Vencedor de leilão no rio Madeira terá de manter capital aberto
Ruy Baron/Valor
Jerson Kelman, diretor-geral da Aneel: "Um prazo de cinco anos já é apertado
para a construção de hidrelétricas"
A sociedade montada após o leilão da usina Santo Antônio, primeira das duas
hidrelétricas do rio Madeira, deverá fazer uma oferta pública de ações e manter
capital aberto. Também precisará seguir regras de governança corporativa que
restringem o poder de construtoras e fornecedores de equipamentos nas
decisões societárias. Essas determinações estão em portaria do Ministério de
Minas e Energia com as diretrizes finais para o edital de licitação da usina. O
leilão foi adiado novamente, de 29 de novembro para 10 de dezembro, a
pedido da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), levantando ainda mais
dúvidas sobre a capacidade de ter as primeiras turbinas em operação em 2012.
As diretrizes servirão de base para o edital, que deverá ser aprovado pela
diretoria da Aneel na próxima terça-feira, dia 30. A participação máxima de
construtoras e fornecedores nos consórcios será de 40%. Depois que for
montada a sociedade de propósito específico (SPE), dona da concessão por 30
anos, essa participação ficará limitada a 20%. Isso praticamente obriga o
consórcio vencedor a buscar a "parceria estratégica", como vem chamando o
governo, do BNDES-Par e dos fundos de pensão estatais, como Funcef e
Petros. De acordo com a portaria, que será publicada hoje no "Diário Oficial" da
União, os fundos ganham o direito de entrar na sociedade. Outra forma de
limitar, na prática, o poder de construtoras e fornecedores foi declarar o
"impedimento de voto em situações de conflito de interesses por parte dos
acionistas controladores". O temor do governo é quanto à possibilidade de que
a obra acabe saindo mais cara do que o orçamento inicial.
Orçada inicialmente entre R$ 131 e R$ 132 por megawatt-hora (MWh), a tarifa
máxima da usina Santo Antônio será reduzida em cerca de R$ 5/MWh, mas
não chegará aos 13% de diminuição recomendados pelo Tribunal de Contas da
União (TCU). A diminuição será possível graças a novo cálculo da garantia
física do empreendimento -qual é o volume de energia que pode ser gerado de
forma constante. A potência máxima da usina será de 3.150 MW, mas antes o
governo estimava em 2.150 MW médios a geração "permanente" de energia,
mesmo em períodos mais secos. Refeitas as contas, a garantia foi para 2.218
MW médios.
O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício
Tolmasquim, avaliou que é "complicado" atender a todas as sugestões do TCU.
"Só os custos de transmissão da energia equivalem a R$ 29 por MWh", disse
Tolmasquim. Independentemente de qual for a decisão do Cade a respeito das
cláusulas de exclusividade da Odebrecht com fornecedores de turbinas e de
equipamentos para a obra, ele afirmou que não haverá mais mudanças na data
do leilão. Alvo de reclamação das concorrentes, o efeito das cláusulas foi
derrubado pela Secretaria de Direito Econômico, mas a Odebrecht obteve
liminar que invalida a medida da SDE e uma definição depende do Cade.
Os seguidos atrasos do leilão comprometem o objetivo original de permitir o
início da operação comercial da hidrelétrica em 2012. A idéia era ter as
primeiras turbinas - são 22 ao todo em cada usina - gerando energia naquele
ano. Para isso, no entanto, o cronograma tem ficado cada vez mais apertado.
Quando o Ibama emitiu a licença ambiental prévia ao empreendimento, em
julho, o Ministério de Minas e Energia falava em realizar a licitação em
setembro. Depois, marcou o leilão para 30 de outubro - prazo que já foi adiado
duas vezes. Para não perder a "janela hidrológica" do Madeira, aproveitando o
período de estiagem, a instalação dos canteiros e das ensecadeiras
(responsáveis pelo desvio do rio) deve ser feita até dezembro de 2008. Mas o
ganhador do leilão ainda terá que obter no Ibama a licença de instalação, que
permite o início das obras.
"Um prazo de cinco anos, em geral, já é apertado para a construção de
hidrelétricas", disse ontem o diretor-geral da Aneel, Jerson Kelman, no intervalo
imprevisto de reunião pública de diretoria colegiada, interrompida por queda de
luz que atingiu o edifício da agência. "Em quatro anos, só em circunstâncias
muito especiais."
Justiça dos EUA nega pedido da Odebrecht
A Justiça dos EUA negou pedido da Odebrecht para que a General Electric
fosse obrigada a não fornecer equipamentos para concorrentes no leilão das
usinas do Madeira no futuro. A decisão é parte do embate entre Odebrecht e
Camargo Corrêa . A Odebrecht quer manter a exclusividade para os
equipamentos. A Camargo Corrêa tenta contornar essas cláusulas.
A decisão foi tomada pela juíza Collen McMahon, da Corte Distrital de Nova
York, na quarta-feira. Ela entendeu que existe um embate entre a Secretaria de
Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça e a Justiça brasileira sobre a
possibilidade de a Odebrecht manter as cláusulas de exclusividade para o
fornecimento de equipamentos da GE. "O governo brasileiro já demonstrou
forte interesse neste projeto e está profundamente envolvido na resolução da
disputa", reconheceu a juíza.
Ela citou os dois despachos da SDE, em que as cláusulas de exclusividade são
suspensas para a realização do leilão, e os dois despachos do desembargador
Antonio de Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal de Brasília, em que
as mesmas cláusulas são tornadas válidas para o certame. "Claramente, este é
um forte debate legal entre as autoridades do Brasil e as cortes brasileiras, e
querem que eu decida o assunto. Este é um contrato brasileiro, regido por leis
brasileiras, e a aplicação da cláusula de exclusividade está sendo analisada no
Brasil", escreveu a juíza. Collen McMahon literalmente "lavou as mãos" ao
dizer que o assunto deve ser solucionado no Brasil.
Com este despacho, a solução do conflito deve ser decidida mesmo no Brasil.
Na sexta-feira, a SDE fez um pedido para o presidente do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), ministro Barros Monteiro, para que reconsidere a limina r de
Souza Prudente.
Vencedor de leilão no rio Madeira terá de manter capital aberto . Valor
Econômico, Brasil, Infra-estrutura, A3, 23/10/2007.
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