;
O espaço é pequeno.
Na biblioteca é preciso melhorar o acervo e fica muito tempo sem
profissional. Desse modo a leitura fica na maior parte do tempo
restrita a sala de aula, não que aí não possa ser realizada, mas a
biblioteca é um local imprescindível.
Se oferecesse uma diversidade de textos como Xérox, livros para
empréstimo.
A escola está sem monitor de biblioteca o que impossibilita aos
alunos de frequentar a biblioteca, porém a força de vontade da
direção e coordenação fez com que montássemos um cantinho de
leitura na hora do recreio com a participação dos professores.
Porque a biblioteca não está em funcionamento desde de 2012 e há
pouco espaço para exposição de textos. A escola está em reforma.
165
A escola possui biblioteca com um bom acervo de livros, mas o
atendimento aos alunos não ocorre devido à falta de profissional. Os
professores regentes utilizam a sala de aula para momentos de
leitura.
Porque só a biblioteca às vezes não oferece condições de ter
profissional
à
disposição
devido
às
reformas
físicas
existentes/ocorridas. Mas, sempre se consegue oferecer aos alunos
materiais variados para leitura.
Fonte: correspondente à questão n. 21 do questionário (apêndice 1).
Ao pensar na estrutura adequada para trabalhar a leitura, a maioria dos
professores faz referência ao espaço da biblioteca escolar. Dá a impressão de que
para a maioria, a biblioteca seria o único lugar onde a leitura pudesse acontecer. Há,
ainda, a valorização da oralização da leitura. Verificamos isso quando os
professores consideram como incentivo à leitura atividades como sarau de poesia,
oratória e contador de história.
A próxima questão traz respostas que se assemelham às anteriores, por isso,
consideramos que os comentários que faremos após a apresentação do quadro de
respostas sirvam para as duas questões.
A última questão perguntava se a escola em que o professor trabalha
incentiva o trabalho com a leitura e, em caso afirmativo, solicitamos a eles que
descrevessem como isso ocorre.
Ao responder a essa questão apenas uma pessoa relatou que a sua escola
não incentiva o trabalho com a leitura, duas pessoas posicionaram-se dizendo que
parcialmente, as demais responderam afirmativamente. O quadro seguinte traz as
justificativas apresentadas pelos professores.
Quadro 18 – Incentivo proporcionado pela escola para o trabalho com a leitura
Sim
Leitura semanal na biblioteca;
14 (B, K, N, M, O, C, P, E, G, F, I, J,
Horário estipulado na escola para leitura em sala de aula;
L)
Contador de história;
Noite cultural;
Feira do livro;
Oratória;
Cantinho da leitura na hora do recreio;
Acervo de livros da biblioteca;
Sarau de poesia;
Há livros nas salas e momentos para leitura;
Encaminhamentos individuais dos professores;
166
Hora cívica;
Atividades pedagógicas extras como visitas a museu,
emissora de TV e outros;
Apresentações em datas comemorativas;
Informática educacional;
Aulas com foco na Língua Portuguesa;
Trabalho coletivo dos professores;
Incentivo da coordenação e da direção;
Há livros disponíveis na sala para leitura, assim que vão
terminando as atividades;
Uma vez por semana uma professora faz a leitura com os
alunos.
Parcialmente
Havia mais incentivo antes da reforma. Ao bater o sinal na
2 (A, D)
entrada
da
aula,
semanalmente
direção/coordenação/professores contavam gradativamente
partes de uma história infantil. No mural havia sempre
informações sobre a escola, dicas de livros para empréstimo,
piadas e adivinhas.
Apenas na questão de ritmo, entonação e fluência.
Não
Todo trabalho é fruto do professor, não há incentivo da
1 (H)
equipe pedagógica, apenas acesso aos livros concedidos ao
professor.
Fonte: correspondente à questão n. 22 do questionário (apêndice 1).
De acordo com as justificativas apresentadas pelos professores, percebemos
que eles atribuem à biblioteca grande responsabilidade pelo trabalho com a leitura.
Villejo e Ribeiro afirmam que ―O papel da biblioteca escolar é ser um apoio ao
sistema educacional, caracterizada pelo incentivo à leitura para os alunos‖.
(VILLEJO; RIBEIRO, 2012, p. 4). O trabalho com a leitura, portanto, não pode
resumir-se apenas às aulas na biblioteca, pois os textos selecionados pelo professor
e a forma como ele encaminha a leitura em sala de aula são relevantes para a
formação do leitor.
Há outras atividades relatadas pelos professores nas quais eles consideram
como incentivo à leitura as contações de história, os textos que são afixados no
mural para leitura, sendo que essas não são atividades mediadas pelo professor.
Azambuja nos leva a refletir sobre o papel do professor quando diz que,
167
É importante que o professor esteja atento, verificando se há, por
parte dos alunos, participação efetiva e interação absoluta frente ao
texto. Desse modo, através de levantamento de hipóteses na busca
da compreensão, o aluno irá atuar realmente sobre o texto,
transformando o ato de ler em uma ação produtora de sentidos
(AZAMBUJA, 1996, p. 157).
Segundo Solé, ―o importante é pensar que, por um lado, os alunos e alunas
sempre podem aprender a ler melhor mediante as intervenções do seu professor
[...]‖ (SOLÉ, 1998, p. 117).
Outra resposta que nos leva a refletir, diz respeito ao relato de professores
que consideram como incentivo à leitura os livros que ficam na sala e que os alunos
podem fazer a leitura quando terminam a atividade. No entanto, isso é algo a se
pensar, pois, de acordo com Solé (1998) e Kleiman (2009), é importante que os
alunos tenham objetivos claros para ler. Acreditamos, portanto, que ler só para
passar o tempo enquanto os demais colegas terminam as suas tarefas não serve de
motivação para desenvolver o gosto pela leitura, nem para assegurar a
compreensão.
3.3 Análise documental
Conforme apresentado no capítulo do percurso metodológico, em nossa
pesquisa faríamos a análise documental. Os documentos analisados são os planos
de aula elaborados por três docentes, sendo estes elaborados em dois momentos:
antes da formação e após a formação. Na sequência, apresentamos os resultados
dessa análise.
3.3.1 Planos de aula anteriores à formação
De acordo com o que já foi explicitado no capítulo da metodologia, nesse
trabalho analisamos a concepção de leitura que subjaz a prática docente de
professores do 5º ano do Ensino Fundamental, para tanto, na formação que
propusemos aos professores, solicitamos a eles que elaborassem um plano de aula
168
(apêndice 3), no primeiro encontro, antes de iniciarmos as oficinas. Acreditávamos
que essa atividade nos daria respaldo para estabelecer em qual ou quais
concepção(ões) de leitura as atividades elaboradas se enquadrariam, bem como
para perceber os objetivos de leitura que cada profissional propõe aos seus alunos
quando solicita essa atividade.
Para realizarmos a análise, selecionamos três planos de aula, sendo que,
para fazer essa seleção, observamos entre os planos aqueles que elaboraram
atividades para a tira proposta que proporcionasse inferir como o professor
trabalharia com a leitura. Também selecionamos três professores que participaram
das cinco oficinas. Considerando todos os planos de aula recolhidos, sentimos a
dificuldade para selecionar três, pois a maioria dos docentes não registrou as
questões que fariam a partir da tira, tanto que o professor A será um exemplo disso
nessa análise. Quando planeja a aula, percebemos que esse professor, a exemplo
de outros do grupo, descreve como seriam seus procedimentos passo a passo da
aula. No entanto, não deixa evidente a pergunta que faria. Contudo, pela forma
como descreve, é possível deduzir os questionamentos que seriam realizados aos
alunos.
Manteremos, nesta seção, a mesma denominação atribuída aos professores
na análise do questionário, assim, selecionamos os seguintes profissionais: A, F e J.
Retomando os dados levantados na análise do questionário, constatamos que
A tem 1 ano de experiência com 5º ano e tem 12 anos de trabalho na rede municipal
de ensino; F tem 4 anos de experiência no 5º ano e 10 anos na rede municipal de
ensino e J 5 anos de experiência com o 5º ano e está há 7 anos na rede municipal
de ensino. Os profissionais selecionados já têm uma caminhada na rede municipal
de ensino que é superior a cinco anos e, embora A tenha apenas um ano de
experiência no 5º ano, já atua há 12 anos como professora da rede municipal,
portanto, tem bastante experiência como docente.
Solicitamos a elaboração do plano de aula e atividades para trabalhar a leitura
no 5º ano do ensino fundamental. Ao apresentar o objetivo que tinham para a aula a
ser proposta tivemos os seguintes dados:
Compreensão da estrutura do gênero e sua função e do discurso
direto e indireto. Empregar corretamente os sinais de pontuação (! ?,
...), parágrafo e travessão (Docente A, 28/02/2013).
169
Observamos que nesse relato há a previsão de trabalhar com a estrutura do
gênero discursivo/textual, porém não há, pelo menos, explicitamente a preocupação
com a compreensão leitora, pois a apropriação do gênero não significa apropriação
do conteúdo contido nele. E como a ênfase no trabalho docente consiste em
questões gramaticais, percebemos que aparece a pretensão de explorar o discurso
direto e indireto e a pontuação. É claro que entendemos que isso seja relevante,
pois, se não houver a apropriação dos elementos gramaticais e estruturais da língua,
pode haver dificuldade na compreensão do texto a ser lido. Contudo, entendemos
que o texto não pode ser utilizado apenas como pretexto para atividades de estudo
da língua, sendo necessário que primeiro o seu conteúdo seja bem explorado.
O professor F apresentou o seguinte objetivo:
Desenvolver a leitura, bem como a compreensão das informações
presentes no texto, com segurança e rapidez (Docente F,
28/02/2013).
Nesse objetivo, percebemos que a preocupação com a leitura fica mais
evidente. Teremos que observar no encaminhamento da aula o que F denomina
como desenvolvimento da leitura, se isso se remete à leitura em voz alta ou se se
trata da compreensão em si, pois, pelo que o professor apresenta, pode dar margem
a essas duas práticas. Quando diz ―Desenvolver a leitura‖, o que está considerando
como leitura a passagem do escrito para o oral? Ou considera, conforme Colomer e
Camps, que “Ler é entender um texto[...] (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 29 grifos
das autoras). De acordo com essas autoras, as escolas têm priorizado atividades de
leitura que se distanciam da compreensão do texto e isso se evidencia, segundo
elas, pelas atividades pautadas pela concepção ascendente de leitura, que nem
sempre consideram o texto em sua totalidade para a leitura, ou seja, trabalham
apenas com fragmentos, frases ou palavras.
O professor complementa seu objetivo dizendo:
[...] bem como a compreensão das informações presentes no texto
[...] (Docente,F, 28/02/2013).
170
Acreditamos que, nesse trecho do objetivo, realmente esteja remetendo a
compreensão, mas será que se considera que ler não é compreender as
informações e os possíveis sentidos do texto? Por fim, o professor apresenta:
[...] com segurança e rapidez (Docente F, 28/02/2013).
Aqui mais uma vez há a dúvida se a ênfase do professor consiste na fluência
e ritmo da leitura ou se na compreensão do que está dito, pois falar em segurança e
rapidez na leitura pode remeter à leitura em voz alta. Ao analisar como esse
professor organizou a sua aula, buscamos as respostas ao que foi priorizado em sua
aula: a compreensão ou a oralização do texto.
O professor J traça como objetivo:
Levar o aluno a identificar as ideias do texto, conhecer as
especificidades e características dele; Desenvolver e ampliar as
ideias (Docente J, 28/02/2013).
Esse professor apresenta como objetivo principal a identificação das ideias do
texto, que supomos ser a ideia principal contida nele, e também faz referência ao
gênero quando diz ―conhecer as especificidades e característica dele‖. Solé (1998)
diz que é muito importante o trabalho de identificação da ideia principal em sala de
aula, mas assevera que, acima de tudo, esse processo de localização deve ser
ensinado, isso por meio de atividades que a autora chama de compartilhadas e que
nós compreendemos como sendo ações de mediação do professor. O professor J
ainda espera que, por meio da leitura e do seu trabalho de mediação, possa ampliar
as ideias de seus alunos.
É claro que a partir do que os professores apresentaram como objetivo,
realizamos as nossas inferências a respeito do que acreditamos que eles pretendem
desenvolver a partir do trabalho com a leitura da tira, contudo nossas previsões
serão confirmadas ou não de acordo com os encaminhamentos metodológicos e
atividades propostas pelos docentes.
Ao olharmos para os conteúdos elencados pelos docentes, percebemos a
nítida relação com o objetivo apresentado. Nesse sentido, o professor A, que
demonstrou em seu objetivo ênfase maior ao gênero discursivo/textual e com
aspectos relacionados à pontuação, elencou os seguintes conteúdos: Leitura:
171
entonação, ritmo e fluência, interpretação, decodificação. Escrita: discurso direto e
indireto e sinais de pontuação.
Observamos que A, ao relacionar o conteúdo, voltou-se mais para uma
concepção ascendente de leitura, pois embora diga que vai fazer a interpretação do
texto, ele fala em decodificação. Portanto, somos levados a inferir que há grande
preocupação com a oralização da leitura, pois aparecem como conteúdos:
entonação, ritmo, fluência e decodificação. Tendo em vista que a aula proposta
deveria ser para o 5º ano supomos que a decodificação do texto fosse algo já
dominado pelos alunos e que, destarte, o professor deveria ocupar-se com questões
que vão além da decodificação. O professor ainda destaca conteúdos que fazem
parte do eixo da escrita, ou seja, percebemos a dificuldade dos professores em
pensar em uma aula voltada para a leitura, pois sempre se busca atrelá-la a outros
eixos da língua portuguesa, não que essa relação não seja válida e importante,
contudo a nossa proposta estava relacionada à leitura.
O docente F mantém ênfase na leitura e, desse modo, cita como conteúdo:
leitura, compreensão e tema presentes no texto. Observamos que, quando o
professor elenca o conteúdo, apresenta, além do aspecto da leitura e da
compreensão que já constaram no objetivo, também o tema. O tema pode ser
entendido como idéia principal do texto ou mesmo como conteúdo temático, sendo
este definido por Bakhtin (2003), mas só teremos a confirmação de que tema é
proposto pelo professor na sequência da aula.
O
professor
J
propõe
os
seguintes
conteúdos:
Especificidades
e
características da tira; Identificação de ideias implícitas e explícitas do texto;
Consistência argumentativa; Concordância verbal; Pontuação e expressividade;
Produção textual. Percebemos que relacionado ao eixo da leitura especificamente
aparece a identificação das ideias explícitas e implícitas, os demais conteúdos estão
relacionados à escrita, com exceção de especificidades e características da tira que
envolve a leitura, pois conhecer o gênero a que o texto pertence, quem produziu e
em que contexto social auxilia na compreensão leitora.
Conforme observamos nos conteúdos apresentados pelos professores acima,
apenas F não destaca conteúdos relacionados a aspectos gramaticais, assim,
conforme Menegassi, para haver a compreensão leitora, o leitor precisa dominar
alguns aspectos, nesse sentido, o autor assevera:
172
Compreender um texto é captar sua temática; é resumi-lo. Para que
isso aconteça, o leitor deve conseguir reconhecer as informações e
os tópicos principais do texto, assim como, também, dominar as
regras sintáticas e semânticas da língua usada. Além, disso, é
fundamental que o leitor conheça as regras textuais do gênero que
está lendo, para depreender a significação pretendida pelo autor [...]
(MENEGASSI, 2010, p. 45).
Espera-se, portanto, que os dois professores tenham essa clareza de que o
conhecimento sobre o gênero e a gramática textual seja aliado para a compreensão
do texto em questão. Se não for desse modo, não há sentido no trabalho gramatical.
Queremos, desse modo, afirmar, com base nas palavras do autor, que
reconhecemos a importância da gramática textual.
Conforme já destacamos anteriormente, ao olhar para o objetivo e para o
conteúdo proposto pelos professores, fizemos nossas deduções a respeito do que
acreditamos que eles poderão desenvolver em sua aula, e agora passaremos a
olhar para o encaminhamento metodológico proposto, pois nele acreditamos que
haverá as confirmações ou não daquilo que prevemos.
Vejamos o professor A: O professor não fala em atividade de pré-leitura, mas
aparentemente propõe essa atividade, pois, em seu encaminhamento diz que irá
apresentar a tira, realizar questionamentos sobre os balões, personagens. Na
sequência, propõe a leitura da tira, sendo esta realizada pelo professor e durante a
leitura enfocam-se os sinais de pontuação:
Questionar o que ocorreu com a árvore e se já leram outros textos
sobre desmatamentos, queimadas. Explicar a estrutura desse gênero
(apresentar outros textos com o mesmo tema e outras tiras),
desenvolver perguntas no caderno, atividades para transformar
discurso direto em indireto, partindo do próprio texto, atividades de
pontuação, produção escrita coletiva e individual de tiras com
reestruturação coletiva e individual (Docente A, 28/02/2013).
Esse foi o encaminhamento apresentado por A. Se retornarmos à resposta
desse professor quando questionamos o que ele entende por leitura, a afirmação foi
a seguinte: ―A compreensão da mensagem do locutor/autor.‖ Analisando essa
resposta e o encaminhamento apresentado pelo professor, percebemos que há um
predomínio da concepção ascendente de leitura, pois há preocupação com a
decodificação do texto e as atividades se centram na linearidade do texto.
173
Embora não sejam apresentadas as questões que o professor apresentaria
para o texto, ele enfatiza os aspectos formais da língua, como os sinais de
pontuação e o discurso direto e indireto, sendo estes os aspectos que mais se
sobressaem em sua aula.
Após
ser
realizada
a
leitura
do
texto,
percebemos
que
em
seu
encaminhamento são apresentadas duas questões e podemos dizer que uma é
ascendente e a outra descendente: O que aconteceu com a árvore? Você já leu
outros textos sobre desmatamento e queimadas?
Percebemos que o texto serve de pretexto para o trabalho com a língua e
para discutir questões relacionadas aos conteúdos da disciplina de Ciências, não
que essa interdisciplinariedade não seja importante, no entanto, a produção de
sentido a partir da leitura do texto deveria ser mais explorada.
O professor F, ao propor questões para a tira, mantém-se em uma concepção
ascendente de leitura. Antes, porém, de propor as perguntas, apresenta os
encaminhamentos que teria para a aula, os quais seriam:
Após a distribuição da tirinha do Penadinho de Maurício de Sousa,
pedir a leitura silenciosa de todos e em seguida que eles comentem
o que entenderam com o colega. Após 10 minutos solicitar
novamente o que entenderam, se perceberam a importância do tema
para a vida futura do planeta (Docente, F, 28/02/2013).
Nesse trecho do encaminhamento feito pelo professor, percebemos marcas
de uma concepção ascendente de leitura, pois, de acordo com Leffa, nessa
abordagem de leitura ―o mais competente pode ditar o significado ao menos
competente, incluindo a situação típica de sala de aula, onde o texto significa aquilo
que o professor diz que ele significa.‖ (LEFFA, 1999, p. 19). Conforme observamos
na aula, o que se pretende é que os alunos primeiro discutam em dupla o que
entenderam do texto e, após alguns minutos, o professor retoma a discussão para
novamente solicitar o que os alunos entenderam e espera que eles percebam a
importância do tema para a vida futura do planeta. No entanto, o autor está
apresentando o retrato do que já existe, as causas do desmatamento já são sentidas
nos dias atuais. Percebemos, portanto, que o professor não espera fomentar o
debate sobre o tema apresentado, ou seja, não permite que os alunos exponham o
174
significado que o texto teve para eles, mas quer que se perceba aquilo que ele
acredita.
Das questões apresentadas pelo professor, constatamos que a maioria delas
se enquadra em uma abordagem que tem o foco no texto, vejamos as questões
elaboradas:
1- Quais são os personagens presentes na tirinha?
2- Onde estão estes personagens?
3- Sobre o que eles estão falando?
4- Qual é o personagem que aparece somente no último quadrinho?
5- O que aconteceu com ele?
6- Há algum culpado pelo que aconteceu com o personagem do último
quadrinho?
7- Elabore um parágrafo manifestando sua opinião sobre o tema.
As questões 1, 2, 3, 4 e 5 são classificadas como ascendentes, pois
requerem apenas que o leitor localize as informações no texto. E como se trata de
uma tira deve-se estar atento ao conteúdo verbal e ao não verbal presente nele.
Observamos que para responder as questões 1, 2 e 4 os alunos deverão olhar para
o não verbal, ou seja, para a ilustração da tira e para isso não precisam estabelecer
nenhuma relação da imagem com conhecimentos que já tenham, basta
simplesmente verificar quais são os personagens, onde eles estão e a questão 3 já
remete para o último quadrinho, facilitando ainda mais a localização. Para responder
à questão 3, deve-se ler os textos dos balões, mas logo no primeiro deles já é
possível encontrar a resposta. A questão 5 poderia ter sido elaborada de uma forma
que proporcionasse a interação maior do leitor com o texto, mas como pergunta
diretamente o que aconteceu com a árvore, levando-se em conta o recurso visual
será fácil perceber que se trata de uma morte por queimadas.
As questões de localização propostas pelo docente na atividade são, segundo
Menegassi, ―típicas da formação do leitor, que se prolonga pelos anos escolares até
o final da Educação Básica, incluindo-se o Ensino Fundamental II e o Ensino Médio‖
(MENEGASSI, 2010, p. 41). Dessa forma, inferimos pelas palavras do autor que
essas atividades são básicas para a formação do leitor, contudo, tendo em vista que
o 5º ano está no final do Ensino Fundamental I, as questões de leitura deveriam ser
aprofundadas passando a prever a interação do leitor com o texto.
175
As questões 6 e 7 estão solicitando a opinião do leitor, pois, na questão 6, ao
solicitar se há algum culpado pelo ocorrido com a árvore, deixará o aluno livre para
expor o que ele pensa. Essa questão poderia ser interacional se tivesse sido
elaborada de uma forma que contemplasse os conhecimentos prévios do leitor e as
informações presentes no texto, até mesmo se o professor tivesse acrescentado um
―por quê‖ ao final da questão.
Já a questão 7 é puramente descendente, pois o que se espera é que o
aluno dê a sua opinião sobre o tema apresentado no texto. É claro que
consideramos que as questões descendentes são interessantes para trabalhar a
formação da opinião e argumentação do leitor, porém temos que ter a clareza de
que esse tipo de questão não serve para avaliar a compreensão leitora, é uma
atividade de produção escrita.
Conforme
explicitado
na
análise
do
conteúdo
apresentado
por
F,
analisaríamos no encaminhamento metodológico se, ao falar sobre o tema, o
professor referia-se ao tema como proposto por Bakhtin (2003), que leva em
consideração o contexto de produção, o autor do texto para chegar à temática
proposta no texto, mas, pelo que foi possível observar no encaminhamento, o
professor tratou o tema como sinônimo de assunto.
No encaminhamento proposto, também foi possível observar que o objetivo
do professor em trabalhar a compreensão não foi atingido, haja vista que ele não
permite ao aluno a produção de inferências a partir do que é lido, o que é proposto é
apenas a localização de informações.
O professor J propôs o seguinte encaminhamento metodológico:
―Entregar uma tira para cada aluno ou colocar em transparência.
1º Leitura individual e posteriormente coletiva.
Questionamentos orais.
Apresentar as características e especificidades da tira.
Interpretação escrita envolvendo a identificação das ideias do texto, bem
como o conhecimento que o aluno tem do tema.
Atividades envolvendo pontuação e concordância verbal.
Produção textual.‖
176
Esse professor, além de propor a leitura individual, portanto silenciosa, que
seria para a identificação do texto, também relata que fará a leitura coletiva, e a
partir desta fará os questionamentos orais e escritos.
Após realizar a leitura coletiva são propostas as seguintes questões
(oralmente): ―Quem são os personagens? Onde estão? Sobre o que falam? São
fictícios ou reais? Que tipo de texto é? Como você descobriu? Embora,
aparentemente, não tenha consciência do que esteja fazendo, o professor propõe
atividades que Solé (1998) denominaria de atividades de pré- leitura.
O docente J ainda diz que antes de fazer a interpretação escrita apresentará
as características da tira. As questões propostas pelo professor foram:
1- Responda:
a) Qual o assunto do texto?
b) O texto traz um problema ambiental sério? Que problema é este?
c) O que a árvore quis dizer quando mencionou que no caso dela não foi
acidente nenhum?
d) Quais as causas prováveis ou possíveis para que haja tantas queimadas?
e) O que podemos fazer para evitar este problema?
2- Marque a alternativa correta:
a) Os personagens do texto morreram devido a:
(A) Fogo
(B) Susto
(C) Acidente
b) Quando Penadinho citou a palavra você, ele se referiu:
(A) ao fantasma
(B) a árvore
c) Os pontos de interrogação foram utilizados nas duas falas do Penadinho, por
quê?
(A) Referem-se ao susto.
(B) referem-se a uma pergunta.
3- Passe as frases a seguir para o tempo que se pede.
a) Eu morri, foi um acidente horrível. (futuro)
b) Mas no meu caso não foi acidente nenhum! (presente)
4- Propor aos alunos transformar a tira em um texto narrativo, acrescentando a
opinião deles sobre o tema.
Obs.: Antes dessa atividade poderá ser dada uma pesquisa mais aprofundada
sobre o tema.
177
5- Caso o professor não queira solicitar a produção escrita, poderá também
propor a confecção de um cartaz de alerta.
Na última atividade elaborada pelo professor J percebemos que há certo
desconhecimento do gênero, pois ao afirmar que se o professor não quiser propor
uma produção textual, que certamente deve se tratar de uma redação escolar,
poderá solicitar a produção de um cartaz de alerta, desconsidera, assim, que este
também é um texto, embora tenha uma extensão menor.
Mas,
analisando as questões propostas, percebemos que o professor
trabalha com questões que atendem as três concepções de leitura expostas neste
trabalho. As questões que são propostas na oralidade apresentam perguntas tanto
ascendente quanto interacional.
São ascendentes: Quem são os personagens? Onde estão? Sobre o que
falam? São fictícios ou reais? Já as questões: Que tipo de texto é? Como você
descobriu? Podem ser classificadas como interacionais, pois exigem que o leitor, a
partir do reconhecimento do texto, acione os seus conhecimentos prévios para
determinar a que gênero ele pertence.
No exercício 1, as questões ―a‖, ―b‖ e ―c‖ são interacionais, porque elas não
exigem, conforme Kleiman (2008), apenas o pareamento das palavras da questão
com as palavras idênticas no texto. Da forma como as questões foram elaboradas
pelo professor, ―o leitor poderá interagir com o texto, produzindo seus significados,
indo além das linhas do texto‖ (MENEGASSI, 2005, p. 33).
As questões ―d‖ e ―e‖ são classificadas como descendentes, pois exigem do
aluno que eles comentem sobre assuntos que não haveria a necessidade do texto
para elaborar a resposta. Colomer e Camps asseveram que essas questões
pertencem ao processamento descendente ―porque não atuam como anteriores, da
análise do texto à compreensão do leitor, e sim em sentido contrário, da mente do
leitor ao texto‖ (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 30).
Já no exercício 2 a letra ―a‖ é a única questão ainda de interpretação do texto,
pois as demais se referem a gramática textual. A questão ―a‖ é ascendente, haja
vista que apenas solicita que se identifique a causa da morte da árvore e do
fantasma e ainda o professor apresenta as alternativas, facilitando ainda mais a
resposta.
178
Como já dissemos no parágrafo anterior, as demais atividades propostas pelo
professor envolvem a gramática textual. Algumas são forçadas é o caso da atividade
3, em que se solicita a alteração do tempo verbal, no entanto, as frases não
apresentam coerência quando sofrem a alteração solicitada.
Percebemos que J apresenta questões que se inserem em sua maioria na
concepção interacional de leitura, embora apresente em sua aula questões
ascendente e descendente.
Assim, concluímos que A e F apresentam em sua aula o predomínio de
questões e encaminhamentos ascendentes, enquanto J elabora questões e
encaminhamentos que priorizam a interação entre texto-leitor-autor. O docente A,
conforme já citado, quando questionado sobre o que entende por leitura, apresentou
um depoimento que nos remete a uma concepção ascendente. J relatou que ler é:
Saber entender o que se vê e além do que se vê, a leitura abre as
portas para o conhecimento (Docente J, 28/02/213).
Percebemos que esse relato apresenta uma concepção interacional de
leitura, pois de acordo com Leffa (1996), a leitura consiste na ação de olhar para
uma coisa e ver outra e pelo que percebemos no plano desse professor, ele
apresenta atividades que mantêm essa concepção. F apresentou nessa questão o
seguinte relato:
Uma interação entre um texto e o leitor, capaz de informá-lo,
propiciar lazer, trazer informações sobre o cotidiano, bem como
instruir (Docente F, 28/02/2013).
Constatamos que essa concepção apresentada no questionário não se
confirma na elaboração do plano de aula.
O que verificamos, portanto, é que as práticas de leitura que visam à
compreensão leitora realizadas na escola ainda repetem o descrito por Colomer e
Camps:
A forma adotada com mais frequência para essa atividade nas aulas
é a de leitura de um texto oral ou silenciosa, seguida da resposta a
um questionário que interroga sobre o significado. Frequentemente,
as perguntas do questionário limitam-se a cobrar a lembrança
179
imediata de pequenos detalhes secundários e referem-se a
informações obtidas segundo o desenvolvimento linear do escrito.
Assim, o tipo de resposta resultante é o de uma simples verificação,
concisa e facilmente localizável no texto, mesmo que o leitor não o
tenha compreendido, já que não existe nenhum tipo de elaboração
pessoal nem implícita sua compreensão global (COLOMER; CAMPS,
2002, p. 72-73).
Assim, analisando os três planos de aula, inferimos que se mantém essa
concepção descrita pelas autoras e a escola ainda acredita que o fato de o aluno ler
oralmente bem e responder questões que exigem apenas a localização de
informações lhes garante a compreensão leitora. O que na realidade não acontece.
O que percebemos em nossa pesquisa é que os professores apresentam
dificuldade para pensar em uma aula de leitura e, devido a isso, a maioria deles não
se dispôs a elaborar as questões para trabalhar a leitura e preferiu elencar os
conteúdos que trabalhariam a partir do texto. E isso foi possível verificar nos planos
analisados, com exceção de F, que não abordou questões de gramática, A e J
demonstraram grande preocupação com esses aspectos.
3.3.2 Planos de aula posteriores à formação
Conforme análise dos planos de aula elaborados por A, F e J, percebemos
que A e F apresentaram atividades nas quais houve o predomínio da concepção
ascendente de leitura e J apresentou atividades nas quais predominou a concepção
interacional. Contudo, nosso objetivo, além de constatar a concepção de leitura que
norteia ao trabalho docente, pretendeu verificar se as cinco oficinas de formação
foram capazes de produzir alguma alteração no modo de conceber o trabalho com a
leitura.
Para atingir tal objetivo solicitamos aos professores que, no último encontro,
olhassem para o plano elaborado no primeiro encontro e ficassem à vontade para
realizar as alterações que julgassem necessárias. Assim, a partir de agora
analisaremos as alterações realizadas por esses três professores.
O professor A, ao reavaliar o seu plano de aula, apresentou alterações
inclusive no conteúdo proposto, no primeiro plano constava: leitura: entonação, ritmo
180
e fluência; interpretação, decodificação. Escrita: discurso direto e indireto e sinais de
pontuação. No segundo plano de aula constatamos que o professor apresenta como
conteúdo: especificidades e características do gênero; Linguagem verbal e não
verbal (balões). Observamos que o professor excluiu as questões relacionadas à
escrita e deteve-se ao gênero discursivo/textual. Também percebemos que foi
excluída do conteúdo a decodificação e acreditamos que isso se deve à formação,
haja vista que, nas oficinas, discutimos bastante as questões relacionadas à
decodificação e à compreensão textual.
Em relação ao encaminhamento, percebemos que o professor acrescentou a
atividade de pré-leitura. No primeiro plano, constatamos que o professor relatou que
faria questionamento a respeito dos balões, no entanto, ele não reconhecia que esta
etapa da leitura era a pré-leitura, sendo essa a etapa na qual o professor deve ativar
os conhecimentos prévios dos alunos, bem como motivar a leitura. Para exemplificar
essa fase, utilizamos os estudos de Solé e a autora pontua ―Com relação ao
conhecimento prévio, algumas coisas podem ser feitas para ajudar as crianças a
atualizá-lo‖ (SOLÉ, 1998, p. 105). Ainda abordando questões relacionadas à préleitura a autora orienta que nas aulas de leitura o professor deve:
Dar alguma explicação geral sobre o que será lido. [...]. Ajudar os
alunos a prestar atenção a determinados aspectos do texto que
podem ativar seu conhecimento prévio. [...] Incentivar os alunos a
exporem o que já sabem sobre o tema. [...] (SOLÉ, 1998, p. 105106).
Percebemos, portanto, que a oficina de estratégias, etapas e objetivos de
leitura proporcionou a reflexão do docente A e ecoou em sua prática. As questões
de pré-leitura elaboradas por ele foram: Pela imagem, sobre o que você acha que
eles estão conversando? O que será que ocorreu com a árvore?
O professor mantém a leitura feita a princípio em voz alta pelo professor,
depois a leitura em voz alta pelos alunos e a leitura apontada. Como observamos, a
leitura em voz alta permanece muito presente na escola. Colomer e Camps, ao
tratarem dessa oralização em sala de aula, afirmam:
[...] a análise do ato de leitura questiona decisivamente essa prática
que acostuma o aluno a adotar um comportamento diverso do que é
próprio de um leitor, já que não lhe permite, por exemplo, controlar a
leitura a partir da possibilidade de avançar e retroceder à vontade
181
para encontrar ou retificar informações. Ao contrário, obriga-o a
concentrar-se para conseguir boa oralização. A consequência dessa
atividade é que meninos e meninas não podem dedicar muita
atenção à finalidade real da leitura: a construção de sentido, e
habituam-se a decifrar mecanicamente sem procurar entender o
texto (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 68-69).
Percebemos que a leitura em voz alta não traz contribuições para a
compreensão do texto, contudo essa é uma prática que está muito arraigada nas
escolas. No entanto, acreditamos que o trabalho visando a reduzi-la, demandaria um
tempo maior de formação. Kleiman apresenta em seus estudos considerações que
julgamos pertinente em relação a essa questão:
Se, por exemplo, queremos descobrir se o aluno conhece as regras
ortográficas da língua, a leitura em voz alta é bom instrumento de
avaliação, considerando que a criança, para isso, deverá conhecer
as correspondências entre grafia e som. Se estivermos interessados
em saber se o aluno reconhece os valores dos diversos sinais de
pontuação, também a leitura em voz alta é adequada, porque a
evidência está na entonação com que se lê. Mas, se estivermos
interessados na capacidade da criança para compreender um texto,
fica difícil justificar a leitura em voz alta (KLEIMAN, 2004, p.152-153).
Com base nos estudos da autora, reconhecemos a relevância da leitura em
voz alta realizada na escola. Porém, é importante que o professor tenha em mente
que, quando cobra esse tipo de leitura, estará avaliando as questões de ordem
ortográfica e de pontuação, mas jamais poderá avaliar a compreensão leitora do
texto. Para avaliar a compreensão, a autora sugere o seguinte encaminhamento,
A leitura silenciosa, no entanto, excluindo a preocupação com a
pronúncia e entonação, permite à criança envolver-se totalmente na
busca de significados utilizando para isto seu próprio ritmo de leitura
e as regressões ou releituras que se lhe fizerem necessárias
(KLEIMAN, 2004, p. 153).
Na formação, procuramos manter esse posicionamento em relação à leitura
silenciosa e em voz alta, pois consideramos que, se a pretensão for avaliar a
compreensão, é necessário que haja o momento para o aluno ler o texto
silenciosamente, assim, é possível que depois se proceda à leitura em voz alta com
toda a turma, contudo, se a leitura for feita apenas dessa última forma não adianta o
182
professor propor questões de compreensão do texto. Também é importante destacar
que a leitura silenciosa para os alunos do 5º ano ainda pode admitir a leitura com
movimentos labiais, ou seja, a subvocalização, que é característico nessa fase.
O professor A nesse segundo plano de aula, apresentou questões que faria
aos alunos para interpretação da tira. Apresentamos a seguir como estava o
encaminhamento no primeiro plano e as perguntas formuladas no segundo plano:
Questões elaboradas no 1º encontro
Questionar o que ocorreu com a árvore e se
já
leram
outros
textos
sobre
desmatamentos, queimadas. Explicar a
estrutura desse gênero (apresentar outros
textos com o mesmo tema e outras tiras),
desenvolver
perguntas
no
caderno,
atividades para transformar discurso direto
em indireto, partindo do próprio texto,
atividades de pontuação, produção escrita
coletiva e individual de tiras com
reestruturação coletiva e individual
Questões elaboradas no último encontro
1. Qual foi a causa da morte do fantasma?
2. E da árvore?
3. Por que o fantasma diz ser acidental a
sua morte?
4. E por que a árvore disse que a sua morte
já não foi um acidente?
5. Pesquise no dicionário a palavra acidente.
Qual significado se encaixa melhor ao texto?
Veja que o professor conseguiu elaborar questões que são classificadas
como interacionais. A questão 1 e 2 apresentam resposta literal, contudo elas não
são copiadas exatamente iguais do texto, pois o aluno não pode dizer na questão 1,
por exemplo, que o fantasma morreu de fogo, mas deve dizer que foi vítima de um
incêndio. De acordo com Menegassi, para as questões de resposta literal: ―Todas as
respostas a essas perguntas são retiradas literalmente do texto, porém não são
copiadas, pois o aluno-leitor deve realizar um trabalho de interação com o texto para
produzir as respostas‖ (MENEGASSI, 2010, p. 8). Nesse sentido, podemos afirmar
que o aluno terá que fazer uma inferência para chegar à resposta correta.
As questões 3 e 4 podem ser classificadas em perguntas para pensar e
buscar. Segundo Solé, essas são ―perguntas cuja resposta pode ser deduzida, mas
que exige que o leitor relacione diversos elementos do texto e realize algum tipo de
inferência‖ (SOLÉ, 1998, p. 156).
Quanto à questão, 5 percebemos que o professor solicita aos alunos que
busquem qual o significado que melhor se adequaria ao contexto do texto e isso foi
muito comentado por nós, nas oficinas, pois buscar o significado de uma palavra
pode ser algo totalmente ascendente, se for solicitado apenas a busca dos
183
significados, porém se, além de buscar o sinônimo ter que analisar qual das
entradas se ajusta ao contexto, essa tarefa faz com que o aluno seja levado a refletir
a respeito do significado de determinada palavra naquela situação.
Outra questão que se evidenciou no segundo plano realizado por A é que ele
procurou focar na leitura, já que era isso que havíamos solicitado e excluiu, portanto,
as atividades relacionadas ao estudo da língua.
Constatamos que as oficinas proporcionaram algumas reflexões para o
professor A, já para o professor F não visualizamos tantas marcas da formação.
Esse professor manteve sua aula do modo como havia elaborado no primeiro
encontro. A única alteração que ele fez foi acrescentar o seguinte: Trabalhar o
gênero tira, focar mais na sua funcionalidade e intencionalidade.
A partir desse acréscimo do professor, somos levados a deduzir que o que
mais chamou a atenção dele foi a oficina sobre a leitura e os gêneros textuais, pois
nossa quarta oficina abordou esse tema a fim de mostrar que a leitura proposta em
sala de aula deve partir de situações reais/sociais de uso e como os gêneros
discursivos/textuais são a materialização de todo discurso, é impossível pensar na
leitura ou no trabalho com a língua que não ocorra por meio de gêneros. Essa
perspectiva também foi abordada na oficina que tratou sobre o letramento.
É claro que o professor poderia ter descrito melhor como trabalharia o gênero,
mas apenas destacou que abordaria a funcionalidade e a intencionalidade, ou seja,
qual é a função do gênero tira e a intencionalidade de quem o produz. Nesse
sentido, percebemos que o professor, pelo menos aparentemente, compreendeu
que é importante contextualizar o texto a ser trabalhado em sala de aula, buscando,
ao falar da intencionalidade, trazer aspectos do contexto de produção. E, ao abordar
a funcionalidade, apresentar qual a função social do gênero em questão.
O professor J fez algumas reorganizações em sua aula. Percebemos que ele,
assim como A, destacou a atividade de pré-leitura e acrescentou em sua aula:
―Fazer antes da leitura coletiva e individual‖, ou seja, quis marcar que tinha
consciência de que realizaria a atividade antes de ler o texto.
Para marcar essa atividade o professor reorganizou as questões que,
segundo ele, no primeiro plano de aula faria oralmente após a leitura, na sequência
transcrevemos como ficou a organização da aula, apresentando as questões que o
professor elaborou no primeiro plano e como foi reorganizado no segundo plano.
184
Responda:
Atividades de pré-leitura:
a) Qual o assunto do texto?
1. Que tipo de texto é esse?
b) O texto traz um problema ambiental
2. Onde estes textos circulam?
sério? Que problema é este?
3. Qual o público desse tipo de texto?
c) O que a árvore quis dizer quando
4. Quem são os personagens?
mencionou que no caso dela não foi
5. Onde estão?
acidente nenhum?
6. Sobre o que falam?
d) Quais
as
possíveis
causas
para
que
prováveis
haja
ou
7. São fictícios ou reais?
tantas
queimadas?
e) O que podemos fazer para evitar
este problema?
Observamos que o professor traz para a pré-leitura questões relacionadas ao
reconhecimento do gênero. De acordo com Solé, ―Pode-se considerar que informar
sobre o tipo de texto – ou superestrutura textual – que vão ler também é uma forma
de lhes proporcionar conhecimentos úteis para sua tarefa‖ (SOLÉ, 1998, p. 105).
Conforme verificamos na contribuição da autora, é importante que o aluno saiba que
tipo de texto irá ler antes de iniciar a leitura, pois, dessa forma poderá ativar
conhecimentos que lhe permitam compreender melhor o texto a ser lido. A autora
complementa dizendo que
[...] esta informação vai orientar os alunos para que eles saibam se
se trata de um conteúdo real ou de ficção; se nos informa sobre algo
que aconteceu recentemente ou se, ao contrário, descreve fatos do
passado; se ele vai nos expor determinados conceitos; se vai nos
ajudar a saber como podemos fazer alguma coisa (SOLÉ, 1998, p.
105).
Analisando as questões que J propõe para pré-leitura, percebemos que ele
tentou demonstrar que compreendeu a importância da ativação dos conhecimentos
prévios, contudo, ele trouxe todas as questões referentes ao gênero para essa
atividade. Ao fazer isso, trabalhou com a formulação de hipóteses que o aluno
185
deveria confirmar durante a leitura. Como foi possível constatar pela afirmação de
Solé, é importante que os alunos saibam a que gênero pertence o texto antes
mesmo de realizar a leitura, mas as questões referentes à circulação do gênero e ao
público alvo que pretende atingir poderiam ser realizadas ou retomadas após a
leitura.
E é claro que as questões elaboradas poderiam estar inseridas em um
processamento descendente, isso porque pretendemos na atividade de pré-leitura
ativar os conhecimentos prévios e levantar hipóteses a respeito do que será lido,
então, nesse caso, esse tipo de questão seria mais apropriado. Todavia,
percebemos que o professor sentiu a necessidade de trabalhar com a pré-leitura,
trazendo, assim, para seu segundo plano de aula marcas da formação.
As questões que o professor apresenta na pré-leitura também refletem o
trabalho com o gênero discursivo/textual, pois em seu primeiro planejamento não
demonstrou preocupação em contextualizar questões relativas à circulação e ao
público a quem o texto se dirige. Na primeira versão do plano de aula, o professor
pontuou que antes da interpretação apresentaria as características da tira e na
segunda, acrescentou que nessa apresentação das características da tira exploraria
o discurso e os recursos como os balões presentes nesse texto. Acreditamos que
isso seja reflexo da 4ª oficina, na qual abordamos os gêneros discursivos e a leitura.
Naquela oportunidade, explicamos que para haver a compreensão leitora, é
necessário dominar alguns aspectos relativos ao gênero, como é o caso da tira, mas
se o leitor não conhecer os tipos de balões que são comumente utilizados nesse
gênero, haverá a dificuldade para inferir o sentido do que está lendo.
Concluímos, portanto, que as oficinas deixaram algumas marcas nos
professores, embora tenhamos a clareza de que o tempo de formação foi limitado.
Por isso, para obter resultados mais significativos, seria preciso uma carga horária
maior. Contudo, foi possível encontrar vestígios da formação no segundo plano
elaborado pelos professores.
No quadro a seguir apresentamos o que ficou evidenciado da formação no
plano de aula dos docentes no final dos encontros:
Quadro 19 – Resultados da formação
Antes da formação
Não havia consciência das etapas de leitura
Depois da formação
É possível ver as etapas de leitura bem
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124 Assim, percebemos que nossa ação estava