À EXCELENTÍSSIMA
PREFEITA MUNICIPAL DE CAMPO MOURÃO-PR
Regina Massareto Bronzel Dubay
Paço Municipal
Rua Brasil, nº 1487 – Centro
Nesta.
Campo Mourão, 23 de outubro de 2014.
EXMA. PREFEITA,
O munícipe que lhe dirige é cidadão no regular exercício
dos direitos políticos, com domicilio eleitoral nesta Cidade de Campo Mourão/Pr, atuando como
advogado e professor de Ensino Superior, mais especificamente de Direito Constitucional e
Internacional.
Tradicionalmente minhas manifestações e opiniões sobre a
atividade política, administrativa ou legislativa se resumem ao ambiente acadêmico, local onde a
pluralidade de opiniões é respeitada e a busca incessante pela efetiva aplicação do Direito e da
Justiça, devidamente estimulada.
O Poder Legislativo Municipal, em sessão realizada no dia
22 do presente mês e ano, aprovou por maioria, o Projeto de Lei nº **, de autoria do respeitável
vereador JORGE PEREIRA DOS SANTOS do Partido da República (PR).
O referido projeto de lei, que agora segue à Mesa de Vossa
Excelência para apreciação e ponderabilidade quanto à sanção ou veto, dispõe sobre a dispensa do
funcionário público do exercício de suas funções na data do aniversário.
Acredito que os respeitáveis vereadores que apoiaram o
projeto, bem como o seu autor, possuem boa intenção em proporcionar um tratamento distinto ao
funcionalismo público municipal, merecedor de respeito e estima pelas dificuldades enfrentadas na
consecução do interesse público.
Contudo, peço a devida vênia para discordar tanto da
proposição, quanto de seus motivos e da sua aprovação pela Casa Legislativa, bem como para
sugerir o VETO ao referido projeto.
Nada obstante sabedor dos exímios profissionais que a
acompanham na atividade executiva municipal, em especial ao respeitável Procurador Municipal,
exsurge o meu dever como cidadão em apresentar-lhes os motivos para não sancionar o referido
Projeto de Lei.
DA INCONSTITUCIONALIDADE
O projeto de lei encontra-se eivado de vício desde a origem
porque o Poder Legislativo invadiu a competência do Executivo quanto à iniciativa do Projeto.
É flagrante que lei com tal conteúdo deve ser precedida de
estudo de viabilidade e impacto econômico, bem como a identificação da necessidade e
possibilidades técnicas de sua implementação, considerando inclusive as situações em que o serviço
público deve ser prestado sem interrupção, notadamente em Campo Mourão, onde dispõe-se de
poucos funcionários em determinados Departamentos.
Não é fora de propósito que o ordenamento jurídico pátrio
impõe a iniciativa do Chefe do Executivo na proposição de leis que disponham acerca dos
servidores públicos, bem assim sobre a sua organização e funcionamento.
Sua Excelência, o ex-Ministro do Supremo Tribunal
Federal, CELSO DE MELLO, em situação similar atestou que o regime dos servidores, de
iniciativa privativa do Chefe do Executivo:
é o conjunto de regras que disciplinam os diversos aspectos
das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo
Estado com os seus agentes. A expressão regime jurídico
dos servidores, que é ampla, abrange todas as normas
relativas: a) às formas de provimento; b) às formas de
nomeação; c) à realização do concurso; d) à posse; e) ao
exercício, inclusive hipótese de afastamento, de dispensa de
ponto e de contagem de tempo de serviço, ... h) aos direitos
e às vantagens de ordem pecuniária." (in "Constituição
Federal Anotada", Saraiva, 2a ed., 1986, pg. 220)
O Projeto de Lei ora aprovado desrespeita a independência
e a harmonia que deve imperar entre os Poderes, pois impõe que o Poder Executivo conceda a seus
servidores licença na data de aniversário de seus servidores, verificando-se, pois, flagrante
ingerência do Legislativo Municipal no desempenho das atribuições administrativas típicas do
Chefe do Poder Executivo.
O raciocínio que ora se expõe encontra conformidade com o
entendimento unânime do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (ex vi ADI
121571-6 e ADI 123488-3).
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar a Repercussão
Geral no Recurso Extraordinário 745811 – PA, através da Relatoria de sua Excelência, o Ministro
Gilmar Mendes, traçou limites para que não haja inconstitucionalidade na realização de emendas
em projetos de iniciativa do Poder Executivo.
Insensato seria concluir que se permitiria a própria
iniciativa, raciocínio que se verifica por correto na decisão unânime proferida no Recurso
Extraordinário 370563 – SP, de relatória da então Ministra Ellen Gracie, que considera
inconstitucional alteração de tratamento a servidores por iniciativa de terceiros que não o Chefe do
Executivo.
Ipso facto, concluo que o projeto de lei é formalmente
inconstitucional (vício insanável) por ofensa ao artigo 66, inciso I, da Constituição do Estado do
Paraná e aos artigos 2º, e 61, § 1º, inciso II, da Constituição Federal, bem como ilegal porque
contrário à Lei Orgânica Municipal, motivos pelos quais sugiro à Vossa Excelência, o devido veto.
DA OFENSA À MORALIDADE ADMINISTRATIVA E
DA AUSENCIA DE INTERESSE PÚBLICO
O projeto de lei proposto indevidamente por integrante da
Casa Legislativa trata de dispensar do trabalho, o servidor público municipal, quando da data de seu
aniversário, postura que agrada tão somente o servidor e familiares.
O interesse público é norte obrigatório nas atuações do
Estado, infelizmente esquecido por muitos dos que desempenham a função nos Poderes da
República. A moralidade administrativa é o manto que legitima a atuação do Estado e suas
prerrogativas perante o particular. Os dois institutos não podem andar separados, visto que,
inclusive o segundo reforça o primeiro.
Descuidada a proposta de uma maior análise do impacto
gerencial, financeiro, de recursos humanos, dentre outras, isso porque não dispõe a municipalidade
de pessoal suficiente para atendimento a todas as funções que constitucional e legalmente o Estado
se obrigou a prestar, bem como o cidadão muito reclama das filas e demoras nos mais diversos
setores de atendimento público, em particular no campo do acesso à Saúde.
No compulsar do referido Projeto de Lei, consta Ofício
encaminhado por Vossa Excelência dando informe de que não haveria impacto ao Erário Municipal,
contudo desacompanhado dos dados que levaram a dita conclusão e que se fazia necessário para
melhor análise da Comissão Permanente de Finanças e Orçamento.
E ainda que não se observe impacto negativo no orçamento,
o mesmo não se pode dizer quanto ao funcionamento dos serviços públicos essenciais, estes
entendidos como os mais prejudicados com a proposta.
A benesse
constante
no
projeto
não
se
encontra
acompanhada de explicações satisfatórias de como será efetivada, apontando algumas insuficientes
limitações para evitar o abuso do interesse particular em face do interesse público.
Aliás, a boa moral e a boa prática administrativa dispensa
qualquer raciocínio favorável aos casos de dispensa imotivados ou injustificados, igualmente
colidindo com a pretensão individual e chancelada inadequadamente pelo Poder Legislativo
Municipal.
Assim
como
o
interesse
público,
a
moralidade
administrativa é princípio constitucional de observância obrigatória por todos da Administração
Pública Direta e Indireta de todos os Poderes da União, dos Estados e dos Municípios. (ex vi artigo
37, caput, da Constituição Federal).
Há imoralidade administrativa quando o ato praticado pelo
Poder Público não atende à finalidade pública, mais claramente, o interesse público, seja porque o
motivo do ato (aqui, a ocasião de fazer aniversário) é insuficiente, inadequado, incompatível ou
desproporcional.
Igualmente ofenderá a moralidade administrativa quando o
objeto do ato (aqui a dispensa do ponto) seja desconforme ou ineficiente.
Ipso facto, considero a necessidade de apresentação de
veto a bem do interesse público, visto a ocorrência de ofensa à moralidade administrativa no caso
in quaestio, justamente porque o motivo da benesse é insuficiente e inadequado para a dispensa do
trabalho, bem como o objeto está em desconformidade com o interesse público primário.
Sendo o que tinha para o momento, impulsionado pelo
desejo de ser útil à sociedade mourãoense e de corroborar com a boa prática das Instituições
Políticas desta querida cidade, peço vênia pela intercessão, contudo tomei as rédeas do meu dever
para com o exercício da cidadania, prática que muito valorizo.
Apresento meus votos de estima e apreço.
Atenciosamente,
RAFAEL ALMEIDA CALLEGARI
Cidadão - Advogado – Professor
“Justiça é o que nos favorece, injustiça o que nos contraria”
(Miguel Couto)
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