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A INDISSOCIABILIDADE ENTRE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO: PENSAMENTO E AÇÕES
DE PROFESSORES DE GRADUAÇÃO
Rita Buzzi Rausch – Unifebe
Rafaela Chierici - Unifebe
RESUMO
A expressão “indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão” está presente em várias propostas educacionais de
graduação em nível nacional e internacional. No Brasil, de acordo com Plano Nacional de Graduação (1999), ela faz
parte das principais diretrizes da Educação Superior. Entretanto, questiona-se: Qual o entendimento do professor
acerca do tema? O professor tem promovido atividades que contemple esta diretriz no seu ofício docente? Frente a
isso, essa pesquisa buscou investigar o pensamento e as ações dos professores de graduação, buscando identificar
qual o entendimento que eles têm acerca da indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão, bem como constatar
atividades que são desencadeadas por eles para a sua efetiva concretização no ato educativo. Nossa amostra foi
constituída por três professores de cada curso de graduação de um Centro Universitário, selecionados por meio de
sorteio, totalizando 40 profissionais. O instrumento de coleta de dados foi entrevista, gravada e transcrita, no qual
realizamos análise do conteúdo. Paralelamente, imprimimos os planos de ensino dos respectivos professores,
publicados on line, e procedemos análise documental. Os resultados apontam que o tema é pouco compreendido por
parte dos professores investigados e de complexa operacionalização no contexto educativo. Ficou evidenciado
também que há diferenças conceituais em relação ao termo e ao próprio conceito de ensino, de pesquisa e de
extensão isoladamente. Na prática, constatamos por meio dos planos de ensino, que a maioria realiza atividades de
pesquisa e extensão, mas, na sua maioria de forma desarticulada, predominando atividades de pesquisa. A extensão,
quando ocorre, é ainda compreendida, de maneira geral, em uma perspectiva puramente assistencialista, acontecendo
principalmente nos estágios ou em forma de eventos. A indissociabilidade fez-se presente somente nas disciplinas de
estágio. Os resultados apontam a necessidade de contemplar essa temática na formação contínua dos docentes,
buscando ressignificar suas concepções bem como discutir possibilidades na atuação docente.
Palavras-chave: Educação superior. Indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão. Formação de professores.
1 INTRODUÇÃO
As discussões do Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras, sistematizadas no
Plano Nacional de Graduação, reforçam que “as novas demandas da sociedade contemporânea exigem uma
formação que articule, com a máxima organicidade, a competência científica e técnica, com a inserção política e a
postura ética.” (PNG, 1999, p.12). Desta forma, a indissociabilidade entre o ensino, pesquisa e extensão é
evidenciada como a alternativa que melhor atende à formação desejada.
Frente a isto, busca-se hoje um ensino indissociável da pesquisa e da extensão, pois existe o entendimento de
que não cabe ao ensino somente a transmissão do conhecimento acumulado e o aprendizado não pode reduzir-se a
acumulação das informações, mas sim promover a capacidade criativa e inventiva que o conhecimento provoca. É
preciso que aconteça a produção do conhecimento. Conhecimento esse contextualizado, que tem origem e retorno à
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realidade social. Desta forma, entende-se a pesquisa e a extensão de fundamental importância para a revitalização
do ensino e reelaboração do conhecimento, bem como ser elas, de forma indissociável ao ensino, a real cultura que
as instituições de Educação Superior devem perseguir.
Nesse sentido, essa pesquisa buscou investigar: Qual o pensamento e as ações dos professores de graduação
acerca da indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão? Os objetivos principais dessa investigação foram
identificar o pensamento dos professores acerca da indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão na
graduação e analisar a presença de atividades que articulam ensino, pesquisa e extensão nos planos
de ensino dos docentes investigados.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
O Plano Nacional de Graduação (1999) apresenta uma concepção de indissociabilidade ensino, pesquisa e
extensão afirmando que “o que é indissolúvel pressupõe unicidade”. Pretende com isso superar a afirmação clássica
da “Universidade de pesquisa”. Reconhece a importância da investigação autônoma e a relevância dos institutos de
pesquisa. Entretanto vê a necessidade de superar a inadequação de um conceito de indissociabilidade que apenas
coloca lado a lado atividades que guardam certa autonomia, para afirmar a possibilidade real da unicidade entre
ensino, pesquisa e extensão, desta vez como princípio pedagógico.
Para a unicidade ensino, pesquisa e extensão e sua conseqüência para os novos processos de aprendizagem
à comunidade discente, faz-se necessária uma mudança, não simplesmente na concepção de ensinar, mas também na
compreensão de aprender, pois o aluno necessita ser estimulado a ter atitude questionadora e investigativa,
traduzindo o importante conceito pedagógico como “processo de aprender a aprender”.
A construção/produção de conhecimentos deve impulsionar o acadêmico, em sua dimensão individual e
social, a criar e responder aos desafios que enfrenta. Torna-se necessário desenvolver a atitude de aprender e recriar
permanentemente, retomando o sentido de uma educação contínua. Para atender a essa exigência, a graduação
necessita deixar de ser apenas o espaço da transmissão e da aquisição de informações, para transformar-se no
espaço de construção/produção do conhecimento, em que o aluno atue como sujeito de sua própria aprendizagem.
Se a relação entre “ensino-pesquisa” parece mais articulada, a extensão, é percebida como caminho a ser
mais explorado, até pela dificuldade de se enxergar com mais clareza a sua verdadeira função. O PNG busca
aproximar o conceito de extensão ao da inserção política e da postura ética. “As novas demandas da sociedade
contemporânea exigem uma formação que articule, com a máxima organicidade, a competência científica e técnica
com a inserção política e a postura ética” (PNG, 1999, p.67).
Outro conceito recorrente à extensão universitária, presente nos debates atuais, é aquele relacionado à
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etimologia da palavra: a “saída” da universidade para espaços específicos da sociedade, a partir de seu eixo próprio
de atuação. Quando se insiste no conceito de uma Universidade que se estende para outros espaços, para além
daqueles que a caracterizam, pode-se estar realizando simplesmente o ensino fora dos muros institucionais, não se
percebendo a relação deste ensino com um elemento que dele se distingue. Idêntico fenômeno ocorre quando,
valendo-nos de pessoas externas ao nosso corpo social ou de processos humanos, realizamos estágios acadêmicos
para a formação de nossos alunos. A sociedade entra, de certa forma, como objeto de nossa ação, estando
efetivamente a serviço de nossos fins educacionais.
O PNG vem em nosso auxílio ao explicitar a extensão a partir de outra matriz, “as demandas da sociedade
contemporânea” (1999, p 61), isto é, a extensão denota a necessidade de ação relacional e de diálogo da
Universidade com a sociedade, enfatizando “demandas da sociedade” em lugar de “serviços prestados”.
Buscando compreender a extensão, nessa perspectiva, vale citar aqui mais um parágrafo do PNG:
De qualquer forma, um papel se impõe à universidade contemporânea. Trata-se de sua função social. Aquela
que se orienta pelo direito de todos à vida digna. Mais ainda, no contexto desta nova sociedade do
conhecimento, a que propicia a ampliação democratizante do acesso a esse conhecimento. Ele deverá se
orientar, em primeira instância, não só pelos desafios tecnológicos, mas também pela questão ética que diz
respeito a toda a amplitude da existência humana. Assim, parece fundamental que a universidade, por todas
as suas ações, busque o equilíbrio entre vocação técnico-científica e vocação humanística. Nesta intersecção
parece residir o amplo papel de instituição promotora da cultura (1999, p.62)
Este é o mundo da extensão. É neste contexto, menos de serviço, e mais de parceria com a sociedade
orientada por uma opção ética a favor da vida, que ocorrerá, de modo indissociável, o ensino e a pesquisa. Trata-se
de um ensino impregnado pelos parâmetros fundamentais da investigação científica e com direção política e
orientação ética. Pois, este ensino e esta pesquisa se destinam, em última instância, à sociedade humana, não como
produto imposto por especialistas a não especialistas, mas como processo de parceria cúmplice, iluminado por
opções éticas a favor da vida de todos.
Faz-se necessário um convite à construção de uma Universidade fundada em nova cultura pedagógica, o que
inclui, necessariamente, nova direção ética para a produção do saber e a formação de novas gerações. Na
graduação, a indissociabilidade é traduzida como um princípio educativo e uma metodologia que contemple o
processo de produção do conhecimento através da dimensão investigativa e do contato com o real.
Desse modo, entender e praticar a indissociabilidade é mais do que envolver o aluno nas diversas atividades
(ensino, pesquisa e extensão). A concepção educativa deve ser aquela que compreende uma mudança de postura do
docente no interior de cada disciplina, assumindo a prática do ensino com pesquisa/extensão como princípio
educativo.
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A extensão é um processo educativo, cultural e cientifico que articula, o ensino e a pesquisa de forma
indissociável, porém, tem uma relação transformadora entre universidade e sociedade. A universidade entra em
contato com os problemas da comunidade, promove estudos em busca da solução destes problemas e propõe, até
mesmo, participa da resolução dos problemas. A Extensão deve ser uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado
à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um
conhecimento acadêmico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à
reflexão teórica, será acrescido ao seu conhecimento.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Inicialmente, fizemos um diagnóstico junto ao Registro Docente acerca dos nomes e número de professores
de cada curso de graduação que a instituição investigada atuava em seu campus sede. Em cada um dos quatorze
cursos de graduação oferecidos, sorteamos 3 professores, totalizando, inicialmente, 42 professores.
Após, contatamos com esses professores via telefone e agendamos uma entrevista, em local e horário mais
conveniente para os entrevistados. Cabe ressaltar que nesse contato, dois professores não aceitaram dar entrevista.
Assim, nossa amostra final foi de 40 professores.
Nosso instrumento de coleta de dados foi, portanto, uma entrevista. A entrevista utilizada foi a
semi-estruturada que segundo Laville e Dione (1999), pode ser conceituada como uma série de perguntas, feitas
verbalmente, em uma ordem prevista, mas na qual o pesquisador pode acrescentar outras perguntas de
esclarecimentos.
As entrevistas foram realizadas individualmente e gravadas em áudio com a prévia autorização dos
participantes. Elas foram transcritas na íntegra para procedermos a análise de conteúdo. Esta técnica de análise de
dados, segundo Bardin (1975), compreende procedimentos especiais uma vez que deve ser adequada ao domínio e
ao objetivo pretendido, sendo desta forma, reinventada a cada momento, o que não significa improvisação, mas sim,
adequação das técnicas no sentido de adaptá-las a cada situação.
Paralelamente, fizemos análise documental dos Planos de Ensino dos professores investigados, coletados on
line, com o objetivo de constatarmos a presença de atividades que articulam ensino, pesquisa e extensão na proposta
pedagógica pré-escrita por eles.
4 O DIZER DOS PROFESSORES
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Dentre os professores entrevistados constatamos que alguns têm claro o termo “indissociabilidade, ensino,
pesquisa e extensão”, embora salientem que é um conceito novo e que precisa ser melhor estudado e entendido por
todos. Destacamos abaixo um exemplo:
[...] então a questão se levanta no momento em que o professor está pensando sua disciplina, quando ele faz
seu plano de ensino, ou anteriormente ainda, quando o curso faz seu planejamento semestral, quando o
colegiado de determinado curso senta pra pensar o semestre, já tem que contemplar isso, ou seja,
deslumbrar as disciplinas para além da sala de aula. Então na verdade é o abrir a sala de aula. Quando você
pensa na pesquisa, você já expande e quando você pensa na extensão você expande mais ainda, passa a
pensar num universo, que é extra institucional, engloba o acadêmico e a vida dele lá fora e traz pra sala de
aula, traz o interesse que o acadêmico tem, ou as dificuldades que ele vivencia no seu trabalho ou em sua
comunidade. Aproveitar isso como um objeto de pesquisa e a partir daí o professor vai produzir seu
trabalho com mais propriedade e muito mais provavelmente dará resultado. Tudo isso articulado até pra
poder promover uma ação mais social que realmente tenha uma contribuição com a comunidade [...].
(Professor entrevistado).
Na fala do professor acima, percebemos o entendimento de que a indissociabilidade acontece no trabalho do
professor em sala de aula, na docência, e não algo fora desse contexto. Algo à parte do ensino, em que em alguns
momentos abrimos espaço para uma pesquisa ou fizemos um evento de extensão. Há o entendimento, também, de
que o ensino deve pautar-se em uma problemática real, contextualizada e interativa com a comunidade em que à
instituição está inserida.
Constatamos, também, que na opinião dos professores, a pesquisa está mais presente no contexto
pedagógico do que a extensão.
[...] eu ainda vejo muitas ações mais ligadas ao ensino e à pesquisa do que à extensão. (Professor
entrevistado).
A fala do professor acima nos remete a entender que a extensão é dentre as atividades, aquela que menos se
compreende e se pratica educação superior. Compreendemos que esta questão tem a ver com o próprio histórico da
universidade. O papel central da universidade no Brasil esteve por um longo tempo centrado ao ensino (como mera
transmissão e disseminação do conhecimento). Mais tarde surge a pesquisa (como uma atividade à parte do ensino),
e mais recentemente a atividade de extensão (embora, ainda entendida por muitos como meramente prestação de
serviços da universidade à comunidade). Ensino-pesquisa é algo mais presente no próprio discurso e entendimento
dos professores. Eles não têm muito claro como a extensão pode entrar nesse processo.
O professor abaixo, por exemplo, dá um destaque diferenciado à pesquisa, como sendo prioridade na sua
atuação e preocupação, não trazendo a extensão como algo tão importante quanto.
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Para mim, o conceito mais central é o de pesquisa, com qualidade formal e método, conhecimento e política
da capacidade de intervenção alternativa. Isto porque combina melhor com aprendizagem e conhecimento, que
são dinâmicas, reconstrutivas, não reprodutivas. (Professor entrevistado).
O professor abaixo, a partir de uma concepção equivocada de extensão, considera que a extensão não é
importante na sua atuação docente.
Não dá para responder num tapa. Primeiro, porque não estou muito de acordo com esta trilogia. Segundo,
porque entendo como função central da universidade a produção de conhecimento e a educação de novas
gerações. A extensão foi inventada para retirar a universidade do mundo da lua. Mas, se ela funcionasse bem,
extensão é desnecessária. (Professor entrevistado)
Cabe destacar, ainda, que nas falas dos professores, fez-se presente uma concepção assistencialista de
extensão.
O ensino necessita da extensão para levar seus conhecimentos à comunidade e complementar com aplicações
práticas. A extensão precisa dos conteúdos, educandos e professores do ensino para ser efetivada. (Professor
entrevistado)
A concepção assistencialista de extensão reforça a idéia da comunidade como destinatária das idéias
pensadas e discutidas pela universidade. A idéia de que a universidade sabe, pensa, e “leva” à comunidade
conhecimentos prontos, acabados, como verdades. Cabe destacar aqui as idéias de Paulo Freire que defendem que
a extensão só tem sentido quando assumir como pressuposto básico, a prática da liberdade promovida por meio do
diálogo.
Educar e educar-se na prática da liberdade, não é estender algo da “sede do saber”, até a “sede da
ignorância” para “salvar”, com este saber, os que habitam nesta. Ao contrário, educar e educar-se, na prática
da liberdade, é tarefa daqueles que sabem que pouco sabem – por isso sabem que sabem algo e assim
chegam a saber mais – em diálogo com aqueles que, quase sempre, pensam que nada sabem, para que estes,
transformando seu pensar que nada sabem em saber que pouco sabem, possam igualmente saber mais.
(FREIRE, 1979, p.25).
Vejamos abaixo a fala de outro professor:
Não há como ensinar se o aluno não pesquisar. Ensinar é transmitir conhecimento. Pesquisa é fazer com que o
aluno encontre por si só. Extensão é socializar com o máximo de pessoas possível o conhecimento
construído.” (Professor entrevistado)
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Na fala do professor acima parece existir uma concepção simplista e fragmentada do termo em estudo. Além
disso, há o entendimento de ensino como somente transmissão do conhecimento. Cabe somente ao aluno pesquisar,
e ele faz esta atividade sem o auxílio do professor. Parece existir a idéia de pesquisa como atividade extra-classe e
como meramente uma consulta à deferentes fontes de informação. E extensão uma mera socialização de
conhecimentos.
Ao serem questionados acerca das atividades que eles realizam na sua ação docente e que no seu ponto de
vista, contemplam a indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão no seu trabalho pedagógico, alguns responderam:
O estágio, por exemplo, caracterizo o estágio como um exemplo clássico, onde essas três dimensões podem
ser integradas. (Professor entrevistado)
A disciplina que trabalho volta-se à metodologia do ensino, trabalho com prática de ensino, trabalho com
questões referentes aos campos educacionais, a espaços educacionais em escolas ou organizações não
governamentais. Normalmente, essas disciplinas partem de uma questão problema, e essa questão problema já
supõe pesquisa aos alunos, precisam pesquisar, conhecer a comunidade pra que eles possam depois, fazer seus
trabalhos, envolver–se no ensino. (Professor entrevistado)
Desenvolvo a pesquisa utilizando um questionário aplicativo em profissionais de contabilidade para se obter
uma conclusão. Como exemplo: um questionário verificando se os profissionais de contábeis utilizam a
“ferramenta SIG” sistema de informação gerencias para acompanhar a evolução da contabilidade da sua
empresa. (Professor entrevistado)
No primeiro momento dá se as teorias e técnicas para desenvolver produtos (ensino). No segundo momento o
aluno elabora um instrumento de coleta de dados com objetivo de realizar uma pesquisa a respeito de seu
produto/ serviço (pesquisa). No terceiro momento o aluno desenvolve o produto com base na pesquisa, que
visa atender as necessidades e anseios à sociedade e busca parceiros no mercado para colocar o seu projeto
em prática. Este projeto de produto pode ser, por exemplo, um produto que facilite o dia-a-dia das pessoas,
ou seja, que de alguma forma vá atender as necessidades da população. (Professor entrevistado).
Nas falas acima, percebemos um destaque as atividades como estágio, pesquisas junto a empresas e
escritório de contabilidade. Ressalta-se ainda a criação de produtos pelos acadêmicos. Nesta última, cabe destacar,
na fala do professor, a nítida separação entre cada atividade: primeiro ensino, depois a pesquisa, e depois a
extensão.
Ficou comprovado pela fala dos professores investigados que é nos estágios que eles conseguem
desenvolver com mais consistência a indissociabilidade. Entretanto, nem sempre há o entendimento dos estágios na
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perspectiva da extensão e da pesquisa de mãos duplas, integradora e não única e dominadora. Dessa forma, podem
possibilitar o desencadeamento de uma prática profissional que privilegia a construção e reavaliação dos
conhecimentos, levando a um repensar permanente de seus objetivos e de suas ações. Nesse processo, alunos,
professores e campo de estágio, estabelece-se um espaço social de participação coletiva e política. “Nesse contexto,
o saber então produzido, construído à medida que o grupo em interação articula o saber local e o acadêmico, abre
perspectivas de um novo conhecimento. Instaura-se um processo vivo, e a Universidade se engaja numa ação social
efetiva.” (FREITAS, 2004, p.229).
O estágio, na perspectiva da extensão, pode ser percebido, conforme destaca Freitas (2004), como um
momento da prática profissional e do alargamento da consciência social, que permite uma integralização curricular, do
ponto de vista da participação dos alunos estagiários nas atividades de extensão, em um movimento contínuo de
reflexão e diálogo entre os estagiários, os professores e os profissionais que atuam nos campos de estágios. Assim. A
universidade não só resgata a sua natureza pública, como ainda procura oferecer à sociedade uma atuação de
qualidade, ao buscar trabalhar o conhecimento e o saber de modo a responder às carências e necessidades da
sociedade.
Outras atividades mencionadas foram a Iniciação Científica e o Trabalho de Conclusão de Curso.
Como nós temos aqui a jornada de iniciação cientifica, a própria jornada já é um auxilio, é uma forma de você
proporcionar isso indiretamente o acadêmico (Professor entrevistado).
O TCC, ele é uma das formas de contemplar essas três dimensões. (Professor entrevistado).
Eu como professor orientador contemplo, várias atividades no ensino, pesquisa e extensão. Como alguns
exemplos oriento dois projetos de iniciação cientifica, sou coordenador de uma especialização, e oriento um
aluno de estágio, a partir desses exemplos entra o ensino, a pesquisa e a extensão. (Professor entrevistado)
Conforme já revelaram Floriani e Rausch (2005), a iniciação científica nas instituições de ensino superior vem
sendo considerada, cada vez mais, como um processo fundamental, pois incentiva o aluno de graduação à pesquisa,
inserindo-o em atividades científicas, formando assim o futuro pesquisador. Esse processo formativo alicerça-se no
princípio de que o iniciante deve aprender a fazer pesquisa pesquisando, tendo a possibilidade de compreender e
empreender o próprio caminho da ciência, entendendo que a pesquisa como indagação e principalmente construção
do real constitui a atividade fundamental que alimenta a ciência.
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O TCC , hoje, é também
uma atividade exigida em quase todos os cursos de graduação e de
pós-graduação. Passou a ser considerado uma atividade que oportuniza a interdisciplinaridade e a integração de
conteúdos, a partir dos problemas colocados pela prática profissional e é apresentado, normalmente, na forma
monográfica.
Entretanto, gostaríamos de ressaltar que não podemos apenas nos contentar com atividades
desenvolvidas por programas institucionais de iniciação científica, estágios e TCCs, como promotores da
indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão. Precisamos avançar para o contexto de sala de aula, em qualquer
disciplina que compõe as matrizes curriculares dos cursos de graduação.
Alguns professores, de forma bem humilde, revelaram que têm muitas dificuldades em relacionarem ensino,
pesquisa e extensão no seu ofício docente.
A atividade de investigação científica e desenvolvimento que envolve a pesquisa e a extensão quase não
consigo realizar em minha disciplina. (Professor entrevistado)
A única coisa que consigo colocar em prática são os seminários. (Professor entrevistado).
Ressaltamos, também, que muitos professores, quando questionados, não deram exemplos práticos de
atividades, não respondendo a pergunta feita. Alguns deram respostas superficiais e muito amplas. Outros justificaram
que não conseguem colocar em prática ainda, no seu ofício docente, essa articulação. A maioria destacou atividades
ou de pesquisa ou de extensão, separadamente.
4 O FAZER DOS PROFESSORES
Após imprimirmos os planos de ensino dos professores entrevistados, os agrupamos por curso de graduação
e realizamos uma análise tentando encontrar indicadores que remetessem a uma tentativa de articular ensino,
pesquisa e extensão no desenvolvimento do seu trabalho docente.
Optamos em apresentar os dados em uma
tabela, especificando os cursos de graduação, identificando se existiam ou não, atividades voltadas à pesquisa e à
extensão, bem como, a indissociabiliadade entre ensino, pesquisa e extensão. Sabemos da dificuldade de
conseguirmos constatar isso somente a partir dos planos. Entretanto, tentamos analisar se a pesquisa parte de um
movimento de extensão e a ele retorna, bem como se no desenvolvimento da unidade proposta pelo professor
contempla de forma articulada as três dimensões.
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PLANEJAM PESQUISA
SIM
39
NÃO
PLNEJAM EXTENSÂO
SIM
1
31
NÃO
9
PLANEJAM PES. E EXT.
INDISSOCIADAS DO ENSINO
SIM
NÃO
5
35
A tabela acima mostra que, aproximadamente 98% dos professores entrevistados planejam atividades de
pesquisas e 82% de extensão, incluindo-as no seu plano de ensino. Esse resultado merece ser destacado
positivamente pelo avanço no sentido de romper com um ensino transmissivo e descontextualizado. Porém,
percebemos que o planejamento dessas atividades se dá de forma separada. A pesquisa feita, em sua maioria, na
literatura da área e a extensão em eventos e ou nas disciplinas de estágio.
Percebemos nos planos de ensino dos professores que trabalham com a disciplina de estágio, a presença de
atividades de pesquisa e de extensão articulados. No Estágio Supervisionado o aluno tem a oportunidade de
conhecer a realidade, diagnosticar necessidades sociais, coletar dados e informações sobre a atuação profissional.
Conforme afirma Cunha (2002), ao propormos um ensino que tem a leitura da prática social como inspiração
primeira para a construção de dúvidas acadêmicas, em que a análise e a investigação da realidade tornam-se
matéria-prima para a produção do conhecimento, automaticamente estamos fazendo extensão, verdadeiramente
indissociada do ensino e da pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão, embora alguns demonstraram estar mais seguros quando
ao conceito, é ainda pouco compreendido por parte dos professores e de complexa operacionalização no contexto
educativo segundo seu ponto de vista.
Há diferenças conceituais no meio acadêmico em relação à indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão
e ao próprio conceito de ensino, de pesquisa e de extensão.
E nas atividades de estágio e TCCs que os professores acreditam que é possível realizar de forma mais
significativa a indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão.
Ficou evidenciado que ensino e pesquisa é algo mais presente nas falas e ações dos professores. A extensão é
em si mesma uma atividade muito pouco compreendida. Faz-se necessário avançar para a compreensão de extensão
como um
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Processo educativo, cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a
relação transformadora entre Universidade e Sociedade. A extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito
assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade da elaboração da práxis
de um conhecimento acadêmico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que,
submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento. Este fluxo que estabelece a troca de saberes
sistematizados, acadêmico e popular, terá como conseqüência, a produção do conhecimento resultante do
confronto com a realidade brasileira e regional; e a democratização do conhecimento acadêmico e a
participação efetiva da comunidade na atuação da universidade. (CARRIJO E MORAES FILHO, 2000, p.
25).
Nesse sentido, a extensão deve ser vista como uma relação interativa entre universidade e sociedade, de
modo que haja um fluxo entre o conhecimento acadêmico e o popular com a finalidade de produção de um saber
novo. Por isso que é tão importante a articulação entre extensão e pesquisa no ensino. Através da extensão, ocorre
a troca entre os saberes sistematizados na academia e o saber popular, que possibilitará a produção de conhecimento
resultante do confronto com a realidade, propiciando a efetiva participação da comunidade na atuação da
universidade, com vistas ao desenvolvimento de sistemas de parcerias interinstitucionais.
A identificação das concepções dos professores acerca da indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão é
de suma importância para pensarmos uma formação contínua que amplie suas visões e conseqüentemente construam
uma perspectiva pedagógica cada vez mais condizente com os desafios atuais da profissão.
Em síntese, o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão é fundamental no fazer
acadêmico. A relação entre o ensino e a extensão conduz a mudanças no processo pedagógico, pois alunos e
professores constituem-se em sujeitos do ato de aprender. Ao mesmo tempo em que a extensão possibilita a
democratização do saber acadêmico, por meio dela, este saber retorna à universidade, sendo testado e reelaborado.
A relação entre pesquisa e extensão ocorre quando a produção do conhecimento é capaz de contribuir para a
transformação da sociedade. A extensão, como via de interação entre universidade e sociedade, constitui-se em
elemento capaz de operacionalizar a relação entre teoria e prática.
REFERÊNCIAS
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CARRIJO, I. M.; MORAES FILHO, W. B. Em busca da institucionalização da extensão na UFU.
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FLORIANI, G.; RAUSCH, R.B. Contribuições da iniciação científica aos acadêmicos de graduação.
Revista da Unifebe. Blumenau: Nova letra, 2005.
FORGRAD
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FÓRUM
DE
PRÓ-REITORES
DE
GRADUAÇÃO
DAS
UNIVERSIDADES
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FREIRE, P. Extensão ou comunicação? Rio de Janeiro: Paz e terra, 1979.
FREITAS, M. T. M. A relação do ensino, da pesquisa e da extensão com a p´rtica de ensino e a
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