Realidade Brasileira_________________________________________________________Capítulo 2
CAPÍTULO 2
O Brasileiro cordial
Imparcialidade ou cordialidade? Qual o perfil do
brasileiro ideal? É necessário ensaiar para se ter
a receita do sucesso?
Você sabe o sobrenome do seu melhor amigo? E daqueles amigos mais
afastados? Entre os seus colegas de turma ou de trabalho, você sabe o nome e o
sobrenome de quantos?
Quanto menos sobrenomes de amigos ou colegas você souber, mais perto
estará daquilo que o historiador Sérgio Buarque de Holanda caracterizou, em seu
livro Raízes do Brasil (1936), como o “homem cordial”.
Uma das principais características do povo brasileiro, segundo os
estrangeiros que nos visitam, é a hospitalidade. É algo muito comum ouvirmos de
pessoas de outros países que os brasileiros são muito afáveis, carinhosos, se
aproximam muito rapidamente de pessoas que lhe são estranhas e logo se tornam
seus melhores amigos.
Segundo Sérgio Buarque, estas atitudes do “brasileiro” (lembre-se de que
este historiador trabalha com “tipos ideais”, o que não quer dizer que todos os
brasileiros sejam iguais) decorrem de uma ampliação da esfera familiar. Assim, o
seu relacionamento com pessoas ou instituições tende a ser sempre com base na
emoção – a “cordialidade” não é sinônimo de boas maneiras, mas quer dizer que a
pessoa age com o “coração”, (em latim, cor). As relações sociais, neste modelo, são
baseadas em emoções extremas, amor e ódio. Veja, a este respeito, a seguinte
frase de Sérgio Buarque de Holanda:
O desconhecimento de qualquer forma de convívio que não seja ditada por
uma ética de fundo emotivo representa um aspecto da vida brasileira que raros
estrangeiros chegam a penetrar com facilidade.
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Ou seja, todo o convívio social (incluindo as relações profissionais, o contato
com instituições do governo etc) do “homem cordial” tem como base relações
pessoais, o nível de amizade. Por isso conhecemos as pessoas pelo seu primeiro
nome, e quase nunca nos damos conta de que não sabemos o seu sobrenome –
isto demonstra que nos aproximamos sempre do indivíduo, buscamos sempre uma
maior intimidade, rejeitamos os ritualismos e até desprezamos as “boas maneiras”.
Isto acontece em todos os níveis: podemos sempre nos referir ao nosso mestre
como professor João, ao nosso médico como doutor Marcelo, à nossa chefe como
senhora Cláudia. Mas nunca como professor Santos, doutor Carvalho ou senhora
Oliveira.
Outro elemento marcante no “homem cordial” descrito por Sérgio Buarque é o
uso do diminutivo. O Brasil é o país do “inho”. É conhecer alguém chamado Roberto
e logo passamos a chamá-lo de Betinho. É chegar um novo funcionário chamado
Pedro e logo todos no escritório o estão chamando de Pedrinho. Ao contrário do que
muitos dizem, o emprego do “inho” e da “inha” não demonstra, entre nós, que
prezamos menos esta pessoa. Significa, quase sempre, que temos (ou queremos
ter)0 exemplo, o caso de uma entidade religiosa muito respeitada entre nós, Santa
Teresa de Lisieux, que no Brasil virou Santa Teresinha! Ou o caso de uma
autoridade política, como a ex-governadora do Rio de Janeiro, chamada Rosângela
Matheus, mas conhecida apenas como Rosinha!
Segundo Sérgio Buarque, no Brasil, o rigor dos rituais se “afrouxa”, se
“humaniza” – tanto em questões religiosas quanto em questões políticas ou sociais.
Para o historiador, entretanto, a cordialidade não era necessariamente um valor
positivo. Ao contrário, era algo a ser superado, uma sobrevivência da nossa
formação agrária, rural. A “cordialidade”, segundo ele, impedia que os brasileiros
fizessem uma separação entre aquilo que é privado e o que é público (visível hoje
em dia em várias atitudes, principalmente as de alguns funcionários públicos ou
políticos, que se valem daquilo que é público como se fosse seu, ou favorecem
“amigos” a custa do dinheiro público). Para este homem cordial, que busca no
ambiente fora da família a convivência mais íntima possível, “a vida em sociedade é,
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de certo modo, uma verdadeira libertação do pavor que ele sente de viver consigo
mesmo”.
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TESTE SEUS CONHECIMENTOS
1. Segundo Sérgio Buarque de Holanda o brasileiro é um povo naturalmente
cordial. Você saberia apontar quais as razões de ser dessa cordialidade
nata?
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2. Você acredita que a cordialidade brasileira atrapalha seu desenvolvimento?
Justifique:
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