Princípios Físicos da Bioeletricidade Cardíaca
TRABALHO EM FASE DE DESENVOLVIMENTO
Juan A. Leyva-Cruz J. A1, Fagundes R. M. N1, Ferreira, E. S2, MSR Miltão1
A. V. Andrade-Neto1, Carlos Augusto Lucas Brandão3
1Laboratório
de Instrumentação em Física, Departamento de Física, UEFS, Bahia, 44036-900, Brasil.
de Física de Materiais, Departamento de Física, UEFS, Bahia, 44036-900, Brasil.
3Laboratório de Fisiologia, Departamento de Biologia, UEFS, Bahia, 44036-900, Brasil.
2Laboratório
Resumo
Os problemas cardíacos, principalmente as arritmias cardíacas, são reconhecidos pela organização
mundial da saúde como uma das principais causa de morte do ser humano. É por isso que o coração é um
dos órgãos de maior interesse nas pesquisas na medicina, biomedicina e em geral na Física Médica.
Apoiado nos conceitos da Bioeletricidade hoje é possível compreender melhor o funcionamento deste
órgão. Dentro das pesquisas da Física Médica é prioritário estudar não somente novos equipamentos para
detectar os potenciais bioelétricos cardíacos, mais também novos paradigmas para seu processamento,
que permitam extrair as informações úteis da atividade cardíaca. Nesse sentido novas técnicas de
imagens, como a tomografia de imagens bioelétricas cardíacas, tem sido uma das modalidades que mais
tem chamado à atenção á comunidade científica.
Os resultados preliminares apontam que os beneficiários em termos gerais serão as pessoas com alta
probabilidade de apresentar problemas cardíacos associados com infarto agudo do miocárdio, ou outras
doenças ou problemas de saúde provocados pelo entupimento das artérias coronárias principais, no
coração, e em geral toda a população, que deseje fazer um checape preventivo.
Palavras-Chave: __ECGI; Bioinstrumentação, Imagens Bioelétricas Cardíacas, e Cardiologia__
I- Introdução
1.1- O conceito de bioeletromagnetismo
O bioeletromagnetismo é a disciplina que estuda os fenômenos de natureza elétrica,
magnética e eletromagnética os quais acontecem nos tecidos vivos. Dentre destes fenômenos
podemos citar:
•
•
•
•
•
O comportamento dos tecidos excitáveis (as fontes).
As correntes e potenciais no volume condutor.
O campo magnético ao redor do corpo humano.
As respostas das células excitáveis a estímulos elétricos e magnéticos.
As propriedades elétricas e magnéticas intrínsecas dos tecidos.
Estes cinco pontos representam os principais processos causísticos, seus efeitos e
propriedades associados aos fenômenos eletromagnéticos na matéria viva; no sentido mais
geral, desde a escala microscópica ate à macroscópica.
Hoje em dia existe certa confusão entre os conceitos de equipamentos médicos
eletrônicos e o de bioeletromagnetismo, por isso é importante explicar um pouco mais sobre
estes. O segundo já foi descrito anteriormente, e o primeiro se refere aos equipamentos e
métodos utilizados para estudar os fenômenos bioeletromagnéticos. Por definição o
bioeletromagnetismo é uma ciência interdisciplinar, pois envolve a associação das ciências da
viva com as ciências da engenharias e a Física. Nos últimos anos, como resultados destas
associações tem sido criadas novas disciplinas, dentro das quais destacamos de forma breve a:
Biofísica: é a ciência que trata da solução de problemas biológicos em termos dos
conceitos da física.
Bioengenharia: é a aplicação da engenharia para o desenvolvimento de equipamentos
para os serviços de saúde, análises de sistemas biológicos, e fabricação de produtos resultados
dos avanços nesta tecnologia. Este termo é também utilizado como engenharia biomédica ou
engenharia bioquímica (mais conhecido como biotecnologia).
Eletrônica Médica: é uma divisão da engenharia biomédica relacionada com os
equipamentos eletrônicos e seus métodos na medicina.
Física Médica: uma ciência com escopos da física teórica e experimental para
solucionar problemas na medicina.
Engenharia Biomédica: uma disciplina da engenharia relacionada com a aplicação da
ciência e tecnologia (dispositivos e métodos) na biologia e na medicina.
Todas estas áreas das ciências nutrem-se do bioeletromagnetismo, e justamente ai radica
a importância do bioeletromagnetismo. Por exemplo, a principal razão de estudar os fenômenos
bioelétricos que ocorrem nas membranas celulares, é porque as MC participam de forma
exclusiva na funcionalidade da unidade mínima de via, que é célula, de ai sua importância na
participação das funções vitais dos organismos vivos. De fato, a vida começa com a mudança do
potencial de membrana quando um espermatozóide penetra numa célula ovócito (do óvulo) no
instante da fertilização canais de íons nestas células são ativados. A mudança resultante no
potencial da membrana impede o acesso dos outros espermatozóides.
A diferença das variáveis biológicas das variáveis bioeletromagnéticas é que estas
últimas podem ser medidas em tempo real por métodos não invasivos e assim estudar as funções
biológicas. Por fim, podemos afirmar que o bioeletromagnetismo oferece novas e importantes
oportunidades para o desenvolvimento de métodos diagnósticos e terapêuticos para o estudo de
problemas da saúde do ser humano.
1.2
Alguns aspectos sobre a história da bioeletricidade.
O primeiro documento escrito sobre eventos bioelétricos está em um antigo hieróglifo
egípcio de 4000 a.C. O hieróglifo descreve o peixe elétrico (bagre), como um peixe que libera
choques elétricos com uma amplitude superior a 450 volts. O primeiro documento escrito sobre
a aplicação médica de eletricidade foi a partir do ano 46 d.C. quando Scribonius Largus
recomendou a utilização de peixes para curar dores de cabeça e artrite. O peixe elétrico
continuou a ser o único meio de produção de eletricidade para experimentos eletro-terapêutico
até o século XVII [3].
Na Fig. 2.1, mostramos o primeiro instrumento para medir a eletricidade, o eletroscópio.
Este aparato foi inventado pelo médico inglês William Gilbert, o mesmo é constituído por uma
agulha de metal leve articulada em um pino, de modo que a flecha se volta sempre para as
substâncias que possuem poder de atração [2].
Figura 2.1: O primeiro instrumento para detectar a eletricidade foi o eletroscópio
inventado por William Gilbert [2].
No entanto, a mais famosa estimulação neuromuscular em experimentos foi realizada
por Luigi Galvani, professor de anatomia da Universidade de Bolonha. Seu primeiro achado
importante é datado de 26 de janeiro de 1781 [2]. Um sapo dissecado e preparado estava
mantido sobre a mesma de uma máquina elétrica, quando seu assistente tocou com um bisturi
no nervo femoral do sapo, saíram faíscas elétricas nas proximidades da máquina elétrica, e
contrações musculares violentas ocorreram no músculo do sapo. Esta é citada como a primeira
experiência documentada em estimulação elétrica neuromuscular. Depois seus experimentos
concluíram: os músculos e os nervos constituem uma espécie de condensador de sua própria e
peculiar eletricidade que existe em todos os animais vivos, assim ele acreditava que: ”nos
músculos se reúne o fluido elétrico, que logo se difunde pelo corpo mediante a rede de nervos”
[2].
Figura 2.2: Representação da etapa da estimulação do experimento de Luigi Galvani. O
comportamento eletroquímico de dois metais diferentes [(zinco (Z) e cobre (C)], em um arco
bimetálico, em contacto com os eletrólitos do tecido, produz uma corrente elétrica estimulante
que induz a contração muscular [2]
O primeiro a medir a forma de onda da atividade elétrica cardíaca, conhecido como
eletrocardiograma (ECG), foi Augustus Waller em 1887 usando um eletrômetro capilar. Na Fig.
2.3 mostramos o primeiro eletrocardiograma medido por Waller [2].
Fig. 2.3. O primeiro eletrocardiograma humano medido por Augustus Waller (1887).
As medições foram realizadas utilizando um eletrômetro capilar [2].
A sensibilidade do eletrômetro capilar era de aproximadamente de 1 mV, mais sua
resposta temporal era muito fraca. Waller encontrou que o gerador da atividade elétrica cardíaca
tinha uma natureza dipolar e sugeriu que o ECG deveria ser medido entre 5 pontos formados
por as mãos, os pés e a boca (um total de 10 eletrodos).
O pai da eletrocardiografia moderna foi Willem Einthoven (Dutch; 1860-1927), quem a
começos do século passado desenvolveu o primeiro aparelho medidor de ECG com qualidade
apoiada no uso do Galvanômetro de mola [2], ver Fig. 2.4. Sem dúvidas os aprimoramentos
feitos por Einthoven sobre este aparelho possibilitou seu uso na eletrocardiografia clínica.
Einthoven resumiu seus resultados fundamentais nas pesquisas sobre ECG nos anos de
1908 e 1913. Basicamente realizou estudos do traçado resultante, classificando as partes que
compõem o traçado do ECG e relacionando com o traçado de pessoas com doenças cardíacas.
Este estudo lhe rendeu o prêmio Nobel de fisiologia em 1924 [2].
Figura 2.4: Eletrocardiógrafo original de Einthoven incluía três derivações, que
continham uma solução condutora para estabelecer o contato elétrico com os dois pulsos e uma
das pernas do paciente [1].
Na Fig. 2.4 mostramos o Eletrocardiógrafo original de Einthoven, o qual incluía três
derivações, que continham uma solução condutora para estabelecer o contato elétrico com os
dois pulsos e uma das pernas do paciente [1].
O modelo definido por Einthoven, através da diferença de potencial entre os membros
do corpo humano (chamadas de derivações), passou a ser denominado de triangulo de
Einthoven. O mesmo é caracterizado por um vetor impulso elétrico numa determinada direção e
sentido. Existem 12 derivações básicas segundo as quais os sensores podem ser conectados.
Essas ligações podem ser consideradas redundantes, no entanto auxiliam na redução de ruídos,
bem como nas análises de determinadas regiões específicas do coração. Partindo do princípio de
que o potencial elétrico gerado pela atividade cardíaca se propaga até a superfície do corpo pelo
volume condutor, Einthoven escolheu as mãos e o pé esquerdo como pontos de contato com a
pele para obtenção de sinais, como poder visto na Fig. 2.4.
Na mesma época Horatio Williams foi o primeiro a construir a seqüência de vetores
instantâneos em 1914, ele é usualmente considerado o inventor da vetorcardiografia [2]. Hubert
Mann realizou posteriormente estudos na vetorcardiografia para desenvolver esta técnica como
uma ferramenta clínica. Ele publicou seu primeiro vetorcardiograma bidimensional baseado no
triangulo de Einthoven's em 1916, ver Fig. 2.5, e chamou a esta configuração como
monocardiograma [2].
Fig. 2.5. O monocardiograma medido por Mann [2].
No ano de 1921, J. B. Johnson da companhia Western Electric, inventou o tubo de raios
catódicos de baixa tensão elétrica, isto possibilitou a visualização do sinal bioelétrico num
display em forma vetorial em tempo real e permitiu que a técnica de vetorcardiografia passa-se
ser usada na clínica médica [2].
Finalmente o descobrimento do transistor por Jhon Bardeen e Walter Brattain em 1948
junto com a invenção do tubo de elétrons revolucionou a tecnologia de medição. Utilizando
todos estes avanços hoje em dia podemos encontrar aparelhos miniaturizados, portáteis e muito
sofisticados que permitem medir a atividade eletromagnética da matéria viva em tempo real.
2.3- Bases físicas dos fenômenos bioelétricos.
Uma forma interessante de começar a estudar a bioeletricidade é justamente estudar o
comportamento das células excitáveis. Em particular vamos considerar inicialmente as células
do tecido nervoso e muscular, as quais são excitáveis. A célula nervosa ou neurônio pode ser
dividido em relação a sua estrutura e função em três partes fundamentais,
•
•
•
O corpo celular, também conhecido como soma
Dendritos, pequenas ramificações ao redor do corpo celular,
O Axônio que é uma fibra nervosa longa.
Figura 2.6. Representação esquemática de uma célula nervosa- o neurônio e suas partes
constituintes (modificada de [2]).
Na Fig. 2.6 mostramos uma representação esquemática de uma célula nervosa- o
neurônio e suas partes constituintes. Nela destacam-se o corpo celular ou soma os dendritos, e o
axônio. A morfologia do corpo do neurônio é similar a qualquer outra célula. Por isso,
apresenta as mesmas estruturas internas que qualquer outro tipo de célula, tais como o núcleo,
as mitocôndrias e o reticulo endoplasmático, dentre outras, como vem pode ser observado na
Fig. 2.6. Esta célula é formada por 70 a 80 % de água aproximadamente, a matéria seca é ao
redor de 80 % proteína e 20 % de lipídeo e o volume varia entre 600 a 70 000 µm³ [2].
Os dendritos participam de forma decisiva na função das células nervosas, eles recebem
os impulsos desde outras células e os transferem ao corpo da célula, este caminho de condução,
se conhece como sinais aferentes. O efeito destes pode ser excitatório ou inibitório. Por
exemplo, um neurônio cortical pode receber impulsos desde dezenas a centenas de milhares de
neurônios.
A fibra nervosa, o axônio transfere o sinal desde o corpo celular para outro nervo ou
célula muscular. Nos mamíferos os axônios apresentam dimensões cerca de (1 – 20) µm em
diâmetro. Axônios de vários metros de comprimentos podem ser encontrados em animais
grandes. O axônio pode ser encontrado coberto por uma camada isolante chamada de vagem de
mielina, que por sua vez é formada pelas células de Schuwann. A vagem de mielina não é uma
estrutura continua, ela é dividida por seções separadas em intervalos regulares pelos nós de
Ranvier, como pode ser visto na Figura anterior [2].
Figura 2.7: Esquema representativo de uma membrana celular, constituída de suas
camadas lipoproteicas, e seus respectivos canais iônicos, por onde as células trocam substancias
com o meio externo para seu metabolismo (modificada de [2]).
Na Fig. 2.7 observamos um esquema representativo de uma membrana citoplasmática
ou celular, uma das estruturas mais importante nas células vivas. Ela delimita todas as células
dos seres vivos, estabelecendo a fronteira entre o meio extra e intracelular e constituída
basicamente por uma dupla camada de fosfolipídios e proteínas, que apresenta uma espessura
entre (7 – 10) nm. Nesta Figura também podemos observar os canais iônicos, os quais são poros
macromoleculares formados basicamente por proteínas, desde o ponto de vista bioelétrico, os
canais iônicos, constituem uma peça importante no funcionamento da membrana celular, pois é
através destes poros por onde fluem os íons de sódio, potássio e cloro, através da membrana.
A membrana é de fato uma “porta seletiva”, ou seja, um filtro que a célula utiliza para
captar os elementos do meio externo que lhe são necessários para seu funcionamento, além de
liberar as substâncias que a célula produz no seu citoplasma e que deve também ser enviado
para fora da mesma.
Podemos afirmar que os fluxos de estes íons através das membranas celulares
formam as bases físicas dos fenômenos bioelétricos.
Como os tecidos biológicos não há disponibilidade de elétrons livres para movimentarse de forma análoga à que ocorre nas bandas de valência dos metais condutores, as cargas
elétricas em questão, só podem estar nos íons de compostos dissociados no meio aquoso que a
preenche, dentro e fora da célula. Este fluxo de íons através da membrana ocorre por dois tipos
de mecanismo de transporte, o transporte passivo e ativo, dependendo da termodinâmica que
obedecem. O transporte passivo dá-se espontaneamente, sem gasto de ATP, geralmente
seguindo as leis da difusão e o gradiente químico de concentrações; o ativo, por outro lado, é
realizado contra qualquer tendência entrópica espontânea, ou seja, contra o gradiente, e, por esta
razão, envolve gasto de ATP.
Em especial, os íons de sódio, potássio e cloro são relevantes para o funcionamento das
células excitáveis. Em condições de normais ou repouso, por exemplo, a concentração de íons
de sódio (Na+) é cerca de 10 vezes maior fora da membrana que dentro, enquanto a
concentração de íons de potássio (K+) é aproximadamente 30 vezes maior na região intracelular
que a extracelular.
Figura 2.8: Representação esquemática do neurônio com sua membrana polarizada, na
parte interna negativamente e positiva na externa [7].
O fluxo através da membrana dos íons Na+ e K+ é conhecido como bomba de Na+ e K+.
Estes íons são bombeados de forma ativa através da membrana celular, mais não de forma
equitativa, por exemplo, para cada 3 íons de sódio que são bombeados para fora da célula,
somente dois íons de potássio são bombardeados para o meio intracelular.
Quando a célula não está baixo a ação de estímulo (estado de repouso), a membrana se
mostra permeável somente aos íons de potássio, e bloqueia os canais de sódio. Por tudo isto as
membranas sempre vão apresentar concentrações de íons nas suas regiões intra e extracelular, e
estabelece-se uma diferença de cargas elétricas entre estes meios, sendo que há déficit de cargas
positivas dentro da célula (a qual vai se carregar negativamente) e a face externa torna-se
positiva eletricamente, então dizemos que a membrana está polarizada, como ilustra a Fig. 2.8.
Esta diferença de carga estabelece o chamado potencial de repouso da membrana, o qual
representa a eletronegatividade no interior da célula. A amplitude deste potencial é da ordem de
-70 -90 mV.
A voltagem na membrana (Vm) de uma célula excitável pode então ser definida como a
diferença de potencial no meio exterior (Φo) menos o interior (Φi), ou seja:
Vm = (Φi) - (Φo)
Esta definição é independente da causa do potencial e o comportamento da voltagem
elétrica na membrana.
Quando a membrana é estimulada (este fato também é conhecido como ativação), isto
acontece quando existe um aumento da voltagem na membrana na ordem de 20 mV, e consegue
alcançar o valor umbral (por exemplo, isto acontece quando o Vm varia desde – 90 mV para
aproximadamente 50 mV), a permeabilidade da membrana para íons sódio e potássio muda.
Primeiro acontece um aumento muito rápido da permeabilidade da membrana para íons Na+,
permitindo íons sódio fluir desde a parte externa para a região intracelular, fazendo o interior
ficar mais positivo. O espaço intracelular pode alcançar valores de Vm na ordem de + 20 mV.
Depois disto, o aumento lento da permeabilidade aos íons de potássio permite que os íons de K+
possam fluir desde a parte interna para a região extracelular, portanto, retornando o potencial
intracelular ao seu valor de repouso.
(b)
Figura 2.9: (a) Representação esquemática do processo de ativação da membrana
celular de uma célula excitável, representando os estado da membrana polarizada, despolarizada
e finalmente o processo de repolarização celular [7]. (b) Forma de onda do potencial de ação
medido num neurônio retirado de um gato, como a representação da variação do potencial de
membrana em função do tempo, durante a seqüência dos processos descritos em (a) [2].
Na Fig. 2.9a mostramos a representação esquemática do processo de ativação da
membrana celular de uma célula excitável, representando os estado da membrana polarizada
(estado sem ativação), logo a presença de um estímulo ativa o processo de entrada de sódio ao
interior da célula. Este processo quebra a polarização inicial da membrana celular e por isso
recebe o nome de despolarização da membrana. Finalmente o processo de repolarização celular,
que é chamado ao fato da saída dos íons de potássio do espaço intracelular. Justamente a
mudança no tempo do potencial transmembrana devido a um processo de ativação como
descrito anteriormente é denominado potencial de ação, e no casso do axônio é chamado de
impulso nervoso.
Na Fig.2.9b, ilustra-se a forma de onda do potencial de ação medido num neurônio
retirado de um gato, como a representação da variação do potencial de membrana em função do
tempo, durante a seqüência dos processos descritos na Fig. 2.9b. Aqui também podemos
observar que a máxima variação da amplitude do potencial de membrana durante a ativação é
aproximadamente de 100 mV, com duração próxima de 1 ms. Depois de transcorrido este tempo
a bomba de Na+ e K+ restabelece as concentrações iniciais destes íons dentro e fora de
membrana celular, retornando a voltagem de membrana a seu valor de repouso de – 100 mV.
CAPITULO 3: ATIVAÇÃO ELÉTRICA DO CORAÇÃO.
3.1- Anatomia e função do coração.
Ao estudar os processos de ativação elétrica no coração, para poder entender como é
gerado o eletrocardiograma iremos estudar algumas características anatômica e funcional deste
importante órgão para o funcionamento do organismo humano.
Figura 3.1: Anatomia do coração e vasos associados. (adaptada de [2]).
Na Fig. 3.1, ilustramos uma imagem representando as partes do coração normal, o qual
é um órgão predominantemente de tecido muscular que funciona como uma bomba de ejeção
pulsante. Sua função é ejetar o sangue para o sistema circulatório. O coração normal de uma
pessoa de 25 anos pesa em média 300 gramas, faz circular 5,5 litros por minuto, realizando mais
de 100.000 batimentos por dia. Este órgão, bem como todas as células do miocárdio são
excitáveis da mesma forma como o são os neurônios e capaz de alterar o potencial da
membrana, bem como de gerar potenciais de ação sobre a influência de estímulos externos.
O ciclo cardíaco consiste de um período de contração ventricular denominado de sístole
que expele o sangue dos ventrículos, seguido de um período de relaxamento ventricular
denominado de diástole, durante o qual os átrios se enchem de sangue.
O sistema cardiovascular é composto por três tipos principais de músculo cardíaco; o
músculo atrial, o músculo ventricular e as fibras especializadas, musculares, excitatórias e
condutoras. É de fato uma cavidade oca constituído por quatro compartimentos: átrios direito e
esquerdo; e ventrículos direito e esquerdo. O coração é orientado de modo que o aspecto
anterior é o ventrículo direito, enquanto mostra o aspecto posterior do átrio esquerdo, ver Fig.
3.1. A parede do ventrículo esquerdo é muito mais espessa que a parede do ventrículo direito.
Isto é lógico uma vez que o ventrículo esquerdo bombeia o sangue para a circulação sistêmica,
onde a pressão é consideravelmente maior do que para a circulação pulmonar, que resulta da
saída do ventrículo direito.
As fibras musculares cardíacas são orientadas em espiral e são divididos em quatro
grupos. Desde o ponto de vista da bioeletricidade é importante o fato da resistividade elétrica
nestas fibras tiver um valor menor na direção das fibras ou tangencial comparado com a direção
radial.
Entre o átrio e o ventrículo direito encontra-se a valva tricúspide (ou a valva
atrioventricular direita), e entre o átrio e o ventrículo esquerdo encontra-se a válvula mitral (ou a
valva atrioventricular esquerda). Essas valvas impedem que o sangue impulsionado com força e
pressão, pelos ventrículos, retorne para os átrios. A válvula pulmonar situa-se entre o ventrículo
direito e a artéria pulmonar, enquanto a válvula aórtica encontra-se na via de saída do ventrículo
esquerdo (controle de fluxo para a artéria aorta), os quais impedem o retorno do sangue aos
ventrículos.
O sangue retorna da circulação sistêmica, para o átrio direito, e de lá vai pela válvula
tricúspide e para o ventrículo direito. Sendo ejetado do ventrículo direito através da válvula
pulmonar para os pulmões, o sangue oxigenado, retorna dos pulmões para o átrio esquerdo, e de
lá através da válvula mitral para o ventrículo esquerdo. Finalmente o sangue é bombeado
através da válvula aórtica para a artéria aorta e assim se integra à circulação sistêmica.
3.2- Célula Muscular Cardíaca.
Numa célula muscular cardíaca ou miócito, a ativação elétrica acontece por meio do
mesmo mecanismo como acontece nas células do tecido nervoso e muscular. Ou seja, desde o
influxo de íons de sódio através da membrana celular. A amplitude do potencial de ação
cardíaco é similar ao potencial de ação nervoso e muscular, aproximadamente 100 mV. No
entanto, a duração do impulso muscular cardíaco é duas ordens de magnitude maior.
Figura 3.2: Forma de onde do potencial de ação cardíaco (parte superior) e diagrama
esquemático do funcionamento da bomba sódio – potássio durante a formação do potencial de
ação cardíaco (parte inferior). (adaptada de [2]).
Na Fig. 3.2 superior, mostramos a forma de onda do potencial de ação cardíaco, a parte
crescente representa a entrada de íons sódio (ver Fig. 3.2 inferior) ao citoplasma o qual é
conhecido como despolarização da membrana celular, depois disto o potencial tende a um valor
constante, configurando o que se conhece como fase de platô, depois uma saída de potássio do
interior da célula (ver Fig. 3.2 inferior) acompanha o processo de repolarização com o intuito da
membrana reconstruir seu potencial de membrana de repouso. Também pode ser visto que o
tempo de duração do potencial de ação é aproximadamente de 300 ms.
3.3- Formação do Eletrocardiograma.
Associado a ativação elétrica da célula muscular cardíaca encontramos a sua contração
mecânica a qual acontece um tempo depois, de gerado o potencial de ação. Este processo
acontece em todos os pontos do coração formando assim os chamados centros de ativação
elétrica cardíaca.
Figura 3.3: Visualização da formação e propagação da atividade elétrica cardíaca no
processo de formação do eletrocardiograma (adaptada de [2]).
Na Fig. 3.3 mostramos a da formação e propagação da atividade elétrica cardíaca para a
formação do eletrocardiograma. Partindo do fato que o ECG pode pensar-se que surge de uma
combinação de processos de criação e condução de atividade elétrica no tórax humano. Na
figura também ilustra-se a ativação elétrica do coração começa no nódulo sino-atrial (nódulo
SA), localizado na parte superior do átrio direito na base da veia cava superior, este nó é
formado por um tipo de células especializadas auto-excitáveis, em humanos está região é de
aproximadamente 15 mm de comprimento e 5 mm de espessura. Estes tipos de células também
são chamadas de marca-passos, pois elas marcam o passo ou ritmo da atividade elétrica
cardíaca. Elas geram um potencial de ação com uma freqüência aproximadamente de 70
ciclos/minutos. A partir deste nó os processos de ativação ou seus efeitos os potenciais de ação
se propagam em todas as direções através dos átrios. Mais a passagem para os ventrículos só
acontece por um só lugar num coração normal, que é justamente o nó átrio-ventricular (nó AV),
o qual se encontra na fronteira entre os átrios e os ventrículos, as células cardíacas presentes em
neste nó geram potenciais de ação com freqüência de 50 ciclos/minuto.
A condução desde o nó AV para os ventrículos acontece a través de um sistema de
condução especializado. Perto deste nó o sistema é formado por um ramo comum (aos
ventrículos) chamado de ramo de His. Na parte mais distante, este ramo se separa em duas
ramificações chamadas de feixes de His esquerdo e direito e posteriormente se ramifica nas
chamadas fibras de Purkinje, as quais se distribuem de forma divergente no interior das paredes
dos ventrículos. A propagação dos potenciais de ação acontece ao longo deste sistema com uma
velocidade maior em comparação a propagação na região do nó AV a qual é baixa. A partir da
face interna da parede dos ventrículos os vários sítios de ativação causam a formação de uma
frente de onda que se propaga através da massa ventricular até a face externa da parede dos
ventrículos.
Este processo é resultado da ativação célula a célula. Depois de cada região de
despolarização o processo de repolarização ocorre. A contribuição de todos estes potenciais de
ação durante um batimento cardíaco cria uma onda de tensão elétrica resultante que se propaga
através do volume interno do tórax até chegar a sua superfície e ser medido. Justamente este
potencial elétrico medido é chamado de eletrocardiograma, como vem se ilustra na Fig. 3.3.
CAPITULO 7: REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1]- Araujo et al. Biomagnetismo: Nova Interface Entre a Física e a Biologia Ciência Hoje (153)
Set/1999.
[2]- Jaakko Malmivuo, Robert Plonsey: Bioelectromagnetism - Principles and Applications of
Bioelectric and Biomagnetic Fields, Oxford University Press, New York, 1995.
[3]- Bin He; Dongsheng Wu; , "Imaging and visualization of 3-D cardiac electric
activity," Information Technology in Biomedicine, IEEE Transactions on , vol.5, no.3,
pp.181-186, Sept. 2001.
[4]Suzanne
J Maynarda, John
W Riddella, Ian
B.A Menowna, Jim Allenb, John
McC Andersonb, Mazhar M Khana, A.A.Jennifer Adgey. Body surface potential mapping
improves detection of ST segment alteration during percutaneous coronary intervention.
International Journal of Cardiology. Volume 93, Issues 2-3, February 2004, Pages 203-210.
[5]- Robinson MR, Curzen N. Electrocardiographic body surface mapping: potential tool for
the detection of transient myocardial ischemia in the 21st century?. Ann Noninvasive
Electrocardiol. 2009 Apr;14(2):201-10.
[6]- Imagens extraídas do site: http://rudylab.wustl.edu/overview/index.htm
[7]- Imagens extraídas do site: http://www.afh.bio.br/nervoso/nervoso1.asp
[8]- Campo Velho, H. F., problemas inversos: conceitos básicos e aplicações, Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais, Lab. de Computação e Matemática Aplicada, São José dos
Campos, SP. 1997.
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